Grand Canyon e a Arte

É socialmente reprovável cometer um deslize na História ou Literatura; mas é desculpável se se afirmar que no Marão existem pegadas de dinossáurio. Ou que o Jurássico é um título de um filme.

É lugar comum em conversas de café discutir-se pintura, música, literatura ou história.

Emitem-se opiniões e confrontam-se gostos. Não se confundem tendências artísticas nem épocas históricas; arrumam-se os vários artistas nos movimentos e séculos respectivos. Beethoven foi influenciado na sua obra pelo papel histórico e social de Napoleão Bonaparte e não por Átila, o Huno. Picasso, apesar de o poder ter feito (como seria?), não pintou o tecto da Capela Sistina. Os Medici não patrocinaram a obra literária de Samuel Beckett.

São exemplos, que roçando o absurdo, ilustram que a literacia artística e a histórica tem um papel nos actos sociais.

Mas e a literacia científica?

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CLAQUES VIRTUAIS

A propósito desta notícia, já ela imbuída no espírito do Euro 2008, relembro um texto publicado anteriormente, na altura referente ao Mundial 2006.

Mundial de Futebol – cangurus, coalas e extinções?

(Publicado no jornal O Primeiro de Janeiro a 10/06/2006)

O Campeonato do Mundo de futebol que se avizinha será um palco de intensos combates. Ao longo de Junho e parte de Julho assistiremos a confrontos entre intervenientes que terão o mesmo objectivo e jogarão com as mesmas regras.
Dos confrontos que se avizinham sairão sobreviventes e extintos; adaptados e inadaptados; momentos de sorte e azar; e, sobretudo, intervenientes que lograrão atingirem os seus objectivos e outros…que nem por isso.
Acima de tudo será um período em que tudo se decidirá e nada ficará como dantes.
O acontecimento que é o Mundial de futebol, pode apresentar algumas analogias, umas mais lineares que outras, com um dos processos fundamentais na História da Terra e dos seres vivos – a Evolução.
Encarando cada selecção como um organismo perceber-se-á que poderemos corresponder os jogadores aos órgãos ou estruturas dos organismos. Cada jogador é especializado numa determinada função e, no Mundial, teremos os melhores para um papel específico em campo – ou talvez não, já sei que falta o Quaresma…
Assumindo esta comparação poderemos então entrar neste momento “evolutivo” que é o Mundial.

“Mundiais” na História da Terra?

Existem momentos na História da Vida na Terra em que se alteram as condicionantes do meio ambiente (alterações climáticas; vulcanismo; impacto de objectos extraterrestres; etc.) ou mesmo as relações estabelecidas entre os próprios seres vivos.
Genericamente esses momentos conduzem a extinções que, em maior ou menor grau, conduzirão ao desaparecimento de espécies animais e vegetais. Para além do efeito directo sobre aquelas que desaparecem, existe igualmente um efeito sobre as que ficam – podem explorar e ocupar mais nichos ecológicos, inclusive os daquelas que foram extintas.
Um destes exemplos foi o que se passou no final do Cretácico com a extinção de muitas espécies, entre as quais os famosos dinossáurios (pelo menos os não-avianos).
Da mesma forma as equipas de futebol, em especial em momentos como o Mundial, também sofrem pressões do seu meio envolvente – desgaste físico; desgaste psicológico; lesões – e terão que gerir as tensões com as suas “armas” – capacidade técnica; rigor táctico; capacidade de se adaptar ao adversário.
Apesar de tecnicamente muito dotadas (por ex. o Brasil), tecnicamente disciplinadas (por ex. a Alemanha) e mentalmente fortes (aqui é mais difícil…), algumas selecções apresentam, por isso, um tipo de jogo muito especializado, por vezes sem capacidade de adaptação ao adversário e/ou às condições ambientes (apoio dos adeptos; temperatura; pressão dos media).
Normalmente estas equipas saem derrotadas em fases de eliminação pois não têm tempo ou engenho para se adaptarem, para corrigirem o que estava menos bem.
Na História Natural existem equivalentes.
A maioria das pessoas já ouviu falar, pelo menos uma vez, em marsupiais – por exemplo o canguru e o coala.
Este grupo de mamíferos, distingue-se, dos mamíferos placentários, de que nós humanos fazemos parte, por os seus descendentes se desenvolverem externamente, numa bolsa da fêmea – o marsúpio.
Os marsupiais surgiram no mesmo momento em que os mamíferos placentários, competindo com estes por nichos ecológicos semelhantes.
A América do Sul apresentou uma fauna variada e diversificada de marsupiais até ao instante geológico em que o Istmo do Panamá se formou – há cerca de 3 milhões de anos, no Pliocénico.
Esta estrutura geográfica permitiu que os mamíferos placentários do norte, até aí isolados dos “primos” meridionais, migrassem para sul. Deste confronto evolutivo ganharam em larga maioria os placentários tendo a maioria dos marsupiais existentes na América do Sul sido extinta – hoje em dia a larga maioria dos marsupiais existentes é proveniente da Austrália, que funcionou como refúgio para este grupo de animais.
Apesar de altamente especializados, os marsupiais não estavam preparados para o “combate evolutivo” com os placentários do norte.
Da forma semelhante, algumas selecções apresentam um “fio” de jogo bonito, tecnicamente muito desenvolvido mas sem capacidade adaptativa para confrontos com equipas tecnicamente menos desenvolvidas. Umas conseguem adaptar-se e superar o adversário. Outras e por diversos motivos não o conseguem.
Há quatro anos atrás encontrava-me em Madrid quando decorreu o jogo EUA-Portugal. A nossa selecção era tecnicamente mais forte; éramos favoritos. Mas tal como os marsupiais do sul, Portugal foi incapaz de se adaptar à mudança; perdemos porque fomos mais fracos fisicamente; porque menosprezámos o adversário; porque, enfim, não fomos capazes de nos adaptar ao “ambiente”.
Esperemos que a espécie “Selecção”, neste Mundial, consiga superar o momento de intensa pressão “evolutiva” a que estará sujeita, e que, após a “extinção” que se avizinha, possa transmitir a sua herança aos descendentes…

Referências:

Erwin, D.H. 2001 Lessons from the past: Biotic recoveries from mass extinctions. PNAS vol. 98 no. 10 5399-5403

Imagens – Veer

REVELAÇÃO GELADA*

No espaço de 5 minutos de filme duas cenas surrealistas:

-queimam-se os livros de uma biblioteca para manter uma lareira acesa;
-a fronteira México-EUA é encerrada devido ao enorme afluxo de emigrantes norte-americanos; centenas cruzam ilegalmente, a pé, o rio que separa os dois países.

São assim os filmes-apocalipse – imagens de um fim-de-mundo distante e perturbador.

* – 5 minutos de pausa a mirar na SIC “O Dia Depois de Amanhã”.

Imagem – ilustração da Divina Comédia de Dante “The Traitors in the Lake of Ice” a partir da British Library

Corrigimos o avô

O meu amigo Hugo Gante chamou-me a atenção para uma incorrecção no post “Avô salva neto”.
Diz respeito à relação filogenética entre os actuais elefantes e o mamute (Mammuthus primigenius) que eu deixo implícita no título.

O Hugo tem razão quando diz que elefantes e mamutes “serão 2 linhagens evolutivas distintas.”

É verdade.

Análises filogenéticas ao nível mitocondrial (1, 2) estabelecem um relação de parentesco mais próxima do mamute com o elefante asiático (Elephas maximus) do que daquele com o elefante africano (Loxodonta africana). A família Elephantidae terá tido origem em África há cerca de 6 milhões de anos sendo constituída por três linhagens distintas – os actuais elefantes africano e asiático e o mamute. As três espécies iniciaram a sua divergência pela separação do elefante africano sendo seguida, 440 mil anos depois (2), pela separação dos outros dois membros da sub-família Elephantinae.

Ao analisarmos o cladograma gerado a partir de (1), podemos constatar que o elefante asiático e o mamute são mais próximos entre si do que com o elefante africano.

Do que acabei de dizer não posso deixar de concordar com o Hugo Gante e me penitenciar pela metáfora familiar que utilizei não ter sido a mais correcta.

Usei-a no sentido temporal, ou seja, tentei dar a ideia de que um parente próximo, mas extinto, dos actuais elefantes os estava a salvar. Quando utilizei o vocábulo “avô” foi nesse sentido, temporal, mas obviamente pode deixar a ideia incorrecta de que Mammuthus primigenius é o antepassado directo dos actuais elefantes.

É apenas uma linhagem irmã, e como vimos, mais próxima dos asiáticos do que dos africano.

Obrigado Hugo, por me chamares a atenção para as metáforas e a sua correcta utilização em divulgação científica!

REFERÊNCIAS

(1) Rogaev EI, Moliaka YK, Malyarchuk BA, Kondrashov FA, Derenko MV, et al. 2006. Complete Mitochondrial Genome and Phylogeny of Pleistocene Mammoth Mammuthus primigenius. PLoS Biology Vol. 4, No. 3, e73 doi:10.1371/journal.pbio.0040073

(2) Johannes Krause, Paul H. Dear, Joshua L. Pollack, Montgomery Slatkin, Helen Spriggs, Ian Barnes, Adrian M. Lister, Ingo Ebersberger, Svante Pääbo and Michael Hofreiter .2006. Multiplex amplification of the mammoth mitochondrial genome and the evolution of Elephantidae. Nature 439, 724 – 727.

IMAGENS

Cladograma de (1);
Loxodonta africana juvenil – foto de Luís Azevedo Rodrigues, Universidade de Viena, 2006

AVÔ SALVA NETO?

Duas notícias com uma base comum.

O degelo verificado em vastas áreas da Sibéria tem revelado enormes quantidades de presas de mamute.
As restrições ao comércio de marfim de elefantes, em Outubro passado, levaram ao aumento do preço daquele material contribuindo para que os vestígios paleontológicos sejam vendidos entre os 800 e os 1000 dólares o quilograma.

Uma questão curiosa se coloca – os antepassados dos actuais elefantes estão a contribuir para a preservação dos seus descendentes…

A segunda notícia relata as análise efectuadas a um mamute juvenil, excepcionalmente conservado, designado informalmente de Lyuba.

PDF com alguma informação sobre os mamutes – aqui

Fontes das notícias – daqui , daqui e daqui

Imagens – Chien-Chi Chang/Magnum Photos; Reuters/Daniel Fisher/University of Michigan/Handout

Peso dos Geólogos

Tem o mesmo peso a voz dos geólogos em Portugal?

P.S. – O AVE é o o comboio de alta-velocidade espanhol.
Imagem – La Vanguardia (diário catalão) – 3 de Abril de 2008

TV GEOLÓGICA

Uma excelente (apesar de não a ter visto) série de televisão.
Porque ser e pertencer a um país é conhecer a sua história humana, mas também a sua história natural.
A televisão pública canadiana produziu uma série sobre a história geológica do seu país.
E ouve os seus geólogos.

E porque não não fazer o equivalente em Portugal?
A nossa diversidade geológica é grande e permite-nos perceber a paisagem que nos rodeia, seja natural ou humanizada.
Para não termos apenas ideias para onde vamos.

Dois excertos – um clip sobre as Montanhas Rochosas e outro com entrevista ao paleontólogo Michael Melchin – como “veio” para a Ciência, sobre a evolução de diversos grupos de invertebrados, entre outros assuntos.

PALEO FOI À RÁDIO

Apesar da simpatia, generosidade e o sentido de humor de Ana Sousa Dias, o cansaço do paleontólogo de serviço foi mais forte.
Mas deu para falar da Patagónia, China, do Tempo, de dinos com radioactividade, de ping-pong e de muito mais, com uma excelente conversadora.

A ouvir aqui a entrevista no Rádio Clube Português, de 5ª feira, 20 de Março de 2008 (ficheiro MP3).

HD 189733b – “VIDA” EXTRA-SOLAR?

O telescópio Hubble detectou moléculas orgânicas na atmosfera de um planeta extra-solar.
O planeta, de tamanho semelhante a Júpiter, apresenta metano sendo a primeira vez que se detecta esta molécula orgânica fora do Sistema Solar. O HD 189733b está localizado a 63 anos-luz da constelação Vulpecula.
Já em Julho de 207 tinha sido descoberta água neste planeta.

Fonte – aqui
Imagem – daqui

TEMPOS

You can’t have a better tomorrow if you are thinking about yesterday all the time.

Charles F. Kettering, 1876-1958

A man who dares to waste one hour of time has not discovered the value of life.
Charles Robert Darwin, 1809-1882

I live a day at a time. Each day I look for a kernel of excitement. In the morning I say: What is my exciting thing for today? Then, I do the day. Don’t ask me about tomorrow.
Barbara Charline Jordan

Imagem – John Vink/Magnum Photos