O ENIGMA DO AZUL NA NATUREZA: DESVENDANDO A IRIDESCÊNCIA

por | jul 17, 2024 | Textos | 0 Comentários

    Você já se perguntou sobre a origem das cores que percebemos ou já ouviu falar da iridescência?   Apesar de estar presente no céu e no mar, o azul é escasso na natureza, mas por que? Será que essa cor acarreta alguma desvantagem? Vamos explorar juntos os mistérios por trás do raro e fascinante azul na natureza e o incrível fenômeno da iridescência! 

Sarah Vitória B. Carvalho e Gildo Girotto Júnior 

    A luz solar abrange todo o espectro visível, além de comprimentos de onda invisíveis para nós. As substâncias coloridas absorvem certos comprimentos de onda e refletem outros. Quando observamos algo azul, é porque a luz refletida possui um comprimento de onda entre 450 e 495 nm. Curiosamente, muitas das tonalidades azuis na natureza não são resultado de pigmentos, mas sim de um fenômeno óptico intrigante chamado iridescência.[2-7]

    Das mais de 280 000 espécies de plantas com flores conhecidas, menos de 10% produzem flores azuis. Nas flores, a cor azul vem de moléculas que absorvem a parte vermelha do espectro visível. Esses pigmentos são chamados de antocianinas, que vem da expressão grega para “flor azul” (anthos = “flor” e kyanous = “azul escuro”). No entanto, essas moléculas são grandes e complexas, o que torna difícil para as plantas produzi-las. [1-7] 

    O azul é raro nas plantas e ainda mais raro no reino animal. São poucos os animais que produzem pigmento azul, com algumas exceções como a borboleta Nessaea obrinus. A coloração azul em animais geralmente resulta da ingestão de alimentos específicos ou, mais comumente, de efeitos estruturais como a iridescência.  [1-7] 

E O QUE É IRIDESCÊNCIA?

    A iridescência é um fenômeno óptico onde as cores de uma superfície mudam dependendo do ângulo de visão ou da iluminação. Esse efeito é comumente observado em asas de borboletas, penas de pavões, conchas de moluscos e bolhas de sabão. Ao contrário dos pigmentos, a iridescência resulta da microestrutura da superfície que interfere na luz que incide sobre ela. Por exemplo, as linhas circulares concêntricas de sulcos na superfície de um CD têm tamanho e espaçamento semelhantes ao comprimento de onda da luz visível, o que resulta em uma iridescência colorida quando a luz incide sobre eles. Um efeito semelhante pode ser causado por películas finas e transparentes, que dão às bolhas de sabão seu brilho iridescente. [2,3,5]

    No mundo animal, esse efeito pode ser gerado por micro e nanoestruturas localizadas na superfície da pele, concha ou plumagem do animal. Essas estruturas precisam ser altamente organizadas para controlar a reflexão da luz, amplificando ou atenuando determinadas frequências mais do que outras. [2,5] 

E COMO ISSO ACONTECE?

 Isso ocorre quando a estrutura física de um objeto faz com que as ondas de luz se combinem, um fenômeno conhecido como interferência. Na interferência construtiva, as ondas de luz se alinham para reforçar a cor refletida, enquanto na interferência destrutiva, elas se anulam, escurecendo a cor. Conforme o ângulo de visão muda, as cores do objeto iridescente também mudam, dependendo do grau de interferência.  [1-5] 

ONDE ENCONTRAR A IRIDESCÊNCIA NA NATUREZA?

    A iridescência na natureza é especialmente visível nas asas de borboletas como a Graphium sarpedon e a Morpho menelaus. As escamas microscópicas dessas borboletas atuam como grades de difração, refletindo a luz de forma iridescente. Segundo o estudo de Stavenga, Giraldo e Leertouwer as escamas de vidro das asas da Graphium sarpedon não apenas polarizam a iridescência, mas também realçam os pigmentos azuis/verdes da membrana da asa. [1-5, 8-10]

    Além das borboletas, a iridescência é encontrada em peixes como a donzela azul (Chrysiptera cyanea) e o peixe cirurgião-patela (Paracanthurus hepatus), conhecido como Dory em “Procurando Nemo”. Em aves, a Parotia sefilata, uma ave-do-paraíso, exibe penas azuis iridescentes devido a nanoestruturas que refletem comprimentos de onda específicos da luz, sendo um exemplo notável de adaptação para atrair parceiros durante rituais de acasalamento elaborados. [2,5]

    Além disso, na flora, a Begônia pavonina, planta tropical malaia, possui folhas azuis iridescentes graças a iridoplastia, estruturas dentro dos cloroplastos que refletem luz azul de maneira ordenada. Essa característica permite à Begônia pavonina capturar mais energia da luz verde que penetra na densa floresta tropical. [5]

VAMOS FALAR DAS APLICAÇÕES TECNOLÓGICAS?

    O estudo da iridescência não é apenas importante para a biologia, mas também apresenta implicações significativas em várias áreas tecnológicas. Por exemplo: é altamente valorizada em cosméticos e tintas, criando efeitos de cor que variam com a luz e o ângulo de visão. Isso é comum em sombras de olhos, esmaltes de unhas e pinturas automotivas, adicionando um visual dinâmico e atraente aos produtos. [11,12]  

    No setor da moda, tecidos iridescentes são usados para criar roupas e acessórios que mudam de cor com o movimento e a luz, oferecendo um visual inovador e dinâmico. Dessa forma, o estudo da iridescência não apenas aprofunda nosso entendimento da natureza, mas também inspira inovações em ciência e engenharia. [11,12]  

    Para ter acesso a imagens e mais informações sobre esse fascinante campo de pesquisa, consulte as referências bibliográficas abaixo.

1-STAVENGA, Doekele G; GIRALDO, Marco A; LEERTOUWER, Hein L. Butterfly wing colors: glass scales of Graphium sarpedon cause polarized iridescence and enhance blue/green pigment coloration of the wing membrane. Journal of Experimental Biology. Vol 213, edição 10. 15 de mai. de 2010. Disponível em: <https://journals.biologists.com/jeb/article/213/10/1731/9690/Butterfly-wing-colors-glass-scales-of-Graphium>. Acesso em: 16 de jul. de 2024. 

2-PRUM, Richard O; TORRES, Rodolfo. Structural colouration of avian skin: convergent evolution of coherently scattering dermal collagen arrays. Journal of Experimental Biology. Vol 206, edição 14, 2409–2429. 15 de jul. de 2003. Disponível em: <https://journals.biologists.com/jeb/article/206/14/2409/13691/Structural-colouration-of-avian-skin-convergent> Acesso em: 16 de jul. de 2024. 

3-VUKUSIC, Pete; SAMBLES, J. Roy. Photonic structures in biology. Nature. 14 de ago. de 2003. 

Disponível em: <https://www.nature.com/articles/nature0194> Acesso em: 16 de jul. de 2024. 

4-WICKHAM, Shelley; LARGE, Maryanne C. J; POLADIAN, Leon; JERMIIN, Lars S. Exaggeration and suppression of iridescence: the evolution of two-dimensional butterfly structural colours. Journal of the royal society interface. 15 de set. de 2005. Disponível em: <https://royalsocietypublishing.org/doi/full/10.1098/rsif.2005.0071?casa_token=T1k_Ga8Sk8IAAAAA%3An5ddy1LtAV710LTj9QTzgGgRHeVhLVmw8zXTuJhDks1pHXvz9qhHzLejTaAkl1LdQ0mgGMRhDDuNo32H>  Acesso em: 16 de jul. de 2024. 

5-BETTUC, Ottavia. A cor na natureza: azul verdadeiro. Science in School. 13 de fev. de 2023. Disponível em: <https://www.scienceinschool.org/pt-pt/article/2023/colour-in-nature-true-blue/> Acesso em: 16 de jul. de 2024.   

6-STAM, Gilberto. Azul da natureza. Revista Pesquisa Fapesp. 03 de abr. de 2020. Disponível em: <https://revistapesquisa.fapesp.br/azul-da-natureza/#:~:text=A%20cor%20azul%20%C3%A9%20abundante,uma%20cor%20ainda%20mais%20rara>.  Acesso em: 16 de jul. de 2024.   

7-SAVERS, Green. Azul. O mistério da cor mais rara e desejada na natureza. Green Savers. 18 de set. de 2021. Disponível em: <https://greensavers.sapo.pt/o-misterio-da-cor-mais-desejada-porque-e-que-ha-tao-poucas-flores-azuis/>. Acesso em: 16 de jul. de 2024. 

8-KERTÉSZ, Krisztián; BAJI, Zsófia; DEÁK, András; PISZTER, Gábor; RÁZGA, Zsolt; BÁLINT, Zsolt; BIRÓ, László Péter. Additive and subtractive modification of butterfly wing structural colors. Science Direct. jan de 2021. Disponível em: <https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S2215038220301266>   Acesso em: 16 de jul. de 2024.  

9-KERTÉSZ, Krisztián; PISZTER, Gábor; JAKAB, Emma; BÁLINT, Zsolt; VÉRTESY, Zofia;  BIRÓ, László Péter. Color change of Blue butterfly wing scales in an air – Vapor ambient. Science Direct. Disponível em: <https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S016943321300069X?casa_token=yoW1Di4BhxkAAAAA:lRAR5rw8uHYyzlpjx2Ays8gYe4pVv2eaocmA8WNlE5kjtrcdlYRmq2ElC9YT_5P7phDrZLRl3bMh>  Acesso em: 16 de jul. de 2024. 

10-SIDDIQUE, Radwanul Hasan et al. Theoretical and experimental analysis of the structural pattern responsible for the iridescence of Morpho butterflies. Optica Publishing Group. 2013. Disponível em:  

<https://opg.optica.org/oe/fulltext.cfm?uri=oe-21-12-14351&id=257005>  Acesso em: 16 de jul. de 2024. 

11-IRIBARREN, Victor Echarri; MAESTRE, Carlos Rizo. Gloss, Light Reflection and Iridescence in Ceramic Tile Enamels Containing ZrO2 and ZnO. MDPI. Disponível em: <https://www.mdpi.com/2079-6412/10/9/854>. Acesso em: 16 de jul. de 2024. 

12-O que é Iridescente?. Defendi. Disponível em: https://defendi.com.br/glossario/o-que-e-iridescente/. Acesso em: 16 de jul. de 2024. 

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