Meu prêmio Nobel preferido

Meu prêmio Nobel favorito é bem previsível. Sou fã dos laureados de 1973, Konrad Lorenz, Nikolaas Timbergen e Karl von Frisch. Especialmente os dois primeiros por seu espírito naturalístico e seu legado de popularização da ciência. Os três receberam o prêmio daquele ano por suas contribuições na criação da etologia, ou comportamento animal. Como trabalho nessa área de pesquisa esses caras merecem uma estátua no meu quintal ou, pelo menos, uma foto no quadro de cortiça do meu laboratório.

O austríaco Karl von Frisch dedicou muito de sua  vida à comunicação entre as abelhas melíferas. Frisch descreveu o mecanismo de atuação dos feromônios na comunicação química entre o casal real e na hierarquização das castas dentro da colméia. Também explicou o papel da luz polarizada e da luz ultravioleta na comunicação desses animais. Mas seu trabalho mais conhecido traduziu a mensagem contida na dança das abelhas. As abelhas operárias que saem a forragear e, eventualmente, encontram uma boa fonte de alimento, retornam à colméia e sinalizam esse alimento às outras operárias. Elas realizam uma dança em forma de oito, a direção em que a abelha avança é o ângulo em relação ao sol em que se encontra o alimento. Já o tempo em que a abelha passa “rebolando” no centro do oito informa a distância da fonte de alimento.

Nikolaas, ou Niko, Timbergen foi um holandês interessado no comportamento de aves e peixes, entre outros organismos. O que mais me encanta nos trabalhos de Timbergen são seus experimentos elegantemente simples para testar idéias originalmente complexas. Timbergen, para mim, é um ícone de uma época em que ciência de excelente qualidade e amplamente reconhecida poderia ser feita com poucos recursos e muita criatividade. Entre os experimentos dele lembro-me de um que procurava explicar o comportamento de jogar fora as cascas de ovos eclodidos em gaivotas em que Timbergen observou a freqüência de predadores de filhotes em ninhos com ovos eclodidos e outros sem. Além disso, Timbergen enveredou para as bandas da divulgação científica produzindo filmes de história natural. Talvez o mais importante legado de Timbergen para a etologia tenha sido suas quatro perguntas básicas da etologia. Aquelas relacionadas aos mecanismos proximais: 1) Que estímulos desencadeiam o comportamento? e 2) Como o comportamento muda com a idade? E aquelas relacionadas aos mecanismos distais: 3) Como o comportamento se compara em espécies aparentadas? e 4) Como aquele comportamento afeta a sobrevivência dos animais que o realizam.

Konrad Lorenz, austríaco, também tinha uma predileção por aves. Usando gansos, Lorenz descreveu a estampagem, um mecanismo em que o animal tem um padrão de comportamento instintivo disparado por um estímulo aprendido. O padrão fixo de ação “siga a mamãe que ela irá alimentá-lo e ensiná-lo a voar” codificado no genoma dos filhotes de ganso depende de um outro aspecto, saber quem é “a mamãe”. Nesse sentido encontra-se igualmente codificado no genoma do gansinho a informação “mamãe é a primeira coisa grande que se mexer assim que você sair do ovo”. Ao posicionar-se em frente a ovos eclodidos em chocadeiras, Lorenz criou uma legião de gansinhos a segui-lo. Ele trabalhou ainda com comportamento agressivo, e aprendizado. Lorenz também era adepto da divulgação científica e escreveu alguns títulos sobre o comportamento animal para o público em geral.

As carreiras desses pesquisadores ocorreu em grande parte durante os anos de guerra. De fato, Lorenz e Timbergen viveram a II Guerra Mundial de forma bastante diferente. Lorenz afiliou-se ao partido nazista em 1938, o que lhe rendeu uma cátedra na universidade de Munique. Seus experimentos foram dirigidos pelo regime nazista durante alguns anos, escreveu sobre higienização racial e determinismo genético. No mesmo período Niko Timbergen foi feito prisioneiro dos nazistas e obrigado a realizar experimentos. Isso levou-o a cortar relações com Lorenz por muitos anos. Mais tarde, na cerimônia de entrega do Nobel, Konrad Lorenz reconciliou-se com Timbergen, assumiu seus erros e pediu desculpas por alguns de seus atos do passado.

Discussão - 3 comentários

  1. Igor Zolnerkevic disse:

    O Lorenz escreveu uns livros de divulgação científica muito bons, comparando o comportamento dos animais com o dos humanos e sugerindo dai soluções contra a guerra, a desigualdade social, a degradação do meio ambiente. Vale a pena conferir.

  2. Carlos Hotta disse:

    Foi bem previsível esta, não? 😛
    A propósito, saiu o resultado do sorteio do livro
    http://www.ediouro.com.br/as100maioresdescobertas/
    Veja em:
    http://lablogatorios.com.br/raiox/2008/10/18/e-os-ganhadores-dos-livros-foram/
    Valeu pela participação!

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