A encenação da defesa de tese

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Defesas de tese. A linha de chegada de toda pós-graduação.

Pode ser mestrado ou doutorado. Pode ser com apresentação ou só entregar a tese escrita. Pode ser sozinho ou com uma banca de 6 ou até mais professores. A sua banca (o júri que avalia se você esta pronto para ostentar o título de doutor) pode ser composta só por amigos ou ter algum inimigo. (sim, cada departamento, mesmo dentro de uma mesma universidade, é diferente.)

E tem os prazos pra defender, para juntar a papelada toda, conseguir marcar a data com todos os professores da banca…

Eita estresse!

E por que chama defesa? Ora, não é óbvio? Porque o pós-graduando precisa se defender das flechadas da banca. Perguntas pontiagudas sobre o trabalho da tese ou sobre a área onde ela se encontra. Pode-se rebater com um bom escudo ou desviar no melhor estilo “Matrix” da saraivada de balas que saem das escopetas dos professores.

Ao final de tudo isto, o pós graduando será laureado com a honraria de Mestre, ou Doutor!
Que pompa!

Mas e se o candidato não estiver à altura do título?
E se fez um trabalho meia-boca, ou interpretou os dados de maneira errada, ou se ficar claro que o orientador ou outro aluno é que fizeram todo o trabalho? O que acontece?

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Acontece que ele TAMBÉM será laureado com a honraria de Mestre ou Doutor!
Que bomba!

Pois é meu amigo. Isto é o que acontece nas pós-graduações das melhores e maiores faculdades do Brasil. Não estou falando de qualquer FAFUP (Faculdade de Funilaria e Pintura) da vida não.
Isto acontece na USP, UNICAMP, UNESP, e por aí vai. Digo que ocorre pelo menos na área que eu conheço, a das biológicas.

Em poucas palavras: NÃO SE REPROVA ALUNO NAS DEFESAS!

Exceção parece ser o pessoal de exatas. Lá parece que o pau quebra solto. E parece que em outros países também é diferente (veja um relato no Brontossauros no meu Jardim). Mas nos vários departamentos que eu conheço e ouço falar, ninguém reprova mesmo.

E por que isto acontece? É a velha politicagem. Se eu for professor da banca e descer o pau no aluno que se mostra ruim, posso estar gerando mal estar com o professor que orienta este aluno, ou mesmo baixando o conceito do departamento de pós-graduação, que deixaria de somar mais um doutor formado ali. Situação chata né?

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Então o que todos os departamentos fazem? Acabam passando todo mundo! E eu já vi cada absurdo que dá até dó.
Claro que isto põe em cheque a qualidade dos doutorzinhos por aí. E também desanima saber que o meu titulo, que será conquistado com tanto suor e lágrimas, terá o mesmo valor deu um aluno medíocre empurrado com a barriga pelo sistema.

Um amigo meu uma vez disse que se colocassem um macaco no departamento “piii…” da USP, depois de 3 anos ele se forma doutor. É só alguém preencher as fichas por ele.
E eu acho engraçado que a maioria das pessoas que vão defender fica nervosa e com medo de não passar. Daí eu pergunto “você já viu ou ouviu falar em alguém que não passou?”, e sempre a resposta foi “não”. Então porque o nervosismo? Não querer fazer feio é uma coisa, mas o seu título já está garantido. Relaxa e goza.

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Por isso criei para as defesas de tese o termo “Dragão Banguela”: assusta, mas você sabe que não vai te machucar.

14 comentários em “A encenação da defesa de tese”

  1. Pois é, Rafael, eu também fico indignada. Ousei não dar 10 para um aluno em uma defesa na UFRJ e nunca mais fui convidada para bancas naquele departamento. Consequência direta? Não sei, com n=1 não dá pra concluir grandes coisas... mas acho que a gente se sentiria mais valorizado se o sistema permitisse reprovações - ou, ao menos, que impedisse alunos incapazes de sequer defender a tese. Onde eu fiz a pós, nos EUA, isso era resolvido com um comitê que se reunia a cada seis meses para avaliar o andamento do doutorado. Só ganhava o direito de defender quem tivesse sido autorizado pelo comitê - e olha que o bicho pegava! O resultado, contudo, era bom para todo mundo. Mas vai explicar para a Capes que é mais importante só aprovar as teses de mérito do que aprovar qualquer coisa dentro do prazo...

  2. Talvez essa prática explique porque no último concurso para gari tinha tanto mestre e doutor entre os candidatos...

  3. Pois é...
    E daí que voltamos praquelas velhas discussões:
    1. Orientadores devem ser responsabilizados pela qualidade da produção de seus orientandos? (EU acho que sim. Mas isso é um longo debate...)
    2. O quanto o sistema de avaliação da CAPES baseado, grande parte, em números "crus", tem levado a esse tipo de "distorções do sistema"? E, se deve haver modificações na avaliação, quais seriam? Elas são viáveis?
    3. Qualquer um é "compatível" com a pós graduação? Não é necessário haver determinados critérios e habilidades pré requisitos necessárias para o ingresso na pós? (Acho que foi essa a direção da discussão naquele post do Carlos Hotta citado acima...)
    4. Quem paga a conta de um aluno que passa anos na pós graduação e defende uma dissertação/tese medíocre, que não serve nem pra limpar o traseiro, é a gente. E eu ODEIO gastar dinheiro à tôa...
    5. E por fim, uma coisa que tem me incomodado profundamente nos últimos tempos: desde quando ter formação em qualquer coisa implica em "saber ensinar"? Veja, há todo um campo do conhecimento dedicado a estudar, verificar cientificamente, elaborar e testar métodos de ensino. Há uma literatura IMENSA e váááários métodos baseados em evidências para o ensino de quase tudo e mais um pouco. A questão é: por que - catzo - professores universitários não são treinados para ensinar? Melhorava muito a situação geral se, ao chegar na defesa, o pobre do mané tivesse aprendido alguma coisa durante a pós graduação.
    Acho que eu desviei um pouco a discussão... Sorry.
    A.

  4. Dragão banguela é ótima! 🙂
    Verdade verdadeiríssima! E super bem ilustrada também pelo relato da Suzana.
    A palhaçada já começa na escolha da banca, que raramente é escolhida de forma a ser composta por gente da área que possa debater com propriedade o trabalho do candidato e, inclusive, contribuir para a melhoria deste.
    E em muitos departamentos ainda foi abortado o sistema de notas. É só aprovado ou reprovado, pra facilitar. E como reprovado não há, vai saber que diacho os membros da banca ficam conversando um tempão depois da defesa antes de soltar logo o veredito final, né!

  5. Em 8 anos de USP, só vi dois caras sendo reprovados. Fora que, se eles tivesse sido aprovados, teria causado revolta entre os alunos, porque o nível era MUITO baixo...
    E por culpa dos alunos, não dos orientadores!
    Inté!

  6. Estou terminando meu projeto para entrar no mestrado na Faculdade de Educação da USP e ando circulando por estes meios. Conheço UM caso de uma garota que, por vários motivos pessoais (um ano cheio de desgraças), não conseguiu terminar a dissertação e perdeu o prazo pra pedir prorrogação. Reprovada.
    Eu também nunca vi alguém que tenha sido reprovado na banca. E arrisco dizer até que os orientadores preferem não chamar os "inimigos". Já vi banca só de amigos, sabe?
    Agora, uma coisa engraçada é que na FEUSP, quando alguém faz um mestrado ou um doutorado muito bem, as pessoas dizem que "foi aprovado(a) COM LOUVOR". É o #jeitinho pra dizer que esse sim foi bem. Esse valeu a pena.
    Dá pra entender?

  7. Aí dirão: mas o que é de senso comum não é comprovado cientificamente.
    Eu digo: precisa? Cadê a INOVAÇÃO disso!

  8. Defendo meu doutorado na próxima segunda e concordo em parte com vocês. Quanto a reprovação esta se dá muitas vezes na qualificação, isto se o orientador e aluno forem honestos. Comigo já aconteceu, nem passei perto da defesa. Além do mais quando se vai para defesa se está julgando todo um processo. Penso que se o orientador aceita que o aluno vá para defesa ele passa a ser conivente e, deve achar que a tese está razoável.
    Bem é isso.

  9. Quanto ao que ocorre nas universidades, de fato é verídico que 99,9% das defesas dissertativas não sejam reprovadas. Entretanto, discordo totalmente que um aluno que tenha se esforçado bastante, tenha dado o melhor de si durante dois anos ou mais, seja reprovado. É uma longa e árdua caminhada para que se chege a esta fase final, desde a seleção para o ingresso na pós-graduação, até às disciplinas nada fáceis que os alunos precisam ser aprovados, com uma determinada nota a ser atingida para manterem sua bolsa. Chega a ser um absurdo e falta de humanidade ou solidariedade por parte de quem deseja reprová-lo. Além disso, muitos alunos sofrem com os chamados "pseudo-orientadores", os quais não dão a devida atenção ao trabalho que o seu orientando está desenvolvendo, e não o auxiliam perante as suas dificuldades, obrigando o mesmo a se auto-orientar. Isto obviamente fará com que o trabalho final não saia como o desejado, e é de extrema injustiça que este aluno tenha que arcar com as conseqüências disto.

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