Formação

Como se forma uma pessoa? Um cidadão? Um cientista? Podemos nos questionar sobre a formação de um indivíduo (literalmente, não-dividido) para entendermos algumas diferenças básicas entre as ciências naturais e ciências do espírito. Essa formação a qual nos referimos tem duas palavras em alemão: bildung e formation, esta última sendo mais recente. Bildung é composta por bild que quer dizer imagem. Compõe também as palavras nachbild e vorbild que significam cópia e modelo, respectivamente. Bildung ainda tem uma semelhança enorme com a inglesa building, e a analogia com uma construção, um edifício, parece inevitável.

http://i176.photobucket.com/albums/w172/meninalimao/Sunset_II_by_En_GeL.jpgSegundo Gadamer [Verdade e Método], uma análise preliminar da história da palavra formação já nos introduz no âmbito dos conceitos históricos das ciências do espírito. Seguindo Hegel, Gadamer reforça que o homem se caracteriza pela ruptura com o imediato e o natural – esses pertencem ao domínio dos animais. Assim, quando nasce, “ele não é ainda, o que deveria ser”, razão pela qual necessita de uma formação. E como se dá essa ruptura? Por meio de uma universalização do espírito – o homem vai criando conceitos cada vez mais universais, ampliando seus horizontes e sua capacidade de compreensão. Como se um conceito coubesse dentro de outro, como nas bonecas russas (foto daqui). A universalização do espírito humano permite ao homem entender conceitos cada vez mais abstratos, mantendo-o aberto ao diferente, a outros pontos de vista mais universais.

A diferenciação entre “formar” e “informar” é de uso corrente entre nós. Como se forma um cientista? Outro dia, o Discutindo Ecologia soltou um post muito interessante com a pergunta: “Em que momento matamos os pequenos cientistas?” Vale a pena a leitura da reflexão.

Qual seria a formação ideal para um médico? Mais para o lado científico ou mais para o lado das ciências do espírito? O médico-cientista é melhor que o médico-praticante? Seria uma formação científica sólida (leia-se mestrado/doutorado, papers, exposições em congressos, etc) essencial para um médico?

Discussão - 5 comentários

  1. João Carlos disse:

    Não acredito que haja um "melhor". Tudo depende da atividade principal exercida pelo médico: o atendimento direto de pacientes ou o estudo de doenças e seus tratamentos. A abordagem do primeiro é individualista: existem doentes, não doenças; para o segundo existe a doença, sendo o doente apenas o local de manifestação da mesma (no jargão, "um caso").
    Pode parecer uma abordagem até desumana o segundo caso, mas é necessária.

  2. Daniel Christino disse:

    Cara, gostei muito do post (porque será?).

  3. Sandra disse:

    Mas seria mesmo necessária esta dissociação? Nós tratamos doentes que manifestam doenças. É inútil conhecer a doença se de desconhece o doente e vice e versa. Não somos sacerdotes, somos médicos, portanto temos uma precisa função. Veja, em uma circunstância ambulatorial convencional, o ambiente e a experiência de vida de cada um interferem diretamente na prática, pois podem condicionar a adesão ou não à terapia proposta. Em ambientes como nas urgências, nas SOs e nas UTIs, este conhecimento do background do paciente pode aparentemente ter uma importância menor, mas que na realidade é só aparente, uma vez que também condiciona tratamentos e comportamentos (ex: Testemunhas de Jeová e uso de derivados de sangue), além das relações com os familiares.
    Não creio que um bom médico possa ser somente um xamã, mas convenhamos que na realidade não haveria espaço real para tantas publicações, você não acha? Será mesmo que para sermos "científicos" precisamos obrigatoriamente "publicar algo"?
    A formação do médico, na minha opinião não deve distanciá-lo do indivíduo que trata, pois ele é o objeto e o objetivo de nosso trabalho. É importante agregar as bases científicas nos quais o raciocínio médico se desenvolve,mas uma vez que este raciocínio se aplica a cada indivíduo, fazer de conta que as circuntâncias que condicionam este indivíduo não existem, é absolutamente contraprodutivo.
    PS: Que tal começar a corrigir a distorção que existe entre a carga formativa e a carga de trabalho nas Residências Médicas, pois abemos perfeitamente que muitas instituições usam os residentes como mão de obra barata e não com o espírito educativo para o qual foram criadas.

  4. maria disse:

    boa pergunta.
    uma pessoa que integre uma quantidade imensa de conhecimento, que consiga juntar as peças das maneiras mais diversas (precisa que o conhecimento não amarre o raciocínio, que reste criatividade à mente), que tenha paciência para explicar e saiba ouvir, e ainda por cima tenha afeto disponível na atenção, no gesto e no olhar.
    precisa mais que formação... mas não sei o quê.

  5. raph disse:

    Somos todos seres em formação, quem poderá dizer "agora estou formado?"
    Mas os médicos que buscam o amor (aos seres e ao conhecimento) a meu ver dão passos mais largos que o restante de nós... Ou pelo menos tem a oportunidade para dar.
    Abs
    raph

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