Nise – O coração da Loucura
Acabei de assistir Nise – O Coração da Loucura e olha, tô no chão! Que filme!
Ele conta a história da Nise da Silveira (Glória Pires), médica psiquiatra pioneira da Terapia Ocupacional no Brasil. Lá na década de 40 ela começou a trabalhar no Centro Psiquiátrico Nacional Pedro II, no Rio de Janeiro, e ficou responsável pelo trabalho da terapia ocupacional porque se recusou a seguir os tratamentos tradicionais dos psiquiatras da época, como a eletroconvulsoterapia.
Confesso que antes de ver o filme eu nem a conhecia, mas agora virei fã! E o filme não é bom só pra quem é da área da saúde mental não, por exemplo, do meu lado no cinema estava uma jornalista que encheu os olhos de lágrimas, assim como eu!
Enfim, é uma excelente obra de arte, que recomendo muitíssimo para os amigos e já considero obrigatório para meus colegas, alunos e ex-alunos.
O “pingue-pongue” de pombos
E mais uma vez a Análise do Comportamento foi citada em The Big Bang Theory (The Focus Attenuation, S08E05)!
No episódio, os protagonistas estão tentando iniciar um novo projeto científico mas têm dificuldades para se concentrar. Para resolver o problema, Sheldon sugere o uso de técnicas de condicionamento operante (que Howard chama de “modificação de comportamento”, um termo ultrapassado, utilizado lá nas décadas de 50 e 60).
Sheldon cita que estas técnicas foram usadas para ensinar pombos a jogar pingue-pongue, o que é verdade e pode ser visto no video a seguir:
[youtube_sc url=”https://www.youtube.com/watch?v=MFC62xcOQuQ”]
E isso não é nada, Skinner também chegou a treinar pombos para guiar mísseis para a 2ª Guerra Mundial, escrevi um post sobre isso aqui no ano passado, e aqui você pode ver um vídeo dos pombos em treinamento.
O estranho caso da mulher sem cerebelo
Uma chinesa de 24 anos recentemente foi ao hospital reclamando de tontura e náuseas. Quando os médicos fizeram exames de imagem se depararam com uma surpresa: o cérebro dela estava faltando o cerebelo!
O cerebelo é uma região significativa do cérebero, importante para o controle motor e algumas funções cognitivas. Na figura acima, o cérebro da mulher está a esquerda, e um cérebro normal a direita.
A paciente em questão relatou ter tido alguns problemas de coordenação complexa. Ela também só começou a falar aos 6 anos e a andar aos 7. O fato dela ter sobrevivido tanto tempo mostra como o nosso cérebro é adaptável. Em muitos casos de lesões cerebrais, outras áreas do cérebro, com o tempo, “assumem” as funções da área lesionada (ou no caso dela, da área faltando).
A chinesa é uma de nove pacientes conhecidos na história que sobreviveram sem o cerebelo. E o prognóstico é nebuloso, já que algumas pesquisas apontam que pessoas com esta condição tendem a morrer jovens.
***Editado às 23:20, 11/09:
Complementando, o artigo original do caso pode ser lido aqui.
É bem conhecido que o cérebro tem essa capacidade de plasticidade neural, é importante lembrar que em alguns casos graves de epilepsia na infância são tratados com a remoção (ou a desconexão) de um lado inteiro do cérebro. Isso só é possível em crianças pois durante o desenvolvimento o hemisfério restante “assume” as funções que seriam do outro.
Outra história semelhante é a da cientista Jill Taylor que teve um AVC, perdeu várias funções motoras e as recuperou a ponto de escrever um livro sobre sua história. Uma palestra dela está disponível no Youtube.
Sobre o Poliamor: é possível amar mais de uma pessoa ao mesmo tempo?
Vivemos em uma época em que a diversidade é respeitada e as pessoas estão cada vez mais a vontade para expressar o que sentem e pensam. O mesmo vale para a área da sexualidade humana, trazendo à tona temas antes pouco discutidos como o poliamor.
Poliamor é a “prática, o desejo, ou a aceitação de ter mais de um relacionamento íntimo simultaneamente com o conhecimento e consentimento de todos os envolvidos”.
Em 1929, o matemático e filósofo Bertrand Russel publicou o livro “Marriage and Morals”, em que questiona algumas noções vitorianas acerca do sexo e casamento, podendo ser considerado um dos precedentes da filosofia do poliamor. No entanto, o assunto ainda é pouco investigado sistematicamente.
Alguns autores destacam que enquanto relacionamentos poligâmicos são relativamente raros, acordos poliamorosos em relacionamentos monogâmicos são bem comuns. Em uma pesquisa de 1986 (já faz um tempo), de uma amostra de 3.574 casais casados, 15-28% afirmaram ter acordos que permitiam a não-monogamia em algumas circunstâncias. E a porcentagem era ainda maior para casais homossexuais femininos (29%) e masculinos (65%).
No entanto, outros autores criticam esta forma de sexualidade, afirmando que o amor quando dividido perde em intensidade ou que relacionamentos com mais de duas pessoas duram menos.
Enquanto não temos mais pesquisas sistemáticas para confirmar a veracidade destas críticas, deixo como sugestão aos curiosos o documentário a seguir, e aos psicoterapeutas clínicos, o manual gratuito chamado “What Psychotherapists Should Know About Polyamory”, publicado em 2009.
Poliamor from Zé Agripino on Vimeo.
Wikipedia: http://en.wikipedia.org/wiki/Polyamory
What Psychology Professionals Should Know About Polyamory
What Psychotherapists Should Know About Polyamory
Dez dias em um manicômio
Em 1887 a repórter investigativa Nellie Bly resolveu fingir estar sofrendo de transtornos mentais para ser internada no Blackwell’s Island Insane Asylum (“Asilo para Loucos da Ilha de Blackwell”). Este foi o primeiro manicômio da América, inaugurado em 1839 para ser uma instituição modelo, no entanto, pouco tempo depois os primeiros relatos perturbadores sobre o local começaram a surgir.
Nellie queria verificar a veracidade destes relatos, e assim que entrou no hospital, voltou a agir naturalmente, prestando atenção em tudo que ocorria ao seu redor, mas ainda assim continuou internada. Em seu livro ela descreve os 10 dias que passou na instituição, destacando o que mais a chamou a atenção, como a facilidade que teve em enganar os médicos, o descaso dos mesmos com as pacientes, o frio que passava durante as noites, a comida estragada que era servida e os inúmeros casos de abusos e maus tratos presenciados com os internos.
“My teeth chattered and my limbs were goose-fleshed and blue with cold. Suddenly I got, one after the other, three buckets of water over my head – ice-cold water, too – into my eyes, my ears, my nose and my mouth. I think I experienced the sensation of a drowning person as they dragged me, gasping, shivering and quaking, from the tub. For once I did look insane.”
É um livro muito interessante para os curiosos e profissionais da saúde mental. Algumas observações da autora nos fazem refletir sobre a loucura:
“What a mysterious thing madness is. I have watched patients whose lips are forever sealed in a perpetual silence. They live, breathe, eat; the human form is there, but that something, which the body can live without, but which cannot exist without the body, was missing. I have wondered if behind those sealed lips there were dreams we ken not of, or if all was blank?”
No entanto, para quem já conhece um pouco sobre a história da psicopatologia os relatos de Nellie não são tão inesperados.
A psiquiatria e a psicologia são ciências muito novas e que, ainda bem, evoluem rapidamente. Imagine que os primeiros escritos de Freud foram publicados na virada do século passado (+-1900) e o primeiro medicamento antipsicótico só foi descoberto em 1952. Hoje você pode buscar psicoterapia ou um medicamento com certa facilidade, mas e a 100 anos atrás?
A tendência da nossa sociedade sempre foi excluir aqueles que incomodavam. Antes do século passado a mesma coisa era feita os que sofriam de transtornos mentais. Não só com eles, mas se “internavam” nestas instituições os pobres, criminosos, as prostitutas, entre outros. Por muito tempo estes locais foram verdadeiros depósitos de pessoas indesejadas. E isso não é tudo: os profissionais precisavam encontrar uma maneira de controlar os “pacientes” agressivos e perigosos. Sem terapia nem medicamentos, a solução muitas vezes foi correntes, tortura e barras de ferro.
“What, excepting torture, would produce insanity quicker than this treatment? . . . Take a perfectly sane and healthy woman, shut her up and make her sit from 6 a.m. to 8 p.m. on straight-back benches, do not allow her to talk or move during these hours, give her no reading and let her know nothing of the world or its doings, give her bad food and harsh treatment, and see how long it will take to make her insane. Two months would make her a mental and physical wreck.”
Felizmente, depois da publicação do livro, foi feita uma investigação no local e a instituição recebeu um aumento de $850.000 no seu investimento.
Para aqueles que tiverem curiosidade em saber mais sobre a história dos manicômios e transtornos mentais, recomendo também o livro “O Séculos dos Manicômios“, do Isaias Pessoti.
A música de Ana
” A comida era o inimigo. Eu odiava a sua aparência, o cheiro. Se alguém começasse a falar sobre isso, eu saía da sala.”
“Eu não sei como saí dessa. Eu acho que me assustei de verdade na segunda ou terceira vez que um médico disse para mim que eu estava morrendo.”
Como as drogas interferem na percepção do tempo
Este vídeo incrível da BBC mostra dois ratinhos sob efeitos de diferentes drogas e como elas interferem na realização de uma tarefa. O objetivo dos pesquisadores era investigar como a droga interfere na percepção temporal do rato.
O experimento é bem simples: primeiro os ratos são treinados a pressionar uma barra após exatos 12 segundos, ganhando assim uma porçãozinha de comida. Para o teste realizado, um rato foi injetado com substâncias da maconha, outro com cocaína e um terceiro com salina (que não produz efeito nenhum).
O rato injetado com salina continuou fazendo o mesmo trabalho de sempre, pressionando a barra a cada 12 segundos. O injetado com cocaína, além de ter ficado um pouco hiperativo, pressionou a barra com apenas 8 segundos. E o rato injetado com a maconha pressionou a barra só após 16s.
Agora falta distinguir se o rato demorou para pressionar a barra porque teve a percepção do tempo alterada ou porque esqueceu o que tinha que fazer!
O que se conhece sobre a “cura gay”
Foi noticiado recentemente que a “cura gay” foi aprovada pela Comissão de Direitos Humanos da câmara. Alguns colegas pediram a minha opinião sobre o assunto e, portanto, resolvi expô-la aqui:
1. O que diz o projeto?
Na verdade este é um Projeto de Decreto, que tem como objetivo “sustar a aplicação do parágrafo único do Art. 3º e o Art. 4º, da Resolução do Conselho Federal de Psicologia nº 1/99 de 23 de Março de 1999”. O que estes artigos dizem é:
“Resolução nº 1/1999
Art. 3° – os psicólogos não exercerão qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos ou práticas homoeróticas, nem adotarão ação coercitiva tendente a orientar homossexuais para tratamentos não solicitados.
Parágrafo único – Os psicólogos não colaborarão com eventos e serviços que proponham tratamento e cura das homossexualidades.Art. 4º – Os psicólogos não se pronunciarão, nem participarão de pronunciamentos públicos, nos meios de comunicação de massa, de modo a reforçar os preconceitos sociais existentes em relação aos homossexuais como portadores de qualquer desordem psíquica.”
Um esclarecimento: este projeto suprime apenas o parágrafo único do Art. 3º, e não ele inteiro.
2. O que o projeto está suprimindo?
Considerando que o projeto visa sustar somente o parágrafo único do Art. 3º, então ele não dá ao psicólogo o direito de tratar a homossexualidade como doença. Também não permite ações coercitivas para orientar homossexuais ou tratamentos não solicitados. Ou seja: mesmo que este decreto seja aprovado, homossexualidade continua não sendo uma doença e ninguém vai receber tratamento de reorientação sexual contra a sua vontade.
3. O que o projeto está permitindo?
No entanto, suprimindo o parágrafo único do Art. 3º, o projeto permite que “psicólogos colaborem com eventos e serviços que proponham tratamento e cura das homossexualidades”, e aí ele mesmo entra em contradição, pois se não há doença, não deveria haver cura. Entrarei em detalhes sobre estes possíveis tratamentos mais à frente.
Com relação ao Art. 4º, a supressão do mesmo acaba permitindo que os psicólogos se pronunciem publicamente de modo a “reforçar os preconceitos sociais existentes em relação aos homossexuais como portadores de qualquer desordem psíquica”, o que é um absurdo. Mas absurdo mesmo é saber que já tem gente fazendo isso, como o pastor, psicólogo (e babaca) Silas Malafaia.
4. Existe tratamento de reorientação sexual?
A homossexualidade constava como transtorno mental no DSM (o manual que lista os diagnósticos psiquiátricos) até o ano de 1974, na sétima impressão da segunda edição. Antes disso, durante o desenvolvimento da psicologia, em especial a psicologia clínica, foram estudadas algumas técnicas para reorientação sexual, e alguns estudos de caso chegaram a ser divulgados na literatura científica. No entanto, nem todos obtiveram sucesso e hoje ainda não há um consenso sobre como deve ser realizada uma terapia com este objetivo.
Durante as décadas de 60 e 70 foram testadas algumas técnicas como dar choques ou medicamentos que induzem náuseas junto a imagens eróticas com o mesmo sexo. Outros métodos incluíam terapia pela fala e até mesmo eletroconvulsoterapia. Em 1972, foram descritas por John Marquis algumas técnicas para o tratamento da homossexualidade¹:
Na mesma época, em 1974, George Rekers e Ivar Lovaas² chegaram a publicar um estudo de caso intitulado “Tratamento comportamental de comportamentos de papéis sexuais desviantes em uma criança masculina“. Aparentemente eles conseguiram bons resultados, mas não há um acompanhamento a longo prazo, ou seja, não sabemos o que aconteceu com o garoto nos anos futuros.
É importante acompanhar estes casos longitudinalmente por causa de exemplos como o de Kirk Murphy, que se tornou um adolescente isolado e antisocial que acabou cometendo suicídio aos 38 anos por ~~razões desconhecidas~~.
Estes tipos de intervenção deixaram de ser feitas a partir da década de 80 e hoje não há dados suficientes que comprovem a eficácia de técnicas psicológicas para mudar a orientação de uma pessoa homossexual para heterossexual. Além disso, a Associação Americana de Psicologia fez um levantamento dos estudos sobre técnicas de reversão e chegaram a conclusão de que elas não funcionam. É importante destacar este fato, pois eu me pergunto o que psicólogos como Marisa Lobo fariam para tratar seus pacientes homossexuais. Usariam a “psicologia cristã“?
5. Porque sou contra o projeto:
É possível alguém mudar sua orientação sexual? Talvez sim, assim como mudamos outros hábitos no curso de nossas vidas. Mas ainda não temos evidências científicas suficientes que possam provar isso. E ainda que fosse ou venha a ser praticamente possível, seria eticamente viável?
O projeto é polêmico por permitir que psicólogos pratiquem a reorientação sexual das pessoas que busquem esse tratamento. Pior ainda, ninguém sabe como fazer isso. Uma coisa é você permitir o desenvolvimento de técnicas e pesquisas controladas para este objetivo, outra coisa é deixar os psicólogos fazerem qualquer coisa, isso só traria mais prejuízos do que benefícios à população em geral.
Mais informações:
Na íntegra: Projeto de Decreto Legislativo de 2011
Jornal da Globo: ‘Cura gay’ é aprovada pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara
Olhar Comportamental: Psicologia Cristã, Marisa Lobo e a Psicoterapia para Homossexualidade
Olhar Comportamental: Terapia para Homossexualidade – O Trágico Caso de Kirk Murphy
Pedro Sampaio: O que a Psicologia tem a dizer sobre a homossexualidade?
ScienceDirect: 5 Things You Should Know About Gay Conversion Therapy
University of California: Facts About Changing Sexual Orientation
¹ Agradeço ao Psicólogo César A. A. Rocha pela revisão deste post e disponibilização da imagem utilizada.
² Segundo o leitor Vinícius Garcia: “Não foi o Ivar Lovaas que publicou o estudo de 1974. Ele foi coautor orientador). O autor é um tal de George Reekers, que, além de analista do comportamento, é também ministro da Igreja Batista e ativista pela terapia da reorientação sexual. O tal Kirk Murphy, mencionado no texto, que cometeu suicídio aos 38 anos, foi justamente o sujeito do estudo do Reekers. Esse tal Reekers, em 2010, após toda uma vida dedicada a oferecer terapia de reorientação sexual, foi flagrado num aeroporto norte-americano, viajando para a Europa com um garoto de programa de 20 anos a tiracolo.”
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O quanto você se conhece?
Gil Zamora foi treinado pelo FBI e desenha retratos falados para a polícia. Neste vídeo, ele recebe uma pessoa que deve se descrever fisicamente e ele faz um retrato falado dela a partir destas descrições. Em seguida, esta pessoa é descrita por um terceiro, gerando um outro retrato.
O resultado final é surpreendente: em vários desenhos, os retratos descritos pelas próprias pessoas tinham algumas feições (principalmente as negativas) mais exageradas do que as descritas por um terceiro, ou seja, a maioria das pessoas eram críticas demais consigo mesmas. E você, também não será crítico demais consigo mesmo?
Vale a pena conferir este vídeo!