Astrologia
A astrologia tem grande aceitação do público em geral, oferecendo formas de auto-conhecimento, possibilidades de prever acontecimentos e de ganhar importância no universo. Pode-se dizer que é comum hoje em dia acreditar em algo assim, mesmo que seus pressupostos mais básicos sejam desprovidas de qualquer evidência e não sejam coerentes com o conhecimento produzido até hoje na física e na astronomia em particular.
Uma possível explicação para o sucesso da astrologia é que ela oferece uma forma de preencher certas dificuldades inerentes à condição humana como a insegurança diante da instabilidade do mundo, assim como o medo e a necessidade de controle das situações cotidianas. Mas os mais prováveis motivos pelos quais a astrologia tem tanta aceitação pública é porque ela faz alegações genéricas o suficiente para que nunca pareçam estar erradas; suas alegações não costumam ter implicações muito negativas para a vida das pessoas; e seu acesso é fácil e barato.
Além disso, como Carl Sagan descreve em seu livro O Mundo Assombrado pelos Demônios, “as divulgações escassas e malfeitas da ciência abandonam nichos ecológicos que a pseudociência preenche com rapidez”. Alcançando mais rapidamente o público em geral e fazendo alegações que naturalmente despertam sentimentos profundos de admiração, as pseudociências tem seu sucesso garantido na população. Se a ciência investisse tanto em divulgação quanto a pseudociência, talvez a astronomia hoje fosse mais popular que a astrologia.
Enquanto uma prática ritualística, excêntrica e exótica que algumas pessoas gostam de preservar para si mesmas, a astrologia não demonstra ser um problema maior. Quando ela ganha poder e representatividade em forma de grupos de astrólogos que alegam ser a astrologia um conhecimento científico, eficiente, preciso e faz uso dessa roupagem para vender mapas, livros, peças sagradas, aparelhos e bugigangas, ganhar lojas, colunas em jornais, colunas em revistas e estimula o pensamento místico, irracional e não-crítico, além de informar errôneamente as pessoas sobre o que nós realmente sabemos hoje sobre os corpos celestes e suas propriedades, é um dever ético de qualquer cientista esclarecer falsas apresentações e mostrar o que pode ser dito sobre as proposições astrológicas.
Cito aqui o pedaço de um texto escrito sobre astrologia no blog “Crônica da Ciência”, que pode ser acessado nesse link:
Por uma razão igualmente desconhecida, não é a fecundação o momento determinante. Parece que o útero materno é capaz de proteger o feto das forças astrológicas, mas uma vez que se dê o nascimento, haverá uma tendência vitalicia para pertencer a um dos 12 tipos de esteriotipos descritos (e que por sorte correspondem mais ou menos `a personalidade dos deuses romanos que deram o nome a planetas), e uma tendência perpetua para ter um dia parecido com o das pessoas todas que nasceram quando o sol estava naquela posição. Quer seja por cesariana ou por parto natural.
Aparentemente podemos dispensar facilmente qualquer tipo de força conhecida, uma vez que da disposição das pessoas na sala de partos não é importante. Eu explico: A gravidade seria a unica plausivel. Mas apesar da massa do cirurgião e ajudantes resutarem em campos graviticos muito maiores que o de Plutão ou Urano, por estarem muito mais perto apesar de serem muito mais pequenos, parece que Urano e Plutão influenciam as personalidades e o destino estas pessoas não.
Uma empreitada que estuda a posição entre os corpos celestes e se diz científica não pode negligenciar o fato de que o eixo de rotação da terra se alterou consideravelmente de dois mil anos pra cá, o que tem consequências diretas para a posição do sol em relação às épocas do ano em que as pessoas nascem.
O resultado disso é uma imprecisão considerável até mesmo em dizer qual o signo de alguém, pois com a mudança do eixo de rotação da terra, diferentes signos deveriam ser dados para datas que antes se consideraria um mesmo signo sempre. Para dar um exemplo de forma simplificada, algumas pessoas que acham que são sagitarianas porque nasceram entre 22/11 e 21/12 na verdade deveriam ser consideradas escorpianas, pois no momento em que nasceram a posição do sol ainda era referente à esse outro signo.
Além disso a astrologia não consegue explicar de forma satisfatório porque irmãos gêmeos idênticos podem se diferir tanto em suas personalidades, carreiras e vidas amorosas, algo comum para quem conhece irmãos gêmeos. Uma argumentação que já ouvi é que a diferença de segundos do nascimento de um em relação ao outro já torna tudo diferente.
Mas se um milésimo de segundo é suficiente para determinar diferenças tão grandes entre as pessoas, como é possível qualquer tipo de padrão ou previsibilidade de qualquer coisa? Como librianos têm um padrão de personalidade se um pode ter nascido várias semanas depois do outro, e um simples milésimo já é capaz de tornar as pessoas completamente diferentes?
E se, como alguns propõem, não existe essa uniformidade toda, e cada pessoa terá seu mapa astral, suas tendências e preferências individuais… que tipo de ciência propõe a previsão de carreira profissional, vida amorosa e personalidade de cada uma das 6,8 bilhões de pessoas no mundo, sem regularidades ou padrões? Outra questão instigante é porque os astros não influenciariam os animais, as plantas, as moléculas das substâncias ou os minérios. Seria isso algum resquício medieval do antropocentrismo?
Uma falha maior ainda da astrologia pode ser observada a partir da psicologia. Um psicólogo que teve a oportunidade de fazer um bom curso de graduação em uma boa universidade já poderá ter noções suficientes de variáveis e condições que influenciam a formação dos indivíduos e o comportamento deles. Se torna incompátivel e inútil o estudo ao qual se propõem a psicologia do desenvolvimento e a psicologia da personalidade se apoiamos um determinismo astrológico para o comportamento e a personalidade dos seres humanos.
Para que estudar como a personalidade de um indivíduo se constitui dentro de um contexto sócio-econômico-cultura-familiar-histórico se a posição dos planetas já pode nos fornecer quais serão as predisposições e tendências de pessoas que nasceram em uma determinada época do ano? Existe alguma diferença se um indivíduo nasce em um contexto familiar desfavorecido financeiramente ou não? Indivíduos “aquarianos” sempre serão viajantes natos, amantes da liberdade, excêntricos e intuitivos, a despeito de nascerem no interior do nordeste brasileiro, tendo que trabalhar em plantações de cana o resto da vida, ou numa família burguesa de São Paulo, tendo tudo do bom e do melhor? O acesso à educação de qualidade não intefere no sucesso profissional de uma pessoa?
Essas variáveis são fundamentais para entender o processo de formação psicológica das pessoas e são corroboradas por dados empíricos, diferentemente da variável astrológica. O determinismo astrológico é um desdém ao estudo científico do ser humano que uma boa parte psicologia se propõe a fazer.
Quando um cientista diz que astrologia não é coisa séria ele muito provavelmente não está apenas “sendo cabeça fechada”, apesar de essa ser a argumentação favorita para contra atacar qualquer crítica. O problema está em como o campo, que se diz científico, demonstra a validade do que propõe – e quando um grupo de pessoas defende uma teoria que não explica nem prevê nada de forma consistente, além de não ser corroborada por dados empíricos relevantes (visto que as previsões astrológicas não convergem nem com testes psicológicos de personalidade bem estabelecidos), é papel do cientista concluir que não se trata de coisa séria, assim como quando um editor de uma revista científica não aprova a publicação de um artigo, mesmo de um pesquisador em uma área mais consolidada como a física, por ele estar mal escrito, com afirmações mal elaboradas, não embasadas ou métodos muito furados e mal pensados.
A crítica e o rigor são armas que os cientistas usam para avaliar qualquer alegação, independente de ela vir de um astrólogo, físico, matemático ou biólogo. O problema não é com a astrologia em específico, e sim com a fraude e o logro em nome da ciência, mesmo que dentro da própia ciência. Qualquer cientista que preza sua profissão tem o dever ético de batalhar pela maior seriedade e rigor do seu campo profissional, visto que essas qualidades são vitais para o que um cientista se propõe a fazer.
Discussão - 8 comentários
Ficou ótimo o post, mas achei que você ia citar aqueles experimentos onde é dado aos participantes uma única descrição de um signo, mas é dito a eles que foi feito todo um mapa astral e talz, que a descrição é individual, etc.
Comparar a influência gravitacional do cirurgião e ajudantes médicos à dos corpos celestes foi um golpe certeiro, e o contra-argumento dos gêmeos idênticos, decisivo. No entanto devemos considerar constatações, por parte de alguns estudos da Psicologia Diferencial, sobre a similaridade acima da média encontrada entre gêmeos monozigóticos (algo em torno de 40 ou 50%). Pensando bem, como explicar que gêmeos dizigóticos compartilham bem menos traços de personalidade do que os gêmeos idênticos? Os astrólogos estão em uma empreitada complicada!No mais, excelente texto. Vou encaminhar para meus colegas de especialização.
Jéssica, legal vc tocar nesse ponto, eu me esqueci de remeter um link à textos anteriores em que eu já havia falado de astrologia, mas de pseudociências de um modo geral. Se te interessar, da uma olhada nesse texto que eu escrevi anteriormente em que descrevo esse experimetos do efeito forer, ou efeito barnum, aos quais vc se referiu.http://cienciaumavelanoescuro.blogspot.com/2010/07/porque-as-pseudociencias-persistem.htmlum abraço,André
Obrigado pelo comentário Daniel.Interessante esse dado que vc apresentou, não conhecia. Essa similaridade é relacionada à traços de personalidade apenas ou a carreira profissional, vida amorosa, estilo de vida (algo como "destinos parecidos")?Para arriscar alguma explicação sobre pq dizigóticos compartilham menos traços que gêmeos idênticos os astrólgos vão ter que sujar as mãos com um pouco de interdisciplinariedade e estudar genética. estou curioso pra saber qual pérola um astrólogo soltaria pra explicar isso.um abraço,André
Bom, os dados a que tenho acesso restringem-se a traços de personalidade e inteligência. No vídeo que coloquei há alguns dias no meu blog, Steven Pinker comenta alguns hábitos e preferências compartilhados entre gêmeos, embora eu acredite que alguns deles possam ser "frutos do acaso". No entanto, agora há pouco eu estava lendo um texto do Flynn (aquele do "Efeito Flynn")onde ele sugeria que nossas propensões genéticas fazem com que busquemos certas ocupações e ambientes e não outros, onde p. ex. gêmeos monozigóticos separados ao nascer poderiam, por serem altos e ágeis (algo determinado em grande parte pelos genes), ambos se enveredar por carreiras desportivas. Não é menos possível que isso também se aplique a ocupações laborais, intelectuais em geral e de lazer.Um abraço!
Essa explicação para as similaridades dos gêmeos me parece muito mais razoável, coerente e provável do que se reportar à posição do sol ou de planetas do sistema solar quando alguém saiu do útero da mãe. Sou grande fã do Pinker, vou ver o vídeo que vc colocou no seu blog. Valeu!um abraço,André
André:Esta fixe. Mas olha, o texto é de facto meu, mas os pontos de argumentação não são. Vêm dos links que eu deixo e são de um astronomo. Ha outra coisa que podemos falar. A astrologia podia dizer que os astros actuam indirentamente sobre as pessoas. Através das estações do ano, geoposicionamento - clima, humidade etc, que isso estaria correcto para algumas previsões.O problema é que essas previsões eles não fazem. Ou coisas relacionadas com o que é estudavel. Em vez disso preferem falar de tretas mediadadas por outras tretas. De tal modo que são os primeiros a não dar o exemplo do ciclo dia/noite, (o mais básico do básico), para exemplificar a influencia dos astros. Preferem manter-se num campo do apelo à ignoracia e do misticismo. E não me parece que isso possa ser completamente por acaso, afinal eles pensam naquilo dia e noite! Mas se aceitassem a acção indireta, passavam a não ter maneira de dizer aquelas previsões idiotas sem sentido e caiam no campo da psicologia na parte das personalidades.Afinal o estudo de como o ambiente afecta a personalidade é cientifico. E repito, aí eles não querem entrar. So pensei nisto depois de escrever o post, mas penso que é importante.Um abraço.
Valeu pelas ressalvas João!de fato, para um ramo que se diz científico eles deixam de explicar muitas coisas decentemente. Propõem a ação direta, mas não se preocupam com como isso acontece. Isso fica muito distante do que seria uma postura científica. E se arriscar em uma ação indireta seria muito difícil para eles (teriam que estudar muito de física e de psicologia, um pouco de interdisciplinariedade para variar, acho que não os agradaria).um abraço,André