Como Fazer a Homeopatia Funcionar
Esse post é uma (tentativa de) tradução do original escrito por Greg Laden em seu blog. O autor autorizou sua reprodução integral no Ecce Medicus. Caso os leitores encontrem soluções translacionais mais adequadas que as minhas, a caixa de comentários está à disposição.
A Homeopatia envolve a manipulação de substâncias geralmente escolhidas devido a sua natureza nociva (mas também por outros motivos), seguida pela diluição dessas substâncias, ou de um extrato das mesmas, inúmeras vezes em água, até que a substância em si não seja encontrada, mas de tal forma que a memória da substância seja retida pela água. Essa água com memória é então, considerada pelos praticantes homeopáticos um tratamento eficaz para várias condições clínicas.
O princípio básico de uma substância nociva produzir uma contra-reação, ou uma reação benéfica, é interessante. E a ideia de usar um tipo de memória biológica também é interessante e potencialmente muito eficaz, desde que possamos utiliza-la em outro contexto. A maioria dos meus colegas de science-based skepticism descarta a homeopatia como inconsequente e ineficaz, em geral porque não existem estudos duplo-cego controlados com tamanhos de amostras úteis, apropriadamente selecionadas, trabalhadas com estatísticas apropriadas e análises biologicamente confiáveis que demonstrem sua eficácia, e também porque não há provas de que a água guarde uma “memória” de substâncias diluídas nela. Mas eu acho que eles podem ter desistido muito facilmente da ideia básica da homeopatia e que ela pode funcionar de fato. Basta que alteremos alguns parâmetros.
Em primeiro lugar, a substância que é usada em forma diluída tem de ser uma substância biologicamente potente, e não apenas alguma coisa que alguém achou que poderia funcionar. Por exemplo, se você pegar cristais à base de sílica, como quartzo e moe-los em pó, ingerindo uma pequena quantidade, haverá um efeito mínimo (ou mesmo pequeno) semelhante ao do consumo de suplementos de fibras. Eu não recomendo tentar isso porque se o cristal contiver certos minerais, a substância pode ser muito venenosa, e mesmo se o pó de sílica for 99,9999999% puro, pode ser prejudicial (se inalado). No entanto, do ponto de vista de como funcionam os sistemas naturais, cristais deveriam causar pequenos efeitos por si, especialmente na forma original.
Por outro lado, substâncias orgânicas, que são as compostas de células ou partes de células, podem ter efeitos naturais muito poderosos. Isso ocorre porque nosso corpo contém moléculas naturais que interagem não só entre si, mas também com moléculas naturais de origem orgânica que são introduzidas no corpo. E, mais interessante, tem sido demonstrado em vários estudos que essas reações podem literalmente mudar, de uma forma natural e orgânica, a estrutura das moléculas originais. Mais, e isso pode parecer difícil de acreditar, mas é realmente maravilhoso e demonstrado em vários estudos, as moléculas modificadas podem “aprender” a auxiliar células a produzir mais moléculas que, por sua vez, são modificadas da mesma forma. Estou simplificando um pouco, mas acho que você já deve ter adivinhado para onde estou indo com isso: A introdução de determinados materiais orgânicos naturais no organismo pode provocar o desenvolvimento de uma memória de longo prazo dessas moléculas. Estudos têm demonstrado que esta memória, em muitos casos, dura uma vida inteira, ou pelo menos, por várias décadas.
Então, nós temos todos os elementos homeopáticos: Substâncias que podem ser muito potentes, processadas e em menor concentração, são introduzidas no organismo causando uma reação de memória, não na água onde a substância foi originalmente diluída, mas NO PRÓPRIO CORPO, usando processos orgânicos exclusivamente naturais. Esta “lembrança” vai durar a vida toda, ou quase isso. Desta forma, uma substância natural orgânica adequadamente selecionada pode causar uma altamente desejável re-conformação das reações do organismo a insultos externos, de uma maneira totalmente natural e orgânica.
As moléculas introduzidas no corpo são chamadas de antígenos. As moléculas que o corpo aprende a produzir são chamados anticorpos. Todo o processo é chamado de vacinação.
Discussão - 15 comentários
Há um drawback sério nessa linha de argumentação.
Os próprios homeopatas são uma dos maiores *opositores* da vacinação. A despeito dos alertas quanto à inconsistência da objeção pelos... céticos baseados em ciência.
Deve se ter em conta tb que a homeopatia é uma corrente *principista*. Os medicamentos *por princípio* funcionam com base no "similia similibus curantur" e "lei dos infinitesimais".
Deve-se ter em conta tb que a vacinação *não* obedece propriamente à lei dos infinitesimais. Ultradiluições de antígenos *não* causam potencialização da ação imune - a despeito dos artigos de Benveniste.
[]s,
Roberto Takata
Apesar do espantalho (homeopatas geralmente até citam vacinas como prova do tipo de magia que eles praticam), Takata tem razão: homeopatia visa processar o "princípio ativo" além da capacidade volumétrica do universo.
claro, cafeína é um belo exemplo de antígeno
Roberto, eu concordo. Mas acho que, pelo menos nos Estados Unidos, a maioria das pessoas que usam "homeopático" remédios não estão preocupados com a teoria, eles só querem o que é "natural" e tradicionais. Meu argumento aqui é que a essência do que se pretende com a homeopatia pode ser encontrado neste aspecto da medicina moderna.
Além disso, estou tentando ser um pouco de humor.
Mas provavelmente não tão engraçado na minha tentativa de escrever este comentário em Português.
Caro Laden,
Até vejo um pouco de humor em seu texto, mas ele é sutil demais: ao menos vendo o texto isoladamente, sem considerar seu estilo pessoal. (E isso tem algumas implicações no processo de comunicação com o público.)
(Acredite, você escreve em português muito melhor do que boa parte dos brasileiros. Seguramente escreve em português muito melhor do que eu escrevo em inglês.)
[]s,
Roberto Takata
Takata. Você está correto na argumentação, mas discordo de você e do Igor quanto as "linhas gerais" do texto do Greg. Acho que a ideia de utilizar a semelhança de compostos para sensibilizar o organismo com o objetivo de tratar alguma desordem ou aumentar sua proteção é, sim, um pressuposto básico da homeopatia e da vacinação.
É óbvio que são processos bem diferentes, porém, a meu ver, o texto do post aborda o assunto com humor e originalidade, pela própria oposição que alguns homeopatas fazem à vacinação, como foi notado.
Chocobo. Cafeína na veia é um excelente exemplo de antígeno. Mesmo.
Greg. Sou obrigado a concordar com o Takata quanto ao seu Português. Escreve muito bem sim. Onde aprendeu? Desse jeito o Scienceblogs Brasil vai convidá-lo para escrever um blog aqui. : )
Obrigado por todos os comentários
"um pressuposto básico da homeopatia e da vacinação"
Pois bem. Um pressuposto.
Homeopatia ainda usa ultradiluição e sucução. E sem isso, não é homeopatia.
Pelo Amor de Deus, gente!!!!
O texto é ótimo!!! Greg (posso te chamar apenas de Greg?) foi muito feliz na comparação dos princípios alegados pela homeopatia com os da vacinação! Adorei!!
Gente: Permita-me discordar de uma coisa. Não me pareceu que o tom do texto fosse "sutil de mais" ou que a tradução não ficou adequada.
Diante dos presentes comentários, o que me parece mais provável é que uma vida de leitura de textos técnicos fez com que vocês perdessem a capacidade de leitura intertextual.
Antes que comecem a jogar pedras, quero dizer que falo isso por experiência própria, já que só percebi que havia perdido essa habilidade após uma reviravolta na minha vida me forçar a exercitar, novamente, a interpretação de texto.
Por favor, considerem o que eu disse como uma crítica construtiva, como uma oportunidade para desenvolverem uma capacidade que nem sequer imaginavam ser necessária.
Posso lhes garantir que os resultados serão muito recompensadores.
O texto do link abaixo segue a mesma linha de humor e explicação sobre a a homeopatia.
Está muito interessante ver as diferentes linhas de comentários entre os dois posts. Hehe.
Check it out.
http://scienceblogs.com/gregladen/2010/12/how_to_make_homeopathy_work.php
O texto trás um modelo para uma possível explicação sobre o funcionamento da homeopatia. Porém, farmacologicamente falando, não tem como uma molécula ou extrato diluído homeopaticamente, por mais potente que seja, atuar em algum receptor celular, alterando a estrutura geral do organismo. É praticamente impossível o contato do princípio ativo com a estrutura que seria afetada para acionar a tal "memória". As chances são quase zero. Fisicamente, seria como se conseguissemos determinar a posição exata de um elétron no átomo.
Algumas pequenas moléculas orgânicas podem ser imunogênicas, ou seja, ativam o sistema imunológico. Por exemplo, aminoácidos.
O termo vacinação homeopática é para fazer uma analogia ao termo da vacinação halopática, pois ambos consistem em ativar o organimos contra um mal. Porém essa comparação é meramente didática, para explicar o modelo proposto no texto. Extratos e fármacos em concentrações infinitamente baixas não ativam o sistema imunológico. Portanto, não são vacinas.
A homeopatia funciona graças ao efeito placebo e não há um mecanismo de ação devidamente comprovado e validado cientificamente.
Abrass,
Mauro
Depois do comentário do Greg Laden, quando ele diz que "(...) a maioria das pessoas que usam 'homeopático' remédios não estão preocupados com a teoria, eles só querem o que é 'natural' e tradicionais", eu queria perguntar se, então, não haveria um componente de auto-sugestão na Homeopatia, lembrando o efeito placebo. Mas o Mauro foi mais rápido e apontou esse efeito, no comentário acima.
Coincidentemente, um recente post do João Carlos aponta um estudo recente sobre a eficácia dos placebos, "mesmo sem enganação". E vai além, desenterrando um post sensacional aqui no E.M.
Destaco uma passagem do post resgatado:
" (...) considero o placebo como uma das maiores invenções da medicina. Uma meta-invenção, na verdade, já que atua na fonte das invencionices da estranha espécie humana que adoece como todas, mas resiste como nenhuma, em morrer."
Nessa linha, poderíamos considerar a Homeopatia uma meta-invenção?
Por mais que a intenção do artigo seja bastante louvável, tenho que fazer coro com o Igor e com o Roberto. Como o Igor já aludiu quando mencionou a ultradiluição, vale lembrar que a solução homeopática frequentemente não passa, literalmente, de água destilada. A semelhança entre uma solução contendo percentuais pequenos de uma substância biologicamente ativa (vacina ou o espantalho de homeopatia do artigo), e uma solução contendo literalmente zero de qualquer substância ativa (substância homeopática "real") é tão diluída quanto o Oscillococcinum (remédio homeopático a 200C).
Isso torna tal tentativa de humor um tanto perigosa, já que aqui mesmo nos comentários alguém aludiu à "piada" como uma possibilidade de explanação do efeito homeopático. Se a piada se perde mesmo para leitores mais críticos desse blog, o que dizer de um crédulo em homeopatia encontrando esse texto fora do contexto apropriado?
Odeio quem explica piada.
O texto tá certinho para o q ele se propôs, como confirmou Greg alí.
Eu me assustei no meio mas no fim eu ri. Pena que os comentários acabaram com a graça.
Cheguei a este texto em minhas pesquisas sobre esses temas de terapias alternativas, das quais sou crítico ao extremo.
Este texto não difere em nada do que é comum aos textos de "merchandising" alternativo. Não consegui detectar o humor sutil, mas apenas o típico discurso proselitista e cientificamente nulo daquela gente.
OK, acredito, foi proposital, mas não se parece assim.