Quando a Ciência e a Conservação caminham juntas pela sustentabilidade

Tenho uma visão meio pessimista sobre a sustentabilidade da nossa espécie. Participei recentemente da Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, cujo tema era Ciência para a Sustentabilidade, mas confesso que sou meio descrente desta tal sustentabilidade. Até ponho nas justificativas de meus pedidos de financiamento o valor dos dados que prometo gerar na conservação, mas sei que pouco farei para implementá-los como ferramentas da conservação. Esta é sim uma auto-crítica. No entanto, hoje escrevo sobre um artigo que me ensinou como os dados que geramos no laboratório podem ser ferramentas vitais para a manutenção da existência de espécies, paisagens e, em última instância, da nossa própria espécie.

O documento síntese da avaliação do novo código florestal brasileiro, assinado pelos pesquisadores Thomas M. Lewinsohn, Jean Paul Metzger, Carlos A. Joly, Lilian Casatti, Ricardo R. Rodrigues e Luiz A. Martinelli, será melhor explorado numa seção especial da revista Biota Neotropica em breve, mas o documento síntese já mostra como a capacidade de previsão que caracteriza a ciência pode nos apontar os resultados de ações humanas sobre a natureza. Uma revisão do código florestal brasileiro em construção atualmente traz modificações cujos impactos são assustadores. Algumas das propostas mais controversas são a redução das áreas de reserva legal e de preservação permanente, redução de 30% na área de preservação da Amazônia Legal e anistia aos proprietários de áreas desmatadas anteriores a 2008. Alterações como estas têm resultados cientificamente previsíveis como a perda de espécies, redução da prestação de serviços ecossistêmicos, aumento das emissões de gás carbônico e dos impactos de atividades humanas.

Oito pontos chave foram levantados pelos pesquisadores como geradores de impactos relevantes. Serão estes oito pontos que abordarei na série que se inicia amanhã intitulada: “Por que o código florestal que tramita no congresso não pode ser aprovado”. Serão abordados a redução das matas ciliares, fim da preservação das áreas de várzea, dos topos de morro e altiplanos, redução da Amazônia Legal, das reservas legais, compensação da reserva legal dentro do mesmo bioma, inclusão das áreas de preservação permanente dentro da reserva legal e liberação do plantio de espécies exóticas nas reservas legais.

Reconhecidamente o Brasil peca mais pela dificuldade em fazer cumprir suas leis do que pela existência de leis ruins. No entanto, este problema não se resolve reduzindo o rigor da lei para tornar menor o número de punições. O necessário é fazer-se cumprir leis que tenham embasamento.

Discussão - 3 comentários

  1. João Leme disse:

    É o poder do agronegócio, infelizmente a mentalidade da grande maioria dos agricultores e criadores aponta para o negativo e lógicamente, onde há dinheiro há político.
    Eu me preocupo duplamente quando se pretende rever uma lei, porque sei como os magistrados brasileiros tendem ao tecnicismo ao julgarem ações onde há muita responsabilidade. Hum, mas eles fazem exatamente como o cidadão sem consciência, ou seja, deixam nas mãos de uma divindade e dos políticos (nojentos) de nosso país.
    Em uma viagem que fiz recentemente ao interior do meu estado (MT) fiquei abismado ao ver como tão pouca mata resta em uma região outrora densa. Triste, uma imensa tragédia dos comuns.

  2. Marão disse:

    Lamentavelmente partilho do mesmo ceticismo em relação a este assunto. Somos os maiores corruptores dos ciclos naturais, adulteramos irreversivelmente com nossas “conquistas”, muitas vezes científicas, nossos ecossistemas vitais e degeneramos a nossa biosfera. Balela essa estória de medidas compensatórias e mitigadoras. Balela o licenciamento e fiscalização ambientais. A sociedade contemporânea atingiu ou está perto disso, o máximo do seu potencial destruidor e, “nunca antes na história desse País”, circunscrevendo o nosso (i)mundinho ao Brasil, observamos uma degradação tão acelerada. Essas alterações concentraram-se em poucas décadas, possuem um efeito global e ancoram-se fortemente no comportamento. É isto que confere um caráter insustentável à sociedade hodierna. Por isso o desenvolvimento sustentável, a balela da moda, não é escopo de trabalho para um único ou mesmo vários grupelhos, é sim, em todos os sentidos, uma gigantesca tarefa global. Questões como a participação efetiva da sociedade civil nas decisões ambientais, liberdade de acesso ás informações ambientais sempre dissimuladas pelo aparelho do Estado, a excessiva compartimentação disciplinar, a complexa teia dos impactos socioambientais e o diálogo de surdos dos diversos saberes existentes para organizar todo o potencial científico e tecnológico, são alguns desafios intransponíveis. Isso para não falar na influência nociva dos políticos, na inexistente educação ambiental e muitos etecéteras a mais.

  3. jose david disse:

    reconhecidamente o brasil está tentando um pouco tarde demais para a conservaçao das suas riquezas naturais esperamos que com os nossos novos governantes possamos realmente e de fato consevar com sustentabilidade

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