Sete razões para buscar um treinamento quantitativo avançado
No nível da pós-graduação, métodos quantitativos são provavelmente o único treinamento comum entre as subdisciplinas da psicologia; sua sequência de treinamento estatístico no primeiro ano provavelmente incluiu alunos de psicologia biológica, social, clínica, cognitiva, do desenvolvimento e da personalidade. Enquanto todos nós somos treinados no básico da análise de variância (ANOVA) e regressão múltipla, construir uma ciência psicológica mais forte exige que melhoremos as ferramentas analíticas dos psicólogos. Aqui estão sete razões convincentes do porquê todos deveriam buscar um treinamento adicional:
1. Você está limitado pelas ferramentas analíticas que possui. Como um pesquisador, sua visão está limitada por como você consegue pensar sobre dados e utilizá-los. Processos psicológicos são complexos e raramente se ajustam claramente em grupos. É doloroso assistir acadêmicos limitados à ANOVA, forçando pessoas e processos dentro de grupos para ajustá-los a uma “forma analítica” inapropriada. Ferramentas de análise de dados e inovação teórica são complementares: aprender ferramentas analíticas sofisticadas, novas, expande o modo como você pode pensar sobre perguntas. Tente se imaginar projetando uma casa sem uma régua ou um compasso, ou de fato construindo uma casa sem um piso. As ferramentas que você possui influenciam os seus resultados; ferramentas melhores produzem resultados melhores. Inovações teóricas frequentemente surgem diretamente de avanços metodológicos e prêmios Nobel são mais frequentemente oferecidos por contribuições metodológicas do que teóricas. Não se limite; permaneça atualizado com avanços nas ferramentas de análise de dados.
2. A realidade é complexa. Nem precisaria dizer que o comportamento e os processos mentais são complexos, e psicólogos desejam entender e modelar essa complexidade. Ferramentas analíticas sofisticadas te deixam mais perto de modelar o nosso mundo multivariado e hierárquico. Já que diversas variáveis operam dentro e fora das pessoas, faz sentido modelar relacionamentos entre múltiplas variáveis simultaneamente. A análise multivariada de covariância (MANCOVA), análise de trajetórias e modelagem por equações estruturais estão entre as várias ferramentas úteis para esse propósito. O comportamento humano e os processos mentais ocorrem dentro de uma variedade de contextos (e.g., comportamentos ocorrem dentro de uma pessoa, pessoas dentro de grupos, pessoas e grupos dentro de culturas), e nós podemos modelar ao invés de ignorar a variância de contexto nos dados. Com o advento da modelagem multinível (para uma introdução, veja Luke, 2004), pesquisadores são capazes de investigar fenômenos em multiníveis, incluindo, mas não limitado a diferenças individuais e comportamento, pertencimento compartilhado de grupo, variáveis agregadas sócio-culturais e políticas, variáveis ecológicas e interações entre variáveis de diferentes níveis. Por exemplo, entender como um imposto progressivo se relaciona com o bem-estar exige que nós também levemos em consideração a riqueza das nações nas quais as pessoas vivem, a renda pessoal e as interações entre essas variáveis preditoras. Variáveis que residem dentro e entre pessoas e contextos contribuem unicamente e coletivamente para os fenômenos psicológicos; nós alcançamos uma compreensão mais precisa e detalhada do mundo abraçando, ao invés de ignorando, a sua complexidade.
3. Uma conclusão é apenas tão boa quanto a sua análise estatística. Testes e modelos estatísticos são acompanhados de pressupostos e esses pressupostos são violados mais frequentemente do que nós gostaríamos. Se pressupostos são violados, nossas conclusões são mais ou menos inúteis: lixo para dentro, lixo para fora. Ferramentas analíticas avançadas ou menos convencionais permitem frequentemente mais flexibilidade ao lidar e ajustar pressupostos de análises convencionais. Quando problemas envolvendo a distribuição dos dados surgem, as estatísticas não-paramétricas serão suas amigas. Se existe razão para suspeitar da não-independência das observações, como dados de pares díades, modele os seus dados com modelagem multinível. Você possui alguns sujeitos com sessões faltando ou que deram respostas em momentos irregulares em seu estudo de levantamento ou programa de tratamento? Se sim, você pode utilizar a flexibilidade de análises de dados longitudinais ao invés da abordagem tradicional e mais restritiva da ANOVA de medidas repetidas. Técnicas como a modelagem de curva latente de crescimento permitem que pesquisadores modelem o nível e a taxa de mudança ao longo do tempo. Tais técnicas eliminam a necessidade de remover participantes com dados omissos em um ou mais momentos no tempo ou assumir que dados longitudinais de diferentes participantes foram coletados ao mesmo tempo.
4. Aprendizagem agora promove aprendizagem posterior. Sem a prática continuada, é improvável que você irá reter tudo o que foi ensinado a você em um curso quantitativo avançado. Entretanto, a base dessa educação tem a ver com aprender a aprender. A introdução e a exposição inicial te dão o conhecimento para ler artigos, capítulos e livros inteiros posteriormente por conta própria. Seus cursos deveriam reforçar bons hábitos de dados também. Em outras palavras, um treinamento quantitativo avançado te dará “pernas para ficar em pé” quando você precisar aprender uma nova habilidade ou descobrir como melhor analisar um banco de dados. Expandir o seu treinamento quantitativo formal irá te tornar um acadêmico mais independente.
5. Ferramentas analíticas avançadas encorajam produtividade na pesquisa. Nós nem sempre temos recursos para coletar grande quantidades de dados. Se você estiver em uma faculdade o universidade com menos recursos para coletar dados, ferramentas analíticas mais sofisticadas podem te ajudar a se manter ativo na pesquisa. Várias organizações (e.g., Pew Research Center, General Social Survey) oferecem acesso livre a grandes bancos de dados longitudinais. Usando ferramentas analíticas avançadas (e.g., modelagem por equações estruturais, modelagem multinível, modelagem de curva latente de crescimento), pesquisadores podem testar eficientemente hipóteses multifacetadas sem coletar dados. Conduzir uma meta-análise também contorna a necessidade de coletar os seus próprios dados; em vez disso, você pode contrastar e combinar os resultados relatados por outros para melhor estimar os tamanhos de efeito e examinar os relacionamentos, moderadores e padrões teóricos abrangentes das variáveis. Embora o acesso a softwares de pacotes estatísticos têm sido tradicionalmente uma barreira, pacotes poderosos e de acesso livre, como o R (veja R Core Team, 2013), estão mudando a academia (veja esse vídeo).
6. Você pode ser um melhor consumidor de pesquisas. Eu já discuti os benefícios do treinamento quantitativo avançado para produtores de pesquisa, mas esse treinamento também te tornará um melhor consumidor de pesquisa. Os tipos mais comuns de publicação na ciência psicológica são artigos empíricos de revistas, e você deveria não apenas ler eles, mas também deveria ser capaz de entendê-los. Na medida em que ferramentas analíticas avançadas se tornam mais facilmente acessíveis aos psicólogos, a familiaridade com essas ferramentas será necessária para entender e interpretar os resultados das análises relatadas. Se você não for capaz de avaliar os resultados por si mesmo e formar sua própria interpretação dos dados, você contará apenas com a interpretação dos autores.
7. Ser habilidoso com ferramentas analíticas te tornará um colega ou colaborador desejável. Não deveria ser uma surpresa que psicólogos acadêmicos com ferramentas analíticas sofisticadas são mais valorizados. Todos nós queremos colegas em nosso departamento que possam explicar técnicas, ensinar cursos de métodos avançados e dar feedbacks e conselhos sobre análise de dados. Possuir essas ferramentas te tornará um candidato de trabalho mais atraente e um colaborador mais valioso também. Você pode ser convidado a participar de projetos interessantes ou até mesmo ser adicionado como um consultor em um projeto com auxílio financeiro para pesquisa por causa da sua habilidade em técnicas analíticas particulares.
Finalmente, você deveria explorar os cursos disponíveis para você dentro e entre departamentos. Cada vez mais, instituições voltadas para os negócios e departamentos de educação estão oferecendo cursos avançados de interesse a psicólogos. Workshops de treinamento especializado são também oferecidos em vários campus (e.g., o “Stats Camp” da University of Kansas), em convenções (e.g., APS-SMEP Methodological Workshop Series), e online. É importante estar ciente desses recursos se você deseja ampliar o seu treinamento quantitativo. Com a era dos “grandes dados” (“Big data”) sobre nós, adicionar técnicas analíticas sofisticadas à sua caixa de ferramentas se mostrará muito valioso.
Agradecimentos
Eu gostaria de agradecer a Ana Bridges e William Levine pelos seus comentários e discussões inteligentes sobre treinamento quantitativo, e também a Allison Skinner pelo seu feedback a uma versão anterior desse artigo.
Referências e leituras recomendadas
Aiken, L. S., West, S. G., & Millsap, R. E. (2008). Doctoral training in statistics, measurement, and methodology in psychology: Replication and extension of Aiken, West, Sechrest, and Reno’s (1990) survey of PhD programs in North America. American Psychologist, 63, 32-50.
Greenwald, A. G. (2012). There is nothing so theoretical as a good method. Perspectives on Psychological Science, 7, 99-108.
Little, T. D. (2013). Longitudinal structural equation modeling. New York, NY: Guilford Press.
Luke, D. A. (2004). Multilevel modeling. Thousand Oaks, CA: Sage Publications.
Oishi, S., Schimmack, U., & Diener, E. (2012). Progressive taxation and the subjective well-being of nations. Psychological Science, 23, 86-92.
R Core Team. (2013). R: A language and environment for statistical computing. [Computer software]. Retrieved from http://www.R-project.org.
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Fonte: Observer
Autor: John C. Blanchar
Tradutor: André Rabelo
Discussão - 2 comentários
Não sei como é na psicologia, mas na biologia, o numero de pessoas sem o mínimo de conhecimento analítico é impressionante.
E não acho que seja um problema não saber fazer contas ou analisar coisas, mas muita gente sequer tem o conhecimento para interpretar dados quantitativos, o que sempre me pareceu mais facil do que interpretar dados qualitativos.
Fabio,
na psicologia a situação é lastimável. Predomina uma posição de relativismo epistêmico que qualquer coisa serve como evidência para qualquer coisa. Cada um escolhe oq é melhor para si acreditar. Uma tristeza isso.
O pior que o argumento mais utilizado é "o ser humano é muito complexo e abstrato para ser expresso em números, não é como nas ciências naturais, exatas". Aí eu me pego lendo um artigo sobre modelagem estatística na decodificação de inputs sensoriais e penso "o que nesse nosso universo é 'exato'?"
Enfim... também não é tão incomum pessoas que abominam estatística, literalmente, virem pedir ajuda para amigos e para mim, que dominamos essas técnicas pelo menos minimamente, para resolver problemas dessa natureza em estágios e coisas semelhantes. Um dia eles não vão ter quem ajudar e o peso será sentido.