A psicologia da UnB precisa de atenção, mas “só se for agora”

Nada como salas maquiadas e defasadas para começar bem um semestre... (Foto: Mariana Costa/UnB Agência)

As aulas dos alunos de psicologia na Universidade de Brasília (UnB)  tiveram o seu início adiado este semestre por uma semana até agora. O motivo é que a situação da psicologia nesta instituição está grave, muito grave.

Os professores do Instituto de Psicologia (IP) tiveram 60 salas alocadas para darem suas aulas provisoriamente, por conta de obras no Instituto Central de Ciências da UnB. Muitas das salas estão com: janelas quebradas, buracos nas janelas e nas grades (por onde pessoas podem entrar pela sala a qualquer momento), vestígios de urina e fezes nas salas, problemas na iluminação e na fiação, falta de cadeiras para o número de alunos das disciplinas, falta de ventilação em salas pequenas no subsolo do prédio… a lista é grande. Neste vídeo é possível ver um pouco desta situação frustrante com a qual estamos convivendo.

A diretoria do IP alertou inicialmente que poderia adiar o início do semestre por conta da falta de condições mínimas para trabalhar – e foi exatamente o que aconteceu, pois poucas das mudanças necessárias foram efetivadas até o momento pela administração da universidade, de acordo com a diretoria do IP.

Um dos 52 buracos nas grades das nossas salas... (Foto: Mariana Costa/UnB Agência)

Não estamos com problemas apenas nas salas de aulas: a situação não é nada boa para os nossos laboratórios, logo no tipo de lugar aonde teoricamente deveríamos formar nossos melhores pesquisadores e profissionais. Temos laboratórios paralisados por conta de problemas na ventilação que já se arrastam há anos e que impedem diversos pesquisadores de implementar seus projetos de pesquisa.

E mesmo quando temos dinheiro de edital para reformar nossos laboratórios, como é atualmente o caso, não conseguimos – há anos que existe verba e espaço destinado para a reforma de um laboratório de psicologia experimental na UnB, mas que, pela  falta de eficácia por parte da administração, não iniciou a reforma até agora e está travando o trabalho e a produção científica de cerca de 30 pesquisadores do instituto (que, caso pudessem contar atualmente com o laboratório, provavelmente estariam com um índice de produtividade radicalmente superior).

A comunidade do IP se mobilizou e organizou uma semana inteira de atividades visando conscientizar os docentes, discentes e a comunidade geral quanto à falta de condições mínimas de trabalho com a qual estamos sofrendo. Diante do barulho, a reitoria fez promessas e relatou estar empenhada na solução dos problemas. Hoje, no fim da semana, o balanço feito por professores e alunos das mudanças que foram implementadas não foi animador: mais da metade das salas ainda se encontra com muitos dos problemas identificados, por mais que alguns dos problemas mais simples tenham sido “arrumados.” Professores e alunos foram de sala em sala ontem (15/03) e registraram dados evidenciando que as mudanças estão exageradamente lentas.

Contrariando estes dados, membros da administração afirmam que todas as exigências feitas já foram cumpridas e os professores estão em condições plenas de ministrar suas aulas. Alguns chegaram a sugerir que nós já tínhamos as condições básicas e que estávamos “pedindo demais” ou pedindo “condições demasiadamente ideais.” Seria reconfortante (e, literalmente, confortável, principalmente durante as aulas) se eles estivessem falando a verdade, mas as evidências coletadas (que aparentemente não foram uma preocupação deles) indicam exatamente o oposto.

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O vídeo acima mostra uma das muitas manifestações do IP nesta semana, um pouco antes de entregar mais um ofício à administração da UnB com as exigências para que as aulas possam ser iniciadas em condições mínimas de trabalho.

A campanha de boas vindas neste semestre adotada pela UnB é o “só se for agora.” É uma pena para nós, estudantes de psicologia nesta instituição, que este lema não seja a filosofia adotada pela administração na resolução dos nossos problemas urgentes, mas é exatamente isso o que pedimos: apoio “agora” e efetivo ao instituto que abriga um dos melhores cursos de psicologia do Brasil, que certamente não recebe este status apenas pela “ótima” estrutura que possui ou pelo apoio que recebe da administração universitária, mas principalmente pelo talento, pela paixão e pela dedicação de gerações de professores e alunos com uma paciência e perseverança de deixar qualquer um impressionado.

Só se for... agora?

Não há nada de madura em uma instituição que se auto-intitula madura e, ao mesmo tempo, age de maneira amadora com profissionais que elevam o seu nome nacionalmente e internacionalmente em uma área do conhecimento tão importante quanto a psicologia. Madura mesmo seria uma instituição de ensino superior pública, que almeja reconhecimento internacional, direcionar esforços maciços e imediatos para garantir as condições básicas de um de seus institutos mais reconhecidos, sem que este precisasse adiar o início de suas aulas para receber alguma atenção explícita, enviar mais de 60 documentos solicitando ações urgentes que não foram seguidas de ações concretas e mobilizar alunos e professores para exigir algo que “já deveria estar lá”, enquanto estes poderiam estar estudando e produzindo conhecimento.

O nosso instituto precisa de atenção urgente, mas “só se for agora“, pois todos já estão cansados de ouvir promessas com prazos sistematicamente remarcados (ou simplesmente descumpridos) e com sonhos e esperanças envenenadas pelo “passa-ou-repassa” burocrático que tanto permeia os nossos cotidianos atualmente na UnB. Os professores só querem condições para trabalhar e os estudantes só querem condições para estudar, então, prezados administradores, da para “ser pra agora” ou isso é pedir demais?

Discussão - 8 comentários

  1. Isso me lembra muito a situação do Instituto de Psicologia da UFBA, em Salvador. Infelizmente nossas universidades federais estão sucateadas, deixadas na desorganização, enquanto os estudantes e professores se matam para tentar trabalhar.

  2. Ileno Costa disse:

    Caro André,
    Parabéns pelo site, pela manifestação genuina e por estar atento à nossa Psicologia. Acabo de publicar seu email (e blog) em nosso site.
    Obrigado pelo engajamento.
    Prof. Ileno Costa
    Vice-Diretor do Instituto de Psicologia, UnB

  3. André Rabelo disse:

    Caro Ileno,

    muito obrigado pelo seu comentário e por me alertar para a publicação no site. Agradeço também pela divulgação do blog! Espero que nessa semana tenhamos alguma evidência de que nossas demandas principais poderão avançar como gostaríamos nos próximos 15 dias.

    Abraço!

  4. André Rabelo disse:

    Marcus,

    pois é, parece que essa situação é comum em outras universidades do Brasil, o que demonstra o enorme amadorismo com o qual esta questão tem sido tratada até o momento pelos nossos governantes.

    Abraço!

  5. Mariana Costa Queiroz disse:

    Prezado André,

    Sou graduada em Psicologia pela PUCRS, mas convivi muito com alunos da UFRGS e da UFSPA. No Sul, a Psicologia e a Psiquiatria são áreas muito desenvolvidas e as universidades excelentes. Acontece que eu agora moro em Brasília e cheguei aqui já pensando em fazer pós na UnB, mas é desanimador vê-la nesse estado, até porque ela é referência na nossa área em Brasília...

  6. André Rabelo disse:

    Prezada Mariana,

    obrigado pelo seu comentário! Eu já ouvi falar muito bem da psicologia ai no sul, em especial do curso da UFRGS. É uma pena mesmo a situação, eu entendo a sua frustração, principalmente pq, como vc disse, somos um dos cursos de psicologia de referência. Essa fama é justa, principalmente por causa dos profissionais que o curso dispõe, mas as condições de trabalho estão ainda em descompasso com a qualidade dos professores. A depender da sua área de interesse, acho que vale a pena se envolver em uma pós aqui sim, mas você já precisa entrar conhecendo as possíveis dificuldades que enfrentará... espero que os próximos dias tragam algum motivo para termos esperança de que as coisas vão melhorar.

    Abraço!

  7. Prof. Fernando Capovilla, USP disse:

    A UnB em 1983 e 1984 era uma pérola preciosa. Tenho as melhores lembranças daqueles tempos tão bons, lembranças vívidas, como se fossem de ontem mesmo. Mas surpreendentemente já se passaram 30 anos que estou fora de Brasília, primeiro em Philadelphia, depois em São Paulo. Fico imaginando o que teria acontecido com aquela memorável e amada UnB. É preciso um esforço concentrado para restaurar a força, o brio e o brilho dessa universidade de que sempre tanto nos orgulhávamos. A UnB merece o melhor. Temos gratidão profunda e amor imenso por ela.

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