Piracema prorrogada na Bacia do Paraguai

Os municípios que compõem a Bacia do Paraguai estão sofrendo mais um golpe econômico este mês. A economia local chega a aumentar em 30% com o dinheiro que vem do turismo para a pesca. Muitos dos pacotes turísticos são montados para o período imediatamente posterior à época reprodutiva, devido à grande quantidade de peixes desse período. Este ano, porém, o período de proibição da pesca foi estendido por mais um mês, passando do dia 28 de fevereiro ao dia 30 de março. Os turistas movimentam a economia em hotéis, restaurantes e através do aluguel dos barcos. Pacotes que já haviam sido vendidos para o período ficaram incompletos, gerando grande frustração nos turistas.

A época de proibição pesqueira, também chamada de defeso ou piracema, coincide com o pico de atividade reprodutiva de diversas espécies de peixes, inclusive aquelas com maior interesse econômico, como o dourado, a cachara e o pacu. Neste período os peixes sobem os rios em direção às cabeceiras para desovar num ambiente onde haja menor pressão de predação dos filhotes e maior quantidade de nutrientes na água. A subida do rio é o ápice comportamental de um processo fisiológico que vem ocorrendo há mais tempo para os peixes. Nos meses que antecedem a piracema os peixes desenvolvem suas gônadas e se preparam para a reprodução. Neste sentido, proibir a pesca dos indivíduos que irão dar origem aos novos peixes é primordial para a preservação das espécies, especialmente as de interesse comercial.

A piracema está pareada na fisiologia dos peixes com um evento ambiental: o aumento do nível dos rios devido às chuvas. Ora, se chove muito a água que cai irá varrer o solo, levando muita matéria orgânica para o leito do rio e enchendo-o de nutrientes. Com alimento de sobra os filhotes poderão desenvolver-se melhor e sobreviverão mais facilmente. Portanto, faz todo o sentido que a desova ocorra no período de maior quantidade de chuvas. Quando a marinha registrou os efeitos do fenômeno climático La Niña, que levou a um atraso nas chuvas, um relatório foi encaminhado às autoridades e a Justiça Federal decretou a extensão do defeso por mais um mês. Até aí tudo faz muito sentido, sem as chuvas os peixes não devem ter desovado, já que não iriam ter ainda as vantagens necessárias aos seus filhotes.

Mas há um problema aí. Análises encomendadas pela SEMA, a Secretaria de Meio Ambiente do Mato Grosso, a um colega de UNEMAT, o Prof. Claumir César Muniz, indicam que os peixes já haviam desovado dentro do período esperado, mesmo com o baixo volume de chuvas. Isso acontece porque a desova não é um produto direto das chuvas, mas é controlado antes pelo relógio biológico dos animais. Secundariamente, os relógios biológicos são aferidos por mecanismos ambientais, como a duração dos dias ou o chegada das chuvas, são os chamados zeitgebers ou marcadores temporais. Os marcadores temporais ajudam a ajustar o relógio biológico, mas não é a alteração deles uma única vez que irá desregular o relógio biológico para sempre. É preciso que haja um padrão que se repita para o relógio biológico ser reprogramado. Como o La Niña só ocorreu este ano, isto não afetou o relógio biológico dos peixes, que continuaram desovando no período de novembro a fevereiro, não indo março adentro.

A SEMA-MT já enviou um relatório à justiça solicitando a suspensão da liminar e levando alívio aos que dependem do turismo para encher a geladeira. É a Ciência auxiliando o cidadão comum e a economia a progredir de forma sustentável. Enquanto não sai a revogação da liminar, melhor manter os anzóis na caixinha. O fiscal do IBAMA não vai querer saber do Blog que você leu dizendo que foi um erro estender o defeso.

Discussão - 1 comentário

  1. Bom,o senhor poderia me dizer o nome de alguns peixes que participam da piracema,por favor
    obrigada

Envie seu comentário

Seu e-mail não será divulgado. (*) Campos obrigatórios.