Energia Eficiente para Crescer

por Antônio Márcio Buainain (*)

O crescimento econômico parece ter entrado, firme, na agenda política que vem sendo discutida para o segundo mandato do presidente Lula. Em seu discurso da vitória Lula incorporou as prioridades defendidas por Geraldo Alckmin, reconheceu que o baixo crescimento dos últimos anos e chegou até a repetir bordões do adversário, como “não podemos mais perder oportunidades.” Crescimento não se alcança por geração espontânea e para alcançar a meta de 5% a.a., modesta para o Brasil, a nova administração deverá superar muitas inconsistências, como a dubiedade em relação ao papel do Estado e do setor privado, e ter coragem de levar adiante as reformas estruturais, como a fiscal, tributária e trabalhista, necessárias tanto para elevar a capacidade de investimento do Estado como para melhorar o ambiente macroeconômico. Com todas mexem, diretamente, na base de sustentação política e na lógica de operação do PT e aliados, resta saber se o Governo terá determinação e “vontade política” para levar adiante o projeto de crescimento.

Um dos obstáculos que terá que enfrentar é a ameaça, cada vez mais difícil de esconder, de falta de energia. As projeções de oferta futura, a cargo da Empresa de Pesquisa Energética, têm sido questionadas por produtores, distribuidores e grandes consumidores de energia. O Estado, que vem assumindo compromissos de geração, não tem recursos para bancar os projetos, e o setor privado não tem tido incentivos para investir. Projetos continuam paralisados por razões ambientais e por indefinição regulatória. Além disso, parte das termos a gás não teriam condições de operar por falta do insumo e o próprio preço, em elevação, pode eliminar a competitividade de importantes setores da economia brasileira. A resposta tem sido uma profusão de regras que vem reduzindo a concorrência e eficiência do mercado, elevam custos da energia futura e a conta de subsídios e compensações embutidos na atual estrutura tarifária. Destravar o setor é condição para o crescimento acelerado do país.

Ao lado da ameaça real de escassez de energia, gasta-se mal a energia disponível. Em que pese os progressos alcançados desde 2001, os equipamentos domésticos e industriais em uso ainda são ineficientes do ponto de vista energético; os padrões exigidos são tímidos quando comparados com os vigentes em países desenvolvidos e até em países como México e Chile; o consumidor voltou a relaxar na questão da economia e faltam incentivos, positivos ou punitivos, para conservar energia. Estudo de pesquisadores da Unicamp, patrocinado pela WWF- Brasil, mostra que, comparado com o padrão atual, se o Brasil adotasse medidas de eficiência energética (MEE), seria possível reduzir em até 38% a demanda esperada de energia elétrica até 2020. “Em termos práticos, essa energia corresponde à geração evitada de 60 usinas nucleares de Angra III”, proporcionando “uma economia de até R$33 bilhões na conta de eletricidade.”

A adoção de MEE não é alternativa aos investimentos em geração, mas complementar. São medidas tecnicamente simples, já adotas e testadas em muitos países, que poderiam elevar a oferta com ganho de eficiência na produção e distribuição e poupar energia na ponta do consumo. Envolvem desde melhorias na operação do sistema interligado e repotenciação de usinas hidroelétricas, redução de perdas no sistema de transmissão e distribuição, incentivo à co-geraçao e geração descentralizada até a utilização de motores mais eficientes, utilização de sistemas de iluminação mais modernos e substituição de chuveiros e aquecedores elétricos ― responsáveis por 8% da energia consumida ― por sistemas de aquecimento solar. Também chama atenção para o potencial das fontes de energia renovável, tais como bioenergia, energia eólica e pequenas centrais hidroelétricas (PCHs).

Os instrumentos para melhorar a eficiência energética estão disponíveis, mas vem sendo mal gerenciados. Os recursos disponíveis (em torno de R$400 milhões/ano) são usados de forma descoordenada e sem vinculação a resultados objetivos e a Lei de Eficiência Energética é adotada com frouxidão. Como economizar energia impõe um custo imediato, faltam incentivos em toda a cadeia para mudar o padrão vigente. Como o setor é complexo e os interesses variados, somente o setor público é capaz de coordenar o conjunto de ações necessárias para melhorar a eficiência energética do país. Mas isto parece uma tarefa menor para quem ainda confunde Estado Forte com Estado Produtor e Interventor.

Texto publicado no jornal O Estado de São Paulo em 07/11/2006. Caderno Economia.

(*) Professor Assistente Doutor do Instituto de Economia da Unicamp (buainain@eco.unicamp.br).

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Gilberto

Professor Titular em Sistemas Energéticos do Departamento de Energia, Faculdade de Engenharia Mecânica da UNICAMP (Universidade de Campinas), Pesquisador Sênior do Núcleo Interdisciplinar de Energia da UNICAMP (NIPE-UNICAMP). Diretor Executivo da International Energy Initiative-IEI, uma pequena, organização não-governamental internacional, independente e de utilidade pública conduzida por especialistas em energia, reconhecidos internacionalmente e com escritórios regionais e programas na América Latina, África e Ásia. O IEI é responsável pela edição do periódico Energy for Sustainable Development, da editora Elsevier.

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