Em 1979, Stephen Jay Goul e Richard Lewontin publicaram o artigo “The Spandrels of San Marco and the Panglossian Paradigm: A Critique of the Adaptationist Programme“, onde propunham o uso do termo Spandrel – em português Tímpano. Na arquitetura representa o espaço que sobra nas laterais de um arco. Segundo eles, o tímpano não é a intenção de quem constrói, mas sim a consequência do formato do arco. Embora seja um “efeito colateral”, passou a ser muito adornado, ganhando grande importância como peça de decoração.
Exemplo de tímpano da Biblioteca do Congresso – EUA.
A proposição é uma crítica aos adaptacionistas, corrente de pensamento na biologia que propõe que todas características dos seres vivos têm valor e foram selecionadas. Jay Gould propõe que algumas características dos organismos são subprodutos da seleção natural, conseqüência da seleção de outras partes. A esse tipo de característica antes sem função ou cooptada para uma nova função damos o nome de exaptação.
A exaptação é de grande valia, ela ajuda a explicar muitas situações que são inclusive atacadas pelos criacionistas. Por exemplo, como a seleção natural poderia gerar o vôo das aves se meia asa não é funcional e não pode ser selecionada. No caso da asa ainda podemos considerar que planar já tem um valor adaptativo, garantindo por exemplo a fuga dos predadores. Mas como explicar as penas?
Fósseis encontrados recentemente, mostraram as penas são mais antigas do que as aves, e já estavam presentes nos dinossauros, antepassados delas. O próprio Tiranossauro pode ter sido bem penudinho, e suspeita-se que as penas nesse caso podem ter servido para manter a temperatura corporal.
Uma nova espécie de dinossauro encontrado na Mongólia, o Epidexipteryx hui, acrescentou mais um pedaço a essa história. O E. hui pertence aos Terápodes, grupo que inclui o Tyrannosaurus rex e posteriormente originou as aves, e viveu cerca de 160 milhões de anos atrás. Seu fóssil tem marcas do que pode ter sido um tufo de penas – veja aqui – que aparentemente serviam para comunicação visual, como atrair fêmeas por exemplo.
Aparentemente as penas surgiram em outro contexto, servindo para termoregulação e/ou comunicação visual, e passaram a ser usadas para o vôo posteriormente pelas aves.
Passo-a-passo a história vai sendo contada, intermediários vão sendo encontrados, e as manchas do passado ficam mais claras. Quem se importa com para que servia o lóbulo da orelha, se hoje em dia ele serve brincos?
Fonte:
Stephen Jay Gould and Richard C. Lewontin. “The Spandrels of San Marco and the Panglossian Paradigm: A Critique of the Adaptationist Programme” Proc. Roy. Soc. London B 205 (1979) pp. 581-598