Evento preparatório para a Conferência Nacional de Ciência e Tecnologia discute como conectar oceano e sociedade

Fonte: Wikimedia Commons

Em 2030 se encerra a Década do Oceano, iniciativa mundial da Unesco, que mobiliza a sociedade para melhorar a saúde do oceano. Nessa corrida contra o tempo, especialistas em divulgação sobre o oceano se reuniram no painel “Oceano Inspirador e Sociedade”, como parte da Reunião Temática “Oceano, Ciência e Políticas Públicas”, nesta quinta-feira (04) em Brasília, com transmissão ao vivo pelo Youtube. O encontro faz parte das Conferências Preparatórias para a 5ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, que acontecerá na primeira semana de junho em Brasília, e que pretende traçar diretrizes para avanços nas ações dos próximos 6 anos em prol do gigante azul.

Painelistas durante a reunião temática. Foto: Divulgação

Mariana Martins de Andrade, oceanógrafa, Jovem Embaixadora do Oceano Atlântico no Brasil e co-fundadora da agência que promove soluções para projetos de conservação do oceano Bloom, destacou a importância de colocar a sociedade no centro das discussões para alcançarmos um oceano inspirador e um Brasil justo, sustentável e desenvolvido. Mariana buscou ilustrar os movimentos necessários para conectar sociedade e oceano, por meio da representação de um cubo mágico, no qual cada peça é fundamental para atingir o objetivo do jogo. “Os movimentos que fazemos para organizar esse cubo são ações que implementamos em busca de soluções que podem e precisam ser baseadas em ciência”, explicou.

Representação de cubo mágico para exemplificar formas de conectar sociedade-oceano. Foto: Divulgação

Para orientar as próximas ações sobre o tema, Mariana apresentou um levantamento sobre como as ciências oceânicas têm aparecido nos relatórios da Nações Unidas nos últimos dez anos. “Cooperação internacional e engajamento de stakeholders foram os temas que mais cresceram nos relatórios da ONU, esse resultado pode ter uma grande correlação em como vamos olhar para os processos em escala internacional, que tem guiado nosso entendimento da relação da sociedade com o oceano”, destacou.

Nessa complexa rede de ações Ronaldo Christofoletti, professor associado do Instituto do Mar da Universidade Federal de São Paulo (IMar/Unifesp), disse ser essencial fortalecer políticas públicas para a educação oceânica  na formação das pessoas. “Hoje o Brasil já é uma liderança mundial, com 18 municípios em dois estados com Lei da cultura oceânica”, explicou Ronaldo referindo-se a Lei Municipal nº 3.935/2022 que estabelece a cultura oceânica no currículo de escolas municipais de forma transversal para todos os anos da educação básica. Ronaldo coordena o projeto de extensão “Maré de Ciência” que criou o programa “Escola Azul”, inspirado em Portugal, para fortalecer e ampliar a formação científica e a cultura oceânica nas escolas de todo o Brasil.  Em novembro de 2021, Santos (SP) se tornou a primeira cidade no mundo a definir que a cultura oceânica deve ser parte da educação.

Apesar do avanços ainda são inúmeros os desafios pela frente. Ronaldo destacou o resultado de uma pesquisa de 2022 da Unesco, Grupo Boticário e Unifesp que mostrou que 40% dos brasileiros não sabem que suas ações influenciam o oceano. “Para que tenhamos um Brasil justo, sustentável e desenvolvido precisamos que a sociedade entenda a sua relação com o oceano”, enfatizou. 

Ele também destacou a necessidade de alocação de recursos em espaços para participação social para alcançar engajamento, como ocorre desde 2010 em edital do CNPq que apoia feiras e mostras científicas. 

Nessa mesma linha, Germana Barata, pesquisadora do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e coordenadora da rede colaborativa de comunicação sobre o oceano Ressoa Oceano, destacou a importância de alocar recursos na criação de editais que envolvam a participação de influenciadores, jornalistas e comunicadores que não tenham uma vínculo institucional, para que esses projetos sejam profissionalizados e para potencializar os resultados esperados. Uma vez que muitos projetos de divulgação científica estão sendo feitos por pessoas com pouco ou nenhuma formação ou experiência na área

A democratização do conhecimento científico é outro grande desafio que Germana vislumbra para superar a distância entre o oceano e a sociedade. “Cerca de dois terços do conhecimento científico sobre oceano está publicado em acesso restrito, então para fazermos esse movimento em prol de avanços precisamos incentivar que essa comunicação seja feita nos princípios da ciência aberta”, destacou referindo-se a crescente tendência em compartilhar dados, publicações e outras etapas da ciência de forma gratuita, transparente e acessível.  

Reflexões sobre prioridades e planos de ação foram levantados por Jana del Favero, pós-doutoranda na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e editora-chefe do blog e podcast de divulgação das ciências do mar, Bate-papo com Netuno. “O que de fato estamos fazendo? O que conseguimos fazer e podemos fazer?”, indagou. Segundo Jana, precisamos atingir e formar as crianças em cultura oceânica, mas não podemos esperar a mudança vir delas. “Não serão elas as principais responsáveis pela mudança até 2030. Estamos correndo contra o tempo”, pontuou. 

As ações que resultam em mudanças necessárias para conectar oceano e sociedade estão acontecendo, reflete Mariana. “Somos essas sementes que tentam levar essa palavra para diversos outros locais, isso por si só representa nosso papel como ponte dessas conexões oceânicas”, concluiu. 

Em busca de promover ações que incentivem as pessoas a reconhecerem a influência do oceano em suas vidas, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação  liderou a iniciativa “Aliança pela Cultura Oceânica” em parceria com a Unesco e a Unifesp. Em 2022 a Aliança lançou o curso online e gratuito “Formação de Multiplicadores da Cultura Oceânica” para fomentar a conexão entre a sociedade e o oceano. Para mudar a percepção de estudantes de todos os níveis educacionais e o público geral sobre o território brasileiro, o IBGE, a Marinha do Brasil e o Ministério da Educação desenvolveram um novo Mapa do Brasil que inclui a Amazônia Azul formada por toda vastidão marítima nacional. O contra-almirante da Secretaria da Comissão Interministerial para os Recursos do Mar da Marinha do Brasil, Ricardo Jaques Ferreira enfatizou a importância desse novo mapa. “Pela primeira vez as crianças vão olhar o mapa e não vão ver só terra, terça-feira (09) o IBGE vai lançar oficialmente o novo Atlas, com a representatividade do território marinho”, destacou.

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Juliana Di Beo

sou bióloga pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e bolsista Mídia-Ciência Fapesp pelo Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) da Unicamp. Atuo com comunicação científica para fortalecer a cultura oceânica e o acesso aberto ao conhecimento na Rede Ressoa Oceano.

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