Terras raras: nem terras, nem raras

por | out 21, 2025 | Textos | 0 Comentários

Sabia que as turbinas eólicas, a fabricação de vidros, elevadores e a bateria de celular utilizam elementos chamados de terras raras? Já ouviu falar? Sabe a importância deles? Nesse texto, iremos explicar o que são esses elementos tão essenciais para o nosso dia a dia, mesmo sem perceber a presença deles!

 

Camila Satie Kurihara e Mariana Olimpio de Aquino

 

 

Do nada, apareceram no meu feed….

Talvez muitas pessoas nunca tenham ouvido falar desse termo “terras raras”. Parece até um nome meio mitológico ou bíblico. Mas em algumas semanas começaram a pipocar vídeos e notícias sobre esses elementos químicos. Isso porque há uma disputa política pela exploração deles envolvendo vários países, dentre eles os EUA e a China. E como o Brasil tem reservas ainda pouco exploradas, sobrou pra gente. Mas vamos ver do que se trata.

 

O que são, onde vivem….

É possível que você se lembre de ter estudado a Tabela Periódica dos elementos no colégio. Lembra? Se não lembra, sem problemas. Em um resumo bem resumido, a Tabela Periódica organiza os diferentes elementos químicos que fazem parte de tudo que conhecemos como matéria, desde o ar que respiramos até o microchip do seu celular. Reproduzimos uma tabela na figura abaixo, mas recomendamos fortemente a tabela interativa no site https://ptable.com/. Na figura abaixo, destacamos os elementos chamados de terras raras, que são os 15 elementos químicos que fazem parte do período Lantanídeos da tabela periódica mais os elementos químicos escândio (Sc) e o ítrio (Y) [1,2].

Essa expressão terras raras, na verdade, é pouco precisa para descrever esse grupo de elementos: eles são encontrados, em sua maioria, em formas de minerais, por isso a designação de “terras”, que era um termo geral para óxidos metálicos; e as suas reservas, apesar de sabermos hoje, são abundantes, mas podem envolver processos de extração complexos. Ou seja, com as informações que obtemos hoje, elas não podem ser consideradas nem “terras” nem “raras” [1,2].

 

Figura 1: Terras raras na tabela periódica.

Fonte: A geopolítica das terras raras. Melo, 2017.

 

Como a maior parte dos elementos presentes na crosta e utilizados por nós, eles são extraídos por meio da mineração e, além de poderem ser encontradas em formas de minerais, como citado acima, podem ser encontradas como argila iônica, semelhante a uma argila comum, mas contendo esses elementos. Quando estão presentes na argila, é muito mais simples extraí-los do que quando estão em rochas. Inclusive, esse é o tipo de extração de se faz na região vulcânica de Poços de Caldas, cidade localizada no sul de Minas Gerais [4].

 

 

Dá pra usar pra quê?

Primeiro, vale destacar que todos os elementos desse grupo são metais, o que já dá pra ter uma ideia da importância. Eles possuem propriedades magnéticas, ópticas ou catalíticas; permitindo a sua aplicação em diversos processos e tendo muitas semelhanças entre si, o que dificulta o processo de separação. Vale também lembrar que todo processo de mineração gera resíduos que podem afetar o meio ambiente. Por conta da semelhança entre si, é muito comum alguns elementos serem substituídos por outros, sem grandes problemas [5].

Vamos descobrir alguns dos usos desses metais?!

Existem os chamados ímãs de terras raras que, como o próprio nome diz, apresentam alguns desses elementos em sua composição. Como exemplo, podemos citar o superímã de neodímio (Nd), que é muito forte e, além do neodímio que é um elemento de terras raras, também apresenta ferro (Fe) e boro (B) em sua composição. Esse superímã pode ser encontrado dentro de celulares e em HD de computadores. Outro exemplo é o ímã constituído pela liga metálica de samário (Sm) – um metal de terras raras – e cobalto (Co) [6].

Já o Mischmetal é uma liga metálica composta por alguns dos elementos de terras raras e ferro (Fe) e a primeira aplicação dessa liga foi em pedras de isqueiro. Além disso, quando o Mischmetal  é adicionado a ligas de magnésio (Mg), um material com boa resistência a altas pressões é obtido e pode ser utilizado em componentes aeronáuticos, em motores de aviões a jato e em componentes de cápsulas espaciais e satélites [1].

O catalisador automotivo é um equipamento responsável por transformar os gases poluentes (como CO, NOx e hidrocarbonetos) gerados pelo veículo em compostos mais seguros (como CO2, H2O e N2) para serem liberados na atmosfera durante o uso do carro. O cério (Ce), por causa de suas propriedades de oxirredução, então, além de outros elementos químicos, pode ser utilizado nesse tipo de equipamento [1,7].

Outra aplicação curiosa dos elementos de terras raras e relacionada às propriedades ópticas desses elementos, é na fabricação de vidros, sendo o cério (Ce) um dos elementos mais empregados, já que ele é usado na forma de óxido nos materiais de polimento de vidro e, também, para modificar a coloração do vidro. Além disso, o cério na forma iônica absorve luz da região do ultravioleta e, assim, também pode ser utilizado na fabricação de lentes oftálmicas especiais para uso solar [1].

Além dessas aplicações citadas, os elementos de terras raras também podem ser encontrados em carros elétricos, turbinas eólicas, painéis solares, além de aplicações na medicina [8]. Hoje em dia, com o aumento da produção desse tipo de veículo, a disputa por terras raras fica ainda mais acirrada. Não à toa, a China, que tem liderado esse mercado, é uma das grandes detentoras de reservas desses metais.

 

 

Dá pra escrever um livro

Um não, mas vários. Esse tema – terras raras – pode abranger diversas discussões e debates envolvendo formas de extração, questões ambientais de contaminação da água e do solo, disputas geopolíticas e até romances, como o livro “Terras Raras” de Ane Braga. Além disso, há muito a ser estudado sobre o assunto. Nos nossos próximos materiais, falaremos um pouco mais sobre essas outras questões para tentarmos entender um pouco melhor sobre esses elementos tão presentes no nosso dia a dia. Continue falando sobre ciência.

 

 

Bibliografia
  1. MARTINS, Tereza S.; ISOLANI, Paulo Celso. Terras raras: aplicações industriais e biológicas. Química Nova, v. 28, n. 1, p. 111–117, 2005. Disponível em: <https://www.scielo.br/j/qn/a/xh6SRfJ68HwKGvgQYTy8cnf/?format=pdf&lang=pt>. Acesso em: 23 set. 2025.
  2. ROSENTAL, Simon. “Terras raras.” CETEM/MCTI, 2008. Disponível em: <http://mineralis.cetem.gov.br/bitstream/cetem/1140/1/36%20TERRAS%20RARAS%20ok.pdf>. Acesso em: 23 set. 2025.
  3. Melo, Filipe. (2017). A geopolítica das terras raras. Carta Internacional. 12. 219. 10.21530/ci.v12n2.2017.634. 
  4. Reis, Júlia. Entenda o que são “terras raras” e como será a extração de argila iônica, investimento de R$ 1,1 bi anunciado por Zema em MG. G1 Sul de Minas. 10/08/2023 Disponível em: <https://g1.globo.com/mg/sul-de-minas/noticia/2023/08/10/entenda-o-que-sao-terras-raras-e-como-sera-a-extracao-de-argila-ionica-investimento-de-r-11-bi-anunciado-por-zema-em-mg.ghtml>. Acesso em: 1 out. 2025.
  5. SOUSA FILHO, Paulo C. De; SERRA, Osvaldo A. RARE EARTHS IN BRAZIL: HISTORICAL ASPECTS, PRODUCTION, AND PERSPECTIVES. Química Nova, v. 37, n. 4, 2014. Disponível em: <https://quimicanova.sbq.org.br/audiencia_pdf.asp?aid2=89&nomeArquivo=v37n4a29.pdf>. Acesso em: 23 set. 2025.
  6. Manual do Mundo. Como é feito um ímã? YouTube, 7 de abr. de 2018. Disponível em: <https://youtu.be/jCL2dLh5MME?feature=shared>. Acesso em: 27 set. 2025.
  7. Machado, Simone. Catalisador é precioso e alvo de ladrões: o que é e para que serve a peça. UOL. 14/06/2022. Disponível em: <https://www.uol.com.br/carros/faq/catalisador-o-que-e-e-para-que-serve.htm>. Acesso em: 27 set. 2025.
  8. Bernardes, Júlio. Valiosas e versáteis: pesquisas com terras raras mostram caminho para criar cadeia produtiva no Brasil. Jornal da USP. 19/11/2021. Atualizado em: 14/01/2022. Disponível em: https://jornal.usp.br/ciencias/valiosas-e-versateis-pesquisas-com-terras-raras-mostram-caminho-para-criar-cadeia-produtiva-no-brasil/. Acesso em: 15 out. 2025.

 

0 comentários

Enviar um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *