A artrose do quadril e do joelho é uma das principais causas de dor crônica e incapacidade em adultos, afetando cerca de 528 milhões de pessoas em todo o mundo, apresentando um aumento de 113% desde 1990. Embora os procedimentos cirúrgicos, como a artroplastia, sejam extremamente eficazes em casos avançados, a medicina baseada em evidências, nos mostra que o tratamento não cirúrgico deve ser a base terapêutica inicial e contínua para a maioria dos pacientes.
🔬🧪 O que a ciência atual recomenda?
As diretrizes internacionais da Osteoarthritis Research Society International (OARSI), publicadas em 2019, representam um divisor de águas na abordagem não cirúrgica da osteoartrite. Com base em revisões sistemáticas e meta-análises robustas, o documento propõe um algoritmo prático e centrado no paciente para o tratamento da artrose de joelho e quadril.
🧠 1. Educação do Paciente: A pedra fundamental
A informação é terapêutica. Explicar ao paciente o curso natural da doença, os fatores modificáveis e as expectativas realistas de cada intervenção é uma recomendação universal. A educação não apenas melhora a adesão ao tratamento, mas também reduz o medo e promove autocuidado responsável.
🏃♂️ 2. Exercício estruturado em terra: Eficaz, seguro e essencial
Para pacientes com artrose de quadril e joelho, programas estruturados de exercício em solo — sejam aeróbicos, de fortalecimento, equilíbrio ou exercícios mente-corpo como yoga e tai chi — receberam recomendação forte, por sua eficácia na melhora da dor e da função, com mínima taxa de eventos adversos.
⚖️ 3. Controle de peso: Principal aliado do joelho, possível coadjuvante do quadril
O controle do peso corporal, especialmente quando combinado com o exercício, tem benefícios claros na artrose de joelho. Já na artrose de quadril, embora os estudos sejam mais limitados, a orientação para perda ponderal ainda é considerada boa prática clínica, especialmente em pacientes com IMC elevado (>30 kg/m²).
💊 4. Medicamentos: Usar com cautela, não como primeira linha
A preferência é pelo uso de anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs) tópicos, fortemente recomendados para artrose de joelho, especialmente em pacientes com comorbidades gastrointestinais ou cardiovasculares. O uso de AINEs orais deve ser criterioso, preferencialmente COX-2 seletivos e sempre com proteção gástrica. Acetaminofeno e opioides, amplamente utilizados no passado, foram desaconselhados pela OARSI, devido à baixa eficácia e aos riscos de hepatotoxicidade e dependência, respectivamente.
💉 5. Infiltrações: papel limitado, mas ainda presente
As infiltrações intra-articulares com corticoide e ácido hialurônico foram recomendadas de forma condicional para artrose de joelho, com maior benefício em períodos curtos (4 a 12 semanas). Para o quadril, as evidências são limitadas e não sustentam recomendações fortes.
🔎 Conclusão: A cirurgia não é o início da jornada
A abordagem moderna da artrose de quadril e joelho exige um olhar amplo, integrativo e centrado na pessoa. A dor e a limitação não devem ser vistas apenas como alvos da prótese, mas como fenômenos complexos que respondem de forma robusta à educação, ao movimento e à mudança de estilo de vida.
Este é o propósito do Ciência do Quadril: traduzir a evidência em prática real, valorizando o que temos de melhor na medicina atual — o cuidado individualizado, humanizado e embasado em evidência científica robusta. Como cirurgiões de quadril e joelho, somos também cientistas do movimento. E antes do bisturi, está a ciência.
Referências Bibliográficas
1- Bannuru RR, Osani MC, Vaysbrot EE, Arden NK, Bennell K, Bierma-Zeinstra SMA, Kraus VB, Lohmander LS, Abbott JH, Bhandari M, Blanco FJ, Espinosa R, Haugen IK, Lin J, Mandl LA, Moilanen E, Nakamura N, Snyder-Mackler L, Trojian T, Underwood M, McAlindon TE. OARSI guidelines for the non-surgical management of knee, hip, and polyarticular osteoarthritis. Osteoarthritis Cartilage. 2019 Nov;27(11):1578-1589.
2- Katz JN, Arant KR, Loeser RF. Diagnosis and Treatment of Hip and Knee Osteoarthritis: A Review. JAMA. 2021 Feb 9;325(6):568-578.
3- Felson DT, Lawrence RC, Dieppe PA, Hirsch R, Helmick CG, Jordan JM, Kington RS, Lane NE, Nevitt MC, Zhang Y, Sowers M, McAlindon T, Spector TD, Poole AR, Yanovski SZ, Ateshian G, Sharma L, Buckwalter JA, Brandt KD, Fries JF. Osteoarthritis: new insights. Part 1: the disease and its risk factors. Ann Intern Med. 2000 Oct 17;133(8):635-46.
4- Silverstein FE, Faich G, Goldstein JL, Simon LS, Pincus T, Whelton A, Makuch R, Eisen G, Agrawal NM, Stenson WF, Burr AM, Zhao WW, Kent JD, Lefkowith JB, Verburg KM, Geis GS. Gastrointestinal toxicity with celecoxib vs nonsteroidal anti-inflammatory drugs for osteoarthritis and rheumatoid arthritis: the CLASS study: A randomized controlled trial. Celecoxib Long-term Arthritis Safety Study. JAMA. 2000 Sep 13;284(10):1247-55.
5- https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/osteoarthritis