A fêmea no poder V
Ao chegarmos ao final da primeira semana de fêmea no poder do Brasil não poderia deixar de falar da sociedade matriarcal do bonobo, Pan paniscus. Na árvore da vida o ramo que dá origem a Homo sapiens se separou mais recentemente de um ramo que originou duas espécies: os chimpanzés (Pan troglodytes) e os bonobos. Ambos não poderiam ser mais diferentes entre si em termos da lida com o poder. No entanto, são igualmente aparentados a nós. Aparentemente o surgimento do Rio Congo na África há 1,5 milhão de anos separou duas populações do ancestral Pan, originando ao norte do rio os chimpanzés e ao sul os bonobos. Surpreendente é saber que estes nossos primos tão próximos estão altamente ameaçados de extinção pela caça e desmatamento.
Nossos parentes mais próximos
Fonte: utdallas.edu
A maior sumidade mundial em comportamento de bonobos é o primatologista Frans de Waal. Ele afirmou em seu livro “Eu, primata”, embora não sem uma enxurrada de críticas, que bonobos são altruístas, pacientes, gentis, sensíveis, têm empatia e compaixão. As críticas vêm da dificuldade de imprimir sentimentos humanos a espécies não-humanas, entre outras. Fato é que bonobos nunca foram vistos agredindo seus iguais até a morte, comportamento comum entre os chimpanzés segundo as décadas de observação cuidadosa de Jane Goodall nesta espécie. A falta de trabalhos sobre bonobos em seu habitat natural pode fazer com que agressões letais ainda sejam descritas, mas sua natureza mais pacífica é evidente.
Analisando-se a árvore de nossos parentes viventes mais próximos temos uma gama de opções as quais só me resta desejar que a presidenta Dilma convirja com o primo bonobo. Orangotangos são profundamente solitários, já dizia Drummond, e machos adultos são frequentemente reconhecidos pelo conjunto de cicatrizes faciais que têm em decorrência de seus inúmeros combates. Gorilas formam haréns e intimidam rivais com o tradicional tamborilar dos punhos no peito, à fêmea não resta muita expressão senão cuidar da prole e satisfazer o macho durante o cio. Chimpanzés matam indivíduos solitários que invadam seu território e até filhotes de fêmeas inferiores na hierarquia podem ser mortos. Já o bonobo resolve seus conflitos com sexo! Um indivíduo passa um longo tempo longe? Na volta todos o recebem com sexo. Dois irmãos brigam? As pazes se fazem com sexo. Um intruso aparece? Seu reconhecimento pelo bando é feito através de sexo. Uma orgia, mas uma orgia pacífica bem ao estilo flower power dos anos 60.
Me lembrou a célebre fotografia de Alfred Eisenstaedt ao fim da 2a guerra
Fonte: http://www.dlwaldron.com/bonobos.html
Antropomorfismo e romantismo que seja. A série toda foi cheia de romantismos. Mas é esse altruísmo, gentileza, paciência, sensibilidade, compaixão e afeto que eu espero da líder que o Brasil elegeu e deu poder.
Discussão - 8 comentários
Oi Eduardo,
Muito interessante o livro do Frans de Waal, mas não conhecia dessas críticas ao livro.
Segundo a notícia no link abaixo foi descrito que os bonobos caçam e comem outros macacos. E também podem praticar o canibalismo. Mas também acho evidente que em comparação aos chimpanzés eles são mais pacíficos.
http://www.bbc.co.uk/portuguese/ciencia/2010/02/100202_primatacientistag.shtml
Boa série. obrigado pelos posts.
Ainda bem que você não usou como exemplo de poder feminino aquelas tais aranhas, as viúvas negras. 😉
Oi Eduardo, legal seus comentários. E realmente os animais não tem nenhuma moral. O comportamento é selecionado evolutivamente e favoreceu a espécie. Nossa espécie teve um período matriarcal, onde se organizava em clãs. Mas pelas características morfológicas humanas, selecionamos a agressividade do macho como preponderante no controle do grupo. Mas concordo que a fêmea é agregadora da energia sexual e distende o comportamento agressivo do grupo.
Se tiver curiosidade, lancei um livro num blog que trata um pouco estas questões, inclusive do ponto de vista freudiano...www.carlosburke.com.br...parabéns pelo blog.
Interessante seu site Carlos Burke. Interessante também como a internet pode deixar esse mundo pequeno. Burke, sou colega do Walace e participo da coleta de insetos aquáticos na sua propriedade em Santa Leopoldina.Abraços!
Sempre achei que essa estória de territorialidade inexiste de fato. Briga-se essencialmente por fêmeas, ou sexo, quer seja no Oriente (sem re)Médio ou qualquer outro lugar na natureza, qualquer que seja a espécie. “O Pau Come”, as fêmeas humanas já perceberam isso desde os tempos imemoriais. Agora não adianta falar na tomada de poder entregue generosamente pelo bonomo macho anterior e considerar que a fêmea atual abrandará seus modos e o retornará de bom grado. Não se trata mais de troca de gentilezas e jeitinhos maneirosos para reaver o presente, a falocracia é imperial e indivisível.
Falo simbólico e o “narcisismo do pênis”
Ao final dessa série me vem à mente uma discussão que exige ainda uma convergência maior das tendências ou não. O homem é: um ser biopsicosocial ora mais biológico ora predominantemente simbólico. Parece-me interminável essa queda de braço haja vista se as incursões levarem mais em conta o Campo Darwiniano – o poder do mais “forte”.
Extrapolando ainda mais o exemplo dos “presidenciáveis” estamos falando do sujeito. E aí desembocamos numa discussão do que é material e do que é simbólico e que constituem o sujeito. Ora, vimos que a inveja do pênis dá “pano pra manga”.
No último dia 31 de dezembro constatamos a supervalorização do pênis (ou “narcisismo peniano”). Afirmo isso, porque na passagem da faixa presidencial estava implícita a eloqüência do ato pelo “bonomo macho” (Marão que o diga!) fruto da aprovação do seu mandato e da sorte da companheira receber o país de suas mãos. Se essa percepção está correta estamos diante de um delírio especular e espetacular! O lugar do outro foi ocupado para admirar-se, tal qual narciso fez contemplando-se na fonte. Cito o mito para evocar também o homem mítico onde pode se esconder a “egolatria”.
Após essas considerações o melhor é aguardarmos para ver se o “homo sapiens” será capaz de usar a linguagem, onde se condensam as dimensões material e simbólica, ascenderá efetivamente na cadeia evolutiva - humanização.
É esperar para crer!
A síndrome do “Pau Maior” evoca os tempos de juventude, onde tais “valores” soem ser comparados pelos jovens machos. Não só a coitadinha da fêmea emasculada sente inveja do pênis, os machos desejam religiosamente terem o maior e vale a velha piada de que é mesmo muito mais para mostrar do que só para usar. Psicólogos e psicanalistas que o confiram. Demonstrações à parte, no duro mesmo, poder e Cetro são indissociáveis. A sedução pacífica e interativa traduzida em “bonomia” é, talvez, o caminho mais civilizado para a tomada do poder. A natureza sempre sábia, revela suas singelas verdades...Gostaria que o C.Burke discorresse mais sobre o assunto. Não sei se nos animais já não existe uma espécie de proto-moral determinada pela posse de poder dentro do grupo.
É esperar pra ver como será!