Blog Action Day: As águas de Nobres
à Lala, por tudo o que me ensinou sobre ecologia de riachos tropicais.
Como habitualmente desfilo de roupa de neoprene, snorkel e máscara segurando na mão minha câmera sub e uma prancheta e lápis sob o olhar curioso dos turistas. É mais um dia de trabalho no meu escritório favorito, os rios de Nobres em Mato Grosso. Coloco os pés na água e sinto-a gelada entrando nas botas de neoprene, presas na prancheta estão planilhas à prova de água para anotação do comportamento dos peixes em uma estância turística de rios com águas cristalinas a aflorar do meio das rochas calcárias. Este é meu doutorado.
Nascente do rio Salobras, meu Éden pessoal
No Rio Salobras os proprietários das atrações turísticas, Toninho e Kleber, foram atenciosos com a preservação do local como sempre são comigo, há guias para acompanhar os turistas e evitar maiores danos ambientais e a mata ciliar está completamente íntegra. Termino de entrar no rio e flutuo por alguns instantes enquanto a atividade dos peixes retoma seu ritmo natural. Ao molhar os ouvidos um silêncio tranquilo me invade, posso mesmo divisar o ruido rascante de um curimba abocanhando bocados de areia. A água é de um azul indescritível e trasparente como se não estivesse ali. Uma profusão de pequenas jóias me cerca. Sei que a maioria delas passa despercebida pelos visitantes, mais interessados nas grandes piraputangas e dourados, mas cardumes de lambaris, mato-grossos, moenkhausias e piabas rodeiam meu corpo. Afundo pela primeira vez em busca de casais de carás e joaninhas (o peixe, não o besouro), mas em seu lugar encontro cascudos e uma traira muito bem camuflada.
Cámbia. Todo cámbia.
Ao retornar para a superfície me detenho e tento uma fotografia de uma piraputanga vista do fundo. Lá em cima estão as copas das árvores de onde boa parte da energia deste ecossistema vem. Ao colocar o snorkel para fora e retomar o fôlego, acompanho um grupo de piaus e piraputangas descerem o rio e me recordo ter escutado um bando de macacos prego forrageando antes de entrar na água. Estes peixes aguardam que os primatas bagunceiros derrubem parte de seu alimento no rio para então comê-lo.
A água, os peixes, a mata, o rio, os macacos, as rochas. Subitamente sinto-me pequeno, mas ainda assim uma peça no mais intrincado quebra-cabeças existente. O quebra-cabeças das interações ecológicas.
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