Natureza amoral


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©jurvetson

Me deparei com o post do RNAm sobre o padre Léo, que cita o amor entre os animais para combater o aborto:

“Para emocionar a audiência, o Pe. Léo cita alguns casos de sua humilde infância na roça: Quando um bezerro morre, sua mãe pára de dar leite. E a família dona da vaca, muito necessitada do leite para o próprio sustento, tem que enganar a pobre mamãe vaca, tirando o couro do filhote e o colocando por cima de outro bezerro. Assim a vaca sente o cheiro de seu filho e não pára de dar leite. Isto seria um sinal de amor da mãe pelo filho.”

Pretendia escrever aqui sobre algum parasita, como os vários exemplos de vespas parasitóides que adoro, mas acho que a imagem acima resume bem o que pretendia dizer.

Claro que se você quiser uma discussão mais aprofundada sobre a moralidade da natureza, temos aqui no SbBr. Fique com um trecho do ótimo texto de Glauco Kohler:

“… Na natureza não há o equilíbrio e sim a guerra e o caos, dos quais provem a ordem magna natural. Porém, a humanidade comete pecados ainda maiores ao lidar com as interpretações d a natureza do qual provém: a de julgar suas relações sob a luz opaca de seus preceitos morais…”

[update] Uma ótima sugestão do KentaroO Mito do Homem Assassino:

“a Natureza é uma arena violenta de competição intra- e inter-espécies na qual o assassinato para ganho é um evento cotidiano e flutuações ecológicas conduzem comumente a morte em massa”.

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9 responses to “Natureza amoral”

  1. Olá,
    tornei-me leitor assiduo de seu site desde que meu filho, graduando em biologia, mo indicou. Se a vida tivera sido outra, teria me tornado entomologista, em lugar de “teólogo”. Seja como for, desde que você postou sobre as vespas parasitas, tenho escrito algumas coisas sobre a “a-moralidade” da natureza (em Peroratio)…
    De fato, a natureza não é i-moral, nem moral – ela é a-moral Moralidade é um conceito humano (antropológico), por isso, “divino”, já que divino é tudo que atribuímos, por projeção, a “ele” (Feuerbach).
    O problema é que nós, seres humanos, também somos natureza (Edgar Morin), de modo que reproduzimos tudo que lá há. Quando descobrimos, há duzentos anos, isso no período “cristão”, que a moralidade é uma ideologia humana, perdemos o chão ontológico. Não há mais fundamento metafísico para a moral.
    Mas há uma considerável diferença entre nós e o restante da natureza – consciência.
    Posso, e, ser humano conscinte, sujeito-de-mim, pisar o próximo, em nome de uma pertença à natureza?
    Bem, “poder” posso, desconsierando as leis, claro. Mas penso que foram os milhares de anos aprendendo as conseqüências de fazê-lo que inventamos a sociedade moderna, o Estado Democrático de Direito, a República, a democracia. Nada disso é “natural”. Tudo é humano, demasiadamente humano…
    Parabéns pelo blog.
    Osvaldo.

  2. @ Osvaldo,
    Adorei o comentário! Nunca é tarde para seguir algo que você gosta, o Angelo Machado era neurologista, mas a paixão pelas libélulas acabou fazendo dele um entomólogo (http://www.revistapesquisa.fapesp.br/?art=3148&bd=1&pg=1&lg=). Aliás, não lembro quem foi que comentou que se sabia algo sobre Deus, é que ele tinha uma predileção especial pelos besouros (dada a diversidade dos coleópteros).
    Quanto à moralidade, acho que a grande diferença é que nós atribuímos valor às coisas, algo que outros animais não são capazes. Seu primeiro carro não tem valor só comercial, tem o valor de ter sido o primeiro, conquistado com trabalho, ou dado pelo pai por que passou na faculdade. Esse tipo de coisa. Graças a isso, temos muito mais coisa para levar em conta com uma atitude do que um animal.
    Volte mais vezes!

  3. Excelente… também há um ensaio ótimo de Eric Raymond, exatamente sobre essa visão romântica do homem “malvado” e natureza “perfeita”:
    – O Mito do Homem Assassino
    http://www.ceticismoaberto.com/ciencia/homemassassino.htm
    “a Natureza é uma arena violenta de competição intra- e inter-espécies na qual o assassinato para ganho é um evento cotidiano e flutuações ecológicas conduzem comumente a morte em massa”.

  4. Atila, eu bem seria capaz de recomeçar… Preciso apenas certificar-me do pão cotidiano. Na adolescência/juventude, você tem gente segurando as pontas. Na minha idade, com família para sustentar, tenho que, primeio, fazer como papagaio, bico na grade antes de dar um passo. Mas eu recomeçaria tudo de bom grado – e biologia, particularmente entomologia, mas até botânica rola.
    Conheço O Método de Edgar Morin?
    R, quanto a besouros, que tal essa brincadeira: http://www.ouviroevento.pro.br/abhadya/Sacabeus_sacer/scarabeus_sacer.htm.
    Volto sempre, não precisa convidar. É como sorveteria: a gente gosta, a gente vai…
    Um abraço,
    Osvaldo

  5. “Guerra” e “assassinato” não são também conceitos humanos que refletem conceitos morais? Se vamos criticar um autor por cair no antropomorfismo, não podemos fazê-lo citanto textos que também incorrem nesse erro.

  6. @ Alvaro,
    Esse é o ponto, aplicamos os conceitos para mostrar que eles não existem ou não se encaixam. Fica muito mais difícil de discutir isso sem a aplicação desses conceitos, da mesma forma que citamos que um organismo é bem adaptado, quando não é esse o termo ideal nem de longe.

  7. Mais uma vez alerto contra as generalizações. É claro que a visão da natureza “boazinha” está errada, mas tão errada quanto está a visão de que a natureza é só gerra e caos. Falei um pouco sobre isso no meu post sobre como Não ensinar seleção natural: http://scienceblogs.com.br/discutindoecologia/2009/01/como-nao-ensinar-selecao-natural-para-seus-alunos.php
    Já se passaram 150 anos desde que Darwin publicou o seu grande livro e há 150 anos lutamos para alterar preconceitos criados por interpretações enviesadas. É claro que o argumento teleológico é falso, a natureza não é boa porque tem vontade. Mas as relações positivas são muito relevantes e o seu papel evolutivo é cada vez mais comprovado.
    Para mim o certo é dizer que na natureza não é bondade com motivo, por razão. Existe cooperação positiva por algum mecanismo, que pode beirar o egoísmo (como diria o nosso grande Dawkins) ou o pseudo-altruísmo. A ideia de gerra e caos é muito ligada a competição. E na Ecologia sabemos a competição está longe de ser o único mecanismo evolutivo.
    Abraços.

  8. Concordo contigo Luiz, não dá pra generalizar em bio, o que quisermos afirmar tem exemplo. Por isso disse que a natureza é amoral, nós é que temos essa mania de atribuir valores a tudo que vemos.
    Sou fã de qualquer interação entre espécies, positivas ou negativas, sempre são garantia de inovações evolutivas e uma Rainha Vermelha básica.
    Abraço!

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