Eu sempre adorei discussões. Quando entrei na graduação, o ponto alto da minha semana era o Grupo de Discussão de Evolução, um grupo organizado por três veteranos que talvez tenham achado naquele fórum uma válvula de escape para o que eu iria sentir mais tarde na pele: a total ausência de embate entre pontos de vistas conflituosos na academia.
Foi só quando me meti em discussões sobre ateísmo, que descobri a existência de debates acadêmicos, onde os debatedores expõem seus lados em um formato previamente estabelecido. Eu achei isso fantástico: esses debates não apenas permitem uma grande troca e exposição de informação, como também entretêm. Prefiro mil vezes assistir um debate de duas horas do que o novo filme da série “Velozes e Furiosos”.
Agora, um problema de debates entre teístas e ateus é que eles facilmente se tornam acalorados e muitas vezes desrespeitosos, que é algo tira o foco do assunto e entram no caminho da discussão. Um bom debate é aquele que o debatedor interpreta a posição do oponente sob a melhor luz possível e tenta responder à altura. Sem respeito, os debatedores comumente correm o risco de interpretar errado o que seu oponente tem a dizer e responder àa pontos que não foram feitos. E ninguém ganha com isso.
Abaixo linkei três debates entre teístas e ateus que acho particularmente bons nesses aspectos. São ótimas fontes de informação sobre ambos os lados, mostrando que é possível haver confronto sem ofensas. Ao menos não muitas. Infelizmente estão apenas em inglês, e requerem um ouvido acostumado.
Peter Singer vs John Hare – Mamíferos Morais, e porque nós importamos
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Debate entre o famoso filósofo Peter Singer (ateu) e o filho do seu mentor, também filósofo, John Hare (teísta). O objetivo desse debate é expor as bases e justificativas para o comportamento ético sob as perspectivas ateia e teísta, respectivamente. O resumo é simples: na visão teísta, Deus justifica tudo e é a base da moralidade. Na visão ateia, não (obviamente), mas é bom notar que muitas das questões éticas respondidas por “Deus” não estão resolvidas numa visão secular. O motivo disso, imagino, é que “Deus” não é resposta para essas perguntas em primeiro lugar.
(Meta)Fisica: Hans Halvorson e Sean Carroll em Caltech
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Hans Halvorson, filosofo teísta de Princeton, e Sean Carroll, físico da Caltech, blogueiro e divulgador científico expõem suas visões metafísicas em uma conversa amistosa. A parte que mais me interessa é a discussão que começa em aproximadamente 20min, no qual Carroll responde ao argumento do Ajuste Fino das Contantes do Universo para a existência de Deus. Esse argumento (junto com o Principio Antrópico) sempre me incomodaram muito, pois sugerem que nós sabemos como a vida surgiu. Mas, se soubéssemos isso, criar vida em laboratório de matéria inanimada seria rotina, mas infelizmente ainda estamos anos luz disso. E a resposta de Carroll sugere isso: não sabemos o que é necessário para ter vida e não sabemos o quão provável ela é nesse ou em qualquer outro universo. Halvorson concorda, admitindo que, apesar de achar que o universo é finamente ajustado, ele acredita que os argumentos para isso são péssimos, sugerindo ainda que usar ciência para sustentar a visão teísta é teologia ruim. E eu concordo 100% com ambos.
Bônus: ambos respondem qual é o maior desafio para sua visão de mundo e são bastante honestos sobre isso.
(In)Acreditável?: Um filosofo ateu e um teísta compartilham suas visões de mundo- Universidade de Cambridge
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Esse é um debate bastante interessante, entre o filosofo ateu Arif Ahmed e o Reverendo e professor aposentado Keith Ward. Ward é um idealista, que acredita que a realidade da mente precede a realidade da matéria, e Ahmed defende uma posição empiricista ampla, onde qualquer crença deve ser considerada verdadeira apenas se tivermos evidencias para ela. Apesar desses pontos não serem necessariamente opostos, grande parte do debate se foca na operacionalidade dessa visão de Ahmed, com Ward obviamente discordando.
Gosto bastante de ambos debatedores. Ward é bastante honesto e aberto sobre suas crenças e sobre como encara a filosofia como uma forma de racionalizar sua visão de mundo (nada diferente de o que um ateu deve fazer, na minha opinião). Ahmed é um pouco confuso, mas bastante lúcido em suas posições, conseguindo dissecar e apontar problemas na visão teísta com precisão, nenhum dos quais negados diretamente por Ward. Vale a pena adicionar que Ahmed também é conhecido como o cara que destruiu Willian Lane Craig em um debate que, infelizmente, não entra nessa lista por motivos óbvios.