A 30ª edição da Convenção das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP-30, se aproxima, e neste ano a sociedade civil organizada promete pressionar para que o oceano seja protagonista das negociações e decisões para frear os impactos das mudanças climáticas.
E foi com o objetivo de ampliar a presença do oceano na COP-30 que três especialistas se reuniram no webinário Vozes do Mar, organizado pelo O Eco e Correio Sabiá, no último dia 18.
“Desde a Eco 92 as regras e compromissos têm se desenvolvido no contexto da floresta. Existe uma pressão para que o oceano ocupe um lugar, porque ele é crucial. Ele é tão ou mais importante que as florestas para o contexto de estoque de carbono para que, de fato, as mudanças climáticas sejam freadas”, defendeu Luiza Prestes, engenheira de pesca e professora da Universidade Estadual do Vale do Acaraú (CE). Segundo ela, a COP tem centrado o debate no chamado créditos de carbono verde, vindo das florestas, mas precisa avançar em direção ao carbono azul.
Não à toa, o oceano brasileiro tem sido chamado de Amazônia Azul, uma forma de trazer para si a relevância e a visibilidade mundial que a maior floresta do mundo possui. A COP-30 já garantiu o Pavilhão do Oceano, espaço reservado para o debate e negociações em prol do oceano, mas ele ainda não é dos maiores. Espera-se, que ele se expanda nas próximas COPs, nas quais o oceano precisa “transbordar” para todos os níveis de negociações.
Sem oceano não há solução
Tratar de mudanças climáticas sem incluir o oceano parece um desafio ainda maior, já que este ecossistema de águas salgadas ocupa mais de 70% da superfície do planeta. “Não temos 30 anos para que o oceano entre nas negociações de créditos de carbono”, alertou Luiza, lembrando que as negociações de créditos de carbono precisam incluir pagamentos de serviços costeiros, ou seja para comunidades empenhadas em preservar manguezais e ecossistemas pesqueiros, bem como em praticar a pesca artesanal e outras atividades na costa.

Outro desafio que deverá avançar nas negociações em Belém do Pará são os acordos para limitar a produção e a poluição por plásticos, a mais severa no oceano. Rafael Eudes, da Aliança Resíduos Zero, lembra que cerca de 1,3 milhão de toneladas são despejadas anualmente nas águas marinhas brasileiras, e, neste ano, ultrapassamos a capacidade de gestão desses resíduos, ou seja, produzimos mais plásticos do que conseguimos administrar.
Ele enfatizou que apesar de o Brasil ser líder da produção de plásticos na América Latina, ainda não possui compromissos legislativos para controlar a poluição plástica. “O Brasil precisa liderar pelo exemplo na COP-30 para que a gente consiga avançar nos compromissos climáticos para limitar o aumento da temperatura global”, afirmou.
Rafael defendeu que é necessário avançar nas soluções para a crise da poluição plástica, comparando-a a “uma banheira que está vazando água, e que não adianta tentar resolver tirando água com uma colher; é preciso fechar a torneira”. A analogia usada por Rafael se tornou um dos símbolos do combate à poluição plástica, a partir da instalação “Turn off the plastic tap” do artista Benjamin Von Wong de 2021.
Por mais vozes pelo oceano
Diante do cenário de agravamento da saúde do oceano e, portanto, do planeta, as políticas e ações precisam se voltar para as novas gerações, que deverão sofrer os impactos com maior severidade. Janaina Bumbeer, da Fundação Grupo Boticário, trouxe dados da última pesquisa de percepção dos brasileiros sobre o oceano, indicando que os mais jovens, a chamada geração Z, acreditam mais em mudanças climáticas e na sua relação com o oceano, enquanto aqueles que vivem mais distantes da costa e possuem menor grau de educação tendem a desacreditar nessa relação. “São pontos que precisam ser trazidos ao debate e à COP-30. Qual o espaço da juventude e das comunidades costeiras na COP-30 e nas discussões climáticas?”, questionou.
A defesa por maior inclusão do oceano e de vozes da sociedade tem sido uma constante nos debates sobre as mudanças climáticas. Apesar de ainda insuficiente, Janaína demonstrou otimismo no aumento de espaços para a participação pública nos últimos anos. Ela mencionou as Contribuições Nacionais Determinadas (NDCs), ou seja, como cada nação vai cumprir as metas climáticas estabelecidas no Acordo de Paris, em 2015, e que passaram a incluir o oceano (NDCs azuis) no maior nível de negociações.
Segundo Janaína, as comunidades passaram também a ter maior participação, exemplo disso é o espaço que a Redes de pescadores e pescadoras artesanais do Brasil terá dentro da COP-30, além da iniciativa Casa Vozes do Oceano, que irá disponibilizar espaço para quem quiser ter voz nos debates sobre o oceano. Ela mencionou ainda o Mutirão Azul, ação que mapeia as contribuições locais para enfrentar a crise climática global, coordenada por Marinez Scherer, enviada especial dos oceanos na COP-30. “Não vamos alcançar mudanças políticas nem de investimento, nem no setor poluidor, se não tivermos o engajamento social”, enfatizou.
Os especialistas reunidos deixaram claro que a COP-30, que hospeda a conferência na Amazônia pela primeira vez, precisa incluir o oceano como protagonista das negociações sobre as mudanças climáticas.
Créditos de carbono
Os créditos de carbono seriam como moedas de troca entre governos ou empresas que emitem gás carbônico na atmosfera, contribuindo para o aquecimento global, e que podem minimizar este impacto a partir do financiamento de projetos responsáveis por absorver carbono, como reflorestamento e investimentos em energias alternativas. Quando estes créditos estiverem relacionados à preservação de ecossistemas costeiros e marinhos, como a conservação de manguezais e a restauração de zonas costeiras degradadas, então serão créditos de carbono azul.
Assista ao debate
O evento Vozes do Mar: COP30, negociações internacionais e o futuro do oceano reuniu Luiza Prestes, Rafael Eudes e Janaína Bumbeer, com moderação da coordenadora da rede Ressoa Oceano Germana Barata. Assista ao debate na íntegra, que ocorreu no dia 18 de setembro de 2025, e está disponível nos canais de O Eco e Correio Sabiá.
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