Quem veio primeiro, o ovo ou o Kiwi?
Kiwi mum and dad, this one is for you.
Em 1996 morei por seis meses com uma família neozelandesa para estudar inglês e conhecer um pouco melhor esse país tão longínquo e curioso. Uma das primeiras coisas que me chamou a atenção ali foi o Kiwi, a ave símbolo da Nova Zelândia. Esse bichinho engraçado é noturno, do tamanho de uma galinha, cinzento, tem mais plumas do que penas, o que dá uma aparência peludinha a ele e, pasmem, não tem asas, seus membros anteriores estão reduzidos a estruturas do tamanho da unha de um gato. O kiwi também tem um longo bico com narinas na ponta e um excelente olfato (ao contrário da maioria absoluta das demais aves). Lá na fazenda que eu fiquei às vezes dava para ouvir os cantos deles à noite. Uma experiência e tanto!
A lenda maori conta que o kiwi perdeu suas asas num trato feito com os deuses-árvores em que o kiwi comeria os insetos que devoram as árvores e, em troca, a floresta continuaria abrigando seus primos voadores. Na verdade os kiwis não se alimentam de insetos pragas, mas sim de habitantes da serapilheira, decompositores. A perda das asas deve ser uma característica partilhada com seus ancestrais, as moas.
Coisas estranhas assim, como o kiwi, só surgem em ilhas. O isolamento geográfico das ilhas privilegia uma evolução completamente peculiar. É assim com a Austrália e suas serpentes e medusas super-venenosas, é assim com Madagascar e seus lêmures, também é assim com a Nova Zelândia e os Kiwis. Na ausência de mamíferos terrestres no arquipélago da Nova Zelândia, que por ter origem vulcânica nunca esteve ligada a nenhum continente de onde os mamíferos pudessem ter vindo, o kiwi ocupou um nicho muito semelhante àquele ocupado por mamíferos em outros locais, como o porco-espinho ou a équidna.
De todas as esquisitices do kiwi a que mais me deixa bobo é a proporção de seu ovo. O ovo pesa 20% da massa corporal da fêmea. É como se uma mulher desse à luz um bebê de 13 kg! Durante a incubação o ovo ocupa um grande espaço na cavidade abdominal da fêmea, ela chega a andar de pernas abertas e com a barriga arrastando no chão. Às vezes até imerge a barriga em água para aliviar o peso. Esse ovo também contém a maior quantidade de material nutritivo dentre as aves. Cerca de 40% do ovo é puro alimento que irá nutrir o filhote até uma semana após o nascimento. Esse filhote já nasce emplumado e independente dos pais, condição que chamamos precocial. É o macho quem choca o ovo. Também, pudera. Se bem que a fêmea kiwi não faz grandes dramas para botar tamanho ovão. O processo é rápido e aparentemente indolor (!?!). Surpreendente é ela ser capaz de gerar um novo ovo apenas 25 dias após o primeiro. São dois a três ovos por estação de acasalamento. Até 100 ao longo de toda a vida.
Imagens obtidas em www.savethekiwi.org.nz
Discussão - 7 comentários
Coitadinha...
Realmente surpreendente a natureza, uma pobre fêmea carregar um ovo desse porte .... chega ser cômico huahauhau... muito interessante.... e para os que leem este blog, morram de inveja pq ele é meu prof de zoologia de vertebrado na UNEMAT e acreditem ele é MARAA...rssss
No reino animal também ocorre a divisão das tarefas familiar? Se as fêmeas reclamam é justo porque o menor sacrifício ainda cabe aos machos.
“...quando pensamos em uma pulsão materna nos embrenhamos na teoria, nos perdendo em um emaranhado de seres humanos e animais. Muitos animais de fato lidam muito bem com a maternagem. Nos primeiros estágios do processo evolutivo os reflexos e as mais simples respostas pulsionais demonstravam ser suficientes. De qualquer maneira, as mães e os bebês humanos possuem qualidades humanas, e isso deve ser respeitado. Eles também possuem reflexos e pulsões brutas, mas não podemos descrever satisfatoriamente os seres humanos a partir daquilo que eles compartilham com os animais.” “Relationship of mother to her baby” (apud Abram, Jan. A Linguagem de Winnicott. Revinter, 2000. p, 147).
Acrescento que a preocupação materna primária é característica específica da mãe porque ninguém melhor do que ela é capaz de cuidar do seu bebê ou “filhote”. Mas continuamos presentes para apoiar!
Como ilha que também somos, carregamos dentro de nós nossas idiossincrasias e esquisitices tão estranhas quanto o Kiwi que não come a fruta do kiwi. O nosso cérebro de ornitorrinco não decifra a charada conciliadora dos maoris. Existe uma sabedoria que ciência alguma explica. Mas o Kiwi sabe dela e a utiliza. Do começo ao fim. Como o ôvo.
Nossa essa kiwi é muito doidoo!!! adorei ele! =]