Um dos maiores Físicos do século XX, Richard Feynman, em seu livro “Deve ser brincadeira”, já alertava que no Brasil não se ensina Física adequadamente aos nossos alunos.  Nos anos 50, após ter realizado diversas palestras no Brasil, em muitas das quais esteve em contato com alunos, executando experimentos, ele mesmo afirma que “depois de muita investigação, finalmente descobri que os estudantes tinham decorado tudo, mas não sabiam o que queria dizer”.

Em 5 anos de docência, noto que os alunos têm a impressão de que a Física é apenas decorar e aplicar fórmulas, que ela não serve para nada além de cálculos. Quando analiso um aluno de primeiro ano do Ensino Médio que chega até mim, percebo que ele considera a Física um bicho papão; já meus alunos do curso pré-vestibular (que não foram meus alunos no Ensino Médio), acreditam que basta decorar as fórmulas para estar aprendendo Física. Essas duas realidades discentes exemplificam muito bem o que disse o senhor Feynmann.

Como professor de Física, tenho a preocupação de formar os alunos em sua plenitude, não focando apenas nas informações, mas acreditando na formação através do conhecimento. Assim, não me contento apenas em passar aquilo que os sistemas apostilados pregam. Pensando, então, em promover um conhecimento que, digamos, permita aproximar a Universidade do Ensino Médio (e vice versa), dei início, em 2017, a um projeto de Iniciação Científica Júnior com os meus alunos.

Mas não seria uma novidade, não é mesmo? Concordo que existam os programas de IC Juniores, mas resolvi ser um pouco audacioso fazendo uso do meu lado de pesquisador. Minha meta era fazer com que os alunos participassem de uma escrita científica, sendo que os nomes deles aparecessem como autores principais. Sim, um artigo científico! E deu certo! Com ajuda do meu amigo, professor de Química, Edivaldo, também doutorando na UNICAMP, aproveitamos a feira científica realizada anualmente em um dos colégios em que trabalho para colocar em prática esse plano. Montamos um circuito bem simples, com bateria, chave, fotorresistor (LDR) e LED. Como o fotorresistor depende da intensidade da luz incidente, pensamos em analisar a parcela de luz transmitida e absorvida por diferentes amostras de corante alimentício (diferentes concentrações), medindo apenas a alternância de valores das tensões no LED. Na Química, a absorbância e transmitância da luz são descritas pela chamada Lei de Lambert Beer. Os resultados alcançados deram tão certo que vimos a real possibilidade de publicar um artigo. Agora, nós, professores, os alunos envolvidos, os pais e a escola estamos comemorando nosso artigo publicado na Revista Estudos Aplicados em Educação. Afinal, você já imaginou um aluno ingressando no ensino superior com um artigo publicado no Lattes? Seria o sonho dos professores universitários terem alunos que não chegam tão imaturos do ponto de vista científico, já que nossos alunos chegarão sabendo o que é o método científico, como se faz um artigo e como se resolvem os problemas experimentais. Claro que dentro da cognição do Ensino Médio.

Diante das muitas notícias sobre cortes de verbas nas pesquisas que escurecem as perspectivas futuras, nós, professores do ensino médio, devemos pensar como é possível atuarmos frente à formação dos nossos alunos para que eles queiram (e possam), ainda assim, fazer Ciência? Olhemos para a relação candidato vaga do vestibular da UNICAMP, por exemplo. Segundo o site da COMVEST, os cursos que envolvem a formação em Física, em 2018, tiveram uma média de 8,0 candidatos por vaga na primeira fase. Por que o baixo interesse? Então, quantos grandes cientistas estamos perdendo por ano? Dentre outros fatores, possivelmente a forma com que estamos ensinando a Física deve contribuir, de certa forma, para distanciarmos os alunos das suas reais aptidões. A maioria dos professores foca apenas nas aplicações das fórmulas e faltam experimentos que demonstrem a aplicação do conhecimento teórico. Assim, não é difícil ouvir dos alunos: onde vou usar isso em minha vida? Devo muito a UNICAMP, uma vez que, com a formação que tive durante a graduação, adquiri a capacidade de expor aos alunos a aplicabilidade e a importância da Física em nossas vidas, por exemplo, trabalhando com eles conceitos que aparecem nos desenvolvimentos tecnológicos. E agora, mais ainda, com este projeto, é possível mostrar-lhes na prática a importância de se fazer pesquisa, e faço com que eles coloquem a “mão na massa”. As aulas não se limitam apenas ao esquema lousa e caderno, mas saem do pragmatismo para o construtivismo do conhecimento. Tenho consciência de que nem todos os alunos que fazem a IC Júnior necessariamente se tornarão cientistas. Entretanto, tenho a certeza de que esses alunos, mesmo que não se tornem cientistas, de agora em diante, serão agentes socialmente modificadores, pois valorizarão o desenvolvimento da Ciência. Assim, quem sabe um dia eles sejam os investidores e representantes da sociedade que jamais pensarão em cortar as verbas, pois entenderão a real importância do trabalho científico?

Artigo publicado:

INICIAÇÃO CIENTÍFICA NO ENSINO MÉDIO: A CONSTRUÇÃO DE UM APARATO EXPERIMENTAL DE BAIXO CUSTO PARA ESTUDO DA LEI DE LAMBERT-BEER A PARTIR DE UM CIRCUITO MONTADO COM FOTORESISTOR LDR

Link: http://seer.uscs.edu.br/index.php/revista_estudos_aplicados/issue/view/257/showToc

4 respostas

  1. Parabéns Edvaldo e Yuri pela iniciativa. Preparando os jovens para o futuro e manutenção da ciência e evolução da tecnologia

  2. Professor Luis,

    Agradeço de coração pela mensagem. Acredito que esse projeto seja o início para o fortalecimento da educação e da ciência.

  3. Muito boa a iniciativa, Yuri. Fico imensamente feliz por sua significante contribuição à sociedade.
    Você é um grande apaixonado pela ciência como um todo e essa paixão é fácil de ser reconhecida por gestos como essa iniciativa. Que Deus continue sempre te abençoando e que lhe ilumine com sabedoria em todos os caminhos que percorrer. Um grande Abraço!

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