Aquecimento Global: e que tal essas evidências, Dr. Felicio?

No final do ano passado aconteceu um debate no Jornal da USP (primeiro artigo e replica) sobre aquecimento global. A dança seguiu como de costume: defensores do Aquecimento Global Antropogênico (AGA) falando que os negacionistas não contribuem em nada para a ciência (o que é verdade) e os céticos do AGA (e eu uso o termo “céticos” de forma ampla aqui) acusando os defensores do AGA de não oferecerem provas o suficiente para comprovar o aquecimento.

A discussão teve presença inevitável do nosso amigo Dr. Ricardo Felício, notório cria… oups… “cético”, no artigo de réplica. Depois do meu escrutínio anterior do seu discurso delirante, eu elevei o Dr. Felício ao título de “Saco de Batatas com orelhas”. Ele não tem nada para contribuir, e eu não tenho a menor vontade de voltar a abordar seus argumentos. Entretanto, esse artigo de réplica foi assinado primariamente por um Dr. Kenitiro Suguio. Agora, mais de um paleontólogo colega meu afirmou que o Dr. Suguio é uma referencia na sua área (presumidamente algo a ver com sedimentologia do quaternário) e, diferente do Dr. Felício, parece merecer algum respeito acadêmico. Ok, então ao texto vamos!

A primeira coisa que me saltou aos olhos foi a total ausência de qualquer negação do aquecimento global. Sério, no duro. Vá lá e veja por si mesmo. Em momento algum o Dr. Suguio e companhia negam que existe aquecimento, se limitando a afirmar que

(…) não há qualquer evidência observada no mundo real que permita qualificar como anômalas as variações dos parâmetros climáticos (por exemplo, temperaturas atmosféricas e oceânicas) ou influenciados pelo clima (por exemplo, nível do mar)

O que é uma posição, digamos, muito mais cientificamente conservadora do que negar a existência do aquecimento global. Claro, a afirmação de que os padrões atuais de alteração climática não são anômalos são um tanto… ousada, mas passível de debate. Acho que já abordei isso de forma exaustiva (e você também pode checar os posts no GeneReporter sobre o assunto), então não vou entrar nesse mérito. Mas o que impressiona mesmo é ver o Dr. Felício assinando um texto desses. Afinal, é ele o mesmo que negava explicitamente que a temperatura sequer está aumentando! Não sei, mas algo aqui me cheira muito similar a o que alguns famosos criacionistas fazem ao defender o Design Inteligente como uma versão mais “intelectualmente aceitável” do que sair dizendo que Noé colocou um bando de animais em um bote e fez o pior Big Brother da história. Talvez… quem pode saber?

Digressões a parte, o texto de forma geral gira em torno de um argumento central:

(…) em lugar de evidências físicas, os proponentes do AGA se limitam a oferecer projeções de modelos matemáticos da dinâmica climática e uma exagerada importância atribuída às concentrações atmosféricas de dióxido de carbono (CO2)

Mesmo? É isso tudo que os defensores do AGA fazem? Porque eu sei que os dados climáticos estão por ai, assim como informação sobre emissão de poluentes, e não seria nada impossível simplesmente ver se tais variáveis estão correlacionadas ao longo do tempo. E se tem uma das coisas que eu aprendi na área acadêmica é: toda vez que você tem uma boa idéia, alguém já fez antes e melhor que você.

Teria por acaso alguém que tentou investigar a influencia das emissões na temperatura, e de quebra abordando as principais críticas dos céticos, como coleta de dados mal feita e utilização de metodologias falhas? Então sem mais delongas, com vocês, Dr. Richard A. Muller.

De cético a crente



Dr. Richard A. Muller é um físico da Universidade da California, Berkeley. Em 2004, Muller entrou na dança do Aquecimento global, do lado dos céticos. Aparentemente Muller havia visto a crítica de McIntyre e McKitrick (sobre a qual falei no meu post anterior) e tinha achado as colocações deles válidas:

McIntyre e McKitrick obtiveram uma paste do programa que Mann [famoso autor do gráfico hockey stick) usou, e eles acharam alguns problemas sérios. Não apenas o programa não usa o PCA convencional [uma técnica estatística], mas ele se realiza a normalização dos dados de forma que só pode ser descrita como equivocada. (…) Essa forma inapropriada de normalização tende a enfatizar os dados que tem a forma de hokey stick, e suprime todos os dados contrários. Para demonstrar esse efeito, McIntyre e McKitrick produziram dados que, em média, não tinha padrão. (…) Quando McIntyre e McKitrick deram esses dados para o protocolo de Mann, ele produziu um gráfico de hockey stick. (…) Essa descoberta me atingiu como uma bomba, e eu suspeito que está tendo o mesmo efeito em muitos outros. De repente o hokey stick, o garoto-propaganda ddo aquecimento global é, na verdade, um artefato de matemática ruim. Como isso poderia acontecer?

(tradução porca e ênfase minhas)

Mas Muller, diferente dos céticos padrão, não simplesmente sentou em um canto escrevendo posts zangados na internet (sim, eu sei… hipócrita), e resolveu colocar a mão na massa: arrecadou fundos e fundou o BEST – Berkeley Earth Surface Temperature – com o objetivo principal de arrecadar dados que eles consideram confiáveis sobre o clima, de uma perspectiva inicialmente cética.

E Muller enfrentou muita critica nesse ponto: dizer que não confia na capacidade de coleta de dados dos outros e que irá fazer tudo do zero é mandar o dedo médio para uma comunidade científica inteira (comunidade que ele, como físico, não fazia parte). Mas… e daí? Os climatologistas podem se sentir o quanto ofendidos eles acharem certo. Isso não muda o fato de que verificação independente é um dos pilares centrais da ciência. Muller estava certo de agir sob seu ceticismo, que é algo que não pode ser dito da maioria dos céticos do AGA.

Então, Muller lançou o BEST para resolver tudo, desde a coleta, sumarização, elaboração de novas metodologias e analise dos dados. E o que ele achou?

Estimativas da temperatura anual (esquerda) e por decada (direita) atuais e até 3 séculos atrás. Estimativas do BEST em preto, intervalos de confiança em cinza. Estimativas de outros estudos em outras cores.
Em primeiro lugar, nota-se que as estimativas do BEST correspondem muito com as geradas por outros estudos, para o período que eles coincidem, corroborando assim os estudos anteriores. Adicionalmente, eles conseguiram ampliar a janela temporal, estendendo as estimativas até o ano de 1750.
Tudo é bastante impressionante, principalmente porque, com uma janela de dados dessa magnitude, Muller e colegas resolveram testar diversas hipóteses, incluindo a influencia da emissão de poluentes na temperatura média, mas também dos ciclos solares e de eventos vulcânicos, duas criticas comuns dos céticos. Os resultados eu acho falam por si só:
Em vermelho, temperatura média esperada em decorrência da influência das emissões de CO2 e emissões vulcânicas (que são as quedas mais abruptas de temperatura, antes de 1850). Emissões de radiação solar não influenciaram significativamente as estimativas.
Resumindo: o aumento de temperatura parece estar principalmente ligado à emissão de CO2, irradiação solar não parece influenciar os padrões atuais e eventos vulcânicos tem uma influencia no clima, mas não explicam nenhuma tendencia atual. Dr. Muller foi bastante não-ambíguo em relação a esses resultados:

Eu conclui que o aquecimento global é real e as estimativas anteriores estavam corretas. Agora eu estou indo um passo além: Humanos são quase que inteiramente a causa.

Claro, a analise não é desprovida de falhas: em primeiro lugar os autores não puderam diferenciar a influencia do CO2 da influencia de outros gases, basicamente porque o aumento nas taxas de emissão estão muito correlacionadas entre si. Em segundo lugar, a analise é muito simplista, então eu não descartaria a possibilidade de uma influencia moderada de radiação solar. Mas é válido notar que os autores sabem dessas limitações e decidiram usar uma analise simples (uma análise de regressão simples) exatamente para limitar qualquer crítica metodológica.

E, de qualquer forma, o BEST disponibiliza todos os dados em seu site. Ou seja, qualquer um pode baixa-los, e analisá-los por si mesmo. Então, Dr. Richard A. Muller, por ser um verdadeiro cético com compromisso com a metodologia científica e transparencia acadêmica: cookie points para você. Pontos extras por me fazer poder afirmar confortavelmente que a AGA parece ser a melhor explicação para os dados que temos, e que devemos aceita-la para elaboração de políticas publicas.

Não me entendam mal: meu lado ambientalista anda bastante pessimista, até mesmo no que tange a conservação das espécies. O máximo que quero agora é que consigamos a maior quantidade de informações sobre a biologia das espécies atuais antes que a paleontologia se torne o principal ramo da biologia. Então eu realmente não ligo para o que vai ser feito com essa informação sobre o aquecimento. Seria ótimo que isso fosse utilizado para regulamentar a emissão de gases e para melhorar nossa qualidade de vida, mas não tenho esperanças nisso.

Então… aparentemente sobra a pergunta para Dr. Felicio, Dr. Conti e Dr. Suguio: que tal essas evidências físicas do Aquecimento Global Antropogênico?

Referência
Robert Rohde, Richard A. Muller, Robert Jacobsen, Elizabeth Muller, Saul Perlmutter, Arthur Rosenfeld, Jonathan Wurtele, Donald Groom, & Charlotte Wickham (2012). A New Estimate of the Average Earth Surface Land Temperature Spanning 1753 to 2011 Geoinformatics & Geostatistics: An Overview, 1 (1) : 10.4172/gigs.1000101

Seleção natural não é uma tautologia

Ann Coulter, o sonho molhado de todo conservador Norte-Americano.
É a da direita, eu suponho…

Um dos argumentos que considero mais irritante utilizado por detratores da síntese evolutiva moderna é que a a seleção natural seria uma tautologia. Tal argumento foi colocado pela “pensadora” conservadora norte-americana Ann Coulter em seu livro “Godless: The Church of Liberalism” da seguinte forma:

A segunda parte da “teoria” de Darwin é geralmente nada mais do que um argumento circular: Através do processo de seleção natural, o mais “apto” sobrevive. Quem é o mais “apto”? O que sobrevive! Oras, veja – acontece toda vez! A “sobrevivência do mais apto” seria uma piada, se não fosse parte de um sistema de crença de um culto fanático infestando a Comunidade Científica. A beleza de ter uma teoria cientifica que é uma tautologia, é que ela não pode ser testada.

É interessante notar que quem se vale desse argumento, não nega a existência da seleção natural, pelo contrário: afirma a sua existência como uma verdade inescapável. Quanto falamos de uma tautologia, estamos falando de uma proposição, a qual assume a seguinte forma:

A apresenta as propriedades de A

Por trás da circularidade e obviedade da preposição, está o fato de que uma tautologia é uma verdade necessária. Afirmar que “A não apresenta as propriedades de A” significaria dizer que existe alguma propriedade de A que não é propriedade de A, ou que A não apresenta todas as propriedades de A, sendo que ambas são absurdos lógicos. Em nenhum caso tal afirmação (ou qualquer outra tautologia) pode ser falsa sem simplesmente fazer uma contradição que fere as leis da lógica (o que as tornam logicamente necessárias). Então, nesse ponto, Coulter está correta: uma tautologia não pode ser falseada, pois ela é uma necessidade lógica. Mas seria a teoria da seleção natural uma tautologia de fato?

“Sobrevivência do mais apto”

Uma das primeiras coisas que devemos notar é que “sobrevivência do mais apto” não é exatamente uma das descrições mais adequadas da Seleção Natural. Mas em primeiro lugar, temos que deixar bem claro um conceito que é comumente confundido, que é o de “aptidão”, “aptidão darwiniana” ou “fitness” em inglês.

A aptidão, em biologia evolutiva, é definida como a contribuição média de um genótipo para o pool gênico da geração seguinte. Por exemplo, se tenho uma bactéria (haplóide) com um dado genótipo que apresenta fitness=1.47, então a presença do genótipo na geração seguinte será 47% maior do que na geração anterior. Se o fitness=0.91, então aquele gene terá uma presença 9% menor na geração seguinte e por ai vai.

Note que em nenhum momento precisamos falar de sobrevivência. Afinal, o que seria “sobrevivência” no caso de bactérias que simplesmente se dividem? Faz algum sentido falar que a bactéria da esquerda é a que “sobreviveu”, e não a da direita?

Uma historia de amor melhor que Titanic

O ponto é que um organismo não precisa morrer para ter um fitness baixo. Um organismo pode muito bem ter uma baixa fecundidade, sem nunca precisar “deixar de sobreviver” ou, como no caso das bactérias, sobrevivência é irrelevante visto que todos organismos originais deixam de existir após a reprodução. Outro exemplo são algumas espécies de salmão e polvos, que morrem após o acasalamento, louva-deuses e aranhas que consomem os seus machos, ou ainda algumas espécies de ácaros que explodem ao dar luz aos filhotes. Aptidão não tem a ver com sobrevivência.

– Tira esse hectocótilo daí, João!
Esse papo de sexo vai acabar nos matando…

Então, fica bem claro que “sobrevivência do mais apto” não é uma tautologia, pelo simples fato de que “sobrevivência” não é estritamente igual (apesar de poder influenciar) “aptidão”.

Isso tudo é apenas para demonstrar que o argumento original utilizado está errado. Porém os mais rápidos vão notar que isso não refuta a proposição de que “seleção natural é uma tautologia”: apesar do argumento dos detratores/criacionistas estar equivocado, ainda poderíamos transformar a proposição original em algo próximo a o que seleção natural realmente significa, produzindo assim uma tautologia. Mas como seria isso?
Aptidão como taxa
Se “sobrevivência do mais apto” está equivocado, então como poderíamos frasear a ideia original da melhor maneira possível?

Sobrevivência do melhor sobrevivênte“?

É claramente uma tautologia, uma verdade trivial, mas não parece ser exatamente o que temos em mente quando pensamos em “seleção natural”. Poderíamos pensar em algo na linha de

Capacidade superior de contribuir para o pool gênico da geração seguinte do genótipo (ou fenótipo) mais apto

Bom, essa parece mais próxima da ideia original, mas ela dificilmente é uma tautologia. O motivo é muito simples: ela é falsa. Isso pode ser ilustrado facilmente com uma analogia: a adaptação é uma taxa de variação da frequência de alelos, assim como aceleração é a taxa de variação da velocidade. Se fossemos formular uma proposição análoga para aceleração, teríamos algo similar à

A maior velocidade do que mais acelera

Isso é falso pelo simples motivo de que o que mais acelera pode ser o mais devagar, enquanto o mais rápido pode acelerar menos, mas manter uma velocidade superior pelo simples fato de inicialmente já apresentar uma velocidade superior.
O gráfico abaixo ilustra isso para uma população de organismos haplóides que apresentam dois genótipos, sendo que A2 apresenta uma aptidão duas vezes maior do que A1. q’ é a frequência genotípica após a seleção e q1 é a frequência genotípica de A1 antes da seleção (sendo que a frequência de A2 fica definida como 1-q1).
Assim, fica fácil verificar que, mesmo A2 tendo uma aptidão duas vezes maior, ele não consegue ser o maior contribuidor para o pool gênico na geração seguinte quando sua frequência inicial é muito baixa (ou quando a frequência de A1 é muito alta, no canto direito do gráfico). Moral da historia: aptidão sozinha não determina sucesso evolutivo na geração seguinte.

Um detrator mais perseverante pode argumentar que, se dermos tempo o suficiente (em outras palavras, um numero muito grande de eventos de seleção ou gerações), o genótipo mais apto irá se fixar, não importando sua frequência original, e ele estaria certo ao dizer isso. Mas note que a premissa “dado muito tempo” precisa ser introduzida para que torne a afirmação verdadeira. Essa premissa pode tanto ser ou não verdadeira (da mesma forma que carros e trens não aceleram indefinidamente), o que torna a proposição condicional, não uma verdade necessária e, logo, a proposição não é uma tautologia.

Mas isso tudo gera um impasse. Todas as proposições – tanto as originais, tanto as que tentam se aproximar do significado verdadeiro dos termos no contexto da síntese evolutiva – se mostraram falsas. Seria possível elaborar uma proposição que seja precisa (represente a ideia da seleção natural) e que seja colocada de forma lógica?

Seleção natural como silogismo

Em primeiro lugar, devemos entender como seleção natural ocorre. Não, não estou falando apenas daquele velho e batido exemplo do passarinho comendo os besouros que são mais chamativos, mudando assim a composição da população:

-Na verdade eu enxergo todos os besouros, mas meu médico disse que uma refeição colorida é uma refeição divertida

Esse é um ótimo exemplo para mostrar como seleção natural pode levar à evolução de um fenotipo de forma direcional (existem mais besouros marrons no final do que no começo), mas existem sistemas mais complexos de seleção que não levam a uma mudança nesse sentido. O exemplo mais claro é o da interação da anemia falciforme e malaria, no qual são mantidos indivíduos com genótipo não-letal da anemia na população. Não há mudança, mas há seleção.
Então, como poderíamos definir seleção natural? Na introdução do Origem das Espécies, Darwin resume brevemente como seria o mecanismo:

Como nascem muitos mais indivíduos de cada espécie, que não podem subsistir; como, por conseqüência, a luta pela existência se renova a cada instante, segue-se que todo o ser que varia, ainda que pouco, de maneira a tornarse-lhe aproveitável tal variação, tem maior probabilidade de sobreviver, este ser é também objeto de uma seleção natural. Em virtude do princípio tão poderoso da hereditariedade, toda a variedade objeto da seleção tenderá a propagar a sua nova forma modificada.

Nesse resumo, ele coloca os 3 principais componentes necessários para que ocorra seleção natural (que eu gentilmente sublinhei, para seu conforto): variação em uma caracteristica, diferenças de aptidão (ele fala de sobrevivencia, mas sabemos que isso não é a única variável) ligadas a variação nessa característica, e hereditariedade dessa característica.

Note que, se uma população apresenta variação em uma característica, mas essa não apresenta nenhuma ligação com aptidão, então a “seleção” de organismos é completamente aleatória em relação a aquele caractere (não sendo seleção natural). Agora, se o caractere é ligado com aptidão, mas não é herdado, então mesmo que organismos com uma dada característica seja selecionada, ele não vai passar tal característica para a geração seguinte. Esses componentes são necessários (todos precisam estar presentes) e suficientes (nenhum outro componente precisa estar presente) para que ocorra seleção natural, apesar de outros fatores influenciarem a dinâmica de seleção.

Sendo assim, podemos definir seleção da seguinte forma:

[P1.] Existe variação entre indivíduos para uma dada característica;
[P2.] Tal variação está ligada entre progenitores e prole através de uma relação de herança, e que seja parcialmente independente dos efeitos ambientais;
[P3.] Existe uma correlação dessa característica com a habilidade reprodutiva, fertilidade, fecundidade e/ou sobrevivência (ou seja, diferenças em aptidão);

Se tais condições são satisfeitas para uma dada população natural, então:

[C1.] Diferenças na frequência das características ligadas à aptidão na geração subsequente vai ser serão diferente daquela vista nas populações parentais.

(Modificado de Lewontin, 1970, 1982; e Endler, 1986)

Se as premissas são corretas, então a conclusão segue logicamente. Isso torna a seleção natural, expressa dessa forma, um silogismo, ou uma conclusão dependente das premissas estabelecidas, e não uma tautologia.

Note que para testar cientificamente (no caso, falsear) a hipótese de que uma população está sob seleção natural, um pesquisador pode testar qualquer uma dessas proposições. Afinal, se C1 é falso, então obviamente a população não está sob seleção, mas isso não implica necessariamente que a população está sendo selecionada: uma mudança ambiental pode estar influenciando aspectos dessas características diretamente nos indivíduos, como pele morena em quem toma muito sol. Se os filhos tomam mais sol, eles terão a pele mais escura, sem que isso seja seleção natural. Por esse motivo, é necessário averiguar o quão herdável é uma característica (P2) e se a variação (P1) está ligada a aptidão (P3). De forma geral, é isso que os estudantes de seleção natural fazem, e é a síntese evolutiva moderna que proporciona o arcabouço matemático que nos permite gerar previsões teóricas de como um caractere deve se comportar sob o efeito de seleção (dado que ele apresenta algum tipo de herança mendeliana).

Então… da próxima vez que alguém dizer que evolução é uma tautologia, você pode dizer: “Não, não é. É um silogismo Quod erat demonstrandum, bitches!”.

Referencias

Lewontin, R. (1970). The Units of Selection Annual Review of Ecology and Systematics, 1 (1), 1-18 DOI: 10.1146/annurev.es.01.110170.000245