Deus, hidroxicloroquina e unicórnios: é impossível demonstrar um negativo?

Quem está habituado à discussão teológica está familiarizado com a afirmação de que seria “impossível demonstrar uma negativa”. Ela é rotineiramente usada por crentes e apologetas para argumentar que, “segundo a lógica”, é impossível dizer que Deus não existe, mesmo na total ausência de evidências da sua existência. Logo se você crê em Deus por fé apenas (sem evidencia), você não estaria sendo irracional ou ilógico. Esse argumentos sempre me soou estranho, mas eu honestamente não havia pensado nele por anos até que me deparei com alguns debates recentes na internet envolvendo a hidroxicloroquina e sua eficácia. A discussão segue mais ou menos assim:

Crítico da hidroxicloroquina – Foi demonstrada a ineficácia da hidroxicloroquina

Defensor da hidroxicloroquina – Não foi demonstrada sua ineficácia, porque é impossível demonstrar uma negativa.

O que para mim o curioso nessa história toda é que a frase de efeito, ou truísmo, usado para corroborar esse raciocínio, de que  “é impossível demonstrar uma negativa” é obviamente falso. É completamente lógico derivar um argumento formal no qual a conclusão é a inexistência de algo. Por exemplo, digamos que estejamos argumentando sobre a existência de unicórnios. Eu poderia montar o seguinte argumento

  • P1 – Se unicórnios existem, deveria haver alguma evidencia deles no registro fóssil.
  • P2 – Não existe evidencia de unicórnios no registro fóssil.
  • Conclusão- Unicórnios não existem.

Esse é um argumento logicamente válido no qual a conclusão (uma negativa) é a consequência lógica das premissas. Proposições negativas são tão demonstráveis quanto proposições positivas.

“Mas, calma lá”, você pode pensar “o registro fóssil é notoriamente incompleto. Espécies podem simplesmente não estar representadas sem que isso signifique que elas nunca existiram”.

Esse argumento remete ao problema da indução, que diz basicamente que nenhuma generalização baseada em observações limitadas pode ser bem sucedida. O exemplo clássico é a ideia de que, não importa quantos cisnes brancos você encontre na natureza, você nunca vai poder dizer que todos os cisnes são brancos, visto que você ainda pode encontrar um cisne negro que refute essa generalização. É importante ressaltar que, enquanto isso não invalida a ideia que proposições negativas são demonstráveis, isso parece levantar um problema sério para premissas que sustentem supostas inexistências.

Porém, nem todas proposições são iguais. Imagine que, ao invés de você estar buscando cisnes negros, você que saber se um gene X está associado com a cor das penas em cisnes negros. Uma prática em genética para entender o funcionamento de um dado gene é exatamente deletar esse gene de um embrião, ou “nocautear” o gene. Se o gene era associado com a cor das penas, você espera que o embrião com o gene nocauteado desenvolva penas brancas (ou não-negras). Se o embrião continua desenvolvendo penas negras, você pode afirmar que o gene X não tem efeito sob a coloração negra das penas. Em forma de argumento formal:

  • P1- Se o gene X determina a cor negra da pena, sua remoção produziria penas sem essa coloração
  • P2- A remoção do gene não afeta a cor da pena
  • Conclusão- O gene X não afeta a cor da pena.

Nesse caso não há ambiguidade alguma: uma vez que o mecanismo é proposto e testado, a ausência de um efeito implica que sua hipótese foi refutada: o mecanismo, como designado, não existe. A diferença é que, quanto mais específica é sua premissa inicial, mais certeza você pode conferir à sua conclusão.

O caso de medicamentos tem mais a ver com o encontrar um mecanismo genético do que buscar unicórnios no registro fóssil: a ação de um remédio depende de que um mecanismo proposto seja verdadeiro, ou potencialmente verdadeiro. O que nos trás à hidroxicloroquina.

Presidente Jair Bolsonaro no jardim do Palácio da Alvorada alimentando as emas e mostrando a caixa do remédio cloroquina para as emas, a mesma caixa que mostrou para os apoiadores no ultimo domingo 19/07. Sérgio Lima/Poder360. 23.07.2020

Querida de três em cada três líderes com tendências autoritárias no continente americano (Trump, Bolsonaro e Maduro), a hidroxicloroquina foi alardeada com um possível tratamento ao COVID19 com base em um estudo feito em células in vitro (em placas de petri; aqui e aqui). Esse estudo demonstrou que a hidroxicloroquina em conjunto com azitromicina era capaz de prevenir a entrada do vírus em células vivas. Em investigações sobre a eficácia de medicamentos, a existência de algum tipo de efeito in vitro é considerado premissa básica para que mais estudos sejam realizados, para observar se um remédio pode ter efeito em seres vivos e, em última analise, humanos. De qualquer maneira, esse estudo deu o pontapé inicial à investigação sobre a eficiência da hidroxicloroquina contra o COVID19, resultando em diversos trabalhos que buscaram encontrar um efeito da droga em seres humanos infectados.

Nada disso seria particularmente problemático se políticos não tivessem tomado para si o papel de decidir, com base em evidencias problemáticas, quais são os tratamentos que devem ser seguidos. O que temos agora é a pior situação possível: enquanto a ciência demonstra a total ineficácia da hidroxicloroquina no tratamento de COVID19 (ver aqui e aqui, por exemplo), políticos e entusiastas destes mesmos governantes se veem na posição de ter que defender pseudociência por motivos meramente ideológicos. E é nesse momento que vemos as pessoas se agarrarem cada vez mais desesperadamente à argumentos falaciosos para defender sua posição. No caso da hidroxicloroquina, como coloquei anteriormente, surge essa ideia de que seu efeito positivo não pode ser negado, pois seria impossível demonstrar uma negativa. Como já argumentei, essa afirmação é falsa (é incrivelmente simples demonstrar um negativo). Mas seria esse o caso da hidroxicloroquina?

Pra entender isso, precisamos entender um pouco como supostamente a hidroxicloroquina deveria funcionar. Para entrar nas células animais, o coronavírus pode se valer de dois mecanismos. O primeiro é se ligando a receptores de superfície das células do hospedeiro para introduzir o seu material genético diretamente no interior da célula. No segundo mecanismo, o vírus é absorvido por invaginações da membrana celular (endossomos) e invadem o citoplasma celular a partir daí. Esse segundo mecanismos, o realizado por endossomos, necessita de uma proteína funcional chamada catepsina L, que necessita de um meio ácido para funcionar. Nesse contexto, a hidroxicloroquina atua diminuindo a acidez do meio intracelular, impedindo a ação da catepsina L, impedindo a entrada do coronavírus na célula. Para voltar para nossas preposições, podemos descrever a atuação da hidroxicloroquina da seguinte forma:

  • P1- Para a hidroxicloroquina funcionar no combate a COVID19 ela necessita prevenir a entrada do coronavírus nas celulas pulmonares humanas.
  • P2- Hidroxicloroquina diminui a acidez intracelular, afetando o funcionamento da catepsina L.
  • P3- Catepsina L é usada pelo coronavírus para entrar na célula.

Segundo essa lógica – e essa era a lógica que poderíamos aceitar no começo do ano – a hidroxicloroquina (potencialmente) funcionaria no combate a COVID19. Mas o diabo mora nos detalhes. As células usadas inicialmente para demostrar que a hidroxicloroquina funciona in vitro eram culturas de células de rins de macacos. Essas células normalmente apresentam resultados bons o suficiente para a maior parte dos fármacos, porém no caso do coronavírus a coisa parece ser mais complicada. Enquanto é verdade que em células de rim a Catepsina L é essencial para a ação de entrada do vírus, células pulmonares humanas não apresentam essa enzima em grandes quantidades. Ao invés, o mecanismo de entrada do coronavírus na célula é mediada por uma enzima chamada TMPRSS2. O problema é que, diferente da Catepsina L, o funcionamento da TMPRSS2 não é afetado pela alteração da acidez do meio celular. De fato, um estudo recente em células pulmonares humanas demonstrou que a hidroxicloriquina é incapaz de impedir a invasão das células pelo coronavirus. Assim, podemos atualizar a descrição da atuação da hidroxicloroquina da seguinte forma:

  • P1- Para a hidroxicloroquina funcionar no combate a COVID19 ela necessita prevenir a entrada do coronavírus nas celulas pulmonares humanas.
  • P2- Hidroxicloroquina diminui a acidez intracelular, afetando o funcionamento da catepsina L.
  • P3- Catepsina L é usada pelo coronavírus para entrar em células de rim.
  • P4- TMPRSS2, que é usada pelo coronavirus para entrar em células pulmonares, não é afetada pela hidroxicloroquina.

E disso segue que

  • C- Hidroxicloroquina não funciona no combate a COVID19 através do mecanismo proposto.

O que mostra que é plenamente lógico afirmar que a hidroxicloroquina não funciona.

Óbvio que isso não vai satisfazer os defensores da droga, pois inúmeros outros mecanismos podem ser propostos, inclusive mecanismos sem o menor respaldo científico, como foi o caso da “pílula do câncer”, uma droga sem efeito também defendida pelo presidente da república.

Eu acredito que a luta pela hidroxicloroquina vai durar muito mais tempo depois que sua discussão acadêmica estiver de fato encerrada. Estamos entrando em um caminho onde teorias conspiratórias, pseudociência e pseudofilosofia estarão intrinsecamente ligados com a política nacional. Vai ser um caminho tortuoso. Boa sorte a todos nós.

*Para os nerds: sim, eu estou mais que ciente das problematicas sobre o grau de confiabilidade em resultados experimentais e estatísticos. Você pode transformar todos esses argumentos em probabilísticos e chegar a conclusão que a hidroxicloroquina muito provavelmente não funciona (o que é basicamente a mesma, visto que a unica “certeza” que podemos ter em termos científicos são aquelas referentes à altas probabilidades).

Criacionista da Terra Jovem distorce pesquisa de brasileiros para corroborar o Design Inteligente

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Esse é Dr. Marcos Nogueira Eberlin. Professor da Unicamp. Pesquisador. Membro da Associação Brasileira de Ciência. Criacionista. Eberlin é um daqueles espécimes raros que acredita na literalidade do livro Genesis. O que o torna mais raro ainda é o fato de ser um pesquisador de alto impacto, apresentando um índice de produtividade impressionante para qualquer área de conhecimento acadêmico (mais de 800 artigos publicados, citados mais de mil vezes).

Talvez por ser um daqueles poucos criacionistas com credenciais científicas, Dr. Marcos Ebelin se tornou um garoto propaganda do Design Inteligente, uma versão menos pretensiosa do criacionismo, que apenas busca demonstrar que algum aspecto da realidade (normalmente focando em organismos e estruturas biológicas) foi criado por uma inteligência divina superpoderosa. A despeito disso, Ebelin em todo o seu discurso se assemelha mais a um criacionista terra jovem, tomando como literal os relatos bíblicos da criação especial (mágica) das espécies e na historicidade do dilúvio universal de Noé.

Com o tempo, Dr.Eberlin perdeu toda e qualquer pretensão de sutileza ao defender suas crenças anti-científicas, utilizando-se do facebook como sua principal mídia. Dentre referencias abundantes a sites criacionistas como o answersingenesis.org, podemos encontrar posts como o abaixo:

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De onde saem informações como a de que somos mais similares a porcos do que a chimpanzés (chamados de “chimpas”) me é um mistério. Mas talvez o mais impressionante é o estilo de escrita e argumentação utilizado por um pesquisador que estaria dentre um dos mais produtivos do Brasil.

Recentemente o Dr. Eberlin resolveu argumentar, em uma série de posts em sua página pessoal, que algumas pesquisas desenvolvidas por pesquisadores brasileiros corroborariam o Design Inteligente:

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Nesse post o Dr. Eberlin sugere que a pesquisa referida corroboraria a hipótese de Design Inteligente, e ainda sugere que isso não foi dito no texto do artigo pois tais especulações seriam proibidas dentro da academia (referida pelo Dr. Eberlin como Akademia, talvez como uma referencia à Nomenklatura, um meme usado por outro criacionista brasileiro).

Intrigado com essa afirmação, eu resolvi perguntar diretamente ao principal autor do trabalho, o Dr. Marcus Smolka, se seu trabalho poderia ser interpretado como uma corroboração do Design Inteligente. Abaixo reproduzo na integra a resposta do Dr. Smolka:

Olá Fabio,

Obrigado pela mensagem. Definitivamente NÃO concordo que minha recente publicação seja suporte, em qualquer maneira, para a idéia de DI. O Prof. Eberlin tem o direito de interpretar meu texto do jeito que quiser, porém, me parece que ele esteja fazendo um jogo equivocado de palavras para tentar vender a idéia de DI. Realmente não entendo a lógica dele. Pessoalmente, acho um desfavor a ciência.
Um abraço,
Marcus

Ou seja, nada no resultado reportado na revista Molecular Cell está sustentando a tese criacionista do design inteligente.

Pode parecer picuinha, mas esse caso evidencia o Modus Operandi dos criacionistas do DI: eles não produzem nada que corrobore sua tese, se limitando a canibalizar os esforços alheios, distorcendo os achados e interpretando-os de forma que os beneficie.

Isso não é uma prática honesta, e não é algo que um pesquisador do calibre do Dr. Eberlin deveria se reduzir a fazer. Mas é exatamente isso que ele faz.

Só nos resta perguntar o porque.

Lugar de tigre é no zoológico

Recentemente tivemos uma fatalidade. Um garoto, aparentemente estimulado por seu pai, ultrapassou a grade de segurança de um zoológico no município de Cascavel, no Paraná, e foi atacado por um tigre. A lesão resultou na amputação do braço direito do menino e, atualmente, o pai pode responder por lesão grave. Isso foi documentado por videos e fotos. Se você tiver estômago, acredito que consiga achar as imagens e vídeos por si só.

Como de costume, esse evento foi o suficiente para despertar os trolls da internet, que formaram dois grupos de opiniões: os primeiros eram favoráveis à eutanásia do animal, que obviamente seria perigoso para o contato humano; o segundo grupo clamava pela cabeça do pai, ao mesmo tempo que condenava o zoológico por manter um animal selvagem em cativeiro.

Não vou criticar longamente a primeira posição. Afinal, essas pessoas parecem acreditar que, assim como cachorros, um tigre seria um animal domesticado que deveria estar capacitado à andar entre pessoas, sendo assim a eutanásia justificada. A estupidez dessa posição me é evidente. Vamos a segunda posição.

Tigre: uma espécie ameaçada

Há cerca de um século, tínhamos aproximadamente 100.000 tigres selvagens no mundo. Hoje esse numero não passa de 3.200 espécimes, uma redução de mais de 97% da sua população nativa. As principais pressões em populações naturais são caça por pele, perda de habitat e  morte por vingança: devido a redução de seu habitat natural, tigres enfrentam escassez de alimentos, o que muitas vezes os força a atacar gado e outros animais domésticos. Isso, por sua vez força moradores locais a matar o predador para preservar seu rebanho, algo muito similar ao que ocorre com onças no brasil.

Parece horrível, e é. Mas o ponto é que tudo isso ocorre na natureza. Uma das grandes iluminações que qualquer movimento conservacionista deve ter é que tais pressões em populações naturais ocorrem, principalmente, por um motivo simples são também fortemente influenciadas por dois motivos simples: crescente população humana e desigualdade de renda. Não são apenas populações ricas que vivem em enclaves de matas, cortando ilegalmente madeira para plantar beterrabas e criar carneiros. Pois é… o Capitão Planeta estava errado.*

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– Vamos, crianças, vamos descer o cacete naqueles pobres. Pela natureza!

 

O meu ponto é: enquanto tivermos uma população crescente e desigualdade de renda brutal, teremos problemas ambientais, especificamente os do tipo que causam o declínio de populações de mamíferos de grande porte, como o tigre.

Agora, vamos ser honestos: quais as chances disso acontecer em um tempo viável para salvar populações naturais que às vezes tem menos de 200 animais na natureza? Pois é… foi o que eu pensei.

Conservação ex situ

Conservação ex situ é, resumidamente, a conservação de espécies biológicas fora de seu habitat natural (ex: fora, situ: sitio, local). Isso normalmente significa a conservação de animais em zoológicos, aquários e santuários e de plantas em jardins botânicos. Muitas vezes essas instituições tem programas específicos de manutenção de variação genética, por cruzamentos preferenciais, de forma a manter a viabilidade das espécies, mesmo em cativeiro. Isso é feito através da manutenção de registros minuciosos das relações de parentesco de animais em cativeiros ao nível global, que permite a realização de trocas e cruzamentos em cativeiro de maneira informada. Isso é necessário, pois na eventualidade de extinções locais, tais populações podem ser reestabelecidas a partir de estoques em cativeiro. Não é a melhor opção, não é a mais usada, mas é uma possibilidade.

Uma avaliação desses registros também demonstra um detalhe: a grande maioria dos animais em cativeiros nessas instituições não advém da natureza, mas sim de programas de cruzamentos que já estão em vigor ha décadas. Ou seja, com exceção de animais que estão inviabilizados de serem reintroduzidos por diversos motivos como doenças, injúrias ou pelo simples fato de não sabermos de onde eles vieram, de modelo geral, animais em cativeiro não poderia ser liberados sem um programa muito especifico e custoso de reintrodução. Eles não podem e nem devem ser liberados na natureza: além de despreparados para cuidar da própria subsistência, por estarem mais habituados à presença de humanos, eles podem se tornar um perigo real para populações locais, como já acontece nos Estados Unidos com ursos. Esses animais precisam ser abatidos, e tigres liberados na natureza de forma displicente também teriam que ser.

Defensores dos animais X prudência

Uma das coisas que mais me incomoda em alguns dos autoproclamados “defensores dos animais” é sua ausência completa de pragmatismo: testes em animais é errado, mas nenhuma alternativa racional é proposta (com ênfase no “racional”); zoológicos são antros de exploração animal e deveriam ser fechados, mesmo que os ambientes naturais estejam degradados, e que populações naturais quase com certeza estejam fadadas à extinção. Acho que o melhor exemplo disso foi o recente post de nossa “defensora dos animais” favorita, Luisa Mell:

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Eu não duvido por um momento que pessoas como a Luisa Mell agem por causa de sua empatia para com animais não-humanos, algo que considero louvável. Agora o que não é louvável é a utilização de desinformação para manipular os sentimentos das pessoas para fortalecer o seu próprio ponto de vista, no caso, anti-capitalista. De boas intenções, o inferno está cheio. E o que sobra em qualquer movimento social, incluindo no movimento de defesa dos animais, são boas intenções.

Não, Luisa, esses animais não foram retirado de seu meio-ambiente. Eles nasceram em cativeiro e sua presença em zoológicos e outros centros de conservação ex situ se torna cada vez mais necessário em um mundo de crescente degradação ambiental e desigualdade social. Zoológicos precisam de mais recursos para tratar bem de seus animais e a cobrança de ingressos é um jeito de faze-lo. Abusos e maus-tratos devem ser denunciados, mas isso não advoga contra zoológicos, mas em favor de uma administração correta e bem fiscalizada.

O mundo não é perfeito para humanos, para ursos polares ou para tigres. Lide com isso.

* Devido a criticas, modifiquei essa passagem, apesar de achar que não muda a mensagem central do texto. Para maiores informações e referencias, checar o comentário do Luiz Pires no facebook sobre o assunto.

Castrar um hipopótamo não é tão fácil quanto parece (e não parece nem um pouco fácil)

O problema é simples: temos um dos animais mais agressivos e mortais da terra e queremos mantê-los em zoológicos, sem risco para a vida de tratadores. Solução? Oras, castração! Afinal, se funciona com animais domésticos, deve funcionar com outros animais.

Porém as coisas não são tão fáceis. Como se castrar um animal de mais de 3 toneladas não fosse um problema, os testículos dos hipopótamos são móveis, e tem-se mostrado um grande desafio para os cientistas da castração animal (aparentemente ¬¬).

Isso levou a um desenvolvimento de um procedimento original por um time de cientistas liderados por Christian Walzer, da universidade de Vienna. Esse novo procedimento, adaptado do utilizado em cavalos, permite a localização e remoção dos testículos dos animais. Yei, Science!

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O pior dia da vida de um jovem hipopótamo

Viu, fácil. Agora você só precisa de um guindaste, quantidades obscenas de tranquilizante e uma tesoura.

É, eu sei. De nada.

O porque dos testículos desses animais se movem, como que fugissem de dedos gelados de um urologista, é um mistério. Mas o Walzer tem uma teoria:

Hipopótamos machos realmente brigam- não é apenas uma bravata quando eles bocejam e abrem suas bocas- eles podem atacar o testículo dos rivais com seus dentes.

Agora, nunca vi evidência de que hipopótamos atacam os testículos uns dos outros, mas tanto faz, parece uma ótima ideia! Próximo passo: identificar genes envolvidos para aplicação “biomédica” em humanos.

Já!

Justificando a Pesquisa Básica

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CIÊNCIA pode te dizer como clonar um Tyranossaurus Re
HUMANIDADES pode te dizer o porque disso ser uma má idéia.

Em resposta ao meu último post, algumas pessoas afirmaram que a aquisição de conhecimento básico não precisa ser justificado além da própria aquisição de conhecimento. Apesar de eu concordar que a justificativa deva se afastar do utilitarismo raso que normalmente é exemplificado na forma de acumulo de tecnologias ou financeiro, não acho que a questão se resolva tão facilmente assim.

Afinal, mesmo que as pessoas não sejam (salvo raras excessões) contra a aquisição de conhecimento, existem prioridades “estratégicas” que podem levar órgãos de fomento a excluir áreas que não tem sua utilidade pública claramente justificadas. E se acham a possibilidade muito abstrata, se pergunte: porque será que as Ciências Humanas foram excluídas do Ciências sem Fronteiras, um programa que “busca promover a consolidação, expansão e internacionalização da ciência e tecnologia, da inovação e da competitividade brasileira”? Talvez não tenha ficado claro para o governo/sociedade qual é o valor das áreas humanas para o avanço científico, e porque isso conta. E garanto: qualquer lógica empregada para a exclusão de ciências humanas pode ser igualmente aplicada em diversas áreas da pesquisa básica, por mais hard que seja a ciência.

Então, como poderíamos justificar a pesquisa básica? Creio que a melhor resposta para isso foi dada no contexto da construção do primeiro acelerador de partículas do Fermilab. O Fermilab é um laboratório de investigação física experimental e na época o seu primeiro diretor, R. R. Wilson, foi convocado para uma audiência frente ao comitê de Energia Atômica para conseguir autorização governamental para o projeto:

SENADOR PASTORE. Existe qualquer coisa conectada a este acelerador que envolva a segurança nacional desse país?

DR. WILSON. Não, senhor. Não creio que exista.

SENADOR PASTORE. Nada mesmo?

DR. WILSON. Não, nada.

SENADOR PASTORE. Ele não tem nenhum valor nesse aspecto?

DR. WILSON. Ele apenas diz respeito a o que consideramos uns pelos outros, pela dignidade dos homens, nosso amor pela cultura. Tem a ver com essas coisas.

Não tem nada a ver com o exercito. Sinto muito.

SENADOR PASTORE. Não sinta.

DR. WILSON. Eu não sinto, mas eu não posso honestamente dizer que ele tem esse tipo de aplicação.

SENADOR PASTORE. Tem algo nesse projeto que nos projeta em uma posição de competitividade com Russos, no que diz respeito a essa corrida?

DR. WILSON. Apenas da perspectiva de longo prazo, de um desenvolvimento tecnológico. Fora isso, tem a ver com: Somos bons pintores, bons escultores, grandes poetas?  Eu quero dizer todas as coisas que nós realmente veneramos e honramos em nosso país (…).

Nesse sentido, esse novo conhecimento tem tudo a ver com honra e nação mas não está diretamente ligado à defesa de nosso país, exceto pelo fato de o fazer digno de ser defendido.

E eu creio que seja por ai. Tais pesquisas se justificam no contexto de nossos valores como sociedade. Se você acredita que somos nós que conferimos significado para nossa existência, então deve ser evidente que a busca pelo conhecimento, seja em ciência ou literatura, nos oferece uma fonte de significado e sentido muito maior do que qualquer outra coisa que podemos encontrar por ai. Uma sociedade que valoriza a busca pelo conhecimento como forma de se reconstruir, é uma sociedade que valoriza a ciência. Tecnologia e desenvolvimento econômico deveriam ser casos particulares dessa busca, e não o objetivo da busca em si.

Eu ainda adicionaria que uma base ética secular e humanista implica, necessariamente, na valorização da busca pelo conhecimento, mas isso é uma outra história.

Seleção natural não é uma tautologia

Ann Coulter, o sonho molhado de todo conservador Norte-Americano.
É a da direita, eu suponho…

Um dos argumentos que considero mais irritante utilizado por detratores da síntese evolutiva moderna é que a a seleção natural seria uma tautologia. Tal argumento foi colocado pela “pensadora” conservadora norte-americana Ann Coulter em seu livro “Godless: The Church of Liberalism” da seguinte forma:

A segunda parte da “teoria” de Darwin é geralmente nada mais do que um argumento circular: Através do processo de seleção natural, o mais “apto” sobrevive. Quem é o mais “apto”? O que sobrevive! Oras, veja – acontece toda vez! A “sobrevivência do mais apto” seria uma piada, se não fosse parte de um sistema de crença de um culto fanático infestando a Comunidade Científica. A beleza de ter uma teoria cientifica que é uma tautologia, é que ela não pode ser testada.

É interessante notar que quem se vale desse argumento, não nega a existência da seleção natural, pelo contrário: afirma a sua existência como uma verdade inescapável. Quanto falamos de uma tautologia, estamos falando de uma proposição, a qual assume a seguinte forma:

A apresenta as propriedades de A

Por trás da circularidade e obviedade da preposição, está o fato de que uma tautologia é uma verdade necessária. Afirmar que “A não apresenta as propriedades de A” significaria dizer que existe alguma propriedade de A que não é propriedade de A, ou que A não apresenta todas as propriedades de A, sendo que ambas são absurdos lógicos. Em nenhum caso tal afirmação (ou qualquer outra tautologia) pode ser falsa sem simplesmente fazer uma contradição que fere as leis da lógica (o que as tornam logicamente necessárias). Então, nesse ponto, Coulter está correta: uma tautologia não pode ser falseada, pois ela é uma necessidade lógica. Mas seria a teoria da seleção natural uma tautologia de fato?

“Sobrevivência do mais apto”

Uma das primeiras coisas que devemos notar é que “sobrevivência do mais apto” não é exatamente uma das descrições mais adequadas da Seleção Natural. Mas em primeiro lugar, temos que deixar bem claro um conceito que é comumente confundido, que é o de “aptidão”, “aptidão darwiniana” ou “fitness” em inglês.

A aptidão, em biologia evolutiva, é definida como a contribuição média de um genótipo para o pool gênico da geração seguinte. Por exemplo, se tenho uma bactéria (haplóide) com um dado genótipo que apresenta fitness=1.47, então a presença do genótipo na geração seguinte será 47% maior do que na geração anterior. Se o fitness=0.91, então aquele gene terá uma presença 9% menor na geração seguinte e por ai vai.

Note que em nenhum momento precisamos falar de sobrevivência. Afinal, o que seria “sobrevivência” no caso de bactérias que simplesmente se dividem? Faz algum sentido falar que a bactéria da esquerda é a que “sobreviveu”, e não a da direita?

Uma historia de amor melhor que Titanic

O ponto é que um organismo não precisa morrer para ter um fitness baixo. Um organismo pode muito bem ter uma baixa fecundidade, sem nunca precisar “deixar de sobreviver” ou, como no caso das bactérias, sobrevivência é irrelevante visto que todos organismos originais deixam de existir após a reprodução. Outro exemplo são algumas espécies de salmão e polvos, que morrem após o acasalamento, louva-deuses e aranhas que consomem os seus machos, ou ainda algumas espécies de ácaros que explodem ao dar luz aos filhotes. Aptidão não tem a ver com sobrevivência.

– Tira esse hectocótilo daí, João!
Esse papo de sexo vai acabar nos matando…

Então, fica bem claro que “sobrevivência do mais apto” não é uma tautologia, pelo simples fato de que “sobrevivência” não é estritamente igual (apesar de poder influenciar) “aptidão”.

Isso tudo é apenas para demonstrar que o argumento original utilizado está errado. Porém os mais rápidos vão notar que isso não refuta a proposição de que “seleção natural é uma tautologia”: apesar do argumento dos detratores/criacionistas estar equivocado, ainda poderíamos transformar a proposição original em algo próximo a o que seleção natural realmente significa, produzindo assim uma tautologia. Mas como seria isso?
Aptidão como taxa
Se “sobrevivência do mais apto” está equivocado, então como poderíamos frasear a ideia original da melhor maneira possível?

Sobrevivência do melhor sobrevivênte“?

É claramente uma tautologia, uma verdade trivial, mas não parece ser exatamente o que temos em mente quando pensamos em “seleção natural”. Poderíamos pensar em algo na linha de

Capacidade superior de contribuir para o pool gênico da geração seguinte do genótipo (ou fenótipo) mais apto

Bom, essa parece mais próxima da ideia original, mas ela dificilmente é uma tautologia. O motivo é muito simples: ela é falsa. Isso pode ser ilustrado facilmente com uma analogia: a adaptação é uma taxa de variação da frequência de alelos, assim como aceleração é a taxa de variação da velocidade. Se fossemos formular uma proposição análoga para aceleração, teríamos algo similar à

A maior velocidade do que mais acelera

Isso é falso pelo simples motivo de que o que mais acelera pode ser o mais devagar, enquanto o mais rápido pode acelerar menos, mas manter uma velocidade superior pelo simples fato de inicialmente já apresentar uma velocidade superior.
O gráfico abaixo ilustra isso para uma população de organismos haplóides que apresentam dois genótipos, sendo que A2 apresenta uma aptidão duas vezes maior do que A1. q’ é a frequência genotípica após a seleção e q1 é a frequência genotípica de A1 antes da seleção (sendo que a frequência de A2 fica definida como 1-q1).
Assim, fica fácil verificar que, mesmo A2 tendo uma aptidão duas vezes maior, ele não consegue ser o maior contribuidor para o pool gênico na geração seguinte quando sua frequência inicial é muito baixa (ou quando a frequência de A1 é muito alta, no canto direito do gráfico). Moral da historia: aptidão sozinha não determina sucesso evolutivo na geração seguinte.

Um detrator mais perseverante pode argumentar que, se dermos tempo o suficiente (em outras palavras, um numero muito grande de eventos de seleção ou gerações), o genótipo mais apto irá se fixar, não importando sua frequência original, e ele estaria certo ao dizer isso. Mas note que a premissa “dado muito tempo” precisa ser introduzida para que torne a afirmação verdadeira. Essa premissa pode tanto ser ou não verdadeira (da mesma forma que carros e trens não aceleram indefinidamente), o que torna a proposição condicional, não uma verdade necessária e, logo, a proposição não é uma tautologia.

Mas isso tudo gera um impasse. Todas as proposições – tanto as originais, tanto as que tentam se aproximar do significado verdadeiro dos termos no contexto da síntese evolutiva – se mostraram falsas. Seria possível elaborar uma proposição que seja precisa (represente a ideia da seleção natural) e que seja colocada de forma lógica?

Seleção natural como silogismo

Em primeiro lugar, devemos entender como seleção natural ocorre. Não, não estou falando apenas daquele velho e batido exemplo do passarinho comendo os besouros que são mais chamativos, mudando assim a composição da população:

-Na verdade eu enxergo todos os besouros, mas meu médico disse que uma refeição colorida é uma refeição divertida

Esse é um ótimo exemplo para mostrar como seleção natural pode levar à evolução de um fenotipo de forma direcional (existem mais besouros marrons no final do que no começo), mas existem sistemas mais complexos de seleção que não levam a uma mudança nesse sentido. O exemplo mais claro é o da interação da anemia falciforme e malaria, no qual são mantidos indivíduos com genótipo não-letal da anemia na população. Não há mudança, mas há seleção.
Então, como poderíamos definir seleção natural? Na introdução do Origem das Espécies, Darwin resume brevemente como seria o mecanismo:

Como nascem muitos mais indivíduos de cada espécie, que não podem subsistir; como, por conseqüência, a luta pela existência se renova a cada instante, segue-se que todo o ser que varia, ainda que pouco, de maneira a tornarse-lhe aproveitável tal variação, tem maior probabilidade de sobreviver, este ser é também objeto de uma seleção natural. Em virtude do princípio tão poderoso da hereditariedade, toda a variedade objeto da seleção tenderá a propagar a sua nova forma modificada.

Nesse resumo, ele coloca os 3 principais componentes necessários para que ocorra seleção natural (que eu gentilmente sublinhei, para seu conforto): variação em uma caracteristica, diferenças de aptidão (ele fala de sobrevivencia, mas sabemos que isso não é a única variável) ligadas a variação nessa característica, e hereditariedade dessa característica.

Note que, se uma população apresenta variação em uma característica, mas essa não apresenta nenhuma ligação com aptidão, então a “seleção” de organismos é completamente aleatória em relação a aquele caractere (não sendo seleção natural). Agora, se o caractere é ligado com aptidão, mas não é herdado, então mesmo que organismos com uma dada característica seja selecionada, ele não vai passar tal característica para a geração seguinte. Esses componentes são necessários (todos precisam estar presentes) e suficientes (nenhum outro componente precisa estar presente) para que ocorra seleção natural, apesar de outros fatores influenciarem a dinâmica de seleção.

Sendo assim, podemos definir seleção da seguinte forma:

[P1.] Existe variação entre indivíduos para uma dada característica;
[P2.] Tal variação está ligada entre progenitores e prole através de uma relação de herança, e que seja parcialmente independente dos efeitos ambientais;
[P3.] Existe uma correlação dessa característica com a habilidade reprodutiva, fertilidade, fecundidade e/ou sobrevivência (ou seja, diferenças em aptidão);

Se tais condições são satisfeitas para uma dada população natural, então:

[C1.] Diferenças na frequência das características ligadas à aptidão na geração subsequente vai ser serão diferente daquela vista nas populações parentais.

(Modificado de Lewontin, 1970, 1982; e Endler, 1986)

Se as premissas são corretas, então a conclusão segue logicamente. Isso torna a seleção natural, expressa dessa forma, um silogismo, ou uma conclusão dependente das premissas estabelecidas, e não uma tautologia.

Note que para testar cientificamente (no caso, falsear) a hipótese de que uma população está sob seleção natural, um pesquisador pode testar qualquer uma dessas proposições. Afinal, se C1 é falso, então obviamente a população não está sob seleção, mas isso não implica necessariamente que a população está sendo selecionada: uma mudança ambiental pode estar influenciando aspectos dessas características diretamente nos indivíduos, como pele morena em quem toma muito sol. Se os filhos tomam mais sol, eles terão a pele mais escura, sem que isso seja seleção natural. Por esse motivo, é necessário averiguar o quão herdável é uma característica (P2) e se a variação (P1) está ligada a aptidão (P3). De forma geral, é isso que os estudantes de seleção natural fazem, e é a síntese evolutiva moderna que proporciona o arcabouço matemático que nos permite gerar previsões teóricas de como um caractere deve se comportar sob o efeito de seleção (dado que ele apresenta algum tipo de herança mendeliana).

Então… da próxima vez que alguém dizer que evolução é uma tautologia, você pode dizer: “Não, não é. É um silogismo Quod erat demonstrandum, bitches!”.

Referencias

Lewontin, R. (1970). The Units of Selection Annual Review of Ecology and Systematics, 1 (1), 1-18 DOI: 10.1146/annurev.es.01.110170.000245

Porque você acha que seu chefe é idiota



via diogro


Já teve a sensação de ser mais competente que seu chefe? É uma sensação incrivelmente comum, porém completamente contra-intuitiva. Afinal, espera-se que que um chefe tenha atingido seu posto na hierarquia de uma empresa após demonstrar competência, e por trazer benefícios à instituição. Como poderia alguém que foi considerado tão competente por outrem ser aos seus olhos tão estúpido, ou, mais especificamente, menos competente que você? Afinal, se você é mais competente que seu chefe, você não deveria estar no cargo de chefia?


Esse sentimento foi imortalizado nos quadrinhos Dilbert, no personagem do Chefe: um individuo ignorante, incompetente e totalmente alienado da realidade da empresa (e, em alguns casos, do mundo)




-Nós precisamos de mais programadores
-Use  métodos ágeis de programação
-Programação ágil não significa apenas que famos fazer mais trabalho com menos pessoas
-Então me ache alguma palavra que signifique* isso e me pergunte novamente.

*[haeck]: Ha, notaram o que eu fiz? De novo a coisa toda de significado.

Para investigar essa questão, Plushino e colegas recorreram a uma solução criativa: eles retomaram um princípio proposto pelo psicólogo canadense Laurence J. Peter nos fins dos anos 60. Segundo Peter: 

‘Cada novo membro em uma organização hierárquica sobe na hierarquia até que ele/ela atinja seu nível de máxima incompetência’


Ou seja, segundo este princípio, quanto mais alto um individuo avança na escala hierárquica de uma empresa, mais incompetente ele se torna, até atingir o ponto mais alto, onde sua incompetencia será igualmente maior.


Representação esquemática de uma organização hierárquica. Quanto mais escuro o individuo, maior o seu nivel de competência. À esquerda temos os valores médios de competência para cada nivel, que vai aumentando na medida que subimos na hierarquia. Esse exemplo representa nossa ideia intuitiva de progresso hierárquico, onde o melhor individuo de uma camada inferior é escolhido para compor a camada superior, e assim sucessivamente. De Plushino et al.


Os autores colocam no resumo:


Apesar de não aparentar razoável, esse principio agiria realisticamente em qualquer organização onde o mecanismo de promoção recompensa o melhor membro e onde a competência no nível atual não depende da competência que ele possuía em níveis anteriores, usualmente porque a tarefa nos diferentes níveis são muito diferentes umas das outras.


Ou seja, um padeiro, por melhor que ele seja em fazer pães, não precisa saber muito sobre administrar uma padaria. Ou seja, promover o melhor padeiro para administrador pode não ser a melhor jogada.


Para investigar a possível influência do Princípio de Peter em uma organização hierárquica, os pesquisadores produziram um modelo bem simplificado, no qual eles simulavam os diversos individuos da hierarquia como apresentando apenas duas características: competencia global e idade. A seguir, eles distribuíram os individuos nas diversas hierarquias, e iniciaram as rodadas da simulação. Cada rodada consistia na avaliação da competencia global do indivíduo e sua subsequente demissão ou promoção, sendo que individos acima de 60 anos se aposentavam. Eles também testaram dois diferentes cenários: no primeiro, chamado de “Hipótese de Peter”, os indivíduos, quando movidos para uma hierarquia superior, ganhavam um novo valor de competencia (pois, afinal, administrar tem pouco a ver com fazer pães). No segundo cenário, chamado de “Hipótese do Senso-Comum“, os individuos mantinham sua competencia quando subiam na hierarquia. Adicionalmente, os pesquisadores investigaram a influencia de 3 diferentes estratégias de promoção nesses dois cenários diferentes: a primeira é quando o melhor funcionário é promovido para a hierarquia superior (“The Best“), a segunda é quando o pior é promovido (“The Worst“) e a terceira os funcionários são promovidos aleatoriamente (“random“). Eles então mediram a eficiência global da organização, para ver o efeito das hipóteses e das estratégias de promoção em uma organização.


Os resultados são bem curiosos:


De Plushino et al.

As linhas representam a evolução da competencia global da instituição nas diferentes hipóteses: em vermelho vemos a Hipótese de Peter e em preto temos a Hipótese do Senso Comum. As diferentes linhas de uma mesma cor representam as diferentes estratégias de promoção.

Ou seja, segundo essa simulação, se uma organização na qual o Princípio de Peter não atua (Senso Comum) a promoção de individuos competentes leva a um aumento global na performance da instituição, enquanto promover o pior indivíduo piora a performance da instituição. Promoções aleatórias são intermediárias, como esperado. Agora, em uma organização onde o Princípio de Peter atua, o resultado é oposto: promover os indivíduos melhores piora mais a performance de uma instituição do que promover os piores individuos de uma instituição sem o Princípio. A solução que aparentemente melhora a produtividade média da instituição é a promoção dos indivíduos piores. Novamente, a promoção aleatória apresenta valores intermediários de competencia global.


A partir disso, os autores concluem:


Nosso estudo computacional do Princípio de Peter aplicado a uma organização prototípica com uma hierarquia piramidal mostra que a estratégia de promover os melhores membros, no cado da Hipótese de Peter induz um rápido decréscimo de eficiencia.


Eles ainda adicionam que a estratégia de promoção mais segura para a organização, seria a promoção aleatória, que no pior dos casos, não implicaria em um decréscimo da eficiencia global de uma organização.


Agora, eu não faço a menor ideia de o quanto o Princípio de Peter é empiricamente verificado. Me parece complicado conseguir medir “competência” de forma objetiva, principalmente quando estamos comparando entre ocupações muito diferentes (como presumidamente elas precisam ser para o princípio de Peter ser válido). 


Mas, supondo que seja verdade, o que isso faz com as nossas noções de “meritocracia”, até mesmo no contexto acadêmico? O quanto a eficiencia de um estudante é determinante para o seu sucesso universitário ou profissional? O quanto nossas avaliações de mérito acadêmico refletem de fato o que se espera da pessoa, a partir do momento que ela ganha a “promoção” (passa no vestibular, conclui a graduação, etc)? Isso explicaria talvez o fato de que alguns cotistas apresentam desempenho acadêmico melhor ou igual aos não-cotistas, mesmo tendo notas mais baixas no vestibular?


Referência

Pluchino, A., Rapisarda, A., & Garofalo, C. (2010). The Peter principle revisited: A computational study Physica A: Statistical Mechanics and its Applications, 389 (3), 467-472 DOI: 10.1016/j.physa.2009.09.045

Graffiti+Ciência

Essas são algumas fotos de um graffiti que está ao lado do Museo Argentino de Ciencias Naturales aqui de Buenos Aires, no Parque Centenário. A temática é “ciência”, mas tem algo na mistura de estilos e cores que me grita “pop-hipster-latino”. Não preciso dizer que acho fenomenal.

Existem também algumas frases de pessoas presumidamente famosas que acompanham algumas partes do painel. Digo presumidamente porque sou inculto demais para saber e preguiçosos demais para procurar.

(clique nas imagens para ver em formato de slide-show)



“As conquistas cientificas só servem se estão ao serviço do povo” -Ramón Garrillo

Nota mental: não esquecer de perguntar para o sr. Garrillo qual é a utilidade para o povo de análises de evolução morfológica de Caniformes.

“Não somos donos da terra. Somos parte dela”

“A ciência não tem pátria, mas o homem da ciência têm” -S. Houssay

Com nota especial para:

Essa para mim é fantástica. Não apenas mistura lhamas (ou guanacos? Vai saber…), um átomo e um senhor extremamente bem vestido em posição emblemática. Na minha opinião só faltou uma coisa: gravatas-borboletas. Para o cara, para a lhama, para o átomo. Gravatas borboletas nunca são demais.

Duvidam? Cliquem aqui.

I rest my case.

13 Posters fantásticos sobre divulgação científica.

Via buzzfeed.

Abaixo reproduzo 13 posters de divulgação do Museu de Ciências de Vancouver chamado Science World, com suas respectivas traduções.

Com tanto brasileiro indo pro Canadá, eu fico aqui pensando se não poderíamos trazer alguns canadenses para cá.

Todos os anuncios são seguidos do slogan do museu: “Nós podemos explicar”. Eu gostei.

“Mosquitos adoram a cor azul”
“Você engole um litro de catarro todo dia”
“Você pesa menos durante a descida”.
“Balanças foram montadas dentro de elevadores comerciais e residenciais, permitindo que os passageiros testassem esse fato.”

“O coração de uma baleia azul é do tamanho deste carro.”

“Você come 430 insetos todo os dias por um ano”

“Você tem [haeck: aproximadamente] dois metros quadrados de pele”

“Mijo de gato brilha sob luz negra”

“Seu corpo tem carbono o suficiente para encher 9000 lápis”

“Dois medos mais comuns: Palhaços e alturas”
“Tigres usam caixas de areia”
“Você vê melhor quando está assustado”

“Você peida um balão de gás por dia”

“57 gramas de ouro podem cobrir um outdoor”
[haeck: Esse cartaz nunca poderia ser feito no Brasil. Pensando bem, nem mesmo o dos lapis. Ou quem sabe o da caixa de areia…]

Videos no Canal do FSEMZUSP!

Para quem ainda não sabe, o Fórum de Sistematica e Evolução do Museu de Zoologia da USP está com um canal no YouTube e está disponibilizando filmes de palestras e outros eventos que ocorrem no museu.

Eu estava na cola deles sobre isso à séculos, desde que descobri que o MZUSP tem um sistema de filmagem bastante avançado (e com uma qualidade de som ótima, como vocês irão notar). A internet carece de filmes científicos de alto nível em português, e acredito que essa seja uma oportunidade ótima para divulgação e popularização.

Eles também estão colocando aulas que foram ministradas durante o curso de aperfeiçoamento de monitores, que ajudei a organizar. As aulas tem caráter mais didático, então talvez seja ideal para quem quer saber um pouco mais sobre os assuntos expostos.

O único motivo pelo qual estou falando disso é que eles ainda tem menos vizualizações do que meu blog, o que é uma evidência forte de que estão tremendamente sub-aproveitados. Então, entrem lá, se inscrevam e aproveitem as palestras!

Acompanhem também as novas palestras no site deles e no perfil deles no facebook.

Links:
Canal: http://www.youtube.com/user/FSEMZUSP
Google Site: https://sites.google.com/site/fsemzusp/
Facebook: https://www.facebook.com/profile.php?id=100003741473576