Um simples xadrez para N jogadores

Neste texto venho apresentar uma solução simplória mas eficaz para um dilema de todo enxadrista criativo com mais do que um amigo: como jogar o xadrez clássico com 3 ou mais jogadores?

O dilema não é novo, dado que há várias soluções propondo modificações no tabuleiro e por consequente nas peças para viabilizar este desafio. Em um cenário irônico, na série The Big Bang Theory, o protagonista Sheldon Cooper chega a trabalhar no desenvolvimento de uma solução para este dilema. Isto ocorre modificando o formato do tabuleiro, das casas, da movimentação das peças, levando a criação de duas outras peças que podem ser combinadas para gerar uma terceira nova peça… no fim o jogo se torna tão complexo que Sheldon, Howard e Leonard precisam de verdadeiros manuais de várias páginas para jogar, contando com acréscimos como carrinhos de golfe, máquinas do tempo e catapultas… (se ficou curioso, isto ocorre no episódio 22 da 4a temporada, “A Implementação Gnu”).

Em contextos um pouco mais sérios (se é que tratando de jogos podemos dizer que devemos ser sérios para atingirmos nosso objetivo…) temos algumas modificações de tabuleiros e ajustes de peças que permitem o jogo de um xadrez triplo. Sinceramente estas soluções sempre me incomodaram, acho que no momento em que modificamos severamente a estrutura do tabuleiro e das peças, já não estamos mais jogando xadrez e sim um jogo parecido, porém que permite três jogadores.

Dessa forma, após várias reflexões sobre o tema observei que a solução poderia não ser a modificação das peças nem do tabuleiro, e sim da dimensionalidade do jogo. No caso, uma partida convencional ocorre em duas dimensões espaciais descritas por um tabuleiro de 8×8. Uma solução para este dilema seria propor que a partida ocorra em seis dimensões espaciais… pode parecer um pouco complexo, mas sendo o tabuleiro uma representação de 2 dimensões espaciais, podemos representar estas 6 dimensões espaciais utilizando ao mesmo tempo 3 tabuleiros.

Neste contexto para facilitar as explicações com exemplos, nomearemos os jogadores de A, B e C. Cada jogador terá peças em dois tabuleiros chamados T1, T2 e T3.

T1: Jogador A – Brancas, Jogador B – Pretas;

T2: Jogador A – Brancas, Jogador C – Pretas;

T3: Jogador B – Brancas, Jogador C – Pretas.

As peças de cada jogador ocupam simultaneamente dois dos três tabuleiros (dimensão 4), assim para movermos uma peça, seu trajeto deve estar desobstruído em ambos os tabuleiros (exceção ao movimento de ataque do Peão, no qual a viabilidade de ataque em um tabuleiro e o espaço desocupado no outro, permite que a peça se mova neste tabuleiro uma casa na diagonal, diferindo do que seria sua movimentação natural).

Respeitando a ordem das peças brancas começarem, o jogador A é o primeiro a mover as peças (dado que ele controla apenas peças brancas). O jogador B joga em seguida, dado que em um tabuleiro ele controla peças pretas e no outro peças brancas. E o jogador C joga por último dado que ele controla apenas peças pretas.

Respeitando o critério de que uma peça coexiste em dois tabuleiros, se uma peça for eliminada em um tabuleiro, ela será no outro em que existe. De modo análogo, se um jogador eliminar com o mesmo movimento duas peças (uma de cada jogador), cada uma delas desaparecerá nos outros tabuleiros.

Convenções de jogo que determinam empate, xeque e xeque-mate precisam ser ignoradas enquanto houverem três tabuleiros em ativa. Neste caso, o jogo segue até que um dos três Reis seja eliminado (xeque-mate não faria sentido dado que pode ter interferência do terceiro jogador). Ocorrendo isto, dois dos tabuleiros perdem o sentido de existirem, e o jogo decorre com apenas um tabuleiro, retomando com isto as convenções padrões do xadrez.

Não se preocupe se a explicação pareceu confusa, abaixo ilustro as primeiras 6 ações de uma partida deste jogo acompanhando os jogadores A, B e C.

O contexto desse xadrez pode ficar ainda mais interessante, pois aumentando a dimensionalidade deste jogo conseguimos suportar nesta mesma estrutura partidas com 4 jogadores, realizando para isso a seguinte distribuição de jogador por tabuleiro e cores das peças.

Cada jogador terá peças em três tabuleiros chamados T1, T2, T3, T4, T5 e T6.

T1: Jogador A – Brancas, Jogador B – Pretas;

T2: Jogador A – Brancas, Jogador C – Pretas;

T3: Jogador A – Brancas, Jogador D – Pretas;

T4: Jogador B – Brancas, Jogador C – Pretas;

T5: Jogador B – Brancas, Jogador D – Pretas;

T6: Jogador C – Brancas, Jogador D – Pretas.

Neste caso, temos um jogo de xadrez acontecendo em um universo de 12 dimensões espaciais. Cada jogador tem suas peças em 6 dimensões.

De forma geral, para N jogadores, com N > 1, o problema de jogar xadrez nestas condições exige “N escolhe 2” tabuleiros.

2 jogadores – 1 tabuleiro – 2 dimensões espaciais;

3 jogadores – 3 tabuleiros – 6 dimensões espaciais;

4 jogadores – 6 tabuleiros – 12 dimensões espaciais;

10 jogadores – 45 tabuleiros – 90 dimensões espaciais;

n jogadores – n!/(2.(n-2)!) tabuleiros – n!/(n-2)! dimensões espaciais.

No caso de n jogadores, cada peça de um jogador, ocupará 2.(n-1) dimensões. Pois estará em confronto ao mesmo tempo com os n-1 outros jogadores, cada um em um tabuleiro distinto de 2 dimensões.

Assim, não importa a quantidade de amigos que tivermos, basta uma quantidade suficiente de tabuleiros para nos divertirmos juntos em um “simples” e clássico jogo de xadrez.

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