Nanofiltro de carvão: sanduíche de grafeno e gelo quadrado

Ice-square

Nada mais banal que um cubo de gelo, certo? Embora seja tentador chamá-lo de água quadrada, o termo não seria muito exato em nível molecular. Quando congeladas, as moléculas de H2O formam um arranjo cristalino que geralmente não é muito regular. No entanto, é possível ter gelo com cristais cúbicos: basta amassar uma gotícula de água entre duas placas de grafeno.

A descoberta do “gelo quadrado” revela uma das muitas propriedades notáveis do queridinho da nanotecnologia, o grafeno. Formado por folhas planas de carbono com espessura de um átomo, o grafeno é bastante útil por sua resistência e boa condutividade elétrica. Por mais leve que seja, é capaz de exercer imensas pressões sobre as moléculas que acabam ensanduichadas entre dois desses lençoizinhos carbônicos.

Fenômenos interessantes acontecem quando o recheio de um wafer de grafeno é formado por moléculas de água. Em 2012 uma equipe da Universidade de Manchester sob liderança de Andre Geim observou que o vapor de água podia passar com facilidade por uma lâmina de folhas de óxido de grafeno.

O surpreendente é que o vapor passava por uma barreira que retinha até o gás hélio. No ano passado Geim — um dos ganhadores do Prêmio Nobel de Física de 2010 por suas pesquisas com grafeno — demonstrou que o mesmo truque acontecia quando quando água líquida era pressionada entre duas camadas de grefeno.

Simulações computacionais indicavam que o que acontecia era a formação de gelo quadrado entre as folhas de grafeno. Essas partículas de gelo se comportavam como um trem: ao empurrar uma ponta, a composição inteira passava pelo filtro. Era uma boa simulação, mas Geim decidiu replicá-la experimentalmente.

No experimento, conduzido em temperatura ambiente, os cientistas colocaram um microlitro de água sobre uma folha de grafeno e depois cobriram a água com outro grafeno. À medida que a água evaporava lentamente, as placas de grafeno se juntavam até restar um espaço de menos de um nanômetro entre elas. O que restou da água formou bolsículas achatadas no meio do sanduíche. Observações feitas com um microscópio eletrônico mostraram que essas bolsículas continham gelo quadrado.

Mas o que é, exatamente, o gelo quadrado? Em sua forma comum, a água solidifica-se sob baixas temperaturas, que favorecem a formação de estruturas cristalinas — geralmente são pontes de hidrogênio em formas tetraédricas ou piramidais. No gelo quadrado, cada ponte de hidrogênio forma um ângulo reto entre si, formando camadas horizontais e regulares de H2O. Nesse caso, os átomos de oxigênio de uma camada estão perfeitamente alinhados com os átomos de oxigênio da camada superior ou inferior. Nos pedacinhos de gelo quadrado descritos por Geim et. al. em artigo publicado na Nature, haviam até três camadas de oxigênios enfileirados.

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A estrutura regular do gelo quadrado (esq.) em comparação com a organização meio tetraédrica do gelo comum (dir.)

Não é fácil botar os oxigênios na linha desse jeito. Segundo cálculos da equipe de Geim, as folhas de grafeno exerceram uma pressão 10 mil vezes maior que a pressão atmosférica para achatar a água na forma de gelo quadrado. Tamanha pressão ocorre porque, ao se aproximarem os átomos de carbono das folhas de grafeno, eles passam a distorcer suas nuvens de elétrons. Isso causa uma atração conhecida como força de van der Waals.

Não é a primeira vez que se encontra gelo quadrado – quando se juntam apenas oito moléculas de H2O, elas formam uma estrutura cúbica. Mas é a primeira vez que se observa coisa parecida com uma quantidade relativamente grande de água. É o bastante para confirmar a existência do gelo quadrado — a 18ª. fase cristalina da água (e você pensando que eram apenas três…).

Naturalmente, os estudos do gelo quadrado e suas propriedades estão só começando. Geim acredita que ele também pode se formar no interior de nanotubos. Ainda não se sabe exatamente como tal gelo se comporta, mas tudo indica que ele pode ser uma espécie de lubrificante nos filtros de grafeno, que poderiam ser usados para despoluição e dessalinização da água.

Referência

rb2_large_gray25G. Algara-Siller, O. Lehtinen, F. C. Wang, R. R. Nair, U. Kaiser, H. A. Wu, A. K. Geim & I. V. Grigorieva. Square Ice in Graphene Nanocapillaries [Gelo Quadrado em Nanocapilares de Grafeno]. Nature vol. 519, nº. 7544, pp. 443–445 (26 March 2015) doi:10.1038/nature14295

[via Scientific American]

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  • Jorge Almeida

    Experimentos realizados com a tecnologia da Fundação Keshe, onde bobinas de cobre banhadas em solução de água e soda cáustica por 24h e depois em vapor, da mesma solução, por mais 24h, criam uma nano camada de grafeno a temperatura ambiente, sobre a superfície das bobinas de cobre, que posicionadas a distância de um recipiente com água, é capaz de remover a acidez da água sem ao menos toca-la

    • Renato Pincelli

      Jorge,
      Eu ia perguntar onde e quando esses experimentos foram publicados mas uma rápida pesquisa sobre a fundação citada revelou apenas conteúdo gerado por ela mesma, o que não é nada confiável em matéria de descobertas científicas. Mesmo que houvesse qualquer publicação científica sobre tal experimento, ela não seria proveniente de uma fonte respeitável, pelo simples fato de que é física e quimicamente impossível remover ou diminuir a acidez de uma solução à distância.

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