Com licença Geófagos! Um Desabafo.

Por Elton Luiz Valente

Alguém já disse que toda geração é refém de seu tempo. Eu, declaradamente, sou um desses. O contexto histórico de minha geração me acompanha feito uma sombra, ora me resguardando, como uma castanheira ao sol; ora me assombrando feito fantasmas nefastos. Digo isso porque os protagonistas das manchetes de minha geração estão registrados no núcleo duro da minha memória. De uns poucos tenho saudosas lembranças e referências. De muitos tenho tristes decepções.

Tenho críticas sérias a muitas figuras “ilustres” deste universo brasileiro com “muita estrela e pouca constelação” (como já dizia o saudoso Raul Seixas). Entre eles estão ícones nacionais e internacionais que não viveram em meu tempo, mas deixaram reflexos duradouros na história, quando não nas nossas vidas.

Evidentemente, minhas principais inquietações têm como alvo figuras contemporâneas, na pele de músicos, compositores (Chico Buarque, por exemplo), poetas, artistas plásticos, jogadores de futebol (Pelé, por exemplo), cineastas, novelistas, atores e atrizes com seus personagens de cinema e televisão, papas, políticos… e Oscar Niemeyer.

Se alguém tem curiosidade em saber por que resolvi falar do Niemeyer, é porque vi recentemente uma matéria sobre ele na televisão, com muitos elogios, endeusamentos e NENHUMA CRÍTICA, como é de praxe nesse Brasilzinho hipócrita de muita politicagem e raríssimos estadistas – históricos – porque no presente não há nenhum.

Tenho a honra de dizer que nunca fui comunista. Fui simpatizante do Comunismo na minha juventude pré-universitária, mas desconfiei muito cedo de que aquilo era uma roubada e saí fora. Só para tecer um paralelo, não conheço a biografia do Senador Cristovam Buarque, mas além de sua campanha veemente pela educação, um outro episódio protagonizado por ele merece crédito e respeito. Foi quando destamparam a panela do mensalão. Ele, na tribuna, rasgou sua filiação do PT, dizendo que não tinha condições morais de permanecer naquele partido. É o mínimo que se pode esperar dos homens públicos.

Niemeyer nunca deixou de ser um comunista fervoroso. Talvez isso revele muito do homem por trás do mito – aliás, faço aqui uma observação: eu nunca vi um comunista rico dividir sua fortuna com os pobres. Entre os capitalistas há quem tenha feito isso, existem alguns famosos como Henry Ford, Rockefeller e, mais recentemente, Bill Gates, que pelo menos prometeu.

Antes que alguém proteste, não estou querendo dizer que os capitalistas são bonzinhos e os comunistas são maus, “comedores de criancinhas”. Aliás, gosto muito da biografia de comunistas do naipe de Jesus Cristo e Mahatma Gandhi…

Há uma crítica muito pertinente às obras de Niemeyer, de que elas priorizam as formas, sem um mínimo de consideração pelo conforto dos usuários. Talvez isso revele muito do comunista por trás do homem.

Vivemos tempos desonrosos em todo o mundo, mas especialmente na América Latina, onde VELHAS EXCRESCÊNCIAS POLÍTICAS DA HISTÓRIA ainda encontram ouvidos e palanques. No Brasil, além de encontrá-las nas nossas Universidades Públicas, podemos vê-las por aí lépidas e faceiras, sob muitas siglas e neo-ísmos, e o que é pior, muitas vezes agregadas aos Três Poderes que, em síntese, deveriam zelar pela integridade física e moral desta nação. Mas não é isso o que assistimos. E eles estão aí, perto de você, perto de nós, fazendo as mesmas lambanças de sempre, como na obra “A Revolução dos Bichos” (Animal Farm), do brilhante e impagável George Orwell.

O grego, não me lembro se Aquiles ou Sócrates, que não temia a morte, mas temia a desonra, ficaria horrorizado.

P.S. Ninguém deveria passar pela vida sem ler “A Revolução dos Bichos”.

Discussão - 3 comentários

  1. manuel disse:

    Caro Elton
    Tive hoje um dia muito cansativo,pelo que o meu contário será breve,e talvez muito desfocado.
    Para já, fiquei muito surpreendido. Não esperava um tal desabafo. Deve ter saltado a tampa.Às vezes,acontece. A explicação deve morar na sua juventude. Ainda vai na subida. Quando chegar lá onde eu já estou,será um outro tipo de desabafo. E vamos à sua frase de entrada.
    "Alguém já disse....do seu tempo.". Como se os tempos tivessem sido muito diferentes. É claro que só vivemos o nosso. Mas temos retorno dos muitos tempos de trás. E a uma observação mais demorada tem de se concluir que não foram muito diferentes. É a vida Elton que os faz assim. Os figurantes nela vão mudando de cara,mas não mudam de coração.
    E é aqui que está a chave para não haver desabafos como o seu.
    Continuando tudo como tem sido sempre,é o vira o disco e toca o mesmo,como se diz aqui.
    É triste a pobreza,mais triste a miséria é,em pessoas,não em bichos.
    Faz isto lembrar uma afirmação de um homem publico do passado. Eu,distribuir o que tenho pelos pobres? Para quê? Ficava mais um.
    E depois,o mal,se é,não está na riqueza. Está naqueles que ela,casualmente,ou não, visita. Porque para a ter é preciso estar no sítio certo. E todos,vamos lá,quase todos,porque há sempre uns,como os Cristos e os Gandhis,e outros,os Desconhecidos,sem excepção,querem ser ricos. Mais ainda,o que tem vigorado quase sempre é o tira-te tu daí para eu ir para lá. E lá fica ele no cadeirão e é um sarilho para o arrancar de lá.
    Olhe,Elton,estava cansado,fiquei derreado.
    Só mais esta,deve lembrar-se. O que estiver sem mancha atire a primeira pedra.Isto só lá vai ao
    sítio onde devia estar quando Deus nos refizer. Doutro modo,é como o Eça de Queirós escreveu,creio que em 1870,citando alguém- A história é uma velhota que se repete sem cessar.
    Muitas desculpas pelo arrasoado,e o meu tirar de chapéu,como aqui se diz,pelo seu desabafo.

  2. Prezado Manuel,
    O “desabafo” é por constatar exatamente isso: nada muda. É assim como você disse, citando o grande Eça de Queirós que, relembro, nos apresentou a “Choldra”, que aqui muito bem caberia. A história é mesmo esta velhinha gagá que se repete numa cantilena sem fim.
    Some-se a isto o fato de constatar o quanto fomos ingênuos na juventude, pelo menos aqui nesse nosso universo ao sul do Equador.
    Por fim, o fato de que cultivo, não sei por que cargas d’água, um pouco de saudosismo da esperança que já tive, muito embora eu tenha me livrado, ou escapado, muito cedo dos dogmatismos políticos, religiosos e etc. Tive a sorte de encontrar, antes dos 20 anos, alguns bons livros, entre eles gosto de citar “A Revolução dos Bichos”, do qual o Brasil é hoje a caricatura mais recente.
    Sou grato, mais uma vez, por você manifestar suas opiniões aqui no Geófagos.
    Saúde e muito sucesso pra você!

  3. manuel disse:

    Caro Elton
    Cá estou eu,ainda mais uma vez. Ainda apanhei um amanhã,que aqui,
    onde estou,pelo menos,não está
    nada mal.Está sol,o frio não é muito,e tive pão à mesa. Não sei é se por aqui todos o tiveram.É que seria muito triste se a um faltasse.
    Mas adiante.Em primeiro lugar,grato também por ter tido a paciência de ler o que debitei. Mas já agora, uma palavrinha sobre isto de estar grato. É que,ao fim e ao cabo,todos nós somos uns seres gratuitos. Isto,estou convicto,não é conversa fiada. Sendo gratuitos,recebemos o que temos de graça. De graça também devíamos dar para haver justiça.
    Mas é melhor ficar por aqui,pois trata-se de um assunto muito,muito complicado. E vamos já ao que me trouxe aqui,nada mais,nada menos,do que outro desabafo. Desabafou,primeiro, o Elton,que é um jovem,desabafo eu,a seguir,que sou um velho. Neste caso,não é "ladies first",mas sim,"youngs first",que os velhos já deram o que tinham a dar.
    E ao desabafo vou dar os seguintes títulos,à escolha(que luxo!) - PEDRAS DE TROPEÇO ou EU NÃO QUERO INCOMODAR.
    Produção de armas. Produção de drogas. Compra de umas e outras. Consumo de umas e outras. Paraísos fiscais. Nacionalismos exacerbados ou doentios. Tráfico de crianças.Abuso de crianças. Tráfico ilegal de órgãos. Cobiças.
    Invejas. Ciúmes. Despeitos. Vaidades.Tradicionalismos exagerados. A galinha da minha vizinha é melhor que a minha.Dantes
    é que era bom,que saudades.Eu cá,nunca erro. Eu cá não sou desses.Proteccionismos. Nepotismos.
    Tráfico de influências. Coisas do passado que nunca esquecem. A Velha Europa. As guerras por tudo e por nada. Nunca me irei esquecer do que me fizeram,a mim e à minha família. Traições. Enganos. Ofensas de bradar aos céus. O que eu passei nem ao meu maior inimigo o desejo. Fomes disto e daquilo. Miséria. Carências de coisas fundamentais.
    Comsumismo desenfreado. Oh mãe,eu quero,e pronto. As modas soberanas,muitas sem jeito nenhum,para alguns,claro,haja respeito. Intolerâncias. Absolutismos. Medos. Ameaças.
    Chantagens. Faz de conta. Fronteiras. Eu cá é que sei. Mentiras descaradas,e sem o ser. Descrença. E Deus que não há meio de aparecer,ali bem à frente,a dar
    uns valentes puxões de orelha a gente que perdeu a vergonha,que O engana,sabe-se lá porquê. Ele tem havido tantas invasões,tantos cruzamentos,eu sei lá de quem são os genes que em mim moram. A sorte que tive de não ser isto ou aquilo,uma variedade de caras e de
    pareceres. De uma só cara,de um só parecer,se calhar tramou-se.
    Mas isso que importa?,como disse alguém de muito mérito. Há-de haver uma porta,onde me ponham à frente dela um pratinho,que eu não quero incomodar.
    Desculpe mais esta estopada. É capaz de ser a última,que já não era sem tempo.
    Saúde e muitos progressos aí no doutoramento.

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