Como um cientista vê o mundo

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Imagem de Abstruse Goose
Dica de @uoleo

Não que o modo do cientista ver o mundo seja melhor que o de outras pessoas, mas é um modo bem interessante, que aumenta a complexidade e variedade de pensamentos possíveis quando se vê uma imagem como a do coelhinho (e aumentar a diversidade sempre é bom). Claro que um filósofo, agricultor, dona de casa ou escritor terá também camadas de percepções, que provavelmente não serão equações, mas não deixam de ser complexas e diversas. Não me arrisco em dizer qual visão é melhor.
O pior é que não posso dizer que todos os cientistas veem o mundo assim. Aliás a maioria dos alunos de pós-graduação e alguns muitos professores-doutores parecem aplicar a visão científica apenas no trabalho. Sei que a última coisa que um bancário quer é pensar em trabalho quando acaba o expediente, mas o pensamento científico, e não o trabalho científico necessariamente, é algo que pode e deve ser aplicado no cotidiano.
Afinal pensamento crítico nunca é demais.

13 comentários em “Como um cientista vê o mundo”

  1. Eu não vejo equações em tudo. Qdo penso em destrinchar a realidade fundamental, só consigo enxergar as bolinhas dos átomos de Demócrito...
    []s,
    Roberto Takata

  2. Eu faria biologia se na grade curricular tivesse, por exemplo, cálculo diferencial e integral, cálculo vetorial, cálculo numérico e estatística. Acho que isso tornaria o estudo de biologia muito mais empolgante do que ficar decorando centenas de nomes.

  3. Perfeito. É exatamente esse tipo de "exercício" que potencializa a inteligência humana, seja a tradicional ou aquela outra - que muitos hoje em dia chamam de "emocional" 🙂
    Há várias formas de se interessar e se maravilhar com o mundo, não existe "a melhor"... Mas decerto é melhor conhecer uma delas, ao menos, do que viver anestesiado ou com o cabresto tapando os olhos.
    Abs
    raph

  4. "Pensamento" científico aplicado no cotidiano? Acho muito estranha essa afirmação. Até porque ciência não é, a rigor, uma escola de pensamento ou filosofia, mas um método de investigação da natureza.
    Penso que uma das coisas lamentáveis que vivenciamos no século XX - e que deveria ter deixado lições que muitos preferem ignorar - foram as consequências desse "cientificismo". A aplicação de "princípios científicos" na criação de "sociedades científicas" mais "racionais" engendrou as experiências totalitárias do nazismo e do comunismo.
    A visão de um cientista como alguém diferente (ou especial) do resto da humanidade, um sujeito esquisito que vê o mundo como um emaranhado de equações é caricatural, simplista e equivocada.Homens de ciência são como quaisquer outros homens, talvez um pouco mais vaidosos do que média. Não são piores ou melhores. Há santos, canalhas, gente honesta e desonesta no meio acadêmico. Há tolos e sábios (sabedoria não é sinônimo de inteligência). Há cultos e incultos, os que enxergam longe e os de visão estreita.
    Há uma tendência de exaltar os cientistas como profetas modernos a indicar caminhos por onde deve rumar a humanidade. Alguns cientistas quando falam são ouvidos por muita gente através de livros, entrevistas, vídeos por conta de sua fama ou pela cátedra que ocupam. Mas muitas vezes ele está apenas a emitir opiniões e juízos bastante pessoais sobre assuntos que extrapolam a sua seara. Seu ponto de vista, portanto, é tão científico quanto o de qualquer não-cientista. Porém, não são poucas as vezes onde uma fala, uma reflexão de um grande mestre da ciência quando discorre sobre política, religião, sociedade, ou qualquer outro assunto, é tratada como mostra do "pensamento científico", apesar de outros colegas pensarem de modo diferente.
    A ciência ilustra, desvela, esclarece, mas ela, por si só, nada ou pouca coisa têm a dizer sobre valores, moral, ética, sentido, angústias humanas e questões outras que fogem do escopo das ciências ou que não se prestam a investigação pelo método científico. Essas são algumas das razões pelas quais tenho reservas à aplicação do "pensamento" científico no cotidiano. Bem, é isso. Abraço e parabéns pelo blog.
    PS: também não identifico "pensamento crítico" com ciência, acho que são coisas distintas. Isso tem mais a ver com capacidade de obervação, conhecimento e análise. Nada disso é privilégio exclusivo de quem se dedica à ciência. Tenho certeza que o amigo deve conhecer alguém que, embora cientista, não seja tão bom assim quando se trata de análise e crítica de problemas que fujam da sua seara.

  5. Mario,
    Desculpe, mas espero q entenda q sou um biólogo, não um filósofo, e espero q veja a coisa de minha perspectiva PESSOAL (sim, o blog é um espaço de opinião).
    O pensamento crítico é parte sim do meu pensar, e ele foi gerado e moldado pelo meu treinamento científico, que reconheço q pode nao ser um "escola de pensamento", e aqui a sua crítica pode ter razão (aliás gostaria de uma definição aqui), mas o meu ponto era mostrar camadas de percepção do mundo. Por isso escrevi q é uma das visões possíveis, e não passível de ser julgada, em mérito, com outros pontos de vista. Deixei claro que não há uma visão melhor q outra.
    Ver o mundo com equaçoes é caricatural sim, mas este é um CARTOON, e a sua função é justamente com a caricatura gerar reflexão. E aqui eu me identifiquei sim com a provocação, que obviamente está longe de retratar uma "realidade" (defina realidade ou verdade como quiser). Um dos objetivos do blog é justamente mostrar q cientistas são pessoas comuns que apenas pensam o mundo com influencias específicas que geram uma identidade de pensamento (sempre com pitadas de ceticismo, crítica, empirismo, estatística, etc). Mas esta é só mais uma identidade de pensamento, assim como filósofos, místicos, e outros tem as suas que claro, podem compartilhar algumas características entre si.
    Concordo totalemnte q a ciencia nao faz ou justifica julgamento moral. Mas não entendo porque comentar sobre isto sendo que o post nao entrou neste mérito (talvez pelo termo "pensamento" designar necessariamente uma moral?).
    E deixei claro também que nao são todos os cientistas que tem esta identidade de pensamento.
    A opinião de um cientista dentro de sua especialidade deve ser considerada de modo diferente de quando este se refere a outros temas, claro. Mesmo assim, ele tem o direito e o dever de se expressar como qualquer outro cidadão. (Ainda mais hoje em dia quando celebridades televisivas tem muito mais influencia q os cientistas, feliz ou infelizmente.)
    Agora, é ingenuidade acreditar q o cientificismo gerou o nazismo. Esse foi sim apropriado pelo nazismo e comunismo, assim como dogmas religiosos sempre foram usados em outras ocasiões: para justificar e ocultar outras reais e mais complexas intenções. Aqui eu realmente discordo de você.

  6. Prezado Rafael,
    Entendo perfeitamente ser um blog um espaço de opinião, mas se é de opinião, e aberto a comentários, então também é um lugar para o debate. Debate que nos enriquece e nos aproxima da... verdade (sei como essa palavrinha tem sido desgastada ou até banida pela "pós-modernidade" - digamos assim - mas eu ainda acredito nela). O debate e a discussão madura e respeitosa é uma forma excelente de confrontarmos nossas opiniões, certezas, impressões e preconceitos. Assim, embora meu comentário possa ter sido um pouco ácido, não foi minha intenção criticá-lo dessa forma ou atacar sua opinião pessoal. Por sinal, concordo com você que a os cientistas deixam mesmo as equações e outros aspectos de sua vida profissional no ambiente de trabalho. Mas discordo da sua afirmação (que parece contradizer a anterior) sobre "pensamento" científico aplicado ao cotidiano.
    Deixando a coisa mais clara, a minha estranheza com a aplicação desse "pensamento" em questões cotidianas vem do fato da imensa maioria delas ter muito pouco a ver com ciência ou o método científico. Moral, ética, política foram citadas por mim como exemplos de questões cotidianas importantes e frequentes onde o método científico ou uma atitude científica têm muito pouco a acrescentar. Ora, talvez o amigo estivesse se referindo ao uso da razão, da capacidade de análise, da observação, atributos necessários a quem faz ciência, mas aplicados de forma distinta, seguindo uma metodologia que pouco tem a ver com questões outras que fazem parte da vida das pessoas, e para as quais a "atitude" científica tem muito pouco a contribuir.
    Amigo, embora você diga não ser filósofo, a sua afirmação do pensamento científico em questões cotidianas é filosófica. Um outro ponto: cientistas não são pessoas que pensam o mundo com "ceticismo". Cientista não estão a "pensar o mundo", na minha modesta opinião. Esse é uma atividade identificada com a filosofia. A ciência, com seu aspecto fragmentado, é conduzida por especialistas com campo muito restrito de estudo, ou não é? Estão pois, a pensar menos o mundo, e mais sobre as nervuras da asa de um lepidóptero, ou coisa parecida. E fazem isso com diversas concepções sobre o o mundo, sobre a vida, com valores que são próprios de cada um e gerados por uma história de vida, a qual, inclui, também, a ciência. Assim, penso ser complicada a idéia de uma identidade de pensamento entre os homens de ciência. Questões como empirismo ou estatística fazem parte do exercício do método, ou seja, do fazer ciência. Mas isso não faz de todos os cientistas grandes pensadores sobre o mundo, sobre a problemática humana, sobre a sociedade, sobre política, religião, moral e outras questões do cotidiano que interessam a todos os mortais, cientistas ou não. Ceticismo e materialismo são atitudes muito mais "filosóficas" do que científicas, amigo, pelo menos no meu ponto de vista, pois aqui também não falo como filósofo e grande conhecedor dessas questões. Estou aqui tentando aclarar certas coisas que me pareceram misturadas nessa recomendação do pensamento científico a ser aplicado no cotidiano.
    Bem, um ponto que você destacou foi a ingenuidade da minha "crença" de que o cientificismo (mais outra atitude que é mais uma escolha pessoal ou filosófica do que uma identidade de pensamento entre aqueles que se dedicam a ciência)engendrou o nazismo e o comunismo. Ora, meu amigo, acho que a questão é menos a minha ingenuidade ou o seu - desculpe - desconhecimento dos fatos e da história, sem os quais não se pode construir um juízo sobre a questão. Vejamos.
    O amigo certamente conhece Stephen Jay Gould, paleontólogo e evolucionista já falecido. Também deve saber que ele era um grande divulgador da ciência, com vários livros e artigos publicados. Dentre os livros de Jay Gould, há um particularmmente interessante, chamado Pilares do Tempo, onde ele trata de ciência, religião e filosofia (não sei se o amigo já leu). Pois bem, nesse livro, Jay Gould cita exemplos bem documentados do uso da ciência em coisas do "cotidiano", enfim, para definir o que é "bom", "mau", "desejável", "indesejável", "útil" ou "pernicioso" numa sociedade (os termos entre aspas não são do Gould, mas uma forma que encontrei para sintetizar a questão). Ao discorrer sobre a história do famoso caso Scopes (1925), onde um professor de escola secundária do estado do Tennessee ensinou a teoria da evolução em escola pública, apesar de uma lei estadual proibir o ensino. Tal episódio deu origem a uma ação de inconstitucionalidade. O professor John Scopes passou para a história como um misto de mártir e herói da ciência que confrontava as "trevas" do obscurantismo. Stephen Jay vem nos lembrar que as coisas não foram bem desse jeito, e que no episódio Scopes há um fato intrigante. O promotor do caso, William Jennings Bryan, conhecido político populista e com idéias progressistas foi o promotor do caso Scopes. Bryan passou para a história como um carola reacionário de mente estreita e pensamento obscuro que tentava barrar o avanço das ciências ao se contrapor ao ensino da evolução. Gould questionou como um político como Bryan, identificado com uma série de idéias progressistas "virou a casaca" a se empenhou na causa dos "carolas"? Gould acredita que duas obras foram fundamentais para explicar a atitude de Bryan. Uma delas foi um livro chamado Headquarters Nights (de 1917), do entomólogo, evolucionista e professor universitário Vernon Kellog. Headquarters Nights é o relato de Kellog a respeito da época em que fez parte de uma missão humanitária na Bélgica durante a I Guerra Mundial. Kellog jantava com oficiais do estado maior alemão (os EUA ainda não tinham entrado na guerra), muitos dos quais eram professores universitários. A conversa que transcorreu durante o jantar deixou Kellog estarrecido. Seus colegas cientistas e outros oficiais eram darwnistas sociais (repare, meu caro, que estamos falando da I Guerra) que defendiam o domínio ou extermínio de povos ou de sua soberania. Os alemães tinham de impor sua cultura "superior" aos "povos inferiores", pois assim eram as leis da natureza. Kellog, um pacifista, voltou aos EUA recomendando que o país entrasse em guerra contra a Alemanha. Ora, onde está a tal "identidade de pensamento baseada no ceticismo, no empirismo e na estatística" entre os cientistas? (Essa concepção, a meu ver, faz da ciência algo parecido com uma seita.)Kellog pensava diferente de seus colegas de academia alemães. E por que pensava? Por que era um cientista melhor, mais competente? Certamente que não. Os valores pessoais de Kellog, sua visão particular de mundo, via com horror aquele darwinismo social do estado maior alemão. Mas repare que seus colegas não se horrorizavam com aquilo.
    Um outro ponto importante, destacado por Gould é o teor do livro adotado por John Scopes na escola secudário. O livro chamava-se A Civic Biology, de autoria de George Hunter. No livro de Hunter há um capítulo chamado “O parasitismo e seu custo para a sociedade – O remédio”, que trata do "custo" das pessoas deficientes para a sociedade:
    “Se tais pessoas fossem animais menores, provavelmente os mataríamos para evitar que se reproduzissem. A humanidade não permite isso, mas temos a possibilidade de separar os sexos nos asilos ou outros lugares e de evitar de diversas maneiras o casamento e as possibilidade de perpetuar uma raça tão baixa e degenerada.”
    Também do livro de Hunter, é a seguinte passagem:
    “Na atualidade existem na Terra cinco raças ou variedades humanas... negro ... raça malaia... índios americanos... raça mongol ou amarela... e, finalmente, o melhor tipo, os caucasianos, representados pelos habitantes brancos e civilizados da Europa e Estados Unidos.”
    Acredito que a força dessas idéias errôneas vêm sim do cientificismo, ou seja, da ciência vista como panacéia, como a nova tradição que vem substituir uma outra, antiga e obscura (religião e filosofia). Só que religião e filosofia procuram responder questões que fogem ao escopo da ciência, questões do cotidiano, questões ligadas a valores, moral, sentido. (Foi por isso que as citei no meu primeiro comentário). Essa crença (sim, é crença mesmo) nos poderes da ciência, esse otimismo exagerado se não engendrou o totalitarismo científico (ele não tem uma só raiz), o justificou.
    Acho que vale a pena também citar um outro personagem, Ernest Haeckel, o pai da ecologia. Algumas das idéias de Haeckel o tornariam um sério candidato ao banco dos réus em Nuremberg (mais uma vez, pergunto, de que serviu toda a ciência e inteligência de Haeckel nessa questão particular? O que a sua "criticidade científica" tem a ver com o fato dele ser um racista?). Em sua coluna, o geneticista Sérgio Pena destaca a importância de Haeckel no jovem Adolf Hitler:
    "Paralelamente, Haeckel desenvolveu o monismo, uma filosofia segundo a qual política, economia e ética nada mais são do que biologia aplicada. Esses conceitos atraíram um jovem austríaco que fez notória carreira política colocando-os em prática. Seu nome era Adolf Hitler. Em 2004, o historiador americano Daniel Gasman, em seu livro chamado As origens científicas do Nacional Socialismo, destacou Ernst Haeckel como influência principal. "
    Por que deram ouvidos a Haeckel? Por que ele foi tão influente em questões políticas e sociais? A crença otimista em relação à ciência e suas maravilhosas descobertas não confundiram um pouco as coisas? Acho que sim. Tendo ou não uma identidade de pensamento, o fato é que essa identidade que você apontou (ceticismo, estatística, empirismo) é algo que é aplicável no exercício da ciência, no trabalho, como você destacou no texto, mas nada pode fazer em relação a preconceitos, prepotência, arrogância e desvios de caráter. O cientificismo não foi apropriado pelo nazismo e pelo comunismo. Cientistas renomados construíram os alicerces dessas tragédias, meu caro e o fizeram exatamente no exercício da sua crítica e de seu pensamento, tido como "científico", palavra que muitos acham que é sinônimo de incontestável, infelizmente.
    Bem, meu caro, peço desculpa pela extensão do comentário. Gostaria de continuar a conversa, afinal, acho que é pela exposição de idéias de pontos de vista que nos aproximamos da verdade. Abraço.

  7. Rafael, cá estou de novo.
    Primeiro me desculpe pelos erros de continuidade no meu último comentário, estava sonolento quando o redigi.
    Gostaria de destacar um livro interessante sobre ciência e filosofia. Chama-se Imposturas Intelectuais: O abuso da ciência pelos filósofos pós-modernos (autores Alan Sokal e Jean Bricmont). Trata do uso sem fundamento de teorias científicas por alguns filósofos e pensadores pós-modernos em seus trabalhos. Nesses casos, temos aquilo que você falou, a apropriação de idéias científicas, utilizando-as para fundamentar uma reflexão filosófica. Nada contra, se o conhecimento científico for utilizado para ilustrar e enriquecer o debate. Nâo foi o caso na obra desses pensadores.
    Há uma passagem do livro onde os autores falam sobre o ex-presidente da antiga Tchecoslováquia, Vaclav Havel. Eles citam uma observação de Havel, que ilustra uma tendência pós-moderna, a crença de que a ciência está em crise (penso que a crise se deve mais às pretensões não correspondidas do cientificismo, ou seja, do otimismo em relação ao potencial da ciência, considerado como a única forma válida de conhecimento):
    "A queda do comunismo pode ser vista como sinal de que o pensamento moderno - baseado na premissa de que o mundo é objetivamente reconhecível, e que o conhecimento assim obtido pode ser absolutamente generalizado - chegou a uma crise final."
    Sokal e Bricmont discorrem a respeito da fala de Havel, dizendo:
    "É o caso de perguntar por que um renomado pensador como Havel é incapaz de estabelecer a distinção elementar entre ciência e a injustificada pretensão dos regimes comunistas de possuir uma teoria "científica" da história humana."
    Bem, o pecado de Havel é repetido diuturnamente em nossas universidades, particularmente nos cursos das chamadas ciências humanas. A pretensão científica ao qual se referem os autores não é apenas dos regimes, mas do marxismo, uma filosofia que foi e é considerada por muitos não apenas como ciência, mas como "a" ciência. Ceticismo, estatísticas, materialismo, estão todos lá na obra de Karl Marx. Por sinal, Marx pensou em dedicar O Capital a Charles Darwin, tal o impacto que teve ao ler A Origem das Espécies. Karl Popper já desmontou as falsas pretensões científicas do historicismo marxista baseado no materialismo dialético. Mas o fato é que o prestígio das ciências foi (e ainda é) utilizado para sustentar reflexões sobre temas outros que têm pouca ou nenhuma relação com o objeto de estudo de especialistas. O que eu percebo é uma tendência entre alguns cientistas (não filósofos) de extrapolar suas conclusões numa área, generalizando-as. Uma tendência ao reducionismo, à simplificação, o que leva a criação de sistemas e conceitos que são ofertados como formas de interpretação da sociedade e do ser humano. Edward Wilson é um exemplo atual dessa postura, a "sociobiologia" das formigas poderia ser aplicada às sociedades humanas.

  8. Klaus,
    Curso de Biologia não é ficar decorando centenas de nomes. Não mais do que ficar decorando centenas de regras de diferenciação e nomes como divergente, tensor, distribuição de Poisson, regras de l'Hospital, condições de continuidade, etc, etc.
    E *tem* estatística em Biologia e em muitos tem cálculo - integrais e derivadas.
    []s,
    Roberto Takata

  9. Acho importante este problema levantado...e também acho insatisfatória boa parte do que se fala sobre isso - enfrentemos de frente a questão - filosofia, arte e ciência são modos de pensamento, não há privilégio da filosofia sobre o pensamento - acho que conhecem a tradição filosófica e sabem que Platão ao cunhar o termo filosofia não restringe o pensamento, mas dá a ele uma consistência especifica, singular. A filosofia pensa por conceitos - cogito cartesiano, o cogito kantiano, mônada de leibniz, duração de Bergson - por outro lado a ciência pensa e não precisa da filosofia necessariamente para pensar do seu modo, ela estabelece suas variáveis, suas funções, seus observadores parciais e cria mundos possíveis, na mesma tônica a arte pensa por sensações...alguém dúvida que há mais pensamento em Platão do que em uma opera de Berg? (o grito de Lulu) Há blocos de sensação, afectos que não se confundem com sentimentos individuais e perceptos que não se confundem com percepções empiricas ordinárias - quem não teve lindas visões ao ler Proust? ou terríveis, ao ler Kafka ou Kleist - é o pensamento trabalhando - no cinema isto é evidente - pensar por imagens - Godard um grande pensador. Pensar é uma potência que ultrapassa nossa sensibilidade cotidiana, são visões e audições de mundos que a mera opinião não alcança. Se a filosofia, a ciência e a arte têm algo em comum é a relação que estabelecem com o Caos - é preciso sempre estar no limite das variabilidades que nos violentam para sermos criadores nestas disciplinas (disciplina não tem outro sentido que disciplinar o Caos, dar consistência ao conceito, dar referência as funções, dar composição as sensações) - quantos são filósofos? poucos, porque não se trata de reproduzir idéias, mas de inventá-las, é um trabalho dificil, solitário e povoado - poucos são cientistas e conseguiram criar idéias a partir da observação do mundo e torcer novos universos - olhem mendel, darwin...como constituem outros modos de olhar para o homem a partir de suas investidas vitoriosas sobre o Caos - notem que nada disso deve a opinião, são suas inimigas, lutam para destituí-la, contra a universalização de um mundo visto de uma perspectiva pobre - olha as cores que van Goh descobre/inventa - colorista maravilhoso e o que falar dos interlúidos de Virgina Woolf, os livros DH Lawrence, Henry Miller, Michaux - é de opinião que eles vivem? Claro que não...eles perduram pelas novas sensações que fazem brotar no mundo...isto separa a boa literatura da má literatura feita de opiniões pessoais - quando trabalhamos com criação deixamos de falar em nome próprio, trabalhamos na dimensão impessoal, onde crio zona de vizinhança com mundos moleculares - Pensar é sempre perigoso...não preciso falar de todos os casos em que o plano falha e entramos em linhas de abolição...
    Ciência, arte e filosofia não são comunicativas, debatedoras, reflexivas - são criadoras e devem insistir em suas linhas e assim por ressonância vão atravessando as fronteiras e se afetando mutuamente - não quero saber o que Jacob acha de política, nem o que Derrida acha que sabe sobre a célula - não é nesta dimensão em que eles criam, mas na dimensão de suas disciplinas! Opinião temos demais, nos faltam criadores!

  10. Nahual,
    obrigado pela abertura da discussão para o q realmente interessa q é criar e delimitar a ilimitada possibilidade das tres empreitadas humanas, arte, ciência e filosofia, com seus pesos equivalentes.
    Reforço para o leitor Mário que a ressonância entre as tres q DEVE existir, mesmo pq não há como não existir. Ela é rica e não é livre de ruído. Me espanta quando diz que o pensar cientifico, ou chame como quiser, não deve estar presente no cotidiano. Mas há como evitar? Idéias de Darwin podem influenciar o pensamento filosófico e artistico, e isso ocorre em todas as direções, vindas da arte e da filosofia. Mas me parece que suas críticas tem mais a ver com juizo de valores, mostrando como estas interações podem ser ruins. Mas não dá pra se discutir no nível dos valores.
    O prestígio da ciência é um valor q a sociedade acabou dando a ela, alçar a filosofia acima dela apenas para equilibrar o balanço entre elas é apenas outro erro.

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