Aprendendo com o Dalai Lama

Ah, se todos os líderes religiosos fossem assim… Quem sabe como seria o mundo, se cada um aceitasse seu nicho, seu papel no mundo, e entendesse a importância que o Conhecimento tem para todos os seres humanos (mesmo para aqueles que não aceitam esse fato)… Isso é algo que está sempre nos meus pensamentos, e, na maioria das vezes, de um jeito que me perturba.
Perturba porque a notícia que vou comentar agora me fez lembrar exatamente do contraponto que vi dias atrás no 100Nexos, quando o Kentaro (Mori), seu autor, postou um pseudo vídeo-clipe com um pseudo-letrado cantando uma pseudo-verdade. OU eu poderia falar só “um videozinho de um imbecil ignorante”. Mas estou de bom humor hoje, então peguei leve.
dalailama.jpgDesde 2008 existe uma iniciativa de integração dos monges tibetanos às disciplinas científicas como Biologia, Neurociência, Física, Matemática, entre outras. Muitos dos monges não possuem qualquer tipo de iniciação nesses assuntos, e o Dalai Lama instaurou um projeto bilateral de cooperação com uma universidade norte-americana, a Emory University, em Atlanta.
A parceria entre o Tibete e essa instituição foi fundada em 1998, com o intuito, como está em seu site, de “aproximar o melhor das tradições intelectuais ocidentais e tibetano-budistas para seu mútuo enriquecimento e descoberta de um novo conhecimento para o benefício da Humanidade”.
Aliás, o Dalai Lama é bastante ativo nessas iniciativas, sendo inclusive nomeado Professor em Emory, no ano de 2007. No período em que ficou na universidade ministrou cursos, palestras, etc., uma vez que considera que a ciência e o budismo constituem “abordagens investigativas” complementares, “dirigidas a um mesmo grande objetivo, a busca pela verdade”, como relata em seu livro “O Universo em um Átomo” (Ediouro, 2006).
Em Janeiro de 2008 o Dalai Lama, acompanhado de uma delegação de membros da Emory University, presidiu a inauguração da Emory-Tibet Science Initiavite (Iniciativa Emory de Ciência para o Tibete) em um monastério na Índia. O objetivo é inserir o ensino de Ciências na rotina dos monges e monjas tibetanos, que passam 12 horas por dia estudando filosofia e lógica budista, recitando orações e debatendo textos religiosos.
tibet.jpg

Aulas práticas


O projeto está em seu segundo ano, e foi precedido por um programa chamado “Ciência para Monges”, criado em 2001 com o apoio de um filantropo de Boston chamado Bobby Sager.
Também há outro programa em andamento, que tem por objetivo enviar estudantes de pós-graduação de universidades da Europa para os mosteiros tibetanos na Índia, onde lecionam ciência básica para os monges.
Com certeza, é uma iniciativa louvável, e que pode servir como um belo exemplo para todos, principalmente pelos que se deixam cegar ao confundir Ciência com Religião.
Artigo via New York Times.
ATUALIZAÇÃO 1
Faltou acrescentar outra informação a respeito da inclinação do Dalai Lama para com as Ciências, pois ele é conhecidamente um entusiasta das neurociências, encorajando, por exemplo, pesquisadores dessa disciplina a avaliar os possíveis benefícios da meditação budista para o cérebro e a mente.
Em 2006, durante sua terceira visita ao Brasil, o Dalai Lama firmou um “convênio” com a UNIFESP (mas sem moldes definidos, por enquanto), que há mais de 10 anos investiga as bases científicas das práticas relacionadas à medicina tradicional, em especial os efeitos da acupuntura, meditação e ioga para a saúde física e mental.


ATUALIZAÇÃO 2
Os comentários dos posts sempre são importantes, mas, nesse caso, eles possuem informações complementares ao meu texto, não deixem de ler!

5 comentários em “Aprendendo com o Dalai Lama”

  1. Mas eles não tão misturando ciência e religião?
    A pergunta é: onde a doutrina budista entra em atrito com a ciência?
    Pq que eu saiba, a ciência não passa ilesa por nenhuma religião.
    Outra questão é porque o budismo é a mais aberta para a ciência? Sua doutrina ajuda ou depende apenas da simpatia científica de seu chefe maior o Dalai Lama?

  2. Em relação a essas iniciativas de ensino, não há nenhum conflito entre ciência e religião, a idéia por trás do projeto é justamente fornecer conhecimentos em Ciências para os monges, que via de regra não possuem qualquer tipo de instrução fora os ensinamentos da doutrina budista. Muitos deles não sabem princípios básicos de matemática, por exemplo.
    Acredito que esse maior diálogo entre cientistas e o Dalai Lama vem sim do fato de o mesmo ser simpático à Ciência (o que, na minha opinião, só aumenta o apreço por sua atitude). Acho que transcrever parte de sua entrevista à Revista Época em 2006 explica melhor as idéias dele, aí vão:
    ÉPOCA - O senhor defende a interação entre religião e ciência. Por que isso é importante?
    Dalai - Alguns amigos já me disseram que a ciência é assassina da religião e me recomendaram que tivesse cuidado no trato com cientistas. Mas um dos princípios budistas é analisar, investigar. Se alguma descoberta vai contra nossas escrituras, temos a liberdade de ter uma interpretação diferente (das escrituras) ou de descartá-la. Também há o campo da psicologia. A psicologia budista parece mais avançada que a ocidental, pois está relacionada com as emoções. Meu interesse pelas ciências só cresce. Há cinco anos introduzimos estudo de ciências básicas para os monges.
    ÉPOCA - Se a ciência provar que a reencarnação não é possível, o que o senhor dirá?
    Dalai - Muitos anos atrás, nós, budistas, aceitamos que, se a ciência estiver um dia 100% certa disso, nós aceitaremos. Acho que os cientistas não estão se esforçando especialmente para saber isso. No método científico atual não se pode provar ou não a reencarnação. A fé na existência de outras vidas tem de ser baseada na crença ou na aceitação da consciência, o que é muito diferente das coisas físicas. A consciência, a mente, são muito amplas e não foram completamente exploradas pela ciência.
    Realmente, é uma pessoa admirável.

  3. Corretíssimo da parte dele. Acredito que se mais líderes religiosos demonstrassem esse tipo de interesse pela ciência, há 600 anos atrás, nós já estariamos uns 900 anos além da nossa tecnologia atual, lembrando os "alquimistas" que tiveram de criar criptografias, até então indecifráveis, para esconder as suas fantásticas descobertas.

  4. Desde quando se pode provar uma ou outra área, usando a outra? Impossível! Uma se baseia na fé, enquando a outra em coisas tangíveis. Eles sabem disso. Não são ignorantes. Suas universidade e serviços de inteligência sabem disso muito bem. O que estão fazendo é tentando tirar vantagem política pra suas causas individuais ou corporativas.

  5. Nada disso, Nivaldo. O Objetivo do Dalai Lama não é comprovar que o budismo está certo através da ciência, nem o contrário. A questão é que o budismo, assim como todas as religiões orientais, possuem moldes muito diferentes daquilo que nomeamos de religião no Ocidente. Daí é que vem a confusão. O Budismo é uma religião que tem mais aspecto de filosofia do que de religião propriamente dita. Eles se concentram em aspectos que concernem mais à mente, às emoções e à reflexão do que a conceitos metafísicos, milagres e etc. O objetivo maior do budismo é o controle emocional e o cultivo das emoções positivas. Se usarmos a ciência ocidental para formar uma visão complementar a essa de investigar a mente, não teremos nenhum conflito entre religião e ciência. E é exatamente isso que essas iniciativas interdisciplinares visam.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *