O Mal e a Moléstia

Doentia MaldadeDoentia Maldade, de Daniel M. Barros descreve a história do conceito psiquiátrico de psicopatia e sua relação com o conceito não psiquiátrico do Mal.

A medicina, de uma forma geral, e a psiquiatria, em particular, têm muitos exemplos nos quais conceitos comuns à vida das pessoas são patologizados ou, em outras palavras, transformados em doenças. Essa é uma tendência atual e até figuras arquetípicas como vampiros e zumbis têm sido transformados em doenças. Uma das prováveis razões para isso é que, ao patologizar uma característica, traço, hábito, ou qualquer aspecto peculiar de uma pessoa ou grupo de pessoas, temos ao menos três vantagens imediatas. A primeira, diz respeito à forma própria de encarar aquilo que nos é diferente. Aquilo que além de não nos pertencer, nos é estranho. Lembro-me bem da época em que parar de fumar deixou de ser “falta de vergonha na cara” para ser encarada como uma dependência química com todas as suas dificuldades, ganhando, assim, a simpatia atenta dos médicos que começaram a ver os fumantes, agora, como pacientes. A segunda vantagem é que uma doença, se ainda não tem uma cura, deve ter, ao menos, algum tipo de tratamento. É aqui que muita gente começa a esfregar as mãos com aquele sorrisinho maligno no rosto de quem vai faturar um boa grana. Isso é o que tem sido chamado de disease mongering e tem as já conhecidas e comentadas consequências nefastas para a prática médica e para a sociedade como um todo.

A terceira é a que Barros chama a atenção. Ao mostrar as razões do sucesso do conceito de psicopatia, o autor-médico mostra como a patologização de um comportamento – anormal, sem dúvida – bem como o desenvolvimento de ferramentas para seu diagnóstico, funcionaram como mecanismo expiatório de culpas da sociedade pós-industrial. Mais, como tal conceito se imiscui em uma ampla e antiga discussão que é a teodicéia, ou de como podem co-existir num mesmo mundo algo como Deus e o Mal. Dessa discussão, que de simples não tem nem o nome, tomaram parte gente como Platão, Kant, Leibniz, Hegel, Marx, Ricoeur, entre outros.

Em que pese o fato de que pensadores como Ricoeur enxergarem algumas vantagens em uma “ontologia do Mal” como, por exemplo, ao tomar o mal como sendo a razão última que impede uma apropriação discursiva integral da realidade (o que é bem interessante), a mera existência do mal nos incomoda e sempre incomodou bastante. Barros nos empurra para esse tipo de leitura ao mostrar que jogar o mal para debaixo do tapete não vai nos causar nenhum tipo de alívio.

Doentia Maldade. Daniel Martins de Barros. Kindle Edition USD 2,64. 14 páginas. 2013.

Fábricas de Ideologias

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Membro do Conselho de Educação da Fundação Rockefeller em palestra no Alabama,1914.
Cortesia da Fundação Rockefeller

“Nosso principal argumento é que a estrutura da educação médica moderna foi estabelecida há 75 anos atrás com o propósito de incorporar a revolução na ciência biomédica; ao atingir seus objetivos, acabou por definir a especialização altamente tecnológica como a principal meta para medicina clínica”.

Samuel Bloom, 1988[1]

“Medical education is inextricably tied to the health service system, and when questions arise about service, questions about education must follow”

World Health Organization 1972 (in [1])

A classe dominante organiza toda a vida nacional (social, cultural) construindo em torno do Estado um sistema de aparelhos (privados, semipúblicos e públicos) que constituem as diversas projeções da função de direção política na sociedade civil.

Antônio Gramsci (in Maquiavel, a Política e o Estado Moderno)

Ayres[2], em seu estudo Sobre o Risco (parece que há uma re-edição em português), conta a evolução e a importância do conceito de risco no pensamento médico atual. Em determinado momento do livro, ele põe sua extraordinária capacidade de análise para identificar as causas do pioneirismo dos EUA em relação ao desenvolvimento de um tipo de medicina social bastante peculiar que chama de “Nova Saúde Pública”. Dentre as causas citadas, temos:

  • herança anglo-saxônica. A medicina social desenvolvera-se de forma importante na Inglaterra vitoriana, mas por séculos, os ingleses já proporcionavam serviços médicos a sua população. Uma das prováveis razões disso pode ser o fato de Henrique VIII ter assumido tarefas para o Estado que eram responsabilidade da Igreja em outros países europeus [3, pág 90]. Outro fator é o desenvolvimento da estatística vital, apropriada a estudos populacionais, que iniciou-se no séc XVII e tinha o nome de “aritmética política”. A produção de dados populacionais trouxe à luz problemas que antes não podiam ser avaliados e transformou-se numa praxis.
  • Publicismo radical e privatismo pleno. Sem nos aprofundar em demasia, o espaço público americano parece ter amadurecido precoce e diferentemente do resto do mundo, em especial em função de um profundo individualismo. Nascido no bojo de um processo emancipatório, “a noção de público nos EUA tendeu, como talvez em nenhuma outra sociedade, a restringir-se estritamente às necessidades de compatibilizar e preservar os interesses privados” [2, pág 120, grifos meus]. Segundo Ayres, “democracia e individualismo foram tornando-se traços inseparáveis da própria identidade norte-americana”. É esta combinação peculiar e cheia de contradições que é chamada de publicismo radical e privatismo pleno pelo autor.
  • O Puritanismo. Ao propor uma forma de ascetismo laico, já destacada por Weber, fundamental para construção de uma ética do trabalho, o puritanismo oferece uma justificativa terrena para a acumulação e a filantropia.
  • O Pragmatismo de William James (médico da Harvard) e John Dewey. Para Dewey, “o indivíduo era o fundamento e a medida da retitude, verdade e legitimidade de qualquer projeto generalizador. Ao mesmo tempo, só no âmbito da experiência pública da vida cotidiana é que o indivíduo pode se dar conta de forma concreta destas aspirações”[3, pág. 124]. Todo seu humanismo estava radicalmente embasado num individualismo filosófico.
  • Darwinismo social (confira também este texto para uma referência mais abrangente, em inglês). Sua importância reside, grosso modo, numa “justificação científica” para a riqueza algumas sociedades, consideradas “mais aptas”, e a pobreza de outras, “menos aptas”. De forma geral, o capitalismo assimilou, algo distorcidamente, as ideias do darwinismo social, mas em especial, a centralidade do conceito de competição e sobrevivência do mais apto foram fundamentais para isso.

Tímidas tentativas preliminares de organização da saúde pública norte-americana, entretanto, foram rechaçadas com a argumentação de que os “estados tinham seus direitos ameaçados pela ingerência do governo federal em sua próprias esferas” (pag.122). Porém, em 1872, finalmente, foi estruturada a American Public Health Association (APHA). A APHA congregou vários especialistas de vários estados atuando na área de saúde pública e tornou-se um dos porta-vozes da onda “humanista” que se levantou contra o radical e “prejudicial laissez-faire que se sucedeu à vitória do projeto liberal e industrialista na Guerra de Secessão”. Explica-se, assim, um certo consenso surgido à época em relação a uma intervenção sanitária como forma de resolver os enormes problemas gerados pela industrialização vertiginosa que ocorria. Algo precisava ser feito, mas como? Qual projeto deveria ser levado adiante?

Aqui a história ganha ares de roteiro cinematográfico. Quando a Fundação Rockefeller resolveu financiar sozinha uma escola de saúde pública, havia nessa época, segundo alguns autores citados por Ayres [2], três propostas concorrentes de abordagem do problema sanitário norte-americano. A primeira, de caráter ambientalista, era um projeto conjunto da Harvard e do Massachussets Institute of Technology (MIT) em Boston e enfocava o saneamento do meio externo com um forte embasamento bacteriológico. A segunda, que pode ser chamada de sócio-política, era sediada em Nova York e, mais precisamente, na Universidade de Columbia, entendendo o “desafio da saúde pública sob uma perspectiva mais integral, com reformas na organização dos modos de vida, da estrutura do Estado, das legislações, etc”. O terceiro perfil de proposições era de cunho biomédico. Surgido numa escola mais nova e de menor tradição que as outras duas citadas acima, “sustentava que a saúde pública devia ser entendida e estudada sob o mesmo ângulo biológico-experimental que fundamentava a medicina moderna como um todo” (pág 127). Quem vocês acham que recebeu o dinheiro da Rockefeller? Isso mesmo, caro(a) leitor(a): situada em Baltimore, Maryland, a Johns Hopkins tinha como presidente (o primeiro, aliás) o bem-articulado e visionário Daniel Coit Gilman.  Daniel desempenha um papel de importância nessa decisão. Ele havia sido conselheiro da Fundação Russell Sage, cujos recursos centralizaram a coordenação do movimento de organizações de caridade no pós-guerra civil, em especial, com intenção declarada de combater ideologias socialistas em voga na época. Daniel pertenceria ainda ao próprio General Education Board da Rockefeller e, após aposentar-se da Johns Hopkins em 1901, aceitou a presidência do recém-fundado Instituto Carnegie em Nova Iorque (1902-1904). Trafegou, portanto, com extrema facilidade e desenvoltura no “universo filantrópico” norte-americano do começo do século XX.

Entre as grandes mudanças impostas por Daniel Gilman na Johns Hopkins está a junção orgânica da faculdade de medicina com seu hospital-escola com base numa fusão peculiar dos modelos germânico e inglês que conhecera em viagem à Europa após sua formatura. Para ele, os departamentos de ambas instituições deveriam trabalhar em conjunto, filosofia seguida até hoje em várias escolas de medicina ao redor do mundo. Além disso, os médicos deviam também ser bons cientistas. Em 1884, o primeiro médico que Daniel recrutou para trabalhar, ao mesmo tempo, como professor e assistente do hospital, foi o microbiologista, patologista e general de brigada do exército americano William Henry Welch, que trabalhara, por sua vez, com ninguém mais, ninguém menos que Max von Pettenkofer no Instituto de Higiene de Munique e com Robert Koch (descobridor, entre outros feitos, do bacilo da tuberculose) na Alemanha. Daniel e William tinham mais coisas em comum que suas “germanofilias”. Ambos foram formados em Yale e lá participaram das atividades de uma fraternidade semi-secreta chamada de Skulls and Bones, fonte de inúmeras teorias conspiratórias e filmes. Welch, em 1894, tornou-se o primeiro diretor da Johns Hopkins University School of Medicine e, em 1916, o primeiro diretor da Johns Hopkins School of Hygiene and Public Health, a primeira escola de saúde pública dos EUA e que ditaria a forma como as políticas sanitárias norte-americanas seriam conduzidas nos anos seguintes.

Ayres chama atenção, já no parágrafo seguinte a essa discussão, para a estranheza do fato de uma instituição privada financiar outra de grande importância para as políticas públicas de uma nação. Contudo, me parece que as bases do pioneirismo estadunidense listadas acima (a falácia do darwinismo social, o publicismo radical e o privatismo pleno, o individualismo filosófico e o puritanismo), são já indícios de uma intervenção fortemente ideologizada do privado em direção ao público. De fato, como chamam atenção Sheila Slaughter e Edward Silva [4], uma reação ao caldo ideológico fervilhante que decorreu das crises político-econômicas geradas pela rápida industrialização dos EUA no pós-Guerra Civil parece ter sido o detonador de tais ações. Para eles, uma ideologia permite três eixos explicativos de uma realidade sócio-política: a) identifica quem exerce o poder e em que condições; b) oferece um critério moral de avaliação das decisões tomadas por quem exerce o poder e, por fim; c) esse caráter descritivo de (a) associado ao valorativo de (b) incitam à ação coletiva, seja em defesa do status quo ante, seja contra sua permanência. “Ideologias inibem ou inspiram movimentos sociais”. Várias correntes ideológicas eram politicamente ativas nessa época turbulenta, em especial, as consideradas de inspiração marxista, radicais questionadoras das relações entre trabalho e capital que eram, então, o fulcro dos conflitos. Escrevem Slaughter e Silva (em tradução minha):

Já que ideologias fornecem o fermento social para ações políticas coletivas, os detentores de recursos preocuparam-se eles mesmos em intervir no processo de formação ideológica (…). Na medida em que as fundações filantrópicas no período progressista foram criadas (…) colocaram-se vastos recursos à disposição de alguns, promulgando ideologias (…) (e) disseminando visões de mundo que apoiavam o status quo.

O fenômeno social que convencionou-se chamar de filantropia em larga escala (wholesale philantropy) ocorreu apenas nos Estados Unidos da América, iniciando-se pouco antes da Guerra Civil (1861-1865) mas perdurando, ainda que sem a volúpia de seus anos de ouro, até hoje. Um movimento em concerto, de tal magnitude e alcance tão extenso e profundo, não poderia ser obra de poucos ou ter apenas um punhado de causas. Tampouco, mereceria ficar restrito ao território americano. É o que veremos nos próximos posts.

 

Referências Bibliográficas

[1] Bloom SW (1988). Structure and ideology in medical education: an analysis of resistance to change. Journal of health and social behavior, 29 (4), 294-306 PMID: 3253321

[2] Ayres, JRCM. Acerca del Riesgo: Para comprender la epidemiologia. 1a ed. Buenos Aires. Lugar Editorial. 2005, pag 119-135.

[3] Buck, C; Llopis, A; Nájera, E; Terris, M (orgs) El desafio de la epidemiologia: problemas y lecturas seleccionadas. Washington, 1988. (OPAS n. 505).

[4] Slaughter, S and Silva, ET. Looking Backwards: How Foundations Formulated Ideology in the Progressive Period. in Philantropy and cultural Imperialism: the foundations at home and abroad. Edited by Robert F. Arnove. Indiana Press. 1980. pg 55-86.

Medicina Social

O século XIX foi pródigo em mudanças que alteraram radicalmente a forma como o homem via o mundo e a si próprio, seja em função dos inúmeros avanços tecnológicos e científicos ocorridos no período, seja no modo como tais avanços foram rearranjados em seu horizonte epistemológico. A medicina, como atividade humana,  não poderia escapar desse momento crítico. Dentre as mudanças conceituais no campo médico consideradas de maior importância destaca-se o surgimento da medicina social ou, como querem alguns, pública, ou ainda, coletiva. Por medicina social entenderemos aqui o conjunto de “práticas técnicas, ideológicas, políticas e econômicas desenvolvidas no âmbito acadêmico, nas organizações de saúde e em instituições de pesquisa vinculadas a diferentes correntes de pensamento” iniciadas no século XIX, com vistas a preservação da saúde bem como a prevenção de doenças na população sob sua jurisdição. Tais ações originaram, posteriormente, segundo Paim [1] (apud Wikipédia), o conceito moderno de Saúde Coletiva que não será objeto deste texto.

Gostaria de chamar atenção, contudo, para um outro aspecto derivado dessa situação. O surgimento da medicina social, na Europa e nos EUA, coincide temporalmente com um “impulso” de grande magnitude dado à medicina brasileira em particular. Este impulso veio, inicialmente, na forma de incentivo à medicina pública, que ora engatinhava e pagava seus tributos, como vimos, mas proponho que seja entendido dentro de um contexto mais amplo. Aqui, me refiro especificamente à questão do financiamento de instituições públicas de saúde por instituições filantrópicas, consequentemente, privadas, provenientes dos EUA. O agenciamento da medicina social pela filantropia em larga escala é um fenômeno complexo e não ocorreu apenas no Brasil e em São Paulo.

Para entender tal fenômeno é preciso, em primeiro lugar, perguntar por suas causas. Qual seria a verdadeira razão do envolvimento dessas instituições filantrópicas na área da saúde? São poucos os que tentaram responder a essa questão delicada. Um deles foi Michel Foucault [2]. Para ele, a resposta é imediata: o capitalismo. Foucault tem o raciocínio centrado no conceito de que o corpo é uma realidade biopolítica e a medicina é uma estratégia para manipulá-lo. Quando a medicina começou a ser usada para criar um controle sobre a força de produção (ou força de trabalho), criou-se a medicina social em fins do século XVIII e início do XIX.

Tal fenômeno se inicia em território germânico com o que Foucault chama de medicina de Estado (Staatzmedizin). A medicina de Estado caracteriza-se por fenômenos totalmente novos no cenário administrativo público da época, como a “organização de um saber médico estatal, a normalização da profissão médica, a subordinação dos médicos a uma administração central e, finalmente, a integração de vários médicos em uma organização médica estatal”. Esse grau de organização estatal da medicina no que viria a ser a Alemanha permite o surgimento da figura do médico e químico de Munique Max Joseph von Pettenkofer que desempenhará importante papel na medicina norte-americana, como veremos.

Surge, na França, uma outra vertente de “uma medicina social que não parece ter por suporte na estrutura do Estado, como na Alemanha, mas [em] um fenômeno inteiramente diferente: a urbanização” (grifos meus). Prossegue o historiador francês: “A medicina urbana não é verdadeiramente uma medicina dos homens, corpos e organismo, mas uma medicina das coisas: ar, água, decomposições, fermentos; uma medicina das condições de vida e do meio de existência. É essa medicina que permite a passagem da análise do meio a dos efeitos do meio sobre o organismo e, finalmente, à análise do próprio organismo e abre caminho para o aparecimento da Clínica Médica e da grande medicina científica de Morgagni e Bichat, em meados do século XIX.

Por fim, a terceira vertente da medicina social é exemplificada, segundo Foucault, pelo modelo inglês. Na Inglaterra, o Estado assumiu várias funções que a Igreja manteve sob sua responsabilidade em países como a Espanha e a França [3, pág 90], por exemplo. Desde a dinastia Tudor, havia na ilha a chamada Lei dos Pobres (Poor Law), um conjunto de leis que visavam o que hoje podemos chamar de Defesa Civil. Em 1832, com as mudanças nesse conjunto de leis em função de confrontos entre o capital e o trabalho na Inglaterra industrializada, começa a existir um controle médico da população mais carente. Além de submetida a várias epidemias, e.g. cólera em 1832, que atemorizavam as classes mais privilegiadas, as revoltas também geraram um problema político. A legislação médica contida na Lei dos Pobres visava, principalmente, assegurar a segurança política e sanitária da burguesia tornando a classe pobre mais apta ao trabalho e menos perigosa como vetor de doenças. Além disso, a medicina social inglesa permitiu a presença de três sistemas médicos superpostos, de acordo com Foucault: “uma medicina assistencial destinada aos mais pobres; uma medicina administrativa encarregada de problemas gerais como vacinação, epidemias, etc, e uma medicina privada que beneficiava quem tinha meios para pagá-la”. E conclui:

Enquanto o sistema alemão da medicina de Estado era pouco flexível e a medicina urbana francesa era um projeto geral de controle sem instrumento preciso de poder, o sistema inglês possibilitava a organização de uma medicina com faces e formas de poder diferentes segundo se tratasse da medicina assistencial, administrativa e privada, setores bem delimitados que permitiram, durante o final do século XIX e primeira metade do século XX, a existência de um esquadrinhamento médico bastante complexo.

Em outras palavras, o sistema inglês foi o que melhor se adequou ao capitalismo industrial nascente. Ao analisarmos os sistemas de saúde dos países industrializados, e mesmo o sistema brasileiro, vemos que são apenas variações na forma como esses três campos podem se articular. Não é de se espantar, também, que esse foi o adotado pelos EUA após a Guerra Civil por uma série de razões[4]. Mas, no Novo Mundo, esse sistema precisava ainda ser lapidado e amplificado. Necessitava ainda do reforço de várias outras aquisições conceituais que chegariam com a virada do século para, só então, se tornar a poderosa ferramenta de hoje, capaz de canalizar a vontade de ajudar o ser humano que sofre, e tudo aquilo que gira em torno disso, em um tipo de dominação.

[1] Paim, JSDesafios para Saúde Coletiva no Século XXI. Ba, UDUFBA, 2005.

[2] Foucault, M.  O Nascimento da Medicina Social. in Microfísica do Poder, 1979. 18a Edição. Graal – Rio de Janeiro. pg 79-98.

[3] Buck, C; Llopis, A; Nájera, E; Terris, M (orgs) El desafio de la epidemiologia: problemas y lecturas seleccionadas. Washington, 1988. (OPAS n. 505).

[4] Ayres, JRCM. Acerca del Riesgo: Para comprender la epidemiologia. 1a ed. Buenos Aires. Lugar Editorial. 2005, pag 119-135.

Lições Andinas

1781394_Z8dDc“O corpo é uma realidade biopolítica. A medicina é uma estratégia biopolítica”

M. Foucault in ‘Microfísica do Poder’

Somos ricos, somos cultos. Fora os imbecis corruptos“. 

Grito de guerra de um grupo de médicos em manifestação em frente ao Ministério da Saúde ontem.

As práticas de saúde constituem um segmento estratégico para qualquer governante que se preocupe com o bem-estar da população pela qual é responsável. Dentre as possíveis práticas nessa área, se destaca a medicina que, na sua forma ocidental clássica, é a que vem obtendo os resultados mais espetaculares tanto no sentido de aliviar o sofrimento causado por moléstias que acometem o ser humano, como evitar seu aparecimento, seja no âmbito público/populacional ou privado/individual.

Entretanto, as relações entre os governos e a força médica de trabalho, aqui entendida como sendo a constituída pelos profissionais médicos que exercem a medicina, nem sempre coincidiram em ideais e pontos de vista. Tendo como horizonte o atrito contemporâneo entre governo e associações médicas brasileiras, talvez seja interessante relembrar experiências de outros países com problemas semelhantes para que não tenhamos que repetir retóricas ultrapassadas e fúteis, improvisações atabalhoadas e perigosas e discussões desgastantes e contraproducentes, nas quais quem sempre acaba perdendo é o paciente. Tome-se, por exemplo, o papel que os médicos desempenharam no Chile na época do golpe militar.

Salvador Allende Gossens era médico. “A oposição e os conflitos com os quais se defrontou em suas tentativas de modificar o sistema de saúde chileno refletem em miniatura os problemas que conduziram a queda de seu governo”, afirmam Howard Waitzkin e Hilary Modell, esta última, de corpo presente durante o turbulento período do golpe militar, em interessante artigo de 1974 no New England Journal (abaixo). Allende, socialista, foi ministro da Saúde e tentou introduzir amplas mudanças estruturais na redistribuição dos serviços médicos à população pobre do Chile, principal problema da época. Vale ressaltar, que ele “escrupulosamente evitou medidas compulsórias que limitariam a livre escolha de profissionais da saúde e pacientes” (grifos meus).

A maioria dos médicos chilenos era proveniente de uma elite burguesa e preferia a prática privada, em especial nos grandes centros urbanos, onde era mais valorizada. Allende propôs uma série de mudanças para melhorar a distribuição dos serviços médicos que, inicialmente, não incomodaram as associações de classe dado que era permitido que os médicos escolhessem trabalhar no LHC (um tipo de SUS) ou permanecessem na vida privada. Interessante notar que, em determinadas situações, os médicos poderiam, juntamente com sua carga horária normal no LHC, usar os hospitais públicos para assistir seus pacientes privados, num esquema de “fee-for-service”. Quase 90% dos médicos trabalhavam no LHC, mas dispendiam mais tempo e energia cuidando de seus pacientes particulares em razão disso. Apesar dessas distorções, não foram feitas tentativas de eliminar a medicina privada. O governo continuou subscrevendo-a, mantendo as faculdades de medicina gratuitas e o trabalho privado dos médicos inalterado, mudando concretamente muito pouco a situação geral.

Porém, alguns fatores fizeram com que a Associação Chilena de Medicina iniciasse, em 1972, uma vigorosa campanha contra a Unidad Popular (UP, colizão que dava sustentação a Allende), entre elas, são citadas principalmente: a proposição do governo de treinar mais paramédicos, alteração do currículo das faculdades de medicina com vistas à uma visão mais social do problema da saúde, a falta de insumos devido ao boicote imposto ao governo socialista do Chile, em especial, pelos EUA. Em Outubro de 1972, os médicos chilenos entraram em greve. Entretanto, os outros profissionais da saúde (enfermeiras, parteiras, técnicos de laboratório, administrativos, etc) não apoiaram o movimento e os hospitais da LHC continuaram funcionando devido a um esforço conjunto de funcionários, residentes e médicos pró-governo. Essa situação emergencial não pôde se sustentar por muito tempo. “Durante as semanas imediatamente anteriores ao golpe militar de Setembro de 1973, uma nova greve dos médicos desestabilizou o sistema de saúde chileno. A profissão médica, ameaçada pela redistribuição do poder e incomodada pela instabilidade econômica, ajudou a pavimentar o terreno para ditadura”, argumentam os autores do estudo.

Após o golpe, vários diretores de hospitais da NHC (neighborhood health center – hospitais de comunidade) foram detidos no estádio nacional. Trinta e cinco médicos foram torturados e mortos. Professores de medicina, médicos praticantes e trabalhadores da saúde em geral, foram presos, regularmente torturados e classificados como “confiáveis”, “incertos” ou “politicamente perigosos”, conforme suas convicções políticas. Médicos entregaram médicos à polícia do governo. Médicos militares auxiliaram torturas. O sistema de saúde foi reformatado inteiramente com prejuízo às classes mais desfavorecidas. Departamentos de medicina preventiva, saúde pública e de ciências sociais na área médica foram fechados. Médicos comunitários e voluntários nestas atividades, sumariamente demitidos. O regime militar chileno ainda viveria seus piores momentos e o paradeiro de muitos médicos, ainda hoje, é objeto de investigação.

Waitzkin e Modell concluem o artigo citando três lições gerais tiradas da experiência chilena.

1. Em todas as sociedades, mas especialmente as de países em desenvolvimento, a Saúde é intimamente ligada aos sistemas econômico e político da nação.

2. Conflitos no sistema de saúde tendem a refletir em miniatura os conflitos inerentes de uma sociedade estratificada.

3. A experiência chilena mostra que reformas progressivas no sistema de saúde têm pouco significado sem mudanças na ordem social. Profissionais da saúde e usuários devem entender que o esforço conjunto em busca de um sistema de saúde mais humano e justo não terá sucesso sem que haja um esforço concomitante para uma mudança na ordem social.

Atualização: Em 2008 chamei a atenção para o encarecimento da medicina chilena após a implantação do modelo neoliberal, bastante elogiado na época pelo Banco Mundial. Veja só.

ResearchBlogging.orgWaitzkin, Howard; Modell, Hilary (1974). Medicine, Socialism, and Totalitarianism: Lessons from Chile New England Journal of Medicine, 291 (4), 171-177 DOI: 10.1056/NEJM197407252910404

Johns Hopkins

Johns Hopkins

Fig 1. Johns Hopkins (1795-1873)

Johns Hopkins (1795 – 1873) (figura 1) nasceu e viveu em Maryland, EUA. Filho de uma família de fervorosos quakers, seu pai, proprietário de uma fazenda de tabaco, seguiu a determinação da Sociedade dos Amigos local e libertou os escravos que trabalhavam em sua lavoura em 1807. Johns, então com doze anos, interrompeu seus estudos e foi trabalhar na roça. Aos dezessete anos, um tio o chamou para uma sociedade em seu relativamente já bem sucedido atacado de bens de consumo em Baltimore. Lá, Johns conheceu Elizabeth, sua prima, por quem apaixonou-se. O romance, entretanto, não vingou pois não foi permitido por questões religiosas concernentes à consanguinidade que eles se casassem. Johns e Elizabeth juraram, então, não se casar e, de fato, assim o fizeram, não deixando descendentes; fato importante para o que se segue.

Ao longo dos anos, Johns acabou por divergir do tio (que chegou a afirmar que “não podia fazer negócios com alguém que gostava mais de dinheiro que ele próprio”) – mas não exatamente por causa do romance frustrado com Elizabeth: ele queria vender uisque. O tio, quaker, não. Ao, finalmente, romperem a sociedade, o tio deu-lhe dez mil dólares, que ele juntou com mais alguns que outros membros da família lhe adiantaram, contratou três de seus irmãos como vendedores e abriu a Hopkins & Brothers que ficou famosa, entre outras coisas, por distribuir no nordeste dos EUA o Hopkins’ Best (popular destilado de milho que poderia muito bem ter sido degustado pelo nosso Doc Josiah). Quando Johns se retirou da sociedade com os irmãos aos cinquenta anos de idade, já era um homem rico. Lançou-se, então, ao promissor mercado financeiro de Baltimore. Emprestou dinheiro, comprou ações (em especial da Baltimore & Ohio Railroad) e, com um tirocínio incrível para os negócios, amealhou uma enorme fortuna.

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Fig 2. Mapa da Guerra Civil dos EUA (1861-1865). O “Norte” (azul) e o “Sul” (cinza) com os border states (vermelho). Maryland (MD) e Delaware (DE) são representados a leste. Clique na figura para ver o original.

Foi quando a Guerra Civil irrompeu em 1861. Maryland era um border state. Os border states constituíam o “meio de campo” da guerra (estados em vermelho na figura 2, acima) e, por esta razão, eram estratégicos, tanto politicamente (nenhum deles apoiara a eleição de Lincoln), quanto por questões geográficas: exércitos de ambos os lados tinham que passar por eles. Maryland, particularmente, tendo Baltimore, sua capital, a apenas sessenta quilômetros de Washington DC, foi palco de sangrentas batalhas. Além disso, tinha uma economia escravagista, baseada no plantation (como a família de Johns), hostil a Lincoln, dominada por republicanos ferozes, sendo a maioria dos marylanders, por essas razõesfavoráveis às causas sulinas. Mas, Maryland tinha também Johns e outros influentes cidadãos apoiando o Norte. Tudo isso explica o fato de que o estado contribuiu com tropas para o dois lados da guerra e deu origem ao nome Brother against Brother War para descrever a situação absurda em que a guerra colocou os border states. Johns era abolicionista e um grande defensor da União. Sua casa de veraneio (hoje um belo parque) chamada de Clifton, era palco de reuniões frequentes dos simpatizantes do Norte a despeito de represálias frequentes. O auxílio da Baltimore & Ohio Railroads no transporte de tropas e mantimentos foi fundamental para a União, tendo Johns empenhado-se pessoalmente na campanha. Seu envolvimento na Guerra Civil foi tamanho que ainda hoje tal divisão “ideológica” tem seus desdobramentos[1].

Segundo o verbete na Wikipédia, Johns Hopkins era amigo de George Peabody, outro solteirão milionário da época. Peabody é considerado o pai da filantropia americana moderna (chamada de wholesale por razões que veremos em breve). Peabody começou a construir uma escola de arte e música em 1857 mas, devido a guerra, o projeto só foi completado em 1866, não sem certa dificuldade. Segundo conta a história, Peabody iniciou Johns nas atividades filantrópicas. Não se sabe exatamente porque Johns escolheu fundar uma universidade. O fato da elite marylander sulista ter sido derrotada e politicamente cassada por Lincoln após a vitória do Norte, inclusive com a promulgação de uma nova constituição estadual, dado que a anterior era republicana radical, terminou por deixar a cidade em frangalhos. Além disso, a necessidade de um hospital era premente. Epidemias de febre amarela, febre tifóide e cólera eram frequentes, tendo o próprio Johns contraído esta última. O fato é que em 1867 ele escreveu seu testamento. Não deixaria filhos, sua família estava bem. Presenteara Elizabeth com uma bela casa…

Johns morreu na véspera de natal de 1873, dormindo, aos setenta e oito anos. Seus bens foram utilizados postumamente para fundar, pela ordem por ele mesmo estabelecida (segundo a Wikipédia), um orfanato (Johns Hopkins Colored Children Orphan Asylum), em 1875; a Johns Hopkins University em 1876; a Johns Hopkins Press, a editora acadêmica de maior longevidade ainda operando nos EUA, em 1878. Em 1889 foram duas instituições: o Johns Hopkins Hospital e a Escola de Enfermagem (Johns Hopkins School of Nursing). A Faculdade de Medicina (Johns Hopkins University School of Medicine) só viria em 1893. A Escola de Saúde Pública (Johns Hopkins School of Hygiene and Public Health) só no final de 1916, mas já com dinheiro da Fundação Rockefeller (que, logo após, em 1918, iniciou o que seria o Instituto de Higiene de São Paulo, veja só).

O hospital da Johns Hopkins tem sido apontado como o melhor dos EUA por vinte e um anos consecutivos, segundo o U.S. News & World Report. A faculdade de medicina, o hospital e sua escola de saúde pública moldaram a educação médica norte-americana e mundial já a partir do começo do século XX, tendo sido tomados como exemplo pelo Relatório Flexner. Por quê? Quais elementos presentes tão precocemente em sua estrutura acadêmica a puseram à frente de seu próprio tempo? Vivemos ainda sob um modelo “hopkinsniano” de medicina? É o que tentaremos responder a seguir.

 

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[1] Todo mês de janeiro, como noticiou em 2008 o Baltimore Sun, descendentes de soldados sulistas viajam a Baltimore para prestar homenagens a dois generais lendários dos Estados Confederados da América: Robert E. Lee e “Stonewall” Jackson. Do Wyman Park, local dos monumentos, a multidão caminhava até a Johns Hopkins University, bem próximaonde utilizavam parte das acomodações para lanches e para hospedar-se a preços acessíveis. A direção da universidade, entretanto, informou a divisão de Maryland das Filhas Unidas da Confederação (United Daughters of the Confederacy) e os Filhos de Veteranos Confederados (Sons of Confederate Veterans) que não ia mais alugar o espaço a eles pois não tinha a obrigação de ver a bandeira confederada circulando no campus da Johns Hopkins.

Medicina, Capitalismo e Esquizofrenia

FMUSP

Prédio da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

Quem passa pela avenida Doutor Arnaldo vindo da Heitor Penteado em direção à avenida Paulista tem, logo após a rua Cardeal Arco Verde, à sua esquerda, o cemitério do Araçá e suas bancas de flores; à sua direita, pela ordem, o Centro de Saúde Escola Geraldo de Paula Souza, a Faculdade de Saúde Pública, o cruzamento da rua Teodoro Sampaio, o Instituto Oscar Freire,  a Faculdade de Medicina (acima), o Instituto Adolfo Lutz, o moderno prédio do Instituto do Câncer, o Instituto de Infectologia Emílio Ribas e finalmente, a ponte sobre a Rebouças que dá acesso à rua da Consolação e à Paulista. A depender do trânsito, sempre muito intenso na região, não é raro perder quinze ou vinte minutos neste trajeto de quinhentos metros tendo como visão algumas das mais antigas instituições estatais da Saúde Pública do estado de São Paulo. Isso sem esquecer que tal fachada esconde o complexo gigantesco do Hospital das Clínicas que se estende até a rua Artur de Azevedo, tendo como limite a Teodoro Sampaio e a Rebouças. Tal como uma parada na qual quem se move são os espectadores, desfilam diante nós instituições centenárias ao lado de modernas instalações hospitalares numa paisagem que tem sido descrita como local “onde a tradição se junta à inovação tendo como objetivo a saúde da população”. É uma demonstração de poder. Público.

Quando entrei a primeira vez no prédio da Faculdade de Medicina, lembro-me bem, tive um tipo de dispneia (vale a visita, agora que está restaurada). “Nem parece que estamos no Brasil” – diziam com orgulho. O intróito é de mármore italiano. A escadaria central é imponente e, ao mesmo tempo, discreta. As salas de aula, tradicionais e belas. Vitrais, janelas, o relógio. As salas da diretoria e da Congregação são máquinas do tempo de austeridade e estilo. Obras de arte. Apenas lá pelo terceiro ou quarto ano da faculdade, a memória agora me falha, descobri que nossa belíssima casa fora construída com capital privado dos EUA proveniente da Fundação Rockefeller, por meio de acordos que se iniciaram no longínquo ano de 1916. Também o prédio do Instituto Oscar Freire, da Faculdade de Saúde Pública, do Hospital das Clínicas, além da Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto, ou receberam incentivos, ou foram totalmente construídos com verbas da mesma fundação. Demorei algumas décadas para me dar conta de tal extravagância. Na medida em que fui me inteirando dos fatos, questões foram surgindo. Por que cargas d’água uma fundação norte-americana com capital gigantesco proveniente da refinação monopolizada do petróleo e outras commodities (como carvão), forjada no pós-guerra civil (presumivelmente um conflito anti-escravidão), financiaria uma faculdade de medicina em um país sul-americano que, apenas algumas décadas antes do início das negociações, era uma monarquia escravagista? Por que o Brasil, e especificamente, a cidade de São Paulo? A medicina praticada aqui e lá era assim tão diferente para haver uma “exportação de tecnologia” dessa monta? Por que a Fundação Rockefeller acatou integralmente o tal relatório Flexner sobre ensino médico financiado por outra instituição (abastecida pelo capital da exploração também monopolizada do aço norte-americano) a Fundação Carnegie? Qual seria a relação entre esses eventos e a vinda de médicos norte-americanos ao Brasil, como Alan Gregg?

Desta vez, tive um tipo de cefaleia; e vertigem também. Isso sempre acontece quando tenho que pensar uma coisa muito grande e acho que minha cabeça não vai dar conta de pensar tudo, até o fim. Me foi inevitável relacionar os discursos de vários colegas e entidades médicas de hoje, expostos que estão por força de atitudes governamentais (vide Ato Médico, Programa Mais Médicos, etc), com as bases da estruturação do ensino médico no Brasil e, particularmente, em São Paulo. Haveria algo assim como uma “ideologia médica” alienante, esquizofrenizante? Algo que misturasse o humanismo visceral que os verdadeiros médicos carregam em suas entranhas com um vício de pensamento egocentrado e auto-referente? O que seria isso e como o diagnosticamos? De onde vem? Ao trazermos, com força, ao debate acalorado de hoje, a ciência que nos embasa e nossa própria sabedoria prática médica como argumentos inelutáveis ao criticismo “laico”, não estaríamos também invocando os fantasmas de um certo “conservadorismo sofisticado”, autoritário e paternalista, aos moldes dos grandes filantropistas à frente de suas poderosas fundações? Teria tudo isso alguma relação com a enorme crise na saúde norte-americana e seu encarecimento sem precedentes, com a interação, por vezes, promíscua dos médicos com as indústrias farmacêutica e de tecnologia médica, com o teor do que é publicado como ciência médica nas revistas especializadas, com as regras do jogo que transforma alguns de nós em professores titulares?

Tomei um grama de dipirona e fiquei com seu(?) gosto amargo na boca.

O Filho do Pastor e o Padre

Allan Gregg

Alan Gregg (cerca de 1919). Do Profiles in Science (public domain). Clique na foto para o original.

Esse moço de chapéu, cachimbo, trajando longas botas e aquelas calças de explorador usadas em filmes de aventura, nasceu em 1890 na cidade de Colorado Springs, no Colorado – Estados Unidos da América. Seu nome: Alan Gregg. Filho de um pastor congregacionalista e uma musicista, logo partiu para estudos em Boston, tal como seus três irmãos mais velhos, cidade onde sua família vivia antes de seu pai ser transferido para o Colorado. Na época em que a foto foi tirada, ele tinha por volta de vinte e nove anos de idade. Alan, se assim podemos chamá-lo, tinha um espírito muito aventureiro. Em 1914, quis alistar-se para a Primeira Guerra Mundial (1914-18), mas pelo Canadá, já que os EUA ainda não havia enviado tropas para o confronto, o que, de fato, só ocorreria em 6 de Abril de 1917. Foi convencido que seria muito mais útil se terminasse a faculdade que ora cursava. Seguiu, então, o conselho de seus tutores graduando-se em medicina pela Harvard em 1916 e, ao final do ano seguinte, após um internato breve, integrou a equipe médica britânica em território europeu (mesmo destino, aliás, do cirurgião brasileiro Benedito Montenegro [pdf], formado em 1909 pela Universidade da Pensilvânia. Montenegro, entretanto, serviu do lado francês do conflito). Mas, voltando ao Alan, no período que seguiu ao seu retorno da Europa, não sabia ao certo qual rumo dar a sua carreira, profundamente impactada pela experiência da guerra. De conversa em conversa, encontrou algumas pessoas interessantes e a uma específica solicitou um “serviço que qualquer outro médico recusaria”. Um serviço que fosse o “mais selvagem e mais difícil” que um médico pudesse ter em tempos de paz. A pessoa a quem ele pediu tal missão escreveu, anos depois, que diante de tal solicitação, tentou fazer exatamente o que lhe foi pedido.

Em Março de 1919, então, Alan Gregg desembarca na cidade do Rio de Janeiro. A foto é desse período.

Mas por que viria Alan a terras brasileiras? “Depois de trabalhar em laboratórios no Rio de Janeiro e estudar a ancilostomíase (“amarelão”) e mosquitos transmissores de malária, Alan foi enviado a rincões remotos do país onde trabalhou em campanhas com equipes de saúde pública locais, tanto diagnosticando, como tratando aldeões infectados pela endemia.”

MiltonConduziu pesquisas e escreveu relatórios técnicos sobre a ancilostomíase e sobre as condições sanitárias gerais do país. Durante os três anos em que ficou no Brasil afirmou ter mudado consideravelmente sua visão da medicina entendendo que a prática médica de então só teria sucesso em sua vertente “preventiva” posto que a “curativa” não tinha, como vimos, um êxito técnico muito significativo; além disso, sua própria carreira de médico teve seus horizontes ampliados ao adquirir aqui a base para a apreciação de outras culturas. “No Brasil de então”, ele relembra em uma de suas cartas a amigos nos EUA, “após descer de um trem, você volta no tempo. Nos jogos infantis, as crianças entoam música gregoriana porque as pessoas não dispõem de melodias mais recentes.” (Eu, cá com os botões do meu avental, pressuponho que Alan possa ter cruzado com algum “parente” desses moleques de cara suja da foto ao lado, a cantar, pelo interior das Minas Gerais, o que seria, neste caso, um avanço no tempo, mas… isso jamais saberemos de fato).

Alan teve dificuldades no trato com a cultura brasileira. Certa vez, conta, ao chegar a um vilarejo, não estava conseguindo convencer os moradores a deixarem-se examinar pela equipe médica. Ele apelou então ao padre da igreja local, um polonês, também em missão. O padre perguntou a Alan se ele vinha levando uma vida dúbia e a razão de desperdiçar dinheiro com aquela pobre gente não seria a de fazer uma “oferenda pacífica” a seu Deus. Alan retrucou perguntando se deveria haver algum motivo para dar comida e dinheiro a pessoas fracas e famintas. Quando o padre disse que seus motivos deveriam ser caridade ou mesmo uma sensação de culpa, Alan sentiu um sufocante desejo de concordar mas, ao invés disso, disse que seu patrão acabara de doar uma quantia de 3 milhões de dólares à Polônia. Isso aparentemente convenceu o padre que concordou em intervir, favoravelmente a Alan, junto a seu rebanho.

O fato é que, depois de tantas experiências, Alan Gregg estava pronto para deixar o Brasil em 1922. Seus nada misteriosos patrões americanos o chamaram de volta aos EUA para integrar a diretoria adjunta da recém-fundada Divisão de Educação Médica da Fundação Rockefeller. Ele tinha um trabalho a realizar. Ao redor do mundo.

O Ethos Médico e o Espírito do Capitalismo

Dr Josiah “Doc” Boone por Thomas Mitchell em “No tempo das Diligências” (Stagecoach-1939)

A medicina do final do século XIX não tinha o discurso empoderado, nem tampouco o status atual (se bem que este último anda bastante combalido, convenhamos). Abrigava em sua “maleta” múltiplas teorias de doença que a dividiam em escolas beligerantes; era tecnicamente ineficaz; não tinha nenhum tipo de controle governamental e, por isso tudo talvez, era também mal remunerada e pouco reconhecida como profissão.

No Brasil, um exemplo que talvez tipifique tal situação é a Revolta da Vacina (1904) iniciada por uma  decisão do médico brasileiro de maior prestígio nacional e internacional de então, Osvaldo Cruz, em vacinar contra a varíola, compulsoriamente, os habitantes da cidade do Rio de Janeiro. Sem conseguir convencer as pessoas dos benefícios de sua decisão, a revolta terminou por deixar trinta mortos e cento e dez feridos, sendo centenas de pessoas presas, muitas delas depois “deportadas” para o Acre. (O episódio foi recentemente reconstituído por uma novela.)

Na América do Norte a situação não era diferente. Os médicos norte-americanos do começo do século XIX não tinham lá muito boa fama. Tal arquétipo, encarnado pelo premiado (Oscar de melhor ator coadjuvante em 1939) Thomas Mitchell que interpretou um médico alcoólatra no filme “No tempo das diligências” de John Ford, com John Wayne no elenco, estava mais para um fracassado que para bom partido. Seu enorme coração e sua coragem não garantiam ao Dr. Boone os bons resultados. Sua especialidade eram mesmo os destilados de milho do Velho Oeste.

Na década de 30, contudo, a medicina norte-americana já era uma profissão organizada em sociedades médicas de caráter econômico e científico. Os médicos passaram a ascender socialmente, aumentando seus ganhos financeiros e também sua importância no cenário político das cidades. Faculdades de medicina e hospitais tornaram-se o centro da prática médica concebida como atividade tecnológica e voltada para obtenção de resultados objetivos. O que teria ocorrido? Qual mudança foi responsável por esse salto de qualidade? Que onda de modernidade daria conta de passar a limpo a medicina e tornar os EUA a potência biomédica que são hoje? Conta a história oficial que, no início do século XX, grandes reformas na educação médica foram instauradas e ajudaram a organizar o grande caos que reinava no Canadá e nos Estados Unidos. Abraham Flexner, educador e professor americano, foi o mentor dessa reforma. Visitou 155 escolas de medicina (131 dos EUA e 24 do Canadá) e produziu um relatório que é seminal nas discussões sobre ensino médico (em pdf) até hoje. Nesse relatório, ele define o que seria um currículo ideal para as faculdades de medicina tendo como modelo a faculdade de medicina da Johns Hopkins. Foram fechadas quase uma centena de faculdades que não se adequaram ao procedimento padrão. Feita a “poda”, a medicina poderia então, florescer e dar bons frutos na América do Norte.

Mas, algumas questões sobre esse mainstream histórico têm sido levantadas. Em especial, porque muitas das causas da brutal crise que se abate sobre a medicina em vários lugares do mundo podem ter sua origem nesse período extremamente turbulento da história da humanidade. Tal transição a que me referi acima e o consequente ethos médico que se deu a partir de então, foram forjados no espírito do capitalismo agressivo e esfomeado do início do século XX e que tomou de assalto, não só a medicina e outras ações humanitárias, mas também, todo o sistema de ensino norte-americano, dado que a mão de obra especializada se constituía no grande óbice à formidável expansão econômica que logo se seguiu. Não se discute a inovação tecnológica e científica da medicina atual, discute-se sua forma de ser nessa tecnociência. Em tempos nos quais a importação de médicos – alegadamente objetivando preencher vazios assistenciais que os esculápios autóctones não conseguem (ou não querem) preencher -, parece iminente e, em meio a medidas atabalhoadas do governo federal contra um establishment de branco, algo demonizado até, em que pese sua óbvia responsabilidade sobre a situação atual, uma leitura histórica parece se impor mais do que nunca.

Espero que tal abordagem ajude a clarificar a diferença entre medicina e ciência, que alguns ainda insistem em não ver. A medicina e seu hibridismo epistemológico atávico, não é ciência e o tecnicismo atual que transforma médicos em tecnólogos da saúde já tem sido suficientemente criticado. Por outro lado, sua importância nas políticas de saúde faz dela uma atividade estratégica ao poder estatal. Reduzir a medicina a um instrumento político é perigoso e ineficaz, e a história é pródiga em exemplos que mostram que quem mais sofre com isso sempre são os mais indefesos. Vivemos as vicissitudes de um modelo médico que escolhemos há duzentos anos. Achar que as responsabilidades desse modelo recaem apenas em seus executores de branco é um ato de pusilanimidade. Aos leitores médicos, não reconhecer nossas responsabilidades sobre tal situação é covardia.

Um passo atrás, por favor. Que outros possam me ajudar a recontar essa história. Talvez assim, possamos entender o presente caótico e planejar um futuro melhor.

Carta-Resposta do Prof. Maurício Rocha e Silva

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Segue a carta do prof. Maurício Rocha e Silva sobre a suspensão de revistas médicas brasileiras pelo JCR, conforme publicado neste blog. As opiniões do autor não são necessariamente as mesmas do editor do blog. Esperamos, entretanto, que isso possa fomentar um debate salutar sobre as publicações científicas brasileiras, debate de importância maior para amadurecermos no nosso papel de relevância científica que conquistamos a duras penas. Todas as perguntas dirigidas ao autor do texto lhe serão encaminhadas por email e me comprometo a publicar integralmente, tanto as questões, quanto suas respostas. (Me reservarei, contudo, no direito de editar eventuais textos ofensivos e em “caps lock” abusivo).

Ainda a propósito da suspensão de revistas pelo JCR

Mauricio Rocha e Silva

Editor, Clinics

Clinics foi suspensa por um ano do Journal Citation Reports (JCR) 2012. A suspensão foi provocada por dois artigos publicados em 2011. A suspensão significa que CLINICS não teve Fator de Impacto divulgado para 2012 pelo JCR. Este é responsável pela publicação do fator de impacto de 8.841 periódicos científicos mundiais. Mas não é a única agência avaliadora no mundo, como veremos adiante.

O Hospital das Clínicas e a Editoria de Clinics estão examinando determinados aspectos do ato de suspensão e entendem que não existem fundamentos dentro das regras JCR em vigor que justifiquem esse ato.

Há que notar que, até hoje, o site JCR continua a afirmar que “Suppressed titles were found to have anomalous citation patterns resulting in a significant distortion of the Journal Impact Factor.” (Títulos suprimidos apresentaram padrões anômalos de citação, que resultam numa distorção significativa do Fator de Impacto da Revista). Isto só pode significar que a condição obrigatória para suspensão é uma distorção significativa do Fator de Impacto.

E qual foi a distorção significativa provocada em nosso fator de impacto? Clinics foi suspensa pela publicação de dois artigos na Revista da Associação Médica Brasileira sobre pesquisa científica brasileira em áreas específicas do conhecimento: aparelhos cardiorrespiratório e locomotor. Estes artigos citam 330 artigos brasileiros, dos quais 127 publicados pela CLINICS. Estas 127 citações representam apenas 18% de todas as citações recebidas pela CLINICS em 2011 (total 704 citações) Como consequência, o Fator de Impacto de Clinics elevou-se em 22% (de 1,687 para 2,058). Como é que esta distorção de fator Impacto é comparada com outras no sistema ISI? Para isso realizamos uma avaliação por amostragem pesquisando 200 revistas não suspensas pelo JCR e escolhidas randomicamente. Convidamos qualquer leitor a fazer o mesmo: escolha o seu método de randomização e veja o que aparece. Esta análise revelou 31 revistas (15,5%) com elevações de Fator de Impacto iguais ou superiores aos 22% da Clinics. Estendendo esta amostragem para o universo de 8841 revistas pode-se esperar encontrar cerca de 1300 revistas com “distorções” iguais ou superiores às da CLINICS. Nenhuma dessas foi suspensa. Entenda-se: não estou acusando de distorção estas revistas semelhantes à CLINICS e não suspensas. Estou simplesmente mostrando que o que não é infração ética para tantas, subitamente virou infração para Clinics.

Como notei, o JCR não havia instituído essa modalidade de impropriedade de citação em 2011, quando os artigos foram publicados. As primeiras revistas suspensas por stacking o foram em Junho de 2012. Três revistas foram suspensas por citações circulares. Só então é que se ficou sabendo que esta modalidade passara a existir. Consequentemente, a nova regra foi aplicada retroativamente à Clinics. Mesmo agora, junho de 2013, as regras continuam obscuras e dão a JCR margem para ações discriminatórias.

Vale repetir: o JCR não detém monopólio mundial de avaliação de impacto. Duas outras grandes instituições também o fazem. (1) A editora científica Elsevier, a maior do mundo, sediada na Holanda, possui um site  www.scimagojr.com, que divulga um impacto entendido pela CAPES, pela FAPESP e pelo CNPq como equivalente ao da JCR. Continuamos ali representados e quem quiser saber quanto será o nosso impacto Scimago 2012 só precisa esperar até o próximo mês de julho. (2) SCIELO, uma das mais importantes experiências de catalogação científica do mundo, sediada em São Paulo, publica também um Fator de Impacto. Continuamos ali representados. A suspensão de Clinics no JCR choca de frente com a não suspensão no Scimago e na SCIELO.

Mesmo que comentaristas inseridos neste e noutros blogs prefiram discordar de nossa posição, seria muito mais conveniente evitar a indecorosa e anônima pressa de criminalizar um evento entendido pela própria JCR como mera decisão técnica. CLINICS foi apenas excluída do JCR em 2011. Tudo o mais referente a ela continua incluído no sistema JCR e decorre normalmente.

Aproveito para reafirmar e renovar nosso compromisso com a informação ética e verdadeira da ciência, dentro do conceito de dignidade da atividade científica.

Ainda sobre as Revistas Suspensas

Este texto é a continuação desse e, de certa forma, também um esclarecimento sobre alguns conceitos que, ou foram colocados de forma errônea no anterior, ou ficaram ambíguos. Então, vamos lá.

BlockedAparentemente, no dia 19/06/13, a Thomson Reuters publicou uma nota na qual suspendia 4 revistas brasileiras de sua principal metapublicação: o Journal Citation Reports® (JCR). Isso significa que as publicações ficarão sem o fator impacto do ano de 2012, conforme esclarece carta enviada pelos editores a assinantes e revisores das revistas, publicada no post anterior. As revistas, mais uma vez, são, em ordem alfabética: Acta Ortopédica BrasileiraClinics, Jornal Brasileiro de Pneumologia e Revista da Associação Brasileira de Medicina.

A razão alegada para suspensão parece ter sido a prática de stacking, mas a nota da Thomson Reuters não deixa isso claro, falando apenas “em padrões de citação anômalos que resultaram em distorção dos respectivos fatores impacto”. Entretanto, os editores das revistas devem ter recebido uma notificação mais específica, dado que a prática de stacking foi citada na carta e também pelo prof. Maurício Rocha e Silva em comentário neste blog.

Autocitação e stacking são práticas condenadas pela Thomson Reuters porque aumentam o fator impacto das publicações artificialmente, dando a elas uma relevância irreal. Segundo Paul Jump do portal britânico THE (Times Higher Education) sobre educação superior, a Thomson Reuters começou a procurar no ano de 2012 o que ela chamou de “citation stacking“. Marie McVeigh, diretora do JCR, definiu a prática como “um específico e anômalo padrão de troca de citações entre dois jornais”, ou seja, “O Jornal A cita excessivamente um Jornal B” durante o período do cálculo do impacto. Naquele ano, três revistas – Cell Transplantation, Medical Science Monitor e The Scientific World Journal – foram excluídas do JCR referente a 2011 devido a tais comportamentos. Em 2012, a lista aumentou para 66 publicações de países como Espanha, China, EUA e Brasil. A Autocitação é uma prática considerada mais grave e é punida pela agência com dois anos de banimento.

Os editores das quatro revistas brasileiras contestam a validade da suspensão, talvez por intermédio de recurso enviado à Thomson Reuters; não sei. Do ponto de vista ético, tudo isso é muito desagradável. O Brasil teve uma ascensão grande no cenário científico mundial nos últimos anos e nossas revistas ganharam muito em importância. Situações como essa só vêm confirmar o preconceito que sofremos quando tentamos publicar nossos estudos em revistas internacionais, em especial, as anglófonas. Nesse caso, o melhor é esclarecermos tudo, doa a quem doer. Por isso, aguardo ainda manifestações dos editores das revistas, a quem ofereço o espaço deste humilde blog, de pessoas envolvidas nas publicações ou de qualquer um que possa nos ajudar jogar um pouco de luz nessa escuridão desconfortável.

 

PS. Agradeço aos leitores Sibele Fausto, Raptor e Suzana Silva pelos esclarecimentos.