Instinto, aprendizado e o recém nascido

Uma das primeiras coisas que todo pai nota em seu bebê é a capacidade de agarrar. Todo bebê segura firmemente com as mãos qualquer coisa que seja posicionada na palma de sua mão. Este comportamento já está presente na hora do parto, mesmo em prematuros, e se mantém até o segundo mês. É um excelente candidato àquele comportamento instintivo, sem nenhum componente aprendido. Só que não.

O reflexo de agarrar emociona os pais pela interação e tem bases evolutivas fundamentais

O reflexo de agarrar emociona os pais pela interação e tem bases evolutivas fundamentais

Os etólogos clássicos descreviam dois comportamentos extremamente simples: o padrão fixo de ação e os atos reflexos. O padrão fixo de ação é a resposta a um determinado fator ambiental conhecido como estímulo-sinal que, depois de desencadeado, não depende mais do ambiente. Ou seja, ao perceber o estímulo-sinal o animal, qualquer que fosse, dispararia o comportamento e seria incapaz de modulá-lo e de interrompê-lo, independente do que ocorresse ao redor. Padrões fixos de ação eram entendidos como comportamentos altamente estereotipados e invariáveis entre indivíduos. Parece combinar com o comportamento de agarrar.

Nos anos 50 a etologia passou por uma mudança de paradigma que propunha que nenhum comportamento é totalmente instintivo nem totalmente aprendido. Na verdade essa distinção é totalmente impossível. Então o que poderia não ser instintivo em se agarrar?

Agarrar-se é um comportamento adaptativo para os bebês de tempos passados, quando não havia carrinhos dobráveis, bebês-conforto ou moisés. Ser levado com a mãe dependia do filhote se agarrar aos pelos dela. Pelos estes que nem mais existem. Como o comportamento de agarrar não causava nenhum prejuízo, a seleção natural não se deu ao trabalho de extirpá-lo do repertório dos nossos bebês. Ele permanece lá como um dente do siso ou um apêndice.

Mesmo assim, o agarrar-se passa por aprendizado. Nos primeiros dias após o parto ele é forte, mas desajeitado, à maneira de alguém puxando outro pelos cabelos. Com o passar das semanas torna-se mais coordenado, com os dedos e o polegar formando um cilindro e tendo maior firmeza, à maneira como seguramos uma lata. A força preênsil vai reduzindo com a aproximação do terceiro mês de vida até que o reflexo desaparece.

O mesmo pode ser dito do reflexo de sucção. É certo que os recém nascidos já têm o costume de sugar o que se lhes ponha na boca. No entanto, qualquer pessoa que já acompanhou uma mãe sabe da dificuldade do aprendizado da chamada pega. O recém nascido frequentemente não sabe ao certo como abocanhar o seio da mãe, surgindo dificuldade em alimentar-se e dor à mãe. É só a prática e a capacidade de aprendizado dos nossos bebês que permite o aumento na eficiência da mamada.

Nem instinto, nem aprendizado. Todo comportamento é uma mescla desses dois componentes indissossiáveis. A grande riqueza do comportamento animal reside na certeza dos comportamentos adaptativos, mas também na flexibilidade que eles mesmos têm para responder rapidamente ao ambiente.

Discussão - 2 comentários

  1. Içami Tiba disse:

    Acredito muito nesta composição instinto-aprendizado. Tanto que no meu novo livro, a ser lançado ainda neste mês de Março de 2014: Educação Familiar - Presente e Futuro, pela Integrare Editora, tenho um capítulo dizendo que é a mãe que vicia o seu recém-nascido e dormir somente no colo, e tumultua a vida de todos os que vivem à sua volta. É um erro de muito amor, mas pouco conhecimento educativo. Içami Tiba, psiquiatra e educador.

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