Filosofando sobre divulgação e jornalismo científico
Eu estou um pouco filósofa estes dias. Isso porque eu aproveitei minhas microférias para conhecer um pouco melhor a blogosfera científica norte-americana. Então, estou eu aqui, em Research Triangle Park, North Carolina, onde aconteceu até agora a pouco o Science On Line 09′.
O evento reuniu muito mais que blogueiros e leitores de blogs. Há, por exemplo, uma professora chamada Miss Baker que trouxe os alunos dela do programa Extreme Biology para conversar com cientistas e para os garotos aprenderem a divulgar a ciência que eles fazem na escola. Há pessoas que não conhecem a ferramenta de blogs e vieram saber mais sobre. Há estudiosos, cientistas, educadores, observadores, interessados, perdidos, etc, etc, etc.
Mas, o que me fez ficar filósofa são particularmente os assuntos envolvendo divulgação científica, jornalismo científico e as novas responsabilidades que blogar fora do Lablogatórios vão trazer (É… o Lablogatórios vai morrer). Por quê? Porque na minha opinião deveríamos levar um peteleco cada vez que abríssemos a boca pra dizer que existe divulgacão científica e jornalismo científico no Brasil. Algo como um castigo por estarmos falando abobrinha.
Não, não há isso no Brasil. E, antes que venham argumentar que sim, existem sim jornais fazendo divulgação de Ciências, já vou adiantando que fazer tradução mal feita de press release e tradução mal feita de sites americanos e ingleses não é jornalismo científico. Quer exemplos do que seria jornalismo científico?
+ O que sabemos sobre a vida e contribuições de Carlos Chagas e sobre suas incursões no interior do Brasil?
+ O que sabemos sobre o que nossos cientistas fazem hoje nos seus laboratórios – muitos deles públicos e que gastam milhões em dinheiro?
+ O que sabemos sobre os avanços tecnológicos e científicos decorrentes das pesquisas do brasileiríssimo Dr. Nicolelis?
+ Quem são os expoentes na Ciência brasileira atualmente?
+ Onde precisamos investir mais dinheiro e que pesquisas deveriam ser completamente encerradas por conta de maus profissionais? (sim, temos maus profissionais, que mentem no currículo, por exemplo.)
+ Quais são os objetivos de cada campo atual das Ciências no Brasil?
+ Por que nossos alunos de ensino fundamental e médio não se interessam por Ciências?
+ O que deveríamos fazer para aumentar o interesse dos brasileiros em Ciências?
+ Por que não temos jornalismo investigativo de qualidade, desses que desenterram questões tipo “Afinal, quem observou pela primeira vez os cromossomos politênicos?”
Enfim…
Graças ao Lablogatórios temos pela primeira vez reunidos em um condomínio bons blogs de Ciência, que atuam em diferentes áreas do conhecimento. Temos cientistas, curiosos, interessados e temos um jornalista (que também é físico). Dos blogs que temos, fazemos bons comentários sobre artigos científicos, sobre novas tecnologias, sobre curiosidades, sobre educação de Ciências nas escolas, sobre ceticismo, sobre Ciência em geral. Mas também não fazemos jornalismo científico, até porque ser um jornalista científico (sendo jornalista ou não) demanda tempo (muito tempo) e precisa ser um trabalho pago (jornalismo científico é profissão, não passa-tempo).
Não sei se consigo levar vocês, meus leitores, onde quero chegar. O que eu tento dizer é que o Lablogatórios é sensacional e que cumpre seu papel em divulgar Ciências de uma forma simples (mas não simplória). Também tenta cumprir um papel interessante de fazer alunos se interessarem mais por Ciências. Também traz a Ciência para o cotidiano das pessoas, ensinando e desmistificando alguns conhecimentos. E também faz a Ciência parecer coisa de maluco, mas ainda assim ser fantástica. O que tento dizer é que para sermos um país preocupado em divulgar Ciências isso não basta. Temos que ter profissionais empenhados nisso. E empregadores interessados em pagar por isso. Temos que divulgar nossa Ciência em livros. Temos que conhecer mais nossos cientistas. Temos que ter mais responsabilidade social e conhecer mais onde nosso dinheiro vai sendo empregado. E isso não é responsabilidade só do Lablogatórios.
Discussão - 33 comentários
Ótimo texto.
Pode não ser só responsabilidade do Lablogatórios, mas há que se persistir no processo... Em todos os aspectos, o homem contemporâneo, ainda, não percebeu que unir forças inteligentes é viável e necessário. A 'Sociedade' desmorona e as pessoas não se dão conta. O 'Planeta' está querendo nos expelir e as pessoas não se dão conta... Cabe a conquista do reconhecimento, cabe a divulgação, cabe a busca de parcerias no meio científico e acadêmico, talvez privado, profissional... Ao governo, e seus integrantes, só interessa o quanto vai ficar em seus bolsos... talvez em todas as questões acima, tenham origem no modelo praticado pelo governo desde o pós-guerra... lamentavelmente.
Oi Paula,
Aqui é o Reinaldo, repórter e blogueiro de ciência do G1. Estive com o pessoal do Lablogatórios num evento em Ribeirão Preto. Entendo a sua indignação. O jornalismo científico é uma área nanica no Brasil, nisso você está totalmente certa, mas daí a dizer que ele não existe é um pouco demais, e chega a ser injusto.
Muita gente, de fato, faz tradução malfeita de release ou matéria estrangeira. No entanto, tanto na Folha, que é de onde eu vim, quanto no G1, que é onde eu trabalho, tenho absoluta convicção em afirmar que a tradição é outra.
Nós nunca fazemos nenhuma matéria sem, pelo menos, ler o paper original da pesquisa e tentar passá-lo para outro pesquisador da área, além de falar com o autor original do estudo.
Além disso, boa parte das suas demandas são realizadas sim, com frequência, tanto pela gente no G1 quanto pelo pessoal da Folha. Cada novo avanço do trabalho do Nicolelis é coberto milimetricamente pela gente, é só dar uma busca. Matérias sobre pesquisas feitas no Brasil? Temos de monte. Críticas a mazelas da ciência no Brasil? O caso de plágio no IF da USP, coberto pelos dois veículos, está aí pra todo mundo ver.
Além disso, se vc me permite corrigir um erro conceitual, jornalismo investigativo tem pouco a ver com os cromossomos politênicos... jornalismo investigativo significa, basicamente, desenterrar sacanagem e expô-la. É, de novo, o caso que aconteceu na IF-USP. Nesse ponto concordo que deveríamos ir mais a fundo, mas existem boas iniciativas.
Concordo que há poucas pessoas podendo se dedicar de verdade, mas é injusto você não valorizar, ou não prestar atenção, nos poucos que o fazem.
Grande abraço!
Paula,
Muito bem dito. Você fez o que deveria ser feito, expos a ferida para se começar a pensar em tratá-la. Realmente, creio que a "divulgação" científica brasileira ainda é muito amadorística, a percepção pública da ciência, além de incipiente, é muito toldada por uma visão caricata ou negativa do cientista. Aliás, o cientista brasileiro, tenho esta impressão, prefere chamar-se de pesquisador, como se cientista sempre invocasse "maluco". Para piorar, a ditadura dos fatores de impacto e companhia desencoraja que cientistas proeminentes em suas áreas escrevam livros de divulgação mais acessíveis ao público. Enfim, espero que possamos mudar isso e contribuir para melhorar a percepção pública da ciência, a educação científica e até a produção científica de nosso país.
Estamos trabalhando nisso! Tipo:"Servimos bem para servirmos sempre, sabe?" Mas, de qualquer maneira precisamos PROFISSIONALIZAR a coisa. E isso não significa virar um PROBLOGGER, isso significa que precisamos criar a necessidade de termos esse emprego nos jornais, nas televisões, dentro das editoras... A gente começou, expôs a ferida, viu que há interesse das pessoas no nosso condomínio. Agora precisamos de MAIS! Precisamos de cientistas jornalistas, de divulgadores de ciências para os grandes meios de comunicação. E quando eu uso "nós" quero dizer como país, como educadores, não só como lablogueiros...
Abraços!
Bora pra frente Ítalo!
Muitas das coisas que fazemos aqui no Lablogatórios iniciam uma caminhada que é imensamente comprida. O que me assusta é que em menos de seis meses de condomínio fomos tomados por uma responsabilidade maior do que blogar. Temos obrigação social de divulgar ciência de qualidade, tanto quanto podemos, com as condições que trabalhamos (sem dinheiro, sem tempo, como passatempo...).
Mas ainda assim isso é tão excitante, não é?
Ah! Abel Pharmboy manda lembranças pra vc! Ele é seu fã!
Desculpe o spam, mas gostaria muito de uma resposta sua também, Paula 😉 Abraço!
Isso mesmo, tenho certeza que estamos à altura da responssabilidade que nos é posta nos ombros. Manda lembranças para ele também. Quando soube que seríamos realmente SB, lembrei dele, ia até postar um comentário no Terra Sigillata. Abraços.
Reinaldo!
Antes de mais nada: PARABENS PAPAI!!!!
OK, agora que eu quebrei as suas pernas (brincadeira, essa não era de fato a intenção) vamos lá!
Eu entendo perfeitamente o que você diz. Sei que há pouquíssimos jornalistas científicos que trabalham duro, acompanho tudo o que vocês e ainda mais o pessoal da Agência FAPESP escreve com muita atenção. Só não acho que chegamos ao ponto, acho que não estamos no caminho. Acho, inclusive, que algumas matérias publicadas tem um texto chato, e nem sempre chego no final deles.
Uma coisa que ouvi por aqui, da Rebecca Skloot, uma jornalista científica frila que escreve para um monte de lugares e agora está lançando um livro sensacional sobre células HeLa e todo o jornalismo investigativo que ela fez sobre o caso
(sim, há sacanagem e se nós não sabíamos até agora é pq ele nunca tinha sido feito) foi: "Há diferença entre cobrir tópicos e escrever uma história". Acho que o jornalismo científico que temos atualmente no Brasil é muito bom em cobrir TÓPICOS, mas dificilmente (não vou dizer NUNCA porque certamente não li tudo que foi publicado) vira uma HISTÓRIA.
E não há erro conceitual nenhum na minha frase sobre jornalismo investigativo. Sim, aparentemente há uma mega sacanagem envolvendo a descrição dos cromossomos politênicos, só que ninguém jamais em tempo algum resolveu escarafunchar a HISTÓRIA.
Abraços!
Paula
Oi Paula,
Não quebrou as pernas de forma nenhuma, hehehe... fico feliz com a menção. Infelizmente minha esposa acabou perdendo o bebê. Mas tudo bem, coisas da biologia humana, e a gente continua tentando.
Desculpe pelo lance dos cromossomos, eu não estava a par.
Concordo plenamente com você nessa questão da história. Certamente falta narrativa no jornalismo científico brasileiro. Como você bem disse, isso demanda tempo e dinheiro para bancar um trabalho de longo prazo e pouco lucrativo, além de espaço -- em páginas mesmo.
Estamos limitados por falta de dinheiro, equipes pequenas (quatro pessoas na Folha, duas no G1) e valorização por parte das chefias. Mas tentamos.
Posso te dar dois exemplos, ambos sobre paleontologia/paleoantropologia?
http://www2.igc.usp.br/museu/noticia3.htm
http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=29688
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe1007200504.htm (só para assinantes do UOL)
É isso o que você quer dizer com contar uma história?
Abraço!
Oi Paula,
Resolvi comentar aqui depois que você postou um comentário no meu blog. Obrigado pela moral 😉
Eu acho que há uma certa confusão em relação ao papel do jornalismo neste caso da divulgação científica. Em poucas palavras o florescimento do jornalismo como profissão é uma consequência direta do letramento da população e do liberalismo político pós revolução francesa (a imprensa, como tecnologia, é mais antiga). Com isso quero dizer que o jornalismo nunca teve, historicamente, o papel de "ensinar" ou "educar" a sociedade. O jornalismo, por conta dos seus próprios critérios para o que é notícia (novidade, relevância, raridade, etc.), está engajado nos fluxos de informação. Ele é derivado de um determinado "mapa cultural" muito mais complexo. Pois bem, a educação é um dos pilares deste mapa cultural fornecendo ao jornalismo elementos para que ele possa selecionar quais notícias privilegiar. Assim, não é bem a coisa do Tostines, mas como mudar este mapa e de que forma.
Quando penso em "divulgação científica" acho que o G1 e a Folha e a Scientific American Brasil estão fazendo seu papel. Mas o conceito tem uma amplitude muito maior, envolvendo outras mídias. O que falta é uma cultura do livro, do documentário, dos sites - blogs! - enfim, da produção cultural voltada para a ciência. Se começarmos a investir agora, como vocês fizeram, talvez consigamos sensibilizar a próxima geração. Um caso interessante é o da ecologia. Hoje matéria curricular, na minha época de secundarista (década de 80) nem se ouvia sobre o assunto.
E parabéns viu Reinaldo. 😉
Brigadão, Daniel 😉
+ Por que não temos jornalismo investigativo de qualidade, desses que desenterram questões tipo “Afinal, quem observou pela primeira vez os cromossomos politênicos?”
RESPOSTA: Porque para fazer isso um repórter vai precisar de tempo e dinheiro para visitar meia dúzia de cientistas em seus locais de trabalho e passar horas do lado deles.
É extremamente raro uma empresa de comunicação investir em séries de reportagens profundas.
Preferem pagar um punhado de jornalistas para ficarem presos na frente do computador lendo press releases.
Atualmente está tramitando no STF uma discussão sobre a necessidade de ter ou não diploma de jornalismo para exercer o papel de jornalista, reflexo da necessidade que uma parcela grande da sociedade tem de se expressar, sem filtros (por melhores que sejam) para o restante da sociedade. Isso significa que os cientistas/pesquisadores brasileiros têm imensa responsabilidade perante a sociedade de informar o que é e que foi produzido no Brasil.
Como biólogo formado no IB-USP e ecólogo no Inpa, tenho tentado atuar nesse sentido, tendo publicado um livro de divulgacao sobre a Reserva Ducke, além de textos em jornais e na web. Nao quero fazer marketing pessoal, mas como o Reinaldo ressaltou, seria injusto desprezar algumas iniciativas nessa linha.
Deixei um post no tubo de ensaios sobre isso (O matador de passarinhos: separando o joio do alpiste). O texto originalmente foi publicado em um blog que montei para ajudar a expressar o que alguns dos jovens cientistas na Amazônia estão fazendo. O blog é conhecido como ULE, de União Local de Ecólogos (Inpa). Esse blog ainda é bastante incipiente, mas devagar estou tentando alimentar um paradigma em que o próprio cientista divulga diretamente seu trabalho (quando se sente confortável em fazer isso) ou busca colaboração de bons profissionais da área jornalística para divulgar de modo crítico e acessível os resultados obtidos com seu suor. No segundo caso, é interessante pedir ao jornalista que permita uma revisão do produto final para evitar inconsistências. Isso tenderá a aumentar a credibilidade do jornalismo científico na terra de Macunaíma.
Contudo, é importante diferenciar entre reporteiros, que basicamente relatam fatos, de analistas, que mergulham mais afundo em temas e depois de espremerem o bagaço bastante e matutarem sobre desenrolares, tendem a estimular mais o raciocínio e a discussão. Creio que como somos cientistas e queremos andar nessa interface com a sociedade, temos que atuar nessas duas linhas: eu prefiro mais a segunda.
Parabéns pela iniciativa Saci! Espero que esse comentário que você me deixou possa servir também como divulgação do seu trabalho!
E espero mesmo que cada vez mais cientistas se sintam a vontade em divulgar seu trabalho. Ninguém melhor do que eles pra contar a verdadeira história por tras dos resultados!
É mais barato, né Igor? E, alguns jornais trabalham com prazos tão curtos que não conseguem se organizar a longo prazo. Pena MESMO!
Mas ainda espero que os jornalistas científicos e divulgadores de ciências passem seu tempo na frente do computador para tentar aprender mais sobre o que escrevem, e então escrever com fundamento, não apenas relatando e traduzindo textos.
Poxa... Ainda bem que continuar tentando é uma tarefa bem prazerosa, né? Estamos torcendo pelo novo bebê!
Então. É QUASE isso que eu acho que seria legal. Não sei se é uma questão editorial - pode ser, obivamente - mas as vezes sinto falta de PAIXÃO no texto, sabe? Aquele mistério, que faça o leitor ficar absolutamente preso na leitura - mas que não deixe de maneira nenhuma de ser informativo.
Tá quase no meu ponto. Mas ele é meu, pode não ser da maioria, nem dos jornalistas, nem dos editores. Opinião pessoal mesmo.
Depois, foi exatamente isso que eu acabei de escrever pro Igor. Infelizmente as equipes são pequenas, tem que lidar com prazos super curtos e não dá mesmo tempo pra sair o melhor texto EVER todas as vezes. Eu entendo, eu entendo. Também entendo que jornalismo investigativo - além do de contar histórias relatando novidades científicas - demanda tempo e dinheiro (que aparentemente as grandes mídias não parecem estar dispostas a pagar).
Mas estamos chegando lá!
Concordo totalmente com o Ricardo nesse ponto. A obrigação legal do diploma de jornalista para exercer a profissão é estapafúrdia, tanto que alguns veículos simplesmente decidem ignorá-la, como a própria Folha, que tem físicos, biólogos e economistas, entre outros, nos seus quadros de reportagem e edição.
Outro problema muito sério: não existe NENHUMA faculdade de jornalismo no Brasil que dê uma boa formação. Jornalista que quer ter conhecimento em profundidade sobre qualquer área precisa ser autodidata, porque a faculdade não irá ajudá-la.
Finally: existe muita preguiça intelectual no meio jornalístico, infelizmente.
Abraços!
Oi Paula,
Só complementando meu comentário para evitar mal entendidos.
O pessoal atual da Ciência na Folha, que conheço pessoalmente, e o Salvador e o Reinaldo do G1, que não conheço mas admiro o trabalho, a-do-ra-riam sair mais vezes da redação para realizar reportagens profundas e "in loco".
A Folha e o G1 subutilizam esses profissionais. Infelizmente, é uma tendência da imprensa nos EUA e na Europa também, como aponta a revista Columbia Journalism Review e o jornalista português António Granado, veja aqui:
http://ciberjornalismo.com/pontomedia/?p=2972
Complementando o que o Igor disse, não se trata de uma tendência só em Ciência não: é uma tendência em todas as áreas do jornalismo no mundo, e em especial no Brasil, onde as empresas têm menos dinheiro e menos vontade de investi-lo em pessoal.
Eu diria até que, no meio impresso (na internet é diferente porque a gente sofre da maldita síndrome do espaço ilimitado), as editorias de Ciência até que não estão tão mal, porque a relação repórter/página é maior do que em outras editorias. Pegue a Folha: cerca de 3/4 de página diária para quatro pessoas. Isso significa que, embora o espaço seja pequeno, pelo menos uma ou duas pessoas podem ficar "fora de dia", como se diz, fazendo reportagens com um pouco mais de calma. Na web não temos esse luxo.
Sobre paixão, hehehe: da minha parte nunca faltou, mas acho que é algo muito subjetivo de se captar, Paula. Amo o que faço, não há dúvida, mas a linguagem jornalística muitas vezes é limitada, até pelo espaço, à necessidade de "dar a notícia", ir "direto ao ponto", porque se parte do princípio que quem importa é o leitor, e ele pode não partilhar da sua paixão pelo tema, por mais que você tente comunicá-la. Não concordo com isso, mas esse é o pensamento predominante nas redações. Abraço!
Oi Reinaldo...
Me perdi aqui hehehehe
Do que exatamente estamos falando? Resposta pra que pergunta? 42?
Nananão, hehehe... isso foi antes de você responder meu primeiro comentário. Era só eu sendo afoito. No matter 😉
Abração!
Reinaldo, creio que em todas as áreas é necessário ser autodidata, pois depois dos anos da faculdade, pós-graduação, etcetera, estamos no mundo jogados à nossa própria sorte ou à nossa própria vontade de crescer. Apesar de a Folha não exigir o diploma, tive dificuldade em me vincular a jornais locais de Manaus, como o Amazonas em Tempo. Eu tenho publicado, com a ajuda de um jornalista desse jornal, alguns textos, mas não consegui ter retorno financeiro nenhum pelo trabalho que faço com dedicação e entusiasmo. Tudo que fiz até agora foi voluntário, mas óbvio que não farei isso ad eternum. Você tem alguma dica que poderia me ajudar?
Caro Saci,
É triste eu dizer isso, mas infelizmente você teve o azar adicional de lidar com a imprensa local, que no Brasil é ainda mais pauperizada e desinteressada em ciência que a imprensa de alcance nacional.
Minha dica é basicamente a seguinte: procure veículos maiores e tente virar free-lancer. Existem poucas vagas fixas na área de jornalismo ou divulgação científica, mas o espaço para free-lancers é até considerável.
Para fazer coisas mais densas na área de biologia da conservação ou ecologia, por exemplo, acho que as revistas Scientific American e Terra da Gente poderiam ter interesse em material seu. Já nas revistas da editora Abril - basicamente Super e Mundo Estranho -, bem como na Galileu, há espaço para frilas de jornalismo científico, mas é preciso oferecer pautas, ou topar fazer pautas, que unam os temas da ciência com o gosto popular. Seria também necessário adaptar os textos que você produz para o formato de reportagem, com entrevistas e "aspas".
Se você quiser, posso te dar os contatos de algumas pessoas do ramo, assim como te desejar meu boa sorte, é claro 😉 Meu e-mail é rlopes@corp.globo.com. Abraço!
Pôxa. Sinto muito pelo bebê, Reinaldo. E boa sorte!
Eu acho que depende muito do tipo de experiência acadêmica que se tem Reinaldo. A maioria absoulta dos nossos cursos de Jornalismo enfatiza a dimensão técnica o que é um erro. A legislação sobre estágio também dificulta muito, porque exige que a prática seja feita totalmente em ambiente acadêmico, daí a necessidade de se ter, nas faculdades, um estúdio de TV que não faz broadcasting. Um desperdício. Além disso, o conetúdo "laboratorial" da profissão pode ser aprendido em 1 ou 1,5 anos de curso. Construir um currículo de 4 anos sobre um conteúdo técnico destes é bobagem. E como a área da Comunicação ou Ciência da Comunicação não tem nem uma espinha dorsal teórica e epistemológica, os cursos acabam frouxos, vacilantes. Via de regra o aluno que entra na faculdade com um texto bom e certa lucidez consegue espremer um pouco mais. Enfim, o diploma de jornalista não deveria ser obrigatório para o exercício da profissão. Isso um dia vai acabar.
Daniel, tiraste as palavras da minha boca. O conteúdo laboratorial é enfatizado demais e isso é uma burrice, porque, além de ser facilmente apreendido em muito menos tempo, os jornais (e revistas, e rádios, e TVs) laboratórios das faculdades têm pouca relação com o ambiente real das redações. Em dois meses de trabalho você pega tudo o que precisa pegar. Melhor seria dar formação teórica caprichada em humanidades e, por que não, em ciência também, ao menos para quem se interessar. Abraço!
Chego atrasada na discussão, mas ela me parece tão boa que não posso deixar de comentar. Começando pelas afirmações da Paula lá em cima, de que não há jornalismo/divulgação científica no Brasil.
Comecei nessa área em 1999 (quando entrei no curso do Labjor na Unicamp, primeira turma)e posso garantir que aconteceu muita coisa nesses dez anos. Naquela época havia basicamente Galileu e Superinteressante. Hoje não só temos mais publicações de ciência (Sciam, Pesquisa Fapesp etc) como também o assunto está bem mais presente em publicações gerais, como os jornais e as revistas semanais, por exemplo, e também na TV. Além disso a coisa cresceu ainda mais na internet, como o G1, o Lablogatórios e outros tantos blogs e diversos sites (profissionais ou amadores). Sem falar nas exposições que vivem rolando por aí. Claro que a qualidade de muita coisa é discutível (ah, os malditos press-releases e materiais importados), mas como já foi dito, tem gente fazendo um bom trabalho, apesar das dificuldades. Portanto, há jornalismo/divulgação científica no Brasil sim. Se ela é nanica? Claro que é. Mas olhando em perspectiva, a evolução foi significativa e não é por acaso que estamos discutindo isso aqui.
O principal problema é que tudo coincidiu com uma crise do jornalismo em geral(impresso, principalmente); tudo encolheu: as vendas, as redações, os borderôs, bem como a mentalidade de muitos editores/publishers (aqui acho que houve um pouco de seleção natural: conheço pelo menos três ótimos editores de ciência que, vendo a mediocrização do setor, se refugiaram na vida acadêmica).
Às vezes me dá a impressão que tem mais gente querendo fazer divulgação científica (digamos assim, para ir além do jornalismo) do que gente disposta a consumir divulgação científica, sem ambições profissionais. Claro que é só uma impressão, mas de qualquer forma a audiência ainda é muito baixa em comparação a outros assuntos que competem por espaço nas grandes mídias, mais lucrativos, obviamente. Um problema que não será resolvido em curto prazo, o que não impede o surgimento de caminhos alternativos.
Sou otimista, principalmente por causa da web 2.0. Sem querer puxar o saco, o Lablogatórios é uma iniciativa importante (que eu destacaria na minha linha do tempo imaginária da divulgação científica no Brasil) porque forma massa crítica, de onde sempre surgem coisas novas. Não falo apenas dos blogs em si, mas de tudo/todos que se agregam em torno deles. Claro que isso não alivia a frustração imediata do repórter que sonha com grandes reportagens (me incluo), mas se vê acuado com os prazos ridículos e o borderô anêmico (assino embaixo de todos os pontos levantados pelo Igor, Reinaldo, Daniel e outros). Para sobreviver, muitas vezes precisamos jogar o jogo possível (falo por mim, que vivo disso e tenho contas a pagar), só não dá pra se resignar e desanimar (às vezes é difícil, sei como é). Eu pelo menos não pretendo mudar de profissão e acho que daqui a dez anos vamos ter coisas boas pra contar. Abraços!
Oi Luciana,
Legal ver vc na discussão também. Eu sinceramente não sei se realmente não tem gente querendo consumir. No G1 acontecem umas coisas malucas -- do tipo matéria sobre cosmologia ou biodiversidade ter 200 mil, 300 mil cliques num dia, desde que seja bem chamada na home da Globo.com, acompanhada por uma fotona chamativa. Talvez o que realmente falta seja transformar esse gosta esporádico em algo sistêmico. Mais que isso, as chefias de jornalismo acreditarem que pode dar audiência. Aqui os mestres dos magos não são chegados em olhar os dados, então ficam pedindo matéria de saúde da gente, mesmo quando a gente vê é que, do par Ciência e Saúde, o que tem potencial de audiência é a primeira...
Abraço!
Queridos,
Considerando o tamanho do nosso país e a quantidade de produção científica que temos, ainda bato na tecla de que nosso jornalismo científico não existe (ou se preferirem, não basta).
Ontem fui num sebo, fui comprar livros usados. A estante de livros sobre divulgação científica, sobre ciências em geral é de chorar de orgulho. Onde estão nossos professores, nossos professores aposentados, nossos interessados por ciências, nossos PhDs, nossos jornalistas científicos? Onde está a mídia impressa? Onde estão as editoras, os autores? Eu tenho certeza que nosso povo não se interessa mais por ciências porque não há demanda suficiente de artigos científicos de fácil acesso, divulgação de qualidade, opiniões e argumentos sobre temas atuais (vide a colocação do Reinaldo, acima).
Eu entendo perfeitamente que houve uma evolução de 10 anos para cá. Mas essa evolução é pouco significativa dentro do todo. Precisamos de mais! E precisamos escrever cada vez melhor, para que os editores simplesmente não possam negar a publicação.
Eu não disse que ia ser fácil ; )
Queremos livros, Reinaldo!:) Quero dizer, mais do que um! É lá que o amor pela matéria pode realmente aparecer (lá e no blog).
Oi Reinaldo. Você disse bem: "Talvez o que realmente falta seja transformar esse gosto esporádico em algo sistêmico". E eu acrescento: por sistêmico, entenda-se também economicamente atraente.
Essa coisa de ficar pedindo matéria de saúde demonstra a visão estreita deles: a oferta dos concorrentes é massacrante nessa área, é difícil fazer diferença. Já na ciência, poucos concorrentes tem essa competência, de modo que seria interessante investir mais (dados os números animadores que vc mostrou) e se diferenciar. Mas os mestres dos magos ainda insistem nas velhas fórmulas...
A propósito, fiquei sabendo que vc vai lançar um livro com material do blog e outros inéditos, que bacana. É a esse tipo de coisa que me refiro também quando digo que a internet anda catalisando algumas "reações" na divulgação científica. Abraços!