Workshop da Rede Ressoa Oceano elencou a baixa leitura dos jovens, o alto grau de analfabetismo funcional e a desconexão com o oceano como barreiras a serem superadas 

Por Germana Barata e Juliana Di Beo

Equipe da Ressoa Oceano e convidados se reúnem para fortalecer a comunicação sobre o oceano. Crédito: Ressoa Oceano

Cerca de 55% dos brasileiros vivem no litoral, mas 40% acreditam que suas ações não afetam o oceano. Estes dados, do IBGE e de pesquisa de 2022 que identificou a relação de brasileiros com o oceano, indicam o tamanho do desafio que a Ressoa Oceano, uma rede colaborativa para comunicar o oceano, tem pela frente. A iniciativa reuniu especialistas nos dias 29 e 30 de abril para debater os desafios e buscar estratégias para tornar a comunicação do oceano mais afetiva e efetiva. 

O Workshop contou com a participação de especialistas em comunicação, como a radialista e jornalista ambiental Paulina Chamorro e a jornalista Juliana Vilas, especialista em neurocomunicação, além do coordenador da Amazônia Vox e a engenheira de pesca Juliana Schober, professora da Universidade Federal de Sergipe (UFS).

Dentre os principais desafios levantados está a diminuição da leitura e do consumo de notícias jornalísticas entre os jovens, somados às altas taxas de analfabetismo funcional (aquelas pessoas alfabetizadas, mas com grande dificuldade de interpretar e compreender textos), e a ausência de conexão da sociedade com a natureza, especialmente o oceano. 

Mas nem tudo é dificuldade. A equipe, majoritariamente feminina, trouxe aspectos positivos que devem fortalecer as estratégias da Ressoa Oceano para pensar estratégias de como tornar o oceano mais envolvente, inspirador e acessível. 

No primeiro dia do encontro, a equipe fez um balanço sobre a atuação da Rede e os necessários desdobramentos futuros. A Ressoa tem como propósito desenvolver ações em quatro frentes: curadoria de ações e iniciativas sobre o oceano; cursos de formação para jornalistas e comunicadores; produção de conteúdos originais e relevantes sobre o oceano; e ciência cidadã com enfoque para envolver estudantes no processo de produção de conteúdos. A produção de conteúdos foi a que mais avançou no primeiro ano da rede. A produção foi majoritariamente em texto e em gêneros diversificados, como a coluna no jornal ambiental o eco, Oceano é fonte de temas para educação básica”, notícia como a publicada no blog Um Oceano Oceano ganha destaque no debate sobre mudanças climáticas na COP 28”, entrevista no blog da Liga das Mulheres pelo Oceano Entrevista com a Bia da Marulho”, coluna na revista Ciência Hoje das Crianças ”Maneiras de se conectar com o oceano mesmo sem colocar o pé na água”, artigo no site da Ilha do Conhecimento Crenças e atitudes sobre tubarões e as implicações para sua conservação” e press release na Agência Bori Recuperação de espécie ameaçada de tubarão-limão em Atol das Rocas”

Os exemplos acima somam mais de 50 produções de conteúdos sobre o oceano, todos em acesso aberto e dando destaque para a ciência brasileira. No entanto, a Rede planeja investir na curadoria de ações de comunicação sobre o oceano. Uma delas é coordenada pelo jornalista Daniel Nardin, o Amazônia Vox, um hub de jornalistas da região amazônica que quer dar visibilidade e fortalecer a cobertura sobre a maior floresta tropical no país e no mundo com profissionais da região. O jornalista aposta no jornalismo de soluções para projetar iniciativas de impacto socioambiental positivo no público. O jornalismo de soluções busca dar enfoque nas soluções de problemas, portanto um viés mais proativo para a sociedade do que as tragédias e dificuldades. Ele também destacou a possibilidade de trazer a comunidade local para atuar na comunicação, como lideranças de comunidades tradicionais na região, e a necessidade de dar mais destaque à Amazônia Azul, região costeira somada à Zona Econômica Exclusiva (ZEE) do país.   

Comunicar com afeto 

Para enfrentar o desafio da falta de conexão do público com o oceano, a jornalista ambiental Paulina Chamorro trouxe o conceito de comunicação amorosa. Com 25 anos de prática jornalística, ela busca elementos que toquem a emoção de forma positiva, como a dedicação de Mulheres na Conservação, série de documentários que aborda a atuação de cientistas como Bárbara Pinheiro, pós-doutoranda da Universidade Federal de Alagoas, que se dedica a estudar o branqueamento dos corais, e Zélia Brito, chefe da reserva biológica do Atol das Rocas (RN), que devota sua vida a conservação deste Patrimônio Natural Mundial pela Unesco. 

Os impactos das ações humanas no clima e no oceano têm sido retratados pela mídia pelo viés negativo e catastrófico, que pode afastar o público de uma possibilidade de ação ou mudança de comportamento. “Estamos alterando nossa casa, o planeta em que vivemos. Mas como vamos transformar isso não apenas em revolta, mas em algo que possa ser transformador?”, questiona. Paulina lembra que não se trata de ocultar os problemas, mas de enfatizar que é preciso focar nas ações e contribuir para a educação, sensibilização e engajamento.  

Além da conexão afetiva para tocar o público, Juliana Vilas mostrou para a equipe da Ressoa Oceano que os processos cognitivos mudaram com as novas formas de comunicação, voltada para a imagem, o vídeo, e mensagens curtas das redes sociais. Neste cenário, ela mostrou as inúmeras vantagens no formato de podcasts, comunicação por meio do áudio e que permite que o ouvinte divida sua atenção com outras atividades como lavar a louça ou fazer exercício físico, por exemplo. 

Ela tratou da importância da entonação de voz, da narrativa atraente, na sonorização para deixar as histórias mais atraentes. Como a informação em áudio não costuma ser interrompida e repetida para mais esclarecimentos, como ocorre no texto, Juliana sugere que na conclusão de cada episódio se recupere três informações principais, como forma de facilitar a compreensão da mensagem que se quer passar.

Os podcasts são um dos meios de comunicação mais usados pela população brasileira. São cerca de 45 milhões de brasileiros que ouvem podcasts pela internet, de acordo com a pesquisa TIC Domicílios de 2023. Apesar de não sabermos ao certo quantos desses ouvintes consomem podcasts relacionados  ao oceano, identificamos em um levantamento que os podcasts sobre oceano aumentaram substancialmente a partir de 2020, ano que marca o início da pandemia de Covid-19 e o início dos esforços de implementação da Década do Oceano no Brasil. A maioria destes podcasts se concentram em estados litorâneos da região sudeste e apenas 33% deles se mantêm ativos.

Em busca de fortalecer a comunicação por meio dessa ferramenta de áudio, um dos frutos do I Workshop Ressoa Oceano será a criação de um podcast colaborativo sobre o oceano que poderá contribuir para sensibilizar e conectar o público ao oceano com elementos trazidos pelos convidados: comunicação afetiva, jornalismo de soluções, com a participação de diferentes atores sociais e informação científica. Aguardem os próximos passos. 

Ressoa Oceano

A Ressoa Oceano, que em abril completou o primeiro ano de atuação, é uma rede de comunicação colaborativa sobre o oceano, fruto de parceria entre o Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) da Unicamp, a Cátedra Unesco para a Sustentabilidade do Oceano da USP, a Liga das Mulheres pelo Oceano e Ilha do Conhecimento com financiamento do CNPq.

Parceria:


Germana Barata

Jornalista de ciência, mestre e doutora em história social. É pesquisadora do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) do Núcleo de Desenvolvimento da Criatividade (Nudecri) da Unicamp e editora dos blogs Ciência em Revista e Um Oceano.

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