O Geófagos e a Rede Minas de Televisão

Caríssimos Geófagos!

Tenho a grata satisfação de anunciar que a Rede Minas de Televisão vai apresentar uma série sobre a Serra do Espinhaço. Será apresentada no programa “Planeta Minas”, que é exibido toda terça às 21:40.

Pois bem! A produção do programa, buscando informações na Web sobre a Serra do Espinhaço, encontrou o Geófagos e, através dele, a nossa pesquisa de doutoramento que trata das relações entre o solo e a vegetação na Serra do Cipó.

Resultado! Entraram em contato comigo e agendamos uma visita ao Departamento de Solos da UFV e daqui fomos para a Serra do Cipó. Foram feitas umas tomadas lá, in loco. Foi uma experiência boa, embora não tenha sido fácil, tendo em vista que a televisão exige objetividade, clareza, períodos curtos (entenda-se respostas curtas) e o não uso de termos técnicos. Some-se a isso o “nosso” despreparo psicológico e técnico para suportar, sem sobressaltos, aquela expressão GRAVANDO! Espero, enfim, ter correspondido às exigências acadêmicas e televisivas das respostas.

A série tem início hoje, 17/02, às 21:40. Nós devemos aparecer na próxima terça, 24/02. O último programa da série será exibido na outra terça, 03/03.

Só para reforçar, o “Planeta Minas” é exibido toda terça às 21:40, com repeteco na sexta, às 13:30, e no sábado, às 18:30. Divirtam-se!

Quero agradecer, em nome da Comunidade Geofágica, a oportunidade de divulgar o nosso trabalho e a gentileza com a qual fui tratado pelos profissionais da Rede Minas com os quais tive contato, em especial, à equipe designada para me acompanhar em Viçosa e na Serra do Cipó. São eles: a Jornalista Julia, o Operador de Câmera e Diretor Jordane (quase um Francis Ford Coppola), e o Cenógrafo e Motorista Paulo.

Sinceros agradecimentos a todos!

Elton Luiz Valente.

Um pouco de geoquímica II

Olá amigos da comunidade geofágica, depois de algumas conversas e puxões na orelha, I’m back!
Turbulências ocorridas nas minhas tarefas diárias me levaram a perda total da administração do meu tempo e, com isso, negligenciei o Geófagos. Sinceras desculpas a todos, em especial aos meus amigos autores deste blog, os quais eu crédito toda a fama, não merecida, a mim atribuída pelos leitores.
Pois bem, agora com tudo nos devidos lugares e fazendo o tempo correr a meu favor, manterei maior regularidade nas postagens em respeito a todos vocês leitores e aos meus companheiros de jornada. Obviamente a prioridade será falar de ciência, Pilar Mestre deste blog, mas já peço desculpas no caso de algum deslize.

Assim, retornando ao trabalho, vou pagar minha dívida com vocês, respondendo ao Quiz deixado na minha última postagem: Porque, de maneira geral, se observa mais feldspatos potássicos (ortoclásio, KSi3AlO8) do que cálcicos (anortita, CaSi2Al2O8) nos solos tropicais?

Na tentativa de facilitar o entendimento, vamos adotar os dados listados na tabela abaixo:

Energia molar de formação de alguns óxidos metálicos, nos minerais silicatados

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Íon

Grupo

minerais silicatados

Energia (kg/cal)

Ca2+

839

Mg2+

912

Fe2+

322

K+

299

H+(na oxídrila, OH)

525

Ti4+

2882

Al3+ (nos sais)

1878

Al3+ (nos Al silicatos)

1793

Si4+ nos MSiO4 Nesossilicato

3142 (18852)

Si4+ nos MSi2O7 Sorossilicato

3137 (21511)

Si4+ nos MSiO3 Inossilicato

3131(25048)

Si4+ nos MSi4O11 Inossilicato

3127 (27290)

Si4+ nos MSi2O5 Filossilicato

3123 (29981)

Si4+ nos SiO2 Tectossilicato

3110 (37320)

M = metal (Fe, Mg, Ca, Al, K, etc.);
Os números entre parênteses foram calculados fixando as quantidades de oxigênio

Como podemos observar, a energia de formação das pontes entre os metais alcalinos e alcalinos terrosos e oxigênio são menores em relação a ligação Al-O, que por sua vez é inferior as ligações Si-O.

Antes de responder ao quiz e indo um pouco mais adiante, a partir dos dados acima podemos extrair mais duas informações importantes: a sequência de cristalização e a estabilidade termodinâmica desses minerais, ou seja a maior ou menor resistência deles ao intemperismo. Por exemplo, a energia de formação para os diferentes grupos de minerais silicatados (dados entre parênteses) aumenta na direção dos nesossilicatos para os tectossilicatos, onde claramente há um aumento no número de íons silício por mol de oxigênio. Na medida em que ocorre este aumento, maior é a estabilidade do mineral. Deste modo, é por isso que observamos a grande quantidade de quartzo (tectossilicatos) nos solos tropicais.

Concluindo, na medida em há o aumento na substituição do Si pelo Al na estrutura do mineral, ele se tornará mais susceptível ao intemperismo por causa do enfraquecimento da estrutura cristalina. Como mencionado no post anterior, no ortoclásio (KSi3AlO8) a relação Si:Al é 1:1, contra 2:2 para anortita (CaSi2Al2O8). Respondido? Espero que sim e qualquer dúvida estamos ai para ajudar.

PS: Observem o valor da energia de formação dos óxidos de Ti! Agora está mais claro porque a presença do rútilo (TiO2) e da ilmenita (Fe2+TiO3) tem sido rotineiramente constatada nos solos de regiões tropicais.

Juscimar Silva

Uma pergunta incoveniente!

Resolvi escrever esse post em resposta a uma pergunta que vem me acompanhando desde o momento em que resolvi especializar-me (em nível de mestrado e posteriormente de doutorado) em Ciência do Solo. Na entrevista de seleção do mestrado, ela foi feita pela primeira vez. O questionamento era “Por que um Engenheiro Ambiental deseja especializar-se em Ciência do Solo”? Essa incômoda perguntinha ainda seria feita em diversas outras oportunidades, inclusive em outras entrevistas para diversos fins.
Bem, para início de conversa , algumas colocações já foram por mim feitas aqui e aqui. A resposta parece-me óbivia, mas pelo que tenho visto não é. Citarei a seguir alguns dos pontos que nortearam e ainda norteiam minhas respostas e que, acredito eu, deixam claro a importância dos solos para as questões ambientais.
Em primeiro lugar gostaria de citar a prórpria definição do termo “meio ambiente”, conforme obtida no Vocabulário Básico de Recursos Naturais e Meio Ambiente, publicado pelo IBGE no ano de 2004. Tal publicação pode ser obtida aqui. Segundo ela, meio ambiente refere-se ao “conjunto dos agentes físicos, químicos, biológicos e dos fatores sociais susceptíveis de exercerem um efeito direto ou mesmo indireto, imediato ou a longo prazo, sobre todos os seres vivos, inclusive o homem”.
No meu modo de ver os solos estão enquadrados diretamente como agentes físicos e ainda indiretamente como agentes químicos, biológicos e sociais. Logo, ele também é objeto de estudo das Ciências Ambientais e consequentemente da Engenharia Ambiental, que é uma das vertentes das primeiras. As funções ecológicas dos solos são os maiores exemplos dessas relações diretas e indiretas. A capacidade de reter poluentes e/ou contaminantes, sustentar edificações, ser meio de desenvolvimento de plantas, ser meio de produção de alimentos, estar em contato direto com águas superficiais e subterrâneas, de sustentar a macro, meso e microfauna edáfica, de fornecer importantes nutrientes para o desenvolvimento da vida, participar dos ciclos biogeoquímicos ativos no planeta, entre outras, é que me permitem dizer que sim, os solos também são compartimentos ambientais de vital importância. Estão intimamente ligados à manutenção de uma boa qualidade de vida para os seres vivos, inclusive os “human beings”.
Mas por que então essa pergunta continua sendo feita constantemente e o espanto está na face do interlocutor quando o mesmo percebe que meu currículo posterior a graduação em Engenharia Ambiental foi feito com base nesse importante compartimento? Vejo diversas respostas para tal, mas duas, na minha opinião, sobressaem às demais. A primeira é que a Engenharia Ambiental deriva da Engenharia Civil e, como tal, desde o seu nascimento esteve muito voltada às questões referentes ao saneamento. É também à esse motivo que atribuo a evidente lacuna de questões biológicas no currículo dos diversos cursos de Engenharia Ambiental país a fora. Outro aspecto importante é que a Ciência do Solo, por outro lado, sempre esteve ligada às Ciências Agrárias e, portanto, ainda há “ranço” tal que questões inovadoras ligadas à ela, por exemplo as tecnológicas e ambientais, ainda sofrem certo preconceito por parte dos cientistas do solo clássicos. O conjunto da obra é, como eu disse em um post antigo, o solo como um compartimento esquecido pelas ciências ambientais.
Carlos Pacheco

Ciência do Solo: Muito além de uma Ciência Agrária.

Em recente discussão, nós, autores do Geófagos, decidimos por uma “volta à fazenda”, conforme proposto pelo Ítalo. Trocando em miúdos, resolvemos voltar o foco para nossa origem, a Ciência do Solo. Para selar essa volta, acredito eu, não há nada melhor que um texto que introduza o leitor ao assunto, mostrando o quão abrangente é essa ciência e que, ao contrário do que costumeiramente se vê e entende, ela abrange uma gama de assuntos que se estendem muito além das Ciências Agrárias.
Piaget diz que a multidisciplinaridade se faz presente quando “a solução de um problema torna necessário obter informação de duas ou mais ciências ou setores do conhecimento sem que as disciplinas envolvidas no processo sejam elas mesmas modificadas ou enriquecidas”. Pois bem, acredito que a ciência do solo se enquadra bem nesse conceito.
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Foto de um perfil de solo – LATOSSOLO VERMELHO-AMARELO Distrófico húmico do Parque Nacional do Caparaó (MG)
Ao contrário da visão tradicional e da “neoclássica” de Ciência do Solo, acredito que ela possui sim uma multidisciplinaridade nata, bastante evidente em uma análise crítica bem fundamentada. Tal multidisciplinaridade fica também evidente quando recorre-se aos primórdios dela, quando Dokuchaev descreveu o solo como um corpo natural dinâmico, cuja dinâmica depende de uma interação de fatores como relevo, ação da biota, clima e tempo. Desses, alguns são fatores ativos, passivos e controladores que são representados, respectivamente, pela biota e clima, tempo e relevo.
A ciência do solo é uma Geociência, principalmente, quando do campo da Pedologia. Afinal, estudar um corpo formado ao longo de centenas ou milhares de anos não nos remete ao estudo do Tempo Geológico e das muitas modificações sofridas pela esferas terrestre ao longo de sua evolução? Estudar os depósitos minerais lateríticos não nos remete à Geologia Econômica? Existem processos sedimentares sem antes haver intemperismo e pedogênese? Enfim, as respostas são claras.
Ela também é uma Ciência Agrária. O exemplos mais claros são, sem dúvida, as interações solo-planta e suas consequências. É o aspecto que tem ficado mais evidente ao longo do tempo, principalmente, devido ao viés agrícola predominante ao longo de sua evolução. Esse já foi deixado subentendido por Heródoto, Teofrasto, Crescentius, etc… Essa íntima relação e a evolução da Ciência do Solo, como um todo, é que permite a exploração agrícola de terras antes consideradas inapatas ao uso agrícola, como o cerrado brasileiro, por exemplo.
Ciências básicas como Química, Física e Biologia também fornecem importantes ferramentas para a evolução desse jovem ramo da ciência. Outras não tão básicas, como a Mineralogia, por exemplo, também o fazem. O equilíbrio químico e as relações da macro, meso e microfauna do solo são bases para estudos do intemperismo e da pedogênese, sobretudo em regiões tropicais úmidas.  A resistência mecânica das rochas é importante fator naquelas áridas e também nas geladas. A resistência de um solo aos processos erosivos está intimamente relacionada com suas características físicas e também com a mineralogia de suas argilas. A fertilidade ou toxicidade de um solo dependem não somente dos teores de nutrientes presentes, mas também de sua especiação. A mineralogia também está frequentemente ligada à maior ou menor disponibilidade de nutrientes, elementos e substâncias tóxicas. A qualidade e a quantidade de recursos hídricos subterrâneos também são fortemente dependentes da qualidade do solo, ou seja, do conjunto de fatores químicos, físicos, biológicos e mineralógicos dos solos.
Obviamente, esses exemplos não esgotam a multidisciplinaridade dessa ciência. Entretanto, eles representam bem como a Ciência do Solo vai muito além de uma Ciência Agrária. O viés agrícola foi sem dúvida o que deu sustentação ao crescimento desta como ciência, sua importância é inquestionável, mas a visão estritamente agrária dessa ciência não mais é a sua realidade.
A expansão e o amadurecimento da Ciência do Solo podem ser vistos em trabalhos recentes. Questões relacionadas à gênese, uso e a ocupação do solo têm sido atualmente reconhecidos como importantes vertentes econômicas, como importantes reservatórios e sequestradores de carbono, como fundamentais para a vida em ambientes hostis como Antártica (por exemplo, pelo transporte através de correntes marinhas do fósforo adsorvido em óxidos férricos Australianos), meio de suporte para crescimento de matérias primas energéticas, como as dos biocombustíveis, entre outras. Mas muito além disso, não tem-se perdido o foco de questões sempre presentes nas discussões, entre elas e, talvez a mais importante, a segurança alimentar (aqui incluídos aspectos qualitativos e quantitativos da produção de alimentos).
Carlos Pacheco

Blogagem Coletiva – Térmitas Africanos: Relações edáficas e utilização por povos nativos

blogcoletiva-africa
Em primeiro lugar gostaria de dedicar o post que virá, referente à blogagem coletiva sobre a África, para os nossos leitores Moçambiquenhos e Angolanos, cuja presença aqui tem sido constante. À outros leitores Africanos, também vai a nossa singela homenagem.
Não há dúvidas quanto ao fato de os organismos atuarem significativamente na gênese dos solos. Alguns cientistas até consideram esse o principal diferencial entre os solos e fragmentos de rochas desintegrados. Obviamente, essa questão é mais profunda, levando o conceito de solo também à aspectos como a organzação, capacidade de sustentação de estruturas e vida, entre outros. A relação benéfica dos organismos em relação aos solos também acontece no sentido inverso. Ou seja, os solos também fornecem condições de vida mais adequadas para sobrevivência de determinadas espécies. Fatores como temperaturas mais adequadas, fornecimento de alimentos e áreas de refúgio, proporcionados por eles, podem ser determinantes no desenvolvimento delas. Em alguns casos, o homem também se aproveita dessa íntima relação, participando do processo de diversas formas. Citarei nesse texto o caso de populações africanas nativas que, por meio do uso (esse sim efetivamente sustentável) de recursos proporcionados por populações de térmitas (cupins), que são insetos da ordem Isoptera, têm garantida sua sobrevivência.
Os térmitas representam um dos grupos mais importantes de invertebrados do solo, apresentam uma impressionante organização social e grande flexibilidade de obtenção de recursos (comida, água, além de temperaturas adequadas) graças ao seu poder de escavação. Nesse sentido, apresenta grande vantagem competitiva e consequente capacidade de adaptação a diferentes ambientes, uma vez que não apresenta limitações de exploração às cavidades naturais do terreno ou, como é o caso das minhocas, movimentos laterais restritos. Tudo isso faz com que esses insetos apresentem-se em abundância mesmo em condições aparentemente hostis, relacionados a climas secos ou com grandes estações secas, desde que uma fonte de água (mesmo que em profundidades consideráveis) esteja presente. Para ter-se uma idéia da capacidade de adaptação desses insetos, os fósseis mais antigos deles datam do Eoceno e Mioceno e apresentam idade estimada em cerca de 50 milhões de anos.
A existência de grupos desses organismos está ligada, principalmente, às regiões tropicais do globo. No entanto, restrições ao desenvolvimento deles existem e estão ligadas a condições de extrema aridez e falta de vegetação, além de climas frios. Por isso, não é comum a existência de grandes populações em ambientes de clima temperado ou em regiões cujas altitudes sejam superiores a 3000 m, com seu consequente clima frio (altimontano).
Apesar de os cupins serem mais conhecidos por prejuízos causados (como devoradores de madeiras e de outros materiais celulósicos), eles apresentam grande importância na decomposição da matéria orgânica, estruturação do solo e ciclagem de nutrientes. Aparentemente as principais modificações por eles proporcionadas aos solos estão ligadas à qualidade da matéria orgânica e melhoria de aspectos físicos. No entanto, não são raros relatos de elevação de teores de C e de nutrientes essenciais como N e P em seus ninhos, também conhecidos como termiteiros ou murundus, quando comparados com os solos ao redor.
Os térmitas fazem parte da mesofauna do solo. Na ciclagem biogeoquímica da matéria orgânica atuam como detritívoros. São, portanto, determinantes da velocidade de decomposição de compostos orgânicos e consequentemente na liberação de nutrientes importantes. Isso porque a redução do tamanho das suas diversas formas de material orgânico (raízes, folhas, galhos, etc) é fator essencial para que uma elevação na taxa de decomposição da matéria orgânica ocorra, uma vez que aumenta a área especificamente “atacável” pelas comunidades microbinas. É frequente, em ambientes não propícios a esses organismos, a existência de matéria orgânica pouco alterada (fíbrica), enquanto que, em ambientes onde eles participam ou já participaram do processo, material orgânico mais alterado é encontrado (sáprico, por exemplo). Isso mostra, didaticamente, que em ambientes não propícios à existência dos térmitas, a ciclagem é prejudicada por não ter seu “cominuidor” inicial presente.
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Exemplo de termiteiro gigante africano (http://www.exchangedlife.com/Creation/african_macroterm.htm)
Em ambientes propícios ao crescimento de colônias e dos seus ninhos, o tamanho desses últimos pode chegar a relatados cerca de 30 m de diâmetro e 20 m de altura. Os maiores termiteiros são encontrados na África, especialmente em ambientes de savana, e apresentam uma arquitetura invejável, com efetivo sistema de aclimatação. Em noites frias, buracos existentes são preenchidos com o objetivo principal de reter calor, enquanto que em dias quentes eles são abertos. O sistema é bem estruturado, com um “cimento” a base de saliva de cupins e material edáfico (do solo) tão resistente que são utilizados até na construção de casas para os nativos. A estrutura de suas partículas formadoras garante uma boa drenagem e aeração dos ninhos, diferenciando-os, inclusive, de áreas mal drenadas ao redor. Em alguns casos, as taxas de infiltração registradas são o dobro daquelas dos solos regionais. Alguns pesquisadores até acreditam que a atuação dos térmitas durante alguns milhares de anos é um dos agentes de formação da estrutura granular, comumente encontrada nos Latossolos brasileiros.
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Termiteiro brasileiro – Foto: Sandro de Caires e Carlos Pacheco (Região de Paracatu – MG).

Quanto às características químicas, é comum o registro de níveis relativamente mais elevados de nutrientes nos termiteiros do que nos solos ao redor. Apesar disso, diversos trabalhos têm apontado para modificações nutricionais não significativas. Já o carbono orgânico geralmente apresenta-se em níveis mais elevados. Outras características como a CTC (capacidade de troca catiônica) também podem sofrer elevação em seus valores. A união dessas caratcterísticas com aquelas físicas tornam termiteiros abandonados aptos à utilização agrícola. A grande estabilidade por eles apresentada, resistindo à erosão por um longo período de tempo após a extinção da colônia, também é um fator determinante para garantir seu uso . Esse fato, associado à riqueza química e qualidade física deles, é o que permite populações nativas da África utilizem as “terras de cupinzeiro” para tais finalidades. É uma agricultura de subsistência que pode ser determinante na estadia de tais povos em suas áreas de ocorrência, contrastando, muitas vezes, com a pobreza nutricional ou características físicas indesejáveis ao cultivo dos solos regionais. Servem como base de sobrevivência para povoados inteiros. Além disso, em regiões onde as colônias ainda estão presentes, os térmitas são utilizados como alimentos por constituirem uma excelente fonte de proteínas.
Enfim, essa pequena história tentou representar um pouco dos modos de sobrevivência de alguns povos nativos africanos e também como as relações entre solos e organismos neles residentes podem determinar o modo de vida e garantir uma relação sustentável entre eles e o meio onde vivem.
Carlos Pacheco

Um pouco de geoquímica

O adjetivo ‘essencial’ e suas derivações são utilizados nas diferentes áreas de estudo para qualificar algo que constitui a parte necessária ou inerente de uma coisa. Porém, a qualificação quanto ser ou não essencial depende, a meu ver, de avaliação individual. Um exemplo é a maneira na qual o alumínio (Al), metal de número e massa atômica igual 13 e 26,98154 g, respectivamente, pode ser “considerado” na Ciência do Solo. Na fertilidade do solo, por exemplo, existe o termo elementos essenciais que agrupa certos elementos químicos (N, P, K, Ca, Mg, S, Fe, Mn, Mo, Zn, Cu, Co, Cl e B) que na ausência de pelo menos um deles a produtividade das plantas é comprometida. Como adendo, existe também os elementos benéficos (Ni, Se, V, etc.) que, embora não tenham sido comprovadas suas essencialidades, pode estimular o desenvolvimento de plantas ou substituir, parcialmente, a função dos elementos essenciais. Por outro lado, o Al é considerado elemento tóxico, ou seja, ele é um dos fatores que pode limitar a produção da maioria das espécies cultivadas e, sendo assim, sua atividade na solução do solo deve ser reduzida. A calagem (uso de calcários ou outras fontes de corretivos da acidez do solo) é a prática mais simples e eficiente adotada.

Entretanto, avaliando a importância do Al em outras áreas, como na geoquímica, mineralogia e gênese do solo, este passa ter papel crucial, haja vista o papel relevante que desempenha durante o resfriamento do magma, cristalização dos minerais e, por fim, formação dos diferentes tipos de rocha. Durante esses processos, a inserção do Al na estrutura dos minerais primários ou secundários (produto de intemperismo), denominada substituição isomórfica (não há modificação da estrutura original), por um lado interfere na gênese dos minerais silicatados e por outro modifica as propriedades físicas, químicas e físico-químicas dos oxihidróxidos de Fe do solo. Vale ressaltar que tais substituições são possíveis porque o raio iônico do Al (0,50 Å) é ligeiramente maior que o íon Si (0,41 Å) e menor que o íon Fe (0,64 Å).

Recapitulando! Os minerais silicatados são classificados de acordo com as diferentes ligações do seu arranjamento estrutural básico, o tetraedro de silício (SiO4). Dentre os diferentes grupos existentes há os tectossilicatos (SiO2), que tem o quartzo como representante mais conhecido. Pertencente a esse grupo, tem-se também os feldspatos que podem ser derivados do quartzo, durante a sua solidificação (cristalização). Para isso, a substituição isomórfica do íon Si pelo íon Al é condição sine qua non. Quando isso ocorre, há um desbalanço de carga estrutural nos feldspatos (SixAlyO8)x-4 que é balanceada pela incorporação de um cátion monovalente (K+), quando a substituição Al: Si é 1:1 (ortoclásio, KSi3AlO8) ou de um cátion divalente (Ca2+), quando são 2:2 (anortita, CaSi2Al2O8). Substituições similares do Si, Fe e Mg também ocorrem nas estruturas dos outros silicatos promovendo grande variedade na composição desses minerais. Nos filossilicatos, a substituição do íon Al por íons Mg e Fe2+ PARECE ser determinante para a gênese da biotita [K(Mg, Fe2+)3(Si3Al)O10(OH,F)2] ou da muscovita [Kal2(Si3Al)O10(OH,F)2].

De maneira generalizada, pode-se inferir que a pouca reserva de nutrientes, principalmente de K, observada nos solos pobres de regiões tropicais se deve à presença intrusa do Al seja durante a cristalização do quartzo, formando os feldspatos, ou na formação da muscovita. Seria isso um tipo de seqüestro de metais alcalinos e alcalinos terrosos? Desculpe o entusiasmo, mas na ausência do Al a quantidade de quartzo nas rochas e, consequentemente, nos solos seria bem maior devido sua maior resistência ao intemperismo. Teríamos também muito pouca muscovita que é mais resistente ao intemperismo que sua “irmã”, a biotita.

Como já mencionado, o Al está presente também nos oxihidróxidos de Fe dos solos. Postula-se que a maioria dos oxihidróxidos naturais (e.g. goethita, hematita, ferrihidrita, etc.) apresenta substituição isomórfica por Al. O menor tamanho do Al em relação ao Fe altera as propriedades da cela unitária (arranjamento mais simples dos átomos ou moléculas que se repetem regularmente na estrutura cristalina), resultando geralmente na diminuição do tamanho dos cristais. No Doutorado trabalhei com amostras sintéticas de goethita sem e com substituição por Al e pude constatar, na prática, tais alterações. Por exemplo, a redução no tamanho dos cristais das goethitas com substituição teve seus valores de superfície específica aumentado de 4 a 6 vezes em relação à goethita pura. Este aumento refletiu diretamente na capacidade máxima de adsorção de arsenato (As+5), que foi em média 6 vezes superior a do mineral puro. Além disso, a presença do Al aumentou a estabilidade da goethita em condições de baixo potencial de oxirredução (Eh).

Diante do exposto, como não considerar o Al é essencial, se por um lado ele contribui para diferenciação mineralógica que garantirá reserva de nutrientes, embora pequena, em regiões onde o intemperismo atua de maneira acentuada (regiões tropicais, por exemplo) ou, por outro, sua presença nos oxihidróxidos de Fe do solo aumenta a estabilidade desses minerais sob condições redutoras e a capacidade deles em reter elementos nocivos ao meio ambiente, agindo como “filtro”.

Por fim, como iniciei este post a essencialidade é subjetiva e depende de uma interpretação conveniente.

Juscimar Silva

Quiz: Porque, de maneira geral, se observa mais feldspatos potássicos (ortoclásio, Ksi3AlO8) do que cálcicos (anortita, CaSi2Al2O8) nos solos trópicais? Deixem a resposta no campo cometários.

 

E o futuro da agricultura?

Por Elton Luiz Valente

Analisando alguns dados sobre as condições ambientais das partes elevadas da Serra do Cipó, na Cordilheira do Espinhaço, frutos de um estudo que trata das relações entre o solo e a vegetação naquele ambiente, surgiram algumas reflexões. Aliás, da Serra do Cipó já temos algumas publicações no Geófagos, como estas aqui e aqui.

Naquele ecossistema, o gradiente de vegetação, de Campo Rupestre para Floresta, acompanha o gradiente de solo. A vegetação vai se tornando mais elevada e densa na medida em que o solo torna-se mais profundo. Os solos são todos ácidos, extremamente pobres quimicamente e ricos em alumínio trocável. A principal estratégia da vegetação, segundo algumas de nossas conclusões, é a ciclagem biogeoquímica. Mais Bio do que Geo, diga-se.

No entanto, a vegetação florestal é robusta. São disjunções de Floresta Ombrófila ocorrendo a mais de 1.200 metros de altitude. Não há evidências de desnutrição na fitomassa. Ocorrem indivíduos com até 30 metros de altura estimada e mais de 200 cm de circunferência de tronco. Isso revela, de acordo com nossas conclusões, uma alta eficiência dessas espécies em utilizar os poucos recursos disponíveis e, com eles, sintetizar altas taxas de carbono. Em outras palavras, estas espécies sintetizam muito carbono, na forma de fitomassa, com pouquíssimos recursos minerais. Isso me fez refletir sobre algumas questões, entre elas, o futuro da agricultura e os possíveis caminhos que podem ser percorridos pelas ciências agrícolas. Ciência do Solo e Fitotecnia, por exemplo.

Os maiores avanços obtidos na agricultura, desde que o homem (ou a mulher) domesticou algumas espécies, tiveram como foco a produtividade. No último século, esses avanços foram espantosos. Ao aliar o melhoramento genético com a modificação, ou ajuste, de ambientes antes negligenciados, como o Cerrado no Brasil, produziu-se uma verdadeira revolução nos modelos e processos de produção agrícola. O Brasil é um excelente exemplo disso.

Muitos entusiastas desse novo modelo de produção agrícola chegaram a dizer que a Teoria Malthusiana (Thomas Robert Malthus, 1766-1834) estava equivocada. Será? Algumas questões nesse enredo não são novas, mas como estão se tornando cada vez mais pertinentes, vale repetir pelo menos uma delas: Os sistemas agrícolas vão suportar a pressão do agronegócio por longo prazo?

E aqui podem entrar outras questões: Qual será o futuro da agricultura? Qual será a demanda para o Engenheiro Agrônomo e para a Ciência do Solo? Será que com nossa visão eminentemente mecanicista do mundo nós estaremos preparados para elas?

Em resumo, o modelo de agricultura do agronegócio promoveu a produtividade, sem se preocupar com as necessidades de consumo das culturas. Essas espécies (ou cultivares) necessitam de um ambiente “ajustado” às suas necessidades. Necessitam de altas doses de nutrientes para manter suas altas taxas de produtividade e fechar os seus ciclos produtivos com a eficiência desejada. Estas culturas apresentam ainda aquilo que nós chamamos de “consumo de luxo”, em que o aumento na absorção do nutriente e sua concentração nos tecidos não são acompanhados por aumento no crescimento ou produção.

Por outro lado, as espécies nativas, em condições naturais, possuem alta eficiência na absorção de nutrientes (utilizam estratégias como associações simbióticas e exsudatos radiculares para “ajustar” a rizosfera); possuem alta eficiência na síntese de carboidratos sob condições adversas e apresentam menor demanda nutricional e, claro, menor produtividade quando comparadas às espécies “melhoradas”.

E aqui entram algumas questões que me ocorreram: Qual é a taxa mínima de disponibilidade de nutrientes que estas espécies nativas conseguem suportar? Qual será o comportamento delas mediante uma melhora na CTC do substrato, aumento do pH do meio e um aumento nas doses de nutrientes disponíveis? Elas responderão positiva- ou negativamente a essas mudanças? Qual a importância dessa alta eficiência na utilização dos poucos recursos disponíveis, mediante a uma agricultura que promoveu a produtividade sem se importar muito com os impactos de modificações do meio (o solo), nem com as exigências nutricionais das culturas?

Utilizando o comportamento das espécies nativas como balizador, será possível, num futuro próximo, conciliar estes dois extremos? Ou seja, será possível desenvolver adaptações, ou modificações genéticas, nas espécies cultivadas para que elas forneçam produtividades economicamente viáveis, exigindo baixos teores de nutrientes e poucas alterações no substrato (o solo)?

Quem sabe não está aí uma importante e promissora linha de pesquisa para a próxima década?

A velha discussão das Áreas de Preservação Permanente.

Hoje, 04 de dezembro de 2008, assisti a dois seminários que me fizeram refletir sobre uma questão antiga, discutida nos meios acadêmicos voltados às ciências agrárias. Trata-se daquelas referentes às áreas e preservação permanente. Para efeito dessas discussões, tratarei nesse post de alguns poucos exemplos que nos fazem questionar a generalização de leis para ambientes completamente distintos. As discussões se referem principalmente a aspectos relacionados ao artigo segundo da lei 4771 de 1965, que se refere, principalmente, àqueles que tratam das áreas marginais aos cursos d’água. Esses dois seminários tratavam de caracterizações de dois geoambientes no estado do Acre, procurando caracterizar as terras firmes e também as áreas de várzea. Essas últimas são aquelas que sofrem influência periódica das cheias dos rios regionais, sofrendo constantes reposições de material originário (sedimentos), enquanto que as primeiras são referentes às áreas que podem ter sofrido, mas não sofrem mais a influência dessas deposições constantes. Devo também lembrar para aqueles que já tem algum conhecimento e afirmar para aqueles que ainda não o tem que as ciências ambientais podem ser baseadas em um tripé composto por três meios, o físico, o biológico e o sócio-econômico. Para que se tenha um ambiente próximo ao que se convencionou chamar de “sustentável” é necessário ter um equilíbrio entre esses três meios. No referido caso, do estado do Acre, a riqueza dos solos de várzea contrasta fortemente com a pobreza de alguns solos de terra firme. A referida riqueza se dá porque os sedimentos que compõem as “praias” regionais são originados de sedimentos naturalmente ricos, vindos dos Andes. Levando-se em consideração que a agricultura regional é basicamente de subsistência, as margens dos rios, sobretudo suas praias são ocupadas durante o período de seca por lavouras como milho, feijão, entre outras. Essas, por sua vez, permitem a sobrevivência dos “povos de várzea” pois são, muitas vezes, junto com a pesca, as únicas atividades econômicas ali existentes. Ou seja, para garantir a sobrevivência dos moradores da região a única forma é “fingir” que a legislação, que proíbe o uso daquelas áreas nas margens dos rios, não existe. Como disse antes não é possível ter-se sustentabilidade se não existe o equilíbrio entre os três meios e respeitar a lei, nesse caso, implica na insustentabilidade do meio sócio-econômico. Implica em não dar o direito de sobrevivência à população ribeirinha local. Caso parecido também é encontrado em outras regiões. Nos mares de morros, por exemplo, por diversas vezes observa-se vales de rios extremamente encaixados. Nesses casos, a declividade acentuada do terreno não permite, em algumas regiões pobres, que os agriculturores de subsistência locais plantem o necessário à sua sobrevivência em áreas fora dos limites que a legislação exige. A única saída é cultivar próximo aos corpos d’água. O fato é que esses dois exemplos mostram que a legislação brasileira referentes às áreas de preservação permanentes é fortemente “engessada”. É necessário que essa legislação seja um pouco mais flexível. Somente essa flexibilidade pode permitir a adaptação de diferentes situações ao conjunto de leis do país. Consequentemente, por meio disso, será obtido um cenário legal mais dentro da realidade sócio-ambiental de diferentes regiões e, provavelmente, maior respeito à mesma ocorrerá. Enfim, não é o ambiente e a cultura de um povo que deve se adaptar à legislação e sim ela que deve se adaptar aos mesmos.
Carlos Pacheco

Uma Aula

Por Elton Luiz Valente

Assisti hoje a uma aula memorável, digna da pós-graduação (aliás, todas as aulas deveriam ser assim, não só da pós-graduação). Foi ministrada pelo Professor Carlos Ernesto Schaefer, do Departamento de Solos da UFV. Durou cerca de 3 horas e meia, sem contar o intervalo para almoço. Cito o nome dele com a devida autorização.

A aula, evidentemente, é impossível de ser reproduzida aqui. O “pano de fundo” foram as adaptações do gênero Homo aos solos e à paisagem. Mas a discussão foi muito além deste que, por si só, é um assunto digno de uma cadeira própria na Academia. A abordagem do Professor começou lá na Gondwana e foi parar no Homo sapiens tecnologicus

Lembrei-me do Geófagos durante toda a explanação, principalmente quando o Professor disse uma frase abordando um assunto que nos é muito caro, a ciência agregada à razão e ao bom senso:

“O Darwinismo causa alergia à nossa mente conservadora. Sabemos mais do Velho Testamento e do Criacionismo do que da origem e evolução do homem. A educação religiosa é plausível, mas fazer a letra do Criacionismo ser a verdade absoluta é um absurdo.”

Quisera eu que todas as pessoas, indistintamente, pudessem comungar deste pão e deste vinho, na mesa da razão e do bom senso.

Comportamento sortivo de alguns dos principais cátions metálicos traço.

Repetidamente venho recebendo solicitações para escrever um pouco mais sobre o comportamento de cátions metálicos traços em solos. Esses nada mais são do que alguns dos anteriormente referidos metais pesados. Questionamentos sobre a força de ligação, preferências por sítios de adsorção, entre outras têm sido o foco da discussão em conversas e solicitações via e-mail. Sendo assim, procurarei esclarecer um pouco mais essa questão. Levarei em consideração durante esse post a possibilidade de ocorrência de contaminação por diversos cátions simultaneamente e concentrarei a discussão em torno de alguns dos principais metais associados à depósitos antropogênicos, sendo eles, o crômio (Cr), cobre (Cu), chumbo (Pb), zinco (Zn), níquel (Ni) e cádmio (Cd). Elementos ametálicos e semi-metálicos também inclusos na definição de metais pesados serão objetos para futura discussão.
Primeiramente, é necessário relembrar as principais formas de retenção de elementos-traço em solos. Os aspectos aqui giram em torno dos processos sortivos (adsorção e dessorção), complexação pela matéria orgânica, da formação de precipitados e da formação de estruturas contendo tais elementos. A curto prazo e para solos tropicais e sub-tropicais úmidos, as questões relacionadas aos processos sortivos são, sem dúvida, as mais importantes. Nesse sentido, ainda precisa-se segregar o processo de adsorção em específica e não específica. Simplificadamente, o primeiro consiste na formação de ligações fortes e não estequiométricas onde o metal fica ligado diretamente à matriz sólida via ligação covalente. Já o segundo processo, se dá por meio de ligações fracas, eletrostáticas e estequiométricas. Nesse caso, os metais ficam interpostos por uma ou mais moléculas de água entre eles e a matriz sólida, o que não permite a formação de fortes ligações.
Estudos conduzidos nas últimas três décadas têm sido bastante objetivos e enfáticos ao caracterizar a afinidade de metais específicos pelos sítios de adsorção disponíveis em solos, sejam eles tropicais úmidos ou não. Parace-me próximo ao consenso que para todos esses solos uma sequência de afinidade é bem definida, sendo ela Cr=Pb>Cu>Zn>Ni>Cd. As principais alterações observadas na literatura referem-se à mudança de ordem entre Cr e Pb e Ni e Cd.
Os primeiros metais da lista, especialmente Cr e Pb, repetidamente aparecem como os metais mais afins aos sítios de adsorção específica. O Cu também o é. Entretanto, Cr e Pb parecem estar mais relacionados aos sítios de adsorção específica minerais, enquanto o Cu parece estar mais associado à formação de complexos orgânicos.
É importante ressaltar aqui a importância da caracterização dos compostos orgânicos aos quais o Cu está se ligando para formação dos complexos. Isso porque quando ligado à matéria orgânica de elevada solubilidade, esse elemento pode formar complexos solúveis, aumentando sua biodisponibilidade. Via de regra, esse fato ocorre quando o Cu se liga a material orgânico de menor massa molecular.
Em relação ao  Cr e o Pb, eles têm se mostrado muito afim da, principalmente, fração oxídica dos solos ou da formação de precipitados. O primeiro caso se torna especialmente importante para solos bastante intemperizados como os Latossolos e Argissolos, de ocorrência comum no território Brasileiro. Já a formação de precipitados se dá, sobretudo, em solos menos desenvolvidos e com valores de pH mais básicos, como alguns solos calcários pobremente desenvolvidos.
Os três outros metais, Zn, Ni e Cd, têm frequentemente mostrado preferência para os sítios de adorção não específicas. Esses metais, portanto, tem comportamento eletrostático. Por esse motivo, são mais facilmente dessorvidos, ou seja, mais facilmente liberados da matriz sólida. Esse fato os torna extremamente perigosos, principalmente o Cd que é o mais tóxico dos três. Isso porque, uma vez liberados, tais metais estarão solúveis na solução do solo, podendo ser lixiviados para águas subterrâneas ou absorvidos por espécies vegetais, entrando assim na cadeia alimentar animal.
Dessa forma, pode-se concluir que, uma vez em solos, Cr, Pb e Cu tendem a formar ligações fortes e, por isso, são dificilmente liberados. Já o Zn, Ni e Cd são mais fracamente ligados à matriz sólida, sendo facilmente liberados em contrapartida à substituição dos mesmos no complexo de troca quando da entrada de outros cátions, não necessariamente metálicos traços, porém, com preferência aos sítios de adsorção ou com maior força iônica em solução.
O estudo e conhecimento de tais formas de retenção de elementos-traço em solos apresenta importância ambiental elevada, uma vez que pode conduzir a definição de destinos ambientalmente mais adequados aos resíduos que os possuam. No entanto, é necessário lembrar que os posts aqui publicados tem o intuito de introduzir o leitor aos assuntos neles contidos. Caso deseje-se um maior aprofundamento é necessário a busca por outras fontes, que detalhem os pormenores da questão a ser abordada.
Em um próximo post serão tratados questões referentes à especiação de espécies metálicas e comportamento de metais pesados presentes na forma aniônica em solos e sedimentos.
Carlos Pacheco

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