Campos cinzas e verdes cidades

Tenho um amigo, médico, que mora em Brasília, pessoa de considerável cultura, muito preocupado com os problemas atuais do mundo, um típico profissional urbano jovem. Meu amigo não lê meu blog nem gosta muito de me ouvir falando de minha vida profissional porque não consegue se interessar por agricultura nem acredita que exista algo como uma “ciência agrária”. Na verdade, notei ultimamente que meu amigo tem uma enorme antipatia por agricultores. Ele sinceramente os considera os maiores culpados pelos problemas ambientais modernos e acha perfeitamente razoável que boa parte da propriedade rural seja destinada à manutenção de áreas naturais como reservas. Também acho razoável esta exigência.
O que não consigo compreender é como a “consciência ecológica” de meu amigo possa ficar tranquila simplesmente por achar que sua antipatia pelos agricultores já o torna uma pessoa ambientalmente amigável. Também não consigo entender porque ele se sente tão bem porque comprou um apartamento no mais novo bairro chique da cidade, que se diz ecológico por ser arborizado, apesar de sua construção ter levado à destruição de uma área imensa de cerrado quase intocado.
Aliás, parafraseando o rei da França, gostaria de dar uma olhada no trecho do testamento de Adão que obriga o proprietário rural a manter reservas naturais na propriedade, e ainda assim ser considerado um destruidor da natureza, enquanto o proprietário urbano não tem nenhuma obrigação deste tipo, mas pode ser considerado um ambientalista consciente porque conhece um número grande de palavras de ordem, não gosta de agricultores e compra produtos orgânicos (presumivelmente produzidos em uma gôndula de supermercado neutra em carbono). Talvez a construção de bairros ecológicos e mercados orgânicos seja a solução, inclusive se se apropriarem de terras produtivas, evitando que os agricultores maus possam produzir comida.
Pergunto-me porque não há um Código Florestal para as cidades. Quantos metros de mata ciliar são deixados às margens dos rios que cortam nossas cidades? Para cada prédio construído, qual a porcentagem da área mantida com vegetação nativa? Serão os agricultores cidadãos de segunda categoria, cabendo-lhes exclusivamente o ônus de salvar a natureza e produzir mais e de forma ambientalmente correta em áreas cada vez menores, enquanto construtoras erguem prédios praticamente dentro do mar, desmatam, tomam terras produtivas, agravam problemas urbanos sem que se lhes exija nenhuma compensação ambiental? Ninguém vê o contrasenso?

Discussão - 3 comentários

  1. Concordo perfeitamente com suas colocações!
    As cidades também deveriam ter esse tipo de código,é um absurdo desmatar áreas tão importantes sem que haja nenhum tipo de preocupação referente a fauna e a flora afetadas!
    Um exemplo que sempre gosto de citar e que todas as prefeituras das cidades brasileiras deviam seguir,é o de Curitiba.É obrigatório de metros em metros ter árvores nas calçadas,a cidade é cheia de parques,etc.Por sinal a cidade foi eleita cidade mais sustentável do mundo segundo a revista Reenergy!
    Não é tanto quanto deveria ser,mas já é um grande passo ter esse tipo de exigencia nas áreas urbanas!

  2. Larissa Newton disse:

    De fato, ninguém pensa nestes "detalhes". E aqui em Mossoró sequer ha projetos que incluam o reuso da água para irrigação de jardins, lavagem das áreas, etc. Isso em pleno semi-árido.

Envie seu comentário

Seu e-mail não será divulgado. (*) Campos obrigatórios.

Categorias