Coautor: Eyder Gomes

Uma pesquisa em escala global publicada na revista Science procurou saber sobre o aumento do apetite de peixes predadores de acordo com a temperatura dos oceanos. Os cientistas descobriram que o impacto é maior em áreas mais quentes e, em escala menor, ou de nenhuma ação, em partes do oceano onde as águas são mais frias.

Com isso, os predadores se tornam mais vorazes com o aumento da temperatura, fenômeno que já está em curso segundo o Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC), a maior colaboração internacional científica para medir impactos das mudanças do clima no planeta.

Baiacu-espinho (Diodon holocanthus) – espécie carnívora presente no Atlântico Ocidental, de Massachusetts à São Paulo. Foto de Malene Thyssen (2007)/ Wikimedia Communs.

O estudo coordenado pelo Instituto Smithsonian e pela Universidade de Temple analisou 36 locais diferentes ao longo da costa dos oceanos Pacífico e Atlântico do continente Americano. No Brasil, a pesquisa contou com a participação de sete instituições (UFC, UFRN, IEAMPM-RJ, UFRJ, UFABC, USP e UFPR) e constatou que no ritmo que os predadores consomem as presas, pode haver um desequilíbrio ecológico marcante com o aumento da temperatura da água do oceano.

Para chegar a essas conclusões, os cientistas fizeram uma série de três experimentos em cada local de pesquisa. No primeiro eles ofereceram uma isca com lula seca durante uma hora e mediram o consumo. No segundo e terceiro experimentos, placas com briozoários e tunicados (grupos de animais bastante consumidos por peixes) crescidos durante três meses foram oferecidas nos diferentes locais de duas formas: metade delas protegidas por gaiolas que impediam a predação e a outra metade livre, exposta à predação. Em ambos experimentos houve grande predação em locais de águas mais quentes e predação reduzida ou inexistente em locais de águas mais frias.

Peixes se alimentam de comunidades bentônicas; mudanças nos padrões de predação demonstrados em experimento de estudo internacional. Fotos extraídas de vídeo feito por Gustavo Dias, da UFABC.

A partir desses resultados, “esperamos uma maior perda de diversidade na região dos trópicos por dois motivos: 1) mudanças nos padrões de predação e como ela afeta as comunidades; e 2) aumento de temperatura acima da tolerância dos organismos, resultando em perdas drásticas de interação e de espécies”, enfatizou Guilherme Longo, um dos autores do estudo e professor do Departamento de Oceanografia e Limnologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).

Futuro do Oceano

De acordo com o último relatório do IPCC, as águas oceânicas já sofreram um aumento de temperatura e será preciso limitar este aumento em 1,5ºC, o que parece pouco em termos numéricos, mas que já é o suficiente para causar “perdas moderadas ou altas de biodiversidade”, como afirma o documento.

Mas será possível que depois de um período de desequilíbrio as relações entre os organismos passe por uma adaptação e se reequilibre? Segundo Longo, é difícil prever como será essa reorganização. “Estamos olhando para um futuro muito diferente do que observamos hoje. Isso é preocupante porque pode afetar não apenas a biodiversidade mas também os benefícios que recebemos desses ecossistemas saudáveis e equilibrados”, lamenta o biólogo. O aumento das temperaturas das águas do mar afetará a todos os habitantes do planeta, minimizar os impactos é tarefa urgente.


Referências:

Ashton, Gail V. et al. Predator control of marine communities increases with temperature across 115 degrees of latitude. Science, 376(6598): 12151219. Junho de 2022. 

Sampaio, Cláudio Luis Santos. Guia para identificação de peixes ornamentais – volume I: espécies marinhas / Cláudio Luis Santos Sampaio, Mara Carvalho Nottingham. Brasília: Ibama, 2008. 205 p.

IPCC. AR6 Climate Change 2021: The Physical Science Basis. 2021.


Germana Barata

Jornalista de ciência, mestre e doutora em história social. É pesquisadora do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) do Núcleo de Desenvolvimento da Criatividade (Nudecri) da Unicamp e editora dos blogs Ciência em Revista e Um Oceano.

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