Por Laura Cristina e Germana Barata

Este ano, a Década do Oceano chega à metade e, apesar de avanços que ocorreram nos últimos anos na saúde do oceano, ainda há muito trabalho adiante. Ronaldo Christofoletti, professor da Universidade Federal de São Paulo e presidente do Grupo Mundial de Especialistas em Cultura Oceânica da Unesco, tem uma visão positiva sobre os primeiros anos da Década do Oceano. “A cultura oceânica nestes primeiros cinco anos avançou muito mundialmente. Vemos uma comunidade que se fortalece e se expande, cada vez mais, em diversidade de todos os tipos, regiões, grupos e setores”, contou.

O Brasil responde por grande parte dos avanços da cultura oceânica. Segundo Christofoletti, o país é líder do Sul Global em publicações (de acordo com dados de 2024), em números de projetos registrados na Década, além de investir em políticas públicas de educação, como a inclusão da cultura oceânica no currículo escolar, o chamado currículo azul. Santos foi a primeira cidade do mundo a aprovar legislação nessa direção, em 2021, atitude que foi seguida por cidades em outros 20 países. 

Christofoletti esteve na Primeira Conferência Internacional da Década do Oceano para Cidades Costeiras, que terminou dia 27 de fevereiro na China, e contou que há um reconhecimento da cultura oceânica como central para atingir todos os desafios da Década, afinal ela responde diretamente pelo desafio “transformar a relação das pessoas com o oceano”.

A interdisciplinariedade é fundamental para avanços na conservação do oceano e sua conscientização

Estudo publicado na revista científica Marine Policy este ano, com autoria de Christofoletti e liderado por Jen McRuer, da Coalizão Canadense de Cultura Oceânica, no Canadá, sugere que a interação entre a sociedade e o oceano é crucial para a preservação marinha, de tal forma que a literatura oceânica seria um alinhamento chave para capacitação das comunidades globais sobre a conservação da saúde e bem estar das pessoas conjuntamente ao oceano.

Os autores do estudo enfatizam que as pesquisas sobre o ecossistema marinho podem se beneficiar de dados e da experiência das comunidades locais que vivem e dependem de regiões de atividade hídrica, para ações de preservação, política e da economia sobre tais sistemas. Os resultados exploram as dimensões da interdisciplinaridade entre esforços amplos de conservação em diálogo com a conscientização oceânica. O estudo demonstra a importância de ações da Aliança da Década do Oceano, promovidas pela Conferência dos Oceanos das Nações Unidas, evidenciando a série Diálogos da Cultura Oceânica em sua edição realizada em Santos (SP) em outubro de 2022. Tais ações participativas colaboram para a restrição das ameaças enfrentadas pelo oceano, compartilhando informações em estruturas sociais, políticas e culturais. Santos foi a primeira cidade do mundo a aprovar uma lei em 2023 que define a cultura oceânica como parte do currículo escolar.

“Reconhecendo o recente crescimento do interesse pela literacia oceânica e pesquisas relacionadas, é cada vez mais evidente que a pesquisa em literacia oceânica oferece uma lente valiosa para investigar e entender as dimensões humanas da conservação marinha.” ressaltam os autores sobre a educação oceânica baseada em sua literacia.

Fonte: 76ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) – 2024. Crédito: Marinha do Brasil

Os autores concluíram que a relação entre a sociedade e o oceano é indissociável. As políticas de decisão sobre conservação marinha devem ser compartilhadas com as comunidades, de tal forma a fazer recortes sociais nas experiências humanas, baseando a direção coletiva em cada local por meio de diferentes estratégias para garantir políticas, recursos e ações mais eficazes. Além da proposta de integrar as iniciativas de conservação marinha à cultura oceânica. Assim, a interdisciplinaridade é fundamental para o avanço da conscientização sobre o oceano, integrando-se à agenda da Década do Oceano.

A cultura oceânica na Conferência Mundial do Oceano

Em junho, a Conferência Mundial da Década do Oceano, ocorrerá em Nice, na França, e será o momento dos países membros assinarem declarações para se comprometerem com ações políticas de avanços dos objetivos em prol de um oceano saudável. Nesse movimento, Ronaldo e a equipe de cultura oceânica atuam para garantir que a cultura oceânica faça parte da declaração. Foi com surpresa que ele e sua equipe identificaram a ausência da cultura ou educação oceânica nos documentos preparatórios da declaração e logo organizaram uma petição que pedia a inclusão do tema. Com mais de mil assinaturas de 58 países, a petição mostrou a força da comunidade e conseguiu sensibilizar os membros da Década para a inclusão da cultura oceânica na declaração. 

Leia o artigo original:

MCRUER, J. et al. Human-ocean relationships: Exploring alignment and collaboration between ocean literacy research and marine conservation. Marine Policy, v. 171: janeiro de 2025.

O Blog Um Oceano tem parceria com a Rede Ressoa Oceano



Germana Barata

Jornalista de ciência, mestre e doutora em história social. É pesquisadora do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) do Núcleo de Desenvolvimento da Criatividade (Nudecri) da Unicamp e editora dos blogs Ciência em Revista e Um Oceano.

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