Torcer contra ou a favor?

Juramento da torcida- arquivo pessoal

Na última segunda-feira, dia 15 de agosto, um brasileiro desconhecido,  para a maioria do país, conquistou a medalha de ouro nos Jogos Olímpicos superando o multi-campeão francês. Thiago Braz em primeiro, Renaud Lavillenie em segundo.

Mas o francês parece não ter levado “na esportiva” o fato de ficar na segunda posição. Afirmou em entrevista que se chocou com as vaias, chegando a comparar o Brasil com a Alemanha nazista nas olimpíadas de 1936, em Berlin, fazendo relação com a opressão da torcida.

De um lado ouso afirmar que a torcida pode ter até influenciado de alguma forma, mas não é a responsável pelo resultado, pois se isto fosse fato, teríamos muitas outras conquistas!

Do outro ponto de vista, é necessário refletir sobre a reclamação do atleta estrangeiro. Somos maus torcedores? Segundo João Batista Freire, não somos nazistas mas mal-educados esportivamente. E, agora minha opinião, influenciados na torcida em outras modalidades pela cultura do futebol (masculino), da catimba, da provocação, do fingimento, da reclamação, do xingamento, do juiz ladrão…

Nas competições de ginástica artística, em meio ao silêncio provocado pela apresentação de um dos adversários do Arthur Zanetti, nas argolas,  alguém grita em alto e em bom português: “Vai cair!” E deixa, espero, qualquer brasileiro minimamente correto com vergonha.

Portanto, o francês Lavillenie nos dá uma lição ou pelo menos oferece a oportunidade de aprendermos. Mas para tanto é necessário abandonarmos o discurso velho, endurecido, tosco, de que no esporte é assim mesmo, que tem que xingar, tem que vaiar, tem que diminuir, e se for argentino, mais ainda! Até porque, novamente citando em minhas postagens Roberto Damatta, o futebol (ou o esporte) é a imagem de seu povo. Portanto, o que fazemos nas arquibancadas é o que norteia nossas vidas. Se no esporte é a rivalidade contra os argentinos, no cotidiano é o pobre contra o rico, o evangélico contra o espírita, o coxinha contra o petralha, o corintiano contra todos e e assim seguimos!

Mas podemos mudar? Claro que sim, mas dá trabalho e é necessário, antes de mais nada acreditar que é possível e principalmente necessário.

Aos colegas professores e treinadores um exemplo: Começamos desde cedo, com as crianças e adolescentes, a desconstruir a ideia de que o adversário é o inimigo a ser eliminado. No lugar, colocamos o opositor como uma pessoa semelhante, que quer ganhar e que nos mostrará onde somos fracos e fortes. Ou seja, é uma amigo de caminho e que, sem ele, o principal não acontece: o fabuloso momento do JOGO!

“Ah, mas e os pais, a família? Isto vem de casa! ” já me abordaram muitas vezes quando proponho ações desta natureza, e como resposta afirmo ser necessário tornar a família pelo menos consciente dos valores que estamos procurando estimular em seus filhos. Um exemplo que simboliza a decorrência deste movimento por agregar a família no processo de formação moral é o que adotamos em diversos torneios em diferentes locais: o juramento dos pais, quando solicitamos formalmente que ergam o braço direito, na frente de seus filhos e repitam algo como: “Juro solenemente torcer para meu filho e não contro o outro…” completada com outras tantas mensagens que podem ser incorporadas neste contrato moral.

E não foram poucas as vezes que presenciei filhos alertando seus pais sobre o juramento, quando deslizavam devido a empolgação do momento competitivo.

Entendo por fim que uma mudança moral no povo brasileiro, tanto no esporte como fora dele, nunca acontecerá de forma abrupta e repentina, mas sim, no conjunto de ações constantes e conscientes. Mas para tanto é preciso ouvir as reclamações e não somente rebatê-las, refletir sobre suas verdades e ter coragem para mudar.

Sobre Leopoldo Hirama 9 Artigos
Docente da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, (UFRB), formado em Educação Física pela FEF-Unicamp, mestre em Ciências do Esporte e doutorando na mesma instituição. Atua na temática da Pedagogia do Esporte, mais especificamente nos esportes coletivos e lutas e as possibilidades do fenômeno esportivo na educação de crianças e adolescentes em comunidades periféricas. Atualmente pesquisa as características do ambiente de ensino do esporte para a formação da personalidade moral de jovens praticantes.

3 Comentários

  1. Escrevi sobre a questão também - analisando os estudos a respeito da influência das vaias no desempenho dos atletas:
    http://genereporter.blogspot.com.br/2016/08/bibbidi-bobbidi-boo-vaias-como-varinhas.html
    ---------

    []s,

    Roberto Takata

  2. Torcer contra, xingar, vaiar, gritar, fazer barulhos para atrapalhar são demonstrativos de uma cultura individualista, desrespeitosa, agressiva, Neandertal e antisocial. Não existe inteligência em torcer contra. A Lei de causa e efeito e a Lei do retorno explicam bem essa incoerência. Tudo que é lançado para o universo, em pensamentos, emoções, palavras e ações retorna para você com a mesma intensidade. Essa máxima é propagada em todas as esferas da vida. A partir do momento que se incorpora a gratidão, a admiração e o entendimento, a alma consciente não cogita agredir de modo algum o seu próximo, mesmo que este seja do time oposto. Cada um dá o que tem!

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