Vou fazer uma pausa nas discussões sobre as manifestações aqui no blog para falar de outro assunto atual ao menos na minha timeline do Facebook: partos. Muitas amigas minhas estão grávidas ou tiveram filhos recentemente. Além das fotos dos bebês lindos e dos barrigões redondões, vez ou outra as conversas faceboquianas acabam em parto. Ouço muitas dúvidas e até ideias equivocadas sobre o assunto. Por isso, gostaria de ajudar as mulheres a debaterem a importância de um parto normal e saberem quando a cesárea é necessária.
De modo geral, a cesárea é uma cirurgia indicada quando a mãe ou o bebê correm risco em um parto normal. Alguns exemplos de indicação: quando o bebê “não vira”, está com a bundinha para baixo (isso porque, geralmente, o maior diâmetro do corpo do bebê é a cabeça, assim, pode ser que ele fique entalado com metade do corpo preso); quando a mãe não tem dilatação suficiente para o bebê sair; ou, quando há o sofrimento fetal (o ritmo cardíaco do bebê é instável, ele faz cocô dentro da barriga da mãe, etc).
Na maioria dos países desenvolvidos, o parto normal é feito quando não há esses riscos – leia o texto a epidemia da cesárea. E, por que o sistema de saúde deles prefere o parto normal? Além de ser mais barato por lá, ele traz muitos benefícios para a mãe e para o bebê. Abaixo, listo algumas dessas vantagens baseadas em pesquisas científicas para ajudar a desmitificar esse tipo de parto. Quando há a opção de escolha, por que não ser favorável ao parto normal – ou parto natural, se preferir (aquele em que se faz a menor intervenção possível como não anestesiar a mãe)?
Seguem algumas observações sobre o parto normal (se quiser saber mais, clique nos respectivos links):
- Um levantamento da Organização Mundial da Saúde (OMS) indicou que o risco de morte é maior para mulheres submetidas a cesárea sem indicações médicas do que para aquelas em que esse procedimento cirúrgico é realmente necessário. O risco de internação era de 6% entre as mulheres submetidas a cesáreas sem indicação médica e de apenas 0,6% nas que fizeram parto normal. Os casos de transfusão de sangue e de bebês prematuros internados em unidades de terapia intensiva também eram mais comuns quando as cesáreas eram eletivas.
- Quando a taxa de cesáreas de um hospital ultrapassa a faixa que vai de 10% a 20% do total de partos, aumenta muito o risco de complicação para a mãe e o bebê. É maior a probabilidade de a mulher morrer durante o parto, apresentar sangramento grave ou adquirir uma infecção que exija internação no setor de tratamento intensivo. Já a criança corre mais risco de nascer com menos de 37 semanas (prematura) por erro de cálculo médico, de morrer durante o nascimento ou na primeira semana de vida e de necessitar de cuidados intensivos.
- Embora o risco de morrer durante uma cesariana seja muito menor do que foi quase quatro séculos atrás, quando esse procedimento começou a ser feito em mulheres vivas – antes fazia-se a cesárea apenas após a morte da mãe para salvar a vida do bebê –, os partos cirúrgicos dispensáveis contribuem para manter a mortalidade materna brasileira em níveis bem superiores aos de países desenvolvidos como o Reino Unido.Estudos internacionais apontam que perto de cem mulheres perdem a vida a cada 100 mil cesáreas, cinco vezes mais que o parto normal.
- Alguns recentes estudos mostram que a mãe possivelmente passa para o filho a microbiota intestinal (antiga “flora intestinal) no parto normal. As pesquisas indicam que a nossa microbiota intestinal tem influência sobre o nosso peso. Portanto, se a mãe for magra, poderá passar para o bebê a sua microbiota e a criança tenderá a ser magra também.
- Recém-nascidos de cesáreas apresentaram risco cinco vezes maior de hipertensão pulmonar persistente do recém-nascido. “A redução do número de partos cesáreos poderia prevenir muitos casos graves de hipertensão pulmonar persistente do recém-nascido”, segundo o artigo.
- Dos 42 casos de pacientes com diagnóstico de endometriose (doença na qual células de dentro do útero migram para a parte externa dele) em cicatriz, 37 eram de endometriose em cicatriz de cesárea. De acordo com este estudo, a endometriose em cicatriz cirúrgica é incomum, entretanto, tem diagnóstico inicial fácil se o quadro clínico for conhecido.
- Segundo um estudo sobre incontinência urinária, é controversa a teoria de que eventos obstétricos e traumas no assoalho pélvico representariam menor risco para mulheres submetidas ao parto cesárea do que para aquelas ao parto vaginal. A prevalência de incontinência urinária dois anos após parto vaginal e cesárea foi, respectivamente, de 17% e 18,9%.
- De acordo com outra pesquisa, complicações hemorrágicas ocorreram em 1,2% dos casos de cesárea e em 0,8% dos casos de parto via vaginal, sem diferença significativa entre esses grupos. A endometrite (inflamação ou irritação do endométrio, membrana que reveste a parede do útero) ocorreu em 0,4% dos casos de cesárea e em 0,1% dos partos por via vaginal. Dois casos de infecção puerperal (que afeta o aparelho genital feminino no período pós-parto) evoluíram para a retirada no útero no grupo cujo parto foi cesáreo. Não foram constatadas associações entre as complicações maternas e o tipo de parto no período analisado.
- Pode-se afirmar que a redução temporal da mortalidade perinatal (do feto ou recém-nascido) observada nessa pesquisa não sofreu influência da taxa de cesárea. Parece que a redução da taxa de mortalidade perinatal dos partos realizados e supervisionados seja mais uma relação direta da melhora do atendimento neonatal do que da via de parto.
- A duração da amamentação, segundo estudo, foi similar entre os nascidos por parto vaginal e cesariana emergencial. Os nascidos por cesariana eletiva (marcada antes de acontecer o trabalho de parto) apresentaram um risco três vezes maior de interromper a lactação no primeiro mês de vida, após controle de fatores de confusão. Este aumento de risco não persistiu até o terceiro mês de vida.
Vale ressaltar que as condições da mãe e do bebê devem ser avaliadas pelo médico durante o acompanhamento da gravidez e, claro, durante o parto. Essa acesso a médicos e a recursos de qualidade garantem um parto mais seguro, seja normal ou com acesso necessário à cesárea. Tendo esse apoio, cuide da sua saúde para ter um parto e um bebê saudável e… Parabéns!
Obs.: Não sou médica. O que escrevo é de acordo com relatos de médicos, com o que li e com o que apurei para fazer matérias sobre o tema. Portanto, doutores, me corrijam se eu estiver errada.
Mais dados:
Alguns dos riscos associados à cesárea são provavelmente relacionados com o contato com bactérias protetoras do canal do parto. Essas bactérias são um fator protetor para a saúde, sobretudo contra alergias. Provavelmente por isso, crianças nascidas de parto vaginal tem menor risco de doença celíaca (alergia ao glúten), rinite e asma. No caso da bronquiolite, curiosamente, o índice é 10% pior para cesarianas eletivas (marcadas).
Outro dado interessante é a clara associação entre a via do nascimento e obesidade aos 3 anos: o índice dobra nos nascidos em partos cesáreos (15% para 7,5% dos nascidos em parto vaginal). Essa relação persiste mesmo controlando-se outros fatores. Outra doença mais comum entre crianças que nascem de cesárea é a diabetes tipo 1 (aumento de 20% do risco) – que seria explicado pela mesma hipótese, da exposição à flora vaginal normal da mãe, que favorece o equilíbrio natural do sistema imunológico.
Complicações respiratórias no pós parto também são mais comuns na cesárea. No parto normal, a passagem pelo canal vaginal comprime o tórax do bebê e estimula a saída do líquido amniótico para que o ar possa entrar. Cerca de 12% dos bebês que nascem de cesariana eletiva (a cesárea marcada) vão para a UTI. No caso dos bebês que nascem de parto normal, o número cai para 3%”, segundo Renato Kalil, obstetra do hospital Einstein.
Do: http://www.pediatriaintegral.com.br/a-incrivel-epidemia-da-cesarea-inventada/
Escrevi sobre a decisão que uma mulher deve tomar sobre parto cesária. Pode ser interessante... http://scienceblogs.com.br/eccemedicus/?s=cesarea
Karl,
Bem que eu ia procurar você, doutor, antes de escrever este post. Mas eu estava muito ansiosa para fazer uma listagem com pesquisas (e olhe que nem peguei as principais). 😉 Vou ler o seu e divulgar!
muito bem isis! quando sofrer bullying, me chama que a gente parte pra porrada juntas! ando há tempos querendo escrever um texto sobre alguns artigos que li sobre o assunto - essa coisa da microbiota eu acho o máximo - mas não consigo achar tempo. quem sabe agora me animo!
Maria,
Eu te chamo para pegarmos eles na saída!! Rs Escreva, sim! Enquanto eu escrevia, lembrava desse artigo que você comentou...