A intimidade da fome irlandesa: sequenciado o genoma do Phytophthora infestans
A batata ou batatinha, Solanum tuberosum, erroneamente chamada de batata inglesa apesar de sua origem andina, foi e é um alimento básico de muitos povos. A hortaliça mais cultivada mundialmente, é a quarta espécie agrícola mais cultivada no planeta. Foi levada para a Europa pelos espanhóis em 1570, após a conquista do Império dos Incas, e lá se tornou a base alimentar de boa parte da população européia.
Já se tornou proverbial a dependência quase exclusiva da população irlandesa no século XIX pela cultura. Em torno de 1845 uma doença, chamada em inglês de potato blight e em português do Brasil de requeima, causou a morte de cerca de um milhão de irlandeses e a emigração de uma quantidade similar no episódio tristemente conhecido como Great Irish Famine, a grande fome irlandesa.
A requeima é causada pelo microrganismo Phytophthora infestans, antes classificado como fungo mas hoje reenquadrado entre os oomicetos. A doença, ainda hoje a mais importante afetando a batata e outras solanáceas, como o tomate, causa prejuízos anuais na cultura da batatinha, no mundo, estimados em cerca de 6,7 bilhões de dólares americanos. De difícil manejo pela rapidez do organismo em se adaptar às medidas de controle, geralmente se recomenda a utilização de variedades resistentes à doença e o plantio em áreas em que a ocorrência é incomum, como climas mais quentes e secos.
Em boa hora foi publicado hoje na revista Nature o artigo “Genome sequence and analysis of the Irish potato famine pathogen Phytophthora infestans“, por Brian J. Haas e colaboradores, em que se descreve o sequenciamento do genoma deste importante fitopatógeno, relevante feito que certamente virá auxiliar o controle da doença nas lavouras bataticultoras mundiais.
Eis o resumo do trabalho:
“Phytophthora infestans is the most destructive pathogen of potato and a model organism for the oomycetes, a distinct lineage of fungus-like eukaryotes that are related to organisms such as brown algae and diatoms. As the agent of the Irish potato famine in the mid-nineteenth century, P. infestans has had a tremendous effect on human history, resulting in famine and population displacement. To this day, it affects world agriculture by causing the most destructive disease of potato, the fourth largest food crop and a critical alternative to the major cereal crops for feeding the world’s population. Current annual worldwide potato crop losses due to late blight are conservatively estimated at $6.7 billion. Management of this devastating pathogen is challenged by its remarkable speed of adaptation to control strategies such as genetically resistant cultivars. Here we report the sequence of the P. infestans genome, which at ~ 240megabases (Mb) is by far the largest and most complex genome sequenced so far in the chromalveolates. Its expansion results from a proliferation of repetitive DNA accounting for 74% of the genome. Comparison with two other Phytophthora genomes showed rapid turnover and extensive expansion of specific families of secreted disease effector proteins, including many genes that are induced during infection or are predicted to have activities that alter host physiology. These fast-evolving effector genes are localized to highly dynamic and expanded regions of the P. infestans genome. This probably plays a crucial part in the rapid adaptability of the pathogen to host plants and underpins its evolutionary potential.”
Discussão - 1 comentário
Caro Ítalo
Está,mais uma vez,de parabéns. Que se cumpra o seu"relevante efeito que certamente virá auxilar o controle da doença nas lavouras bataticultoras mundiais".
A importância do trabalho é tal que mereceu figurar na capa da revista.É isso resultante do tremendo efeito da doença na história da humanidade,como vem apontado no resumo.O nosso Eça,nas Cartas de Inglaterra,faz-se eco da fome na Irlanda. Quanto ao controle da doença,como se infere do resumo,vai ser tarefa de gigante,suponho eu,devido aos "effector genes". O Phytophthora infestans sabe muito.
Para terminar,não resisto a referir uma coincidência. É que tinha lido ontem, em certo blogue, "É de comer batata",isto pelas suas altas qualidades nutritivas ,entre outras,o ser rica em vitamina C,um dos antioxidantes mais citados,e por ter,ainda que pouca,uma rica proteina.
Um abraço,Ítalo,e,mais uma vez,parabéns. Um abraço.