O que Regressão Linear Múltipla nos ensina sobre perder peso?

Este é um post de Matemática e não de Nutrição!

Sugerimos que antes de qualquer alteração na sua rotina para perder/ganhar peso, procure um especialista.

A alguns anos precisei aprender sobre Regressão Linear Múltipla para ajudar um mestrando em Engenharia. Foi uma aprendizagem interessante e razoavelmente eficaz para tratar o problema que ele pesquisava (Estações de Tratamento de Esgoto). Contudo, há mais neste método do que propriamente os cálculos e valores que nos permitem estimar modelos lineares para o comportamento de funções desconhecidas a partir de seus dados observáveis. Digo que há uma aplicação de bastante interesse para a maioria de nós que se preocupa em ficar acima do peso.

Para começar, vamos ver exatamente o que a Regressão Linear Múltipla faz (de forma beeeeeem sucinta e genérica).

Temos um registro de medições de diversos eventos/equipamentos/ações… e supomos que exista uma função matemática que seja linear e que explique a partir desse conjunto de “variáveis” que medimos, a saída do sistema. Assim, para cada variável que registramos, conseguimos estipular o quanto ela influencia de fato a saída do sistema (Calma, talvez a conversa esteja um tanto complicada até o momento, mas se você chegou até aqui, parabéns! As coisas ficarão mais contextualizadas a partir de agora).

Daremos um nome para nosso sistema, ele se chamará “ganho de peso”. Nossa intenção por exemplo, pode ser que esta saída seja próxima de zero (ou seja, mantemos nosso peso como está).

Então, começamos a listar uma série de 26 ações dentro de nossa rotina das quais acreditamos influenciar o sistema “ganho de peso” (criativamente chamarei-as das 26 letras do alfabeto).

a, b, c, d, e, …, x, y, z.

Se este sistema dependente destas ações puder ser expresso de forma aproximada como um modelo linear, então, para cada ação, deve haver um fator de influência representado por um número real αi, onde i é um número Natural entre 1 e 26, assim:

α₁a + α₂b + α₃c + α₄d + α₅e + … + α₂₄x + α₂₅y + α₂₆z + ERRO = ganho de peso

Esse “ERRO” representa a própria imprecisão do modelo. Assim, se o ERRO for 0, isto significa que encontramos realmente um modelo linear que explica nosso sistema. Embora nos exercícios mais simples isto ocorra, na prática (ou nos exercícios mais divertidos) o ERRO será sempre diferente de 0 por mais preciso que seja o modelo e por mais que o sistema se adeque a ele. No caso do ERRO ser muito grande, isso é um indício de que o modelo em questão não é bom, e talvez outras variáveis devam ser incluídas.

Se tivermos em mãos as medidas destas 26 variáveis (por exemplo, variável a, “quantas vezes por mês comemos chocolate”, variável b, “quantos minutos por semana praticamos atividade física moderada”, …) e soubermos como varia o “ganho de peso”, conseguimos determinar (se houver um modelo linear) quais seriam os valores de α₁, α₂, α₃, α₄, α₅, … ,α₂₄, α₂₅, α₂₆. Assim:

  • se algum αi for próximo de 0, sua ação parece pouco influenciar o ganho ou perda de peso;
  • se algum αi for menor que 0, sua ação parece levar à perda de peso;
  • se algum αi for maior que 0, sua ação parece levar ao ganho de peso;

Ok, você pode estar pensando que já entendeu tudo, que é só reduzir os αi maiores que 0, certo? Errado! Isto seria uma mera instrumentalização da Matemática e o tiro poderia muito bem sair pela culatra.

O primeiro passo no caso, é verificar se os dados fazem algum sentido para sua rotina. Por exemplo, eu raramente como chocolate e quase todo dia estou andando de bicicleta, mas se os dados coletados forem por exemplo entre o período de Natal e Ano Novo, provavelmente eu não estarei andando de bicicleta nestas datas e comerei bem mais chocolate do que geralmente como.

Isso quer dizer, que observar a situação em que as medições foram coletadas é estritamente necessário para entender a influência das variáveis no sistema. Se os dados foram coletados por exemplo, num período específico de chuvas em que eu não esteja andando de bicicleta, isto não chega a representar a rotina, mas sim um contexto atípico e que não deve ser considerado. Em resumo, períodos atípicos (viagens, feriados, festas, ou mesmo enquanto nos recuperamos de alguma doença ou ferimento) não devem ser considerados nestes modelos, são casos que fogem à regra e tentar fazê-los regras não viria a representar o sistema em sua maioria.

Ok, não considerando as datas de exceção, podemos simplesmente tirar/reduzir tudo que tiver um αi maior que 0, certo? Errado! Pois precisamos considerar que existam variáveis relacionadas, ou seja, ao tirarmos/reduzirmos a variável “a”, podemos não ter o seguinte sistema:

α₂b + α₃c + α₄d + α₅e + … + α₂₄x + α₂₅y + α₂₆z + ERRO = ganho de peso

Em vez disso, ter o sistema:

β₂b + β₃c + β₄d + β₅e + … + β₂₄x + β₂₅y + β₂₆z + ERRO = ganho de peso

Onde β é um número real.

Isso significa que ao forçarmos a modificação de uma variável, a influência que cada uma das restantes exerce sobre o sistema pode se alterar. Por exemplo, ao cortar da minha rotina meu copo diário de achocolatado, isto reduziu minha disposição para andar de bicicleta, também me fez aumentar a quantidade de comida nas refeições e a frequência com que consumo chocolate. Ou seja, tirar esta variável que tinha um αi maior que 0, proporcionou um aumento em outros αi de modo que a saída do sistema também aumentou.

Mas isto só pode ser percebido, se após alterar uma das variáveis, mantivermos a observação sobre como o sistema está se comportando. Neste caso, após algumas semanas sem o achocolatado, percebi que o ganho de peso aumentava e entendia o que estava gerando esta alteração. Desse modo, achei por bem retomar o achocolatado na rotina.

Se perceber isto com a alteração de uma variável já pareceu um tanto complexo, quem diria se alterassemos várias de uma só vez. Não teríamos realmente uma compreensão clara do que possa estar influenciando o sistema. Daí fica a importância deste processo de ajustes ser lento e com um acompanhamento constante.

Espero que tenha gostado dessa discussão assim como eu gostei de ter aprendido um pouco de Regressão Linear Múltipla 🙂

Por fim, reitero que este é um post de Matemática e não de Nutrição!

Sugerimos que antes de qualquer alteração na sua rotina para perder/ganhar peso, procure um especialista.


Como referenciar este conteúdo em formato ABNT (baseado na norma NBR 6023/2018):

SILVA, Marcos Henrique de Paula Dias da. O que Regressão Linear Múltipla nos ensina sobre perder peso?. In: UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS. Zero – Blog de Ciência da Unicamp. Volume 7. Ed. 1. 1º semestre de 2022. Campinas, 20 fev. 2022. Disponível em: https://www.blogs.unicamp.br/zero/3726/. Acesso em: <data-de-hoje>.

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