Resistência Bacteriana
O anúncio pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) de
que a venda sem receita médica de antibióticos será proibida, gerou
polêmica no meio médico e entre consumidores, farmacêuticos e
associações de varejistas. A medida vem de encontro a uma resolução do
ano passado da própria ANVISA, no sentido de diminuir as altas taxas de
infecções multi-resistentes no Brasil.
O Brasil, por sinal, é um dos poucos países em que se pode comprar antibióticos de última geração no balcão, apenas pedindo pelo nome. Se não souber o nome, o balconista com certeza, o ajudará a encontrar a medicação mais apropriada ao seu problema. Farmacêuticos e médicos estão unidos contra a automedicação. Entretanto, ouvi numa entrevista da CBN o presidente da associação varejista de farmácias de que essa resolução estaria em desacordo ao direito do cidadão em defender-se e cuidar de sua própria saúde (!!!).
O problema da resistência bacteriana é o ponto nevrálgico da antibioticoterapia em pacientes graves. Em terapias intensivas, os germes multirresistentes são muito comuns, alguns deles, resistentes a todas as drogas antimicrobianas conhecidas! Estamos atualmente, com problemas seríssimos com cepas de Acinetobacter sp, Enterobacter aerogenes e Klebsiella pneumophila. Os mecanismos de resistência são engenhosos sistemas de inativação das drogas.
A figura ao lado ilustra alguns desses mecanismos. Enzimas inativadoras ou degradadoras de antibióticos são codificadas por genes naturais de algumas bactérias ou conseguidas através de outras. Interessante notar que alguns desses genes são ativados por antibióticos. Isso mesmo. Alguns antibióticos desreprimem genes que causam resistência. O pior é que isso pode ser extendido à antibióticos de maior espectro, restringindo o uso de “armas mais fortes” e tornando a bactéria mais resistente. Esses genes podem também ser transmitidos de bactéria para bactéria da mesma espécie ou até de outras espécies. Esse tipo de transmissão é chamado de horizontal (para diferencial do vertical – mãe para filha) ou HGT (horizontal gene transfer). As bactérias podem “trocar” material genético entre si (conjugação); podem captar material genético espalhado por uma co-irmã morta em combate (transformação); e por fim, podem contrair – tal como uma “doença” material genético de outra bactéria, da mesma espécie ou não, através de um vírus chamado phago (transdução). Se contar, ninguém acredita. Parece ficção científica mas é a pura realidade.
Bombas de efluxo são mecanismos de bombeamento de antibióticos para fora do citoplasma bacteriano. Muitos antibióticos causam furos na membrana bacteriana para que elas tenham uma morte osmótica. Quem lembra do Star Wars III, quando Anakin e Obi Wan em naves da Federação entram em combate com outras naves e um grupo de “robozinhos do mal” sobem nas asas e começam a desmontá-las chegando a tirar a cabeça do robô do Obi Wan? Esses robozinhos são como antibióticos e as bactérias, assim como as naves, têm formas de inativá-los.
E assim segue a guerra interminável entre hospedeiro e parasita que assume, muitas vezes aspectos épicos, como o que estamos vivendo agora nas unidades de terapia intensiva. A decisão da ANVISA em minimizar o uso indiscriminado de antibióticos pelos leigos pesa a nosso favor na luta. Agora só falta minimizar o uso indiscriminado de antibióticos também em quem tem o poder de prescrevê-los. Mas essa é uma batalha muito mais difícil.
Discussão - 13 comentários
Então são três batalhas, Karl: no campo de quem compra (para automedicação), no campo de quem vende (o comentário do presidente da associação varejista de farmácias, que vc ouviu na CBN, já diz tudo...), e no campo de quem prescreve, com caneta-títere guiada por um "poder invisível"...
Mais difícil que "Guerra nas Estrelas"...
O que me espanta mais é eles serem liberados desse jeito.
Acho sempre interessante observar as farmácias de outros países. Na Alemanha, por exemplo, a farmácia parece mais um banco que um supermercado.
Bactérias são veteranas de competição evolutiva, com bilhões de anos de treino. Enquanto ignorarmos isso tentando combatê-las cegamente, vamos ficar para trás na corrida evolutiva.
A deficiência no sistema de saúde brasileiro tem duas causas básicas: A formação do profissional e a gestão do sistema.
Todas as medidas que não visem essas duas causas serão meramente paliativas.
Uma senhora lição. Obrigado Karl.
Copiei uma parte do seu texto
Isso mesmo. Alguns antibióticos desreprimem genes que causam resistência. O pior é que isso pode ser extendido à antibióticos de maior espectro, restringindo o uso de "armas mais fortes" e tornando a bactéria mais resistente. Esses genes podem também ser transmitidos de bactéria para bactéria da mesma espécie ou até de outras espécies.
Copiei abaixo o mesmo texto trocando uma palavra por outra palavra
Escolha:
bactéria é alma
bactéria é entidade
bactéria é espírito
bactéria é mental
Isso mesmo. Alguns antibióticos desreprimem genes que causam resistência. O pior é que isso pode ser extendido à antibióticos de maior espectro, restringindo o uso de "armas mais fortes" e tornando a alma mais resistente. Esses genes podem também ser transmitidos de espírito para entidade da mesma espécie ou até de outras espécies.
Eu acho legal, algum controle, mas atualmente estou achando um exagero. A Resistencia bacteriana se dá principalmente pelo usso errado do que pela compra desnecessaria. Exemplo alguem q com receituairo compra e não usa adequadamente e interrompe o uso,esse está favorecendo o desenvolvimento da resistencia bacteriana, mas se um leigo que não precisava de Antibiotico e compra mas usar adequadamente(esse nem tinha bacteria, era virus) então não há como desenvolver resistencia. A resistencia bacteriana , é devida a outros varios fatores e situações, não é apenas a venda no balcão. Tem o uso indiscriminado a agropecuaria, nos hospitais etc. Eu não engoli essa fabula das KPC nos hospitais, elas existem mas por culpa de má administração publica.
eu quero pasa em fármacia
queria saber se as bacterias conseguem trocar material genetico com suas parceiras
Trocam, sim. Uma forma é por meio de plasmídeos. Dê uma olhada neste post do Meio de Cultura (do Samir) aqui do Scienceblogs Brasil
http://scienceblogs.com.br/meiodecultura/tag/plasmideo/
Grande abraço
Ótima sua abordagem! Vc pode-me explicar todos os mecanismos de ação dos antimicrobianos? Só a partir daí poderei entender, como eles desenvolvem tamanha resistência orgânica! Excelentes suas colocações!
Puxa, Ana. Dê uma olhada nos livros de antibióticos. Eles contém esquemas bem interessantes disso. Obrigado pelo comentário.