Os novos naturalistas
Que me desculpem os biólogos, mas me parece cada vez mais claro que os herdeiros modernos dos naturalistas de antanho são os cientistas do solo. No caso da Ciência do Solo brasileira, muito têm contribuído para isto alguns professores-pesquisadores da Universidade Federal de Viçosa cuja visão do solo rompeu definitivamente com o paradigma dos estudos de solo voltados unicamente para a produção agrícola. Aqueles de nós formados sob a influência destes e cujos interesses naturalmente convergem para um papel mais amplo da Ciência do Solo seguimos a trilha aberta. O solo é resultado da interação do clima (climatologia), organismos (biologia), relevo (geomorfologia) e rocha de origem (geologia) ao longo do tempo (história). A civilização, por sua vez, iniciou-se com o advento da agricultura, que além da domesticação de espécies vegetais, iniciou também a domesticação dos solos. O adequado ou impróprio uso dos solos ao longo da história determinou, por vezes, o sucesso ou a ruína de civilizações, as quais deixaram e têm deixado cada vez mais intensamente sua “impressão digital” sobre e sob os solos. Após a revolução industrial, o papel do solo como destino final dos detritos da sociedade foi intensificado. Na verdade, hoje o solo deixou de ser visto como depósito passivo e é entendido como filtro, remediador e determinante da saúde ambiental. Agora, sob o bafo quente das mudanças climáticas globais, o chão que pisamos assume a posição de moderador climático como o maior reservatório continental de matéria orgânica, produzida a partir da fixação do dióxido de carbono cuja concentração crescente na atmosfera ameaça alterar dramaticamente o clima do planeta, além do fato de o manejo adequado dos solos ser determinante no balanço hídrico do planeta. Parece-me bastante claro que o Cientista do Solo competente deve dominar com razoável profundidade um campo amplo demais do conhecimento para que a comparação com os antigos naturalistas não venha à mente. No último Congresso Brasileiro de Ciência do Solo, realizado ano passado em Gramado, Rio Grande do Sul, o destacado cientista do solo Rattan Lal chamou insistentemente a atenção para a mudança de rumos do trabalho dos profissionais da ciência do solo, afastando-se da simples pesquisa agronômica para atuar como um resolvedor de inúmeros problemas ambientais, da disposição e remediação de resíduos radioativos à utilização de solos urbanos para construção ou recreação, da indisponibilização de metais pesados ao estudo e futuro planejamento de uso dos solos marcianos. Em um artigo publicado último dezembro na Soil Science, o cientista americano Daniel Richter revisou o papel que a humanidade teve e tem na própria gênese dos solos e de que forma o conhecimento aprofundado desta entidade natural independente pode iluminar os estudos das civilizações pretéritas. Aliás, torna-se gradualmente mais comum a presença de especialistas em solo em estudos arqueológicos. Como eu mesmo mostrei em um post recente, o conhecimento da química e da mineralogia de solos pode auxiliar no desvendamento de questões toxicológicas e até aclarar um pouco o cenário da origem da vida. Não, para mim não há dúvida de que somos os últimos e os novos naturalistas.
Discussão - 4 comentários
Cara, parabéns pelo post.
abraços
é isso aí Guedes.
gostei, muito formal, mas nao gostei de uma coisa ,está sem ilustrasao ,trate de colocar por favor.
OBRIGADO
ASSI:Nahara
Cara Nahara,
Realmente, somos um tanto quanto formais e pecamos por utilizar muito texto e poucas ilustrações. No campo da formalidade, estamos tentando mudar um pouco, inclusive com um autor com mais humor nos textos, o Elton Valente. Tentaremos também ilustrar mais nossos posts. Continue lendo e fazendo sugestões.