Prometo que eu não fiquei maluco. Ainda. Primeiro: esse post não é para todo mundo. Se você não curte ciência a ponto de discutir a discussão, tchau e até o próximo.
Eu tive um professor de Matemática no cursinho que antes de começar os exercícios mais difíceis no final de cada aula, dizia: “Esse é só para os coreanos. Não vai prestar Exatas, Medicina? Quer Letras, Biologia? Pode sair, vai jogar truco que você ganha mais. Só quero o povo cabeçudo aqui!”.
Voltando ao assunto: apesar de a experiência em geral ter sido ótima, algumas partes do livro Letters to a Young Scientist do biólogo-lenda-extraordinaire Edward O. Wilson me incomodaram muito. No calor da confusão, resolvi listar alguns pontos e fazer algo bem 2009: criar um debate com os amigos do SBBr e da rede de divulgação científica BR.
Tenho certeza que as opiniões de vários deles, mais especializados e estudados em teoria científica e evolução do que eu, acrescentarão muito à discussão.
Vamos começar: em negrito e aspas, a citação do livro, em Inglês para vocês não questionarem a minha tradução. Meu comentário seguirá abaixo e fiz questão de não consultar nada antes de escrever, para fomentar a discussão. I want feedback, people!
1) Após testar experimentalmente duas hipóteses sobre o comportamento de retirada dos mortos de colônias de formigas, Wilson comenta:
“I then came up with another idea: insects of all kinds that scavenge for a living, such as blowflies and scarab beetles, find their way to dead animals or dung by homing in on the scent. And they do so by using a very small number of the decomposition chemicals present. A generalization of this kind, widely applied, with at least a few facts here and there and some logical reasoning behind it, is a theory. Many more experiments, applied to other species, would be required to turn it into what can be confidently called a fact.”
Fiquei espantado com a afrouxada que Wilson deu no conceito de “teoria” em Ciência. Uma teoria científica não é definida quando existe um amplo corpo experimental e de observações que, respeitando o método científico, confirmam uma generalização e possibilitam a teoria? Para mim, “alguns fatos aqui e ali” é uma descrição muito pobre dessa complexidade.
2) “… when research is still incomplete, the idea is a theory. If the theory is proved wrong, it was not necessarily also altogether a bad theory. At least it will have stimulated new research, which adds to knowledge.”
Novamente, o problema com a definição de teoria científica. Mas nesse caso, é importante comentar a segunda frase do trecho destacado. Ao contrário do que foi escrito por Wilson, quando uma teoria científica é provada errada, incompleta ou qualquer outra coisa, o que acontece é um grande, enorme movimento no meio científico. Dizer que “enquanto a pesquisa está incompleta a ideia é uma teoria” é leviano, o que significa “pesquisa incompleta”? E uma teoria que é uma ideia, na verdade é uma hipótese, ou não cairia com base em uma única pesquisa. Ou estou errado?
3) “What remais a theory still is that evolution occurs universally by natural selection, the differential survival and successful reproduction of some combinations of hereditary traits over others in breeding populations. This proposition has been tested so many times and in so many ways, it also is now close to deserved recognition as an established fact.”
Vou acrescentar outro trecho, pois a discussão converge:
“Does biology also have laws? I have been so bold in recent years as to suggest that, yes, biology is ruled by two laws… The second law of biology, more tentative than the first, is that all evolution, beyond minor random perturbations due to high mutations and random fluctuations in the number of competing genes, is due to natural selection.”
Longe de mim querer discutir evolução por seleção natural, o meu problema foi com o “universalmente” e com “toda evolução… é produto da seleção natural”. Vou deixar a minha falta de conhecimento específico no tema dirigir a conversa: pensando tanto em macro quanto em microevolução, processos de deriva genética, epigenética, radiação adaptativa e evolução molecular são considerados parte da seleção natural?
Com a certeza de já ter colocado conteúdo demais para uma discussão, termino por aqui. Conto com a participação de vocês e, mais importante: divirtam-se!
Talvez exista um valor linguístico e pra sociologia acadêmica debater a diferença entre o uso da palavra hipótese, teoria e lei. Mas na prática cotidiana do laboratório a distinção entre hipótese e teoria é nula. Rotineiramente as pessoas usam "hypothesis", "theory", "claim", "belief", "current understanding", como um mesmo termo. Acho que ficar tentando definir o que é cada coisa é um pedantismo inútil.
"Ao contrário do que foi escrito por Wilson, quando uma teoria científica é provada errada, incompleta ou qualquer outra coisa, o que acontece é um grande, enorme movimento no meio científico."
Essa revolução Kuhniana é uma raridade. Mas só nessa semana eu disprovei 3 mini-teorias no meu laboratório e isso não afetou ninguém mais (uma delas afeta um colega de laboratório).
Acho que temos que primeiro levar em conta o contexto do livro. Não li, mas pelas resenhas ele não é para discutir a biologia como ciência e teoria científica. Não é desculpa, mas acho que deve ser considerado.
Na minha opinião ele pode ter escorregado na hora de simplificar os conceitos. Com certeza teoria não é só um punhado de evidências e sabemos que a seleção natural não explica toda a evolução.
Prefiro o posicionamento do Mayr sobre o caso. No livro dele "Biologia, Ciência Única" ele até critica duramente o Wilson pelo seu reducionismo, de querer conciliar a Biologia e a física. Talvez por isso o Wilson é tão enfático em citar "leis da Biologia". O que eu acho que não é o caso.
Oi Shridhar, obrigado pelo comentário! Bom saber que o "Round 1, FIGHT!" foi levado a sério hahaha 🙂
Vou discordar em partes do que você escreveu. Sim, é claro que no dia a dia do laboratório "teoria" e "hipótese" se confundem. Eu tento evitar, mas acontece.
Mas quando se está escrevendo um paper, preparando apresentação para um congresso ou aula, é claro que a gente precisa usar o "dicionário científico" e nesse caso teoria, hipótese e lei são conceitos completamente distintos. E você concorda, tanto que usou hipótese corretamente em seu post http://www.entropicando.com/2013/02/notas-sobre-ciencia-e-pratica.html?m=1 não é?
Mais: meu apontamento no livro do Wilson não pretendia gerar uma discussão semântica, mas uma conversa sobre a existência ou não de um furo conceitual importante em um livro de cunho científico. Não é estranho ver erros de conceito na estrutura da Ciência justamente no capítulo em que o autor se propõe a explicá-la para o leitor?
Abraço e obrigado pela contribuição!
Eu não acho que discutir sobre esses termos é um "pedantismo inútil". Muitos dos divulgadores de ciencia rapidamente notaram que, para combater a retórica criacionista, algum tipo de aprofundamento epistemológico é necessário ("teoria em ciência é..."). E eu acho que se vamos colocar o pezinho na piscina epistemológica, então podemos dar uma mergulhada mais profunda.
O que com certeza não podemos fazer é ir e voltar nas definições de forma displicente. "Evolução é uma teoria, e teoria é o máximo. Mas é tão corroborada que é um fato. Mas dai tem o fato evolução e a teoria que explica ele". Toda essa retórica (que não necessariamente está na boca de uma pessoa só) é inconsistente.
Acho que o ponto mais simples é: se vamos ignorar epistemologia, que a ignoremos por completo. Mas se vamos falar sobre ela, que falemos direito.
É, acho que o Wilson tem dado umas escorregadas frequentes ultimamente. Achei isso triste no início porque ele sempre foi um ídolo meu, mas deve ser positivo. Devo estar atingindo minha adolescência intelectual, não dizem que é na adolescência que caem os ídolos paternos?
Decepcionante a fragilidade da definição de teoria que ele dá. Aliás, alguém esconda esse livro dos manés do 'Evolution is just a theory'. Em outros momentos ele deu mancadas homéricas na tentativa de dar ênfase e didatismo a suas ideias, por exemplo na frase título da entrevista à Veja que ele afirma que 'o Homem é o fruto evolutivo da luta do bem contra o mal'. Medo!
Em suma, li o post doido para discordar de você e praticar aquela arte marcial conhecida por retórica, Gabriel, mas não deu. Sorry.
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