Adestrador de Cães, Profissão Biólogo
Sarah Leandrini – Adestradora de Cães
Trabalho com adestramento e passeio de cães na cidade de São Paulo, acho que posso dizer na área de serviços para animais de estimação ou “pets”. Eu trabalho como autônoma, mas pretendo futuramente abrir uma empresa como Microempreendedor Individual.
Acredito que esse mercado tem mais espaço para biólogos. Não há uma formação universitária específica para trabalhar com cães. Conheço biólogos, veterinários e zootecnistas que fazem este trabalho, mas também conheço publicitários, bancários, pessoas sem formação universitária. Acho que o mais importante da profissão é gostar de animais e ter paciência, mas a formação do biólogo ajuda a compreender melhor os aspectos comportamentais e de aprendizagem dos cães.
Não diria que há uma habilidade especial exigida, mas uma qualidade fundamental é a paciência, para lidar com os cães e também com as pessoas relacionadas a eles. A mudança comportamental do animal depende muito do envolvimento dos donos, e fazer com que eles participem do processo de aprendizado do cão requer muita paciência. Outras habilidades/qualidades: saber se relacionar bem com as pessoas, ser educado, saber falar e se expressar de forma clara, assertividade, liderança com os cães, sensibilidade, resolução de problemas, disposição para aprender, saber lidar com frustrações, coordenação motora (para segurar a guia, brinquedos, petiscos, etc.), agilidade, capacidade de observação.
No adestramento eu ensino comandos básicos de obediência aos cães (como sentar, andar junto, dar a patinha, deitar, ficar e vir quando é chamado). Eu trabalho principalmente com o reforço positivo, que é dar algo agradável ao animal quando ele faz o comportamento certo (carinho, elogio, brinquedo, comida, etc.). Durante o treinamento de comandos básicos eu já começo a abordar alguns problemas comportamentais (como agressão, medo, falta de limites, etc.). Mas o foco na resolução dos problemas é dado depois do treinamento, quando há uma relação de confiança e o cão obedece mais.
No passeio eu levo os cães para passear (meio óbvio, mas é isso!). É um passeio estruturado, o cão tem que andar junto e me obedecer. Se ele já é treinado fica mais fácil, se não é tem que treinar os comandos junto, senta, fica e espera. Se ele gosta de alguma brincadeira (pegar bolinha, brincar com outros cães, etc.) eu procuro incluir isso no passeio, pois deve ser agradável e gastar a energia dele.
Não tenho horário de trabalho fixo, depende da quantidade de clientes e da disponibilidade deles. Eu procuro trabalhar durante a semana, enquanto ainda está claro. O bom é que eu consigo ter horários mais flexíveis, mas o ruim é que tem cliente que só pode fora do horário comercial (para entregar e receber o cão).
Não tenho um ambiente formal de trabalho. Eu trabalho na rua, em praças, parques ou na casa do cliente. No adestramento eu geralmente procuro lugares calmos, com pouca distração para o cão, o que acaba sendo agradável. É bom porque eu saio bastante, e vario os lugares. Mas quando chove eu não faço o passeio (deixo de trabalhar e de receber) e dependo da disponibilidade do cliente de fazer o adestramento em casa.
Com relação à formação, foram necessários dois cursos de adestramento e um curso de passeio. Também fiz um mini-curso de gestão e marketing. Na graduação eu gostei muito de Embriologia, mas não tem nada a ver com o trabalho. Gostava também de Zoologia, Neurofisiologia, Bioquímica. Fiz uma disciplina de Comportamento Animal, que na época era optativa. No ano anterior ela não foi oferecida, então a turma ficou muito grande, o que dificultou um aproveitamento maior. No trabalho, as disciplinas que mais uso são um pouco de Comportamento Animal, Zoologia e Evolução, e uma da Licenciatura (acho que era Psicologia da Educação) na qual eu aprendi um pouco sobre aprendizagem e condicionamento.
Como muitos biólogos formados por universidades públicas eu terminei a graduação com a iniciação científica e ingressei no mestrado, na área de Ensino de Ciências. Cheguei a atuar como professora durante a graduação e depois, durante o mestrado, mas percebi que não tenho o perfil de professora de sala de aula, não gostei muito da experiência. Também fui percebendo, durante o mestrado, que não queria seguir carreira acadêmica, e estava insatisfeita com o rumo que a minha vida estava tomando. Foi quando meu marido teve a ideia de eu levar os cães do condomínio para passear, pois eu passava muito tempo em casa e escutava vários cães latindo, sozinhos nos apartamentos. Com essa ideia eu comecei a procurar cursos, ler livros, artigos sobre o assunto. Consegui meus primeiros clientes quando mudei para a Vila Madalena. Estou divulgando o trabalho, fiz um blog (http://caopanhiadasarah.wordpress.com/) e estou trabalhando na captação de mais clientes.
O que me motiva profissionalmente é a paixão pelos animais, principalmente os cães. Eu gosto muito de interagir com eles e observá-los. Também me motiva muito saber que o meu trabalho ajuda as pessoas a terem um relacionamento melhor com os seus cães, seja porque eles ficam mais calmos depois do passeio ou porque as pessoas aprendem a se comunicar melhor e têm um cão mais educado com o adestramento. Um grande desafio para mim é a parte de gestão do negócio e divulgação. Eu entendo pouco disso, e na faculdade não tive formação nessa área. Acho que falta muito nos cursos de Biologia uma visão mais empreendedora da profissão. Outro desafio é conseguir envolver os donos na educação do cão. Algumas pessoas tendem a achar que o adestrador faz milagres, e deixam toda a responsabilidade em cima dele e do cão. É um pouco frustrante ver o cão me obedecendo muito bem e sendo “mal educado” com o dono. Um problema da profissão é que, como autônomo, você trabalha sozinho. Eu fiz cursos, leio muito, mas às vezes sinto falta de discutir com alguém que tenha mais experiência sobre as dificuldades. É importante criar uma rede de relacionamento profissional, para ter pessoas com quem discutir sobre os problemas que você enfrenta no dia a dia.
Que recomendação eu daria a um aspirante a seguir a mesma carreira que escolhi? Estudar muito, procurar livros e artigos (grande parte da literatura está em inglês, por isso é necessário pelo menos saber ler nesta língua), fazer vários cursos e conhecer diferentes metodologias de adestramento. Aqui em São Paulo existem empresas que oferecem cursos de adestramento e passeio. Vale a pena também investir em cursos de administração, gestão e marketing, porque é um negócio como outro qualquer. Outra possibilidade é procurar emprego em creches caninas ou empresas que oferecem o serviço de adestramento ou passeio. O salário não é alto, mas alguns lugares dão um treinamento, o que já conta muito para a experiência.
Discussão - 3 comentários
[…] foi publicada minha entrevista (link aqui) para o blog Ciência à Bessa (muito chique, eu dou […]
olá Bessa, como ex aluna e bíologa formada gostaria de sugerir um artigo sobre o papel que nós Biólogos, podemos desenvolver na Gestão ambiental, dificuldades encontradas, aplicação de nosso conhecimento, etc fica a dica de quem passa por isso todos os dias e, mesmo quando o desânimo fala mais alto, continua a lutapor esse planeta. Bjs da sua ex aluna Claudia
Claudia, dê uma olhada nas entrevistas com o Allan e o Angelo. Acho que eles mostram bem nosso papel na gestão ambiental. Abraços do ex-professor. Bessa