Revisão por pares e projetos de pesquisa

Mesmo projetos considerados aprovados podem ficar de fora devido a limitações orçamentárias (Imagem: grcorporate.com.br)

Enquanto na revisão de artigos você ajuda a decidir se um artigo será ou não publicado, a revisão de um projeto vem primeiro. Ela decidirá se um projeto de pesquisa será ou não financiado e se um aluno merece ou não uma bolsa. O papel do revisor talvez seja até mais dramático nesse ponto do que no peer-review de manuscritos.

Dar parecer em projetos costuma ser menos enriquecedor e desafiador do que em artigos. Os projetos não trazem ainda grandes descobertas, no máximo apontam tendências nas áreas de pesquisa e boas perguntas. Além disso, é mais raro encontrar projetos bem escritos do que manuscritos bem escritos, talvez pelos últimos já estarem mais adiante no processo de produção científica. Por outro lado, existe uma pressão maior para aceitarmos pareceres ad hoc do que revisões de manuscritos. Primeiro porque provavelmente nós próprios seremos financiados por aquele órgão de fomento. Depois porque é mais fácil dizer não a um editor incógnito no escritório da Springer em outro país do que a um chefe de comitê que te é familiar e ocupa uma cadeira logo ali em Brasília.

Em projetos, você pode precisar avaliar se a proposta está completa, se enquadra no escopo do edital e traz a formatação e os documentos pedidos pelo órgão de fomento. Em geral, essas avaliações menos conceituais são feitas pelo editor da revista num manuscrito, mas não é raro que elas caibam ao revisor nos pareceres ad hoc de projetos.

Outra prática comum aí é o ranqueamento dos projetos. Às vezes, mesmo os projetos considerados aprovados podem ficar de fora devido a limitações orçamentárias. Isso resulta naquela familiar frase das cartas de resposta às submissões: “Apesar de reconhecermos o mérito de sua proposta, a classificação de seu pedido não permitiu a concessão do financiamento.”

Com relação ao conteúdo, o mesmo zelo da avaliação de manuscritos deve ser oferecido. Não deixe de resumir a proposta e encontrar nela pontos positivos, avalie quanto os autores estão por dentro da área de estudo e julgue o mérito e a novidade dos objetivos propostos. Acompanhe o raciocínio do proponente entre panorama teórico, objetivos propostos, procedimentos metodológicos e resultados esperados. Confira com atenção aspectos que frequentemente são relegados a segundo plano como a adequação do cronograma e orçamento.

Por fim observe se o projeto tem perspectivas impactantes como a possibilidade de uma patente, interesse para a divulgação científica ou é promissor em termos das publicações possivelmente decorrentes. Algumas excelentes sugestões sobre parecer em projetos foram compiladas para órgãos relacionados à pesquisa na Europa, mas as dicas ajudam qualquer um a aprimorar sua prática e os processos como um todo para aqueles que assumirem papéis de decisão em órgãos de fomento (European Science Foundation, 2011).

Um último ponto a ser ressaltado está relacionado com o financiamento de projetos altamente arrojados. Como afirmamos acima, cientistas são frequentemente considerados conservadores, por isso tendem a conceder financiamento a projetos menos ousados, especialmente quando a economia está instável. Uma possibilidade é buscar editais específicos para projetos de maior risco ou diluir um projeto arrojado dentro de outro cujos resultados são mais concretos. Mesmo pesquisadores com histórico de realizações têm projetos rejeitados tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos (Nicholson e Ioannidis, 2012).

Esperamos que a série, que termina hoje, tenha ajudado você nessa parte tão importante da ciência que é a revisão por pares.

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