Fungos na produção de enzimas para aplicações industriais

Os fungos estão presentes em diversas etapas da produção industrial brasileira. Venha entender um pouco mais sobre esses seres vivos que não são somente cogumelos, e seus atuais usos.

Apesar de controversos, é comum ouvir falar que fungos são utilizados como base na produção de diversos produtos, desde tecidos até hambúrguer. Contudo, você já se perguntou como e por quê?

Existem aproximadamente 1,5 milhão de espécies de fungos desenvolvendo diversas funções e papéis na natureza e por causa disso, a Micologia – ciência que estuda os fungos – tornou-se relevante e abrangente em vários setores do conhecimento e da economia. Vamos explorar o mundo dos fungos utilizados no ambiente industrial.

Gravura obtida a partir de um post informativo. Na imagem há fungos representados como cogumelos gigantes e diferentes pessoas e profissionais observando-os e estudando-os. A saber, destaca-se que o conteúdo da gravura exemplifica a curiosidade à respeitos das diferentes aplicação dos fungos. Uma das aplicações será abordada no texto a seguir.
Fonte: Disponível em: https://www.wired.co.uk/article/fungus-climate-change.

Fungos na indústria

A indústria aplica a diversidade de enzimas de fungos em processos biotecnológicos. Ao conjunto de enzimas produzidas pelos fungos dá-se o nome de coquetel enzimático e as aplicações biotecnológicas são todo e qualquer processo de transformação de matérias-primas em um produto de interesse, ou seja, com valor agregado no mercado. Devido aos recentes avanços nos estudos com edição genética e relacionados ao metabolismo de fungos, visando principalmente aumento na produção e secreção de enzimas, a relevância deles na indústria foi reiterada.

Relevância dos fungos filamentosos

Além da variedade de espécies e e diversidade de enzimas, as principais causas de utilizar fungos em processos industriais são a rápida e alta taxa de crescimento, a facilidade de manipulação e cultivo e a secreção extracelular de enzimas, ou seja, diretamente no meio de cultura. Assim, A secreção extracelular facilita e diminui o custo da produção de enzimas, otimizando o processo.

Entre as várias espécies de fungos conhecidas, os filamentosos são os mais utilizados na indústria, pois são excelentes secretores de enzimas. Dentre os fungos filamentosos, destacam-se os gêneros pertencentes ao filo Ascomycota, como Aspergillus, Trichoderma e Penicillium.

Em cada gênero, podemos citar pelo menos uma espécie conhecida e amplamente utilizada na indústria. Por exemplo, Aspergillus niger,é utilizado na indústria de alimentos para a produção de ácido cítrico e enzimas como a amilase, pectinase e glicose oxidase. Logo, essas enzimas são utilizadas, respectivamente, no controle de qualidade dos alimentos, na produção de xaropes e na remoção de compostos indesejáveis durante a fabricação de bebidas. Outro exemplo é Trichoderma reesei, utilizado para a produção de lipases, xilanases e celulases. Também as Lipases são utilizadas na indústria química e alimentícia, já xilanases e celulases são cruciais na produção de biocombustíveis. E, por último, podemos exemplificar o Penicillium citrino também muito utilizado na indústria alimentícia, e suas enzimas são utilizadas para dar sabor aos queijos roquefort, gorgonzola e camembert.

Fungos na economia sustentável

Resumidamente, um dos principais papéis dos coquetéis fúngicos está relacionado à produção de alimentos, bioprodutos e biocombustíveis. Por causa das alterações climáticas e a criação dos tratados como o Protocolo de Kyoto e a Agenda 21, alternativas sustentáveis aos combustíveis fósseis vêm sendo discutidas desde o começo do século. Nesse contexto, o conceito de biorrefinarias vem sendo utilizado como um modelo de reaproveitamento de resíduos gerados a partir de biomassas vegetais. Define-se como biorrefinaria o processo capaz de utilizar resíduos lignocelulósicos (de diferentes origneis, como a partir da atividade agrícola, agroindustrial ou até de resíduos urbanos) para a obtenção de produtos de interesse industrial.

Na imagem há descrições dos diferentes tipos de biorrefinarias, a origem da biomassa utilizada e os produtos gerados a partir de cada uma dela. A saber, todas as biorrefinarias representadas utilizam coquetéis enzimáticos durante processo de produção.
Fonte: Imagem adaptada de NIZAMI et al., 2017.

Fungos em biorrefinarias

A degradação da parede celular vegetal das biomassa lignocelulósicas é coerente do ponto de vista ecológico, pois é um processo sustentável e ocorre na natureza em ação conjunta e cíclica; e o do ponto de vista econômico, pois a transformação dessas biomassas em um produto de interesse é lucrativa.

Portanto, unindo todas as informações, as enzimas fúngicas são de grande interesse para a biotecnologia, pois os produtos da sua catálise podem ser utilizados como precursores de processos ou diretamente na geração de produtos, como por exemplo, combustíveis, papel, alimentos, ração animal e químicos. Além da secreção de enzimas, os fungos também são capazes de degradar biomassas sob condições brandas, ou seja, sem qualquer tratamento químico ou físico. Em suma, os fungos utilizam e biomassa vegetal como fonte de carbono e através da degradação da parede celular geram produtos de valor agregado em diversas indústrias.

Empresas que utilizam coquetéis enzimáticos

Empresas como Johnson & Johnson e Glaxo empregam fungos em testes laboratoriais para controle de qualidade de cosméticos e alimentos. Outros exemplos são a Novozymes e Dupont, que dominam há anos o mercado de produção de enzimas e coquetéis enzimáticos para degradação de biomassa. E, por último, um exemplo nacional é a Raízen que utiliza coquetéis enzimáticos fúngicos na produção de bioenergia.

Como pode se ver, os fungos estão presentes no nosso dia a dia e participam da nossa vida mais do que imaginamos. Ainda existe um grande potencial econômico, industrial e biológico no uso desses seres vivos na produção de diversos produtos do nosso cotidiano.

A Autora

Fernanda Lopes de Figueiredo. Bióloga pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUCCAMP) mestre em Ciências pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e atualmente é aluna de doutorado na UNICAMP realizando seu projeto no LEBIMO. Trabalha com o melhoramento genético de fungos filamentos para a produção de coquetéis enzimáticos. 

Referências

1. Gupta VK, et al. (2019). Fungal enzymes: an overview. In: Fungi and Their Role in Sustainable Development. Springer, Cham.

2. Singhania RR, et al. (2013). Industrial applications of microbial cellulases. In: Advances in Biochemical Engineering/Biotechnology. Springer, Berlin, Heidelberg.

3. Jäger G, et al. (2020). Production of fungal enzymes for biomass degradation. In: Advances in Biochemical Engineering/Biotechnology. Springer, Berlin, Heidelberg.

4. NIZAMI, A.S. et al. (2017). Waste Biorefineries: Enabling Circular Economies in Developing Countries. Bioresource Technology.

5. NEVALAINEN, Helena; PETERSON, Robyn (2014). Making recombinant proteins in filamentous fungi- Are we expecting too much? Frontiers in Microbiology.

6. PANDEY, A. et al. (2000). Biotechnological potential of agro-industrial residues. I: Sugarcane bagasseBioresource Technology, 2000.

7.https://super.abril.com.br/ciencia/os-fungos-invadem-asfabricas#:~:text=Empresas%20como%20Johnson%20%26%20Johnson%20e,encontrado%20em%20abund%C3%A2ncia%20na%20natureza.

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