
Entretanto, pouco de que produzem é apresentado a sociedade que os financia. Artigos científicos publicados em revistas internacionais são tão indecifráveis para o público geral, como são hieroglifos. Congressos são reuniões para públicos específicos. Entrevistas são raras. Artigos de divulgação em revistas ou jornais mais populares e algo inimaginável. Produzir conhecimento somente pelo prazer da pesquisa e do maior intelecto é algo muito bonito e apaixonante. Porém, fico um pouco fora de contexto em um mundo com tanta pobreza e desigualdade. O tempo da Academia de Platão já passou, não adianta acharmos que cientistas são deuses pagos para produzirem conhecimento para seus pares.
Nesse contexto, vejo um editorial na Nature sobre a Fundação Nacional de Ciências (FNC) dos EUA. Para um projeto ser financiado pela FNC ele precisa conter uma parte que funciona como um “retorno direto para sociedade”. Fora o conteúdo gerado pela pesquisa, o projeto pode gerar ciclos de palestras em Museus (aberto ao grande público), desenvolvimento de novos currículos e materiais didáticos (para os níveis fundamental e médio), produzir programas de iniciação científica para alunos não-graduados, ou mesmo dar o início a uma empresa especializada. Não existe projeto financiado somente pelo prazer de se produzir conhecimento. Se é para produzir, que seja DIVULGADO e APLICADO na sociedade em que o financiou.
out of their ivory towers and connect them to
society”
Palavras do “somente” diretor do FNC Arden Bement
Outro exemplo, o projeto Molecularium financiado pelo Centro de Estudos de Nanoestruturas do FNC. Este projeto produz material didático sobre o mundo das nanoestrutras, além de ter produzido um filme de divulgação sobre o assunto. Além do Molecularium, engenheiros da universidade de Stanford trabalham com alunos de graduação e de ensino médio, ministrando workshops dentro de hospitais para levar aulas de ciência para pacientes que não podem ir a escola, além de ensinarem sobre a rotina dos instrumentos usados no hospital.

Esse assunto é bastante polêmico, porém de grande relevância para o desenvolvimento de nossa sociedade. O despertar de interesse em qualquer tipo de atividade pode ser uma pequena ação pela qual um indivíduo passa na sua infância ou adolescência. Acho que o que me fez gostar de ciência foi ver o Mundo de Beakman e ter meu jogo de química. Crianças precisam de exemplos e de pessoas apaixonadas pelos seus trabalhos. Quem melhor que cientistas para essa missão? Que saiam de seus laboratórios. O estranhamento só é gerado quando saímos de nossa zona de conforto, quem sabe os próprios pesquisadores sejam os que mais tem a ganhar com isso. Fica a dica para o CNPq e outros órgãos de financiamento de pesquisas.
Referência:
Lok, C. (2010). Science funding: Science for the masses Nature, 465 (7297), 416-418 DOI: 10.1038/465416a
Grato por compartilhar!
De fato, é enorme o abismo que há entre pesquisadores e a sociedade. Sobretudo aqueles vinculados a instituições, principalmente públicas, sejam Universidades ou Empresas públicas de pesquisa e geração de conhecimentos. A ciência tornou-se tão parnasiana quanto ousava criticar o parnasianismo no fim do século XIX; mediada pela estatística e pela obsolescência tecnológica, a ciência parnasiana das universidades no Brasil de hoje carece tanto de reflexão epistemológica quanto os acadêmicos carecem de honestidade. Honestidade no sentido claro da palavra, de honrar com a função pública de que se investiram quando assumiram seus cargos após os concursos; honestidade de retornar o conhecimento ao local de origem, quando das ciências sociais e humanas ou relacionadas a estas; honestidade em compartilhar as informações que seriam fundamentais para fomentar a atividade crítica dentro da ciência e também da sociedade, na cultura, na economia, nas organizações. Falta honestidade, e sobra presunção entre pesquisadores vinculados a instituições públicas.
Ainda ontem escrevia para órgãos como CNPq, CAPES, MEC e algumas universidades perguntando se têm conhecimento de algum programa que financie pesquisadores independentes que possuem produção em pesquisa de fronteira, sobretudo aquela que, por possuir caráter transdisciplinar, não pode ser submetida a algum departamento ou programa de pós-graduação. Escrevi essas correspondências motivado pela minha enorme dificuldade em encontrar interlocutores sobre atividade de pesquisa que realizo em mudanças climáticas e transformações socioambientais. Recentemente foi lançado o 7o. Programa Quadro da União Européia, que tem entre seus subprogramas o Programa Idéias, que tem especificamente a finalidade de financiar pesquisadores de qualquer nacionalidade em 100% de seus custos por um prazo de 5 anos, a ser vinculado a alguma instituição em qualquer país da Comunidade Européia. Gostaria de saber se no Brasil há algo parecido, ou se é só um sonho europeu.
Enfim, num país colonial como o nosso, a arrogância dos Senhores permanece superior à organização da sociedade Servil. É lastimável que sejamos assim. Ainda?
Breno e Luiz,
Parabéns pela iniciativa. Também estou nessa luta por uma maior interação da academia com a sociedade. Atualmente mantenho um blog de divulgação científica, mais voltado para ciências da saúde.
Adicionarei vocês como leituras recomendadas. Convido-os a visitar-me: http://simplesciencia.wordpress.com
Um abraço.
Breno, concordo plenamente quando você diz "quem sabe os próprios pesquisadores sejam os que mais tem a ganhar com isso". Pergunto-me se esse tipo de iniciativa seria tomada pela classe científica brasileira. Conheço alguns pesquisadores que topariam e levariam bem a sério esse tipo de projeto; já outros... Viriam com o velho discurso do "ciência é para cientista" (sem brincadeira, ouvi isso de um professor de ensino médio. Que 'belo' educador e incentivador, né não?)
Abraço!
Caro Breno
"Entretanto,pouco do que produzem é apresentado à sociedade que os financia". É pouco,muito pouco,não resta dúvida,e é muito louvável a sua preocupação. Mas estará a sociedade interessada nisso? Não lhe interessará mais o futebol,ou outra coisa do género,que, para massacrar a cabeça,já bastam as preocupações do dia a dia? De resto,quantas vezes os oficiais do mesmo ofício nem uma olhadela dão ao que o vizinho faz! Mas tem toda a razão,era bom que a sociedade fosse acompanhando,de algum modo,o que a ciência produz,e que o cientista trabalhasse a pensar na sociedade.
Muito boa saúde,Breno,e persista nessa sua preocupação.